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O fato consumado e o ônus da sucumbência

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Agenda 10/05/2006 às 00:00

4. REFLEXOS DO FATO CONSUMADO NO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA: APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE

            Nos capítulos anteriores, foram trazidas premissas para se chegar à conclusão do presente tópico, que é o tema central deste trabalho.

            No capítulo segundo, especificamente, foi demonstrado que o julgamento com base na teoria do fato consumado é uma modalidade de julgamento por fato novo superveniente, modalidade esta que detém peculiaridades próprias.

            Dentre estas peculiaridades, destaca-se que o argumento da teoria do fato consumado serve apenas para validar, em sentenças, as atividades ilegais protegidas por liminares. Assim, o beneficiário da medida liminar ilegal, que é confirmada apenas em respeito à situação consolidada pelo tempo, dá causa indevida à instauração do processo.

            Viu-se, também, que mesmo diante do fato novo superveniente extintivo do direito, como no fato consumado, é necessária a análise do mérito do processo pelo juiz, ainda que superficialmente, para que se possa decidir quanto ao capítulo da sentença relativo ao ônus da sucumbência.

            Já no terceiro capítulo, restou demonstrado que o princípio da causalidade, segundo o qual aquele que deu causa à instauração do processo judicial deve arcar com as suas custas, constitui o verdadeiro princípio informador da responsabilidade processual pelas despesas do processo no direito brasileiro, sendo a sucumbência um mero indício para a sua aplicação.

            Feitas estas premissas, resta saber, em primeiro lugar, por que no julgamento por fato novo superveniente o princípio da causalidade se revela mais adequado como regra da responsabilidade processual pelas despesas.

            Em segundo plano, porém não menos importante, saber-se-á como o princípio da causalidade é aplicado diante das peculiaridades do julgamento com base na teoria do fato consumado, que nada mais é do que uma modalidade de julgamento por fato novo superveniente, com o seu conseqüente reflexo no ônus da sucumbência.

            Pois bem: a primeira justificativa para que no julgamento por fato novo superveniente se observe o princípio da causalidade, como regra da responsabilidade processual pelas despesas, é histórica. Com efeito, o § 2º do art. 64 do Código de Processo Civil de 1939, introduzido pela Lei nº 4.632/1965 [54], preceituava que ‘’se a sentença se basear em fato ou direito superveniente, o juiz levará em conta essa circunstância para o efeito da condenação nas custas e nos honorários’’ (grifos nossos).

            Por outro lado, o referido dispositivo teve inspiração lusitana, prescrevendo o art. 663-3 do CPC português [55], cujo título é ‘’Atendibilidade dos factos jurídicos supervenientes’’, que a ‘’circunstância de o facto jurídico relevante ter nascido ou se haver extinguido no decurso do processo é levada em conta para o efeito de condenação em custas’’, ao passo em que o art. 447, 1, do CPC português, cujo título é ‘’ Impossibilidade ou inutilidade da lide’’, preceitua que ‘’quando a instância se extinguir por impossibilidade ou inutilidade da lide, as custas ficam a cargo do autor, salvo se a impossibilidade ou inutilidade resultar de fato imputável ao réu, que neste caso as pagará’’. [56]

            Assim, verifica-se, nos referidos diplomas legais, que o capítulo da sentença relativo às despesas processuais sempre mereceu uma atenção especial quando o julgamento se baseasse em fato ou direito superveniente, especialmente, quando este fato ou direito resultasse na chamada impossibilidade ou inutilidade da lide.

            O Código de Processo Civil vigente não manteve, no art. 462, a ressalva do código revogado quanto às despesas do processo em caso de julgamento por fato novo superveniente. Perdeu o legislador uma boa oportunidade de manter a coerência do sistema anterior.

            Mas não é só por razões históricas que as despesas do processo, no julgamento por fato novo superveniente, serão distribuídas de acordo com o princípio da causalidade. Sua aplicação encontra justificativa, também, na eqüidade.

            Ora, antes do implemento do fato ou direito superveniente, aquele que sofreu derrota como conseqüência desse fato ou direito superveniente tinha razão. Logo, não foi ele quem deu causa à lide, apenas não obteve o êxito diante de uma circunstância superveniente à sua instauração, não merecendo, assim, ser condenado no ônus da sucumbência.

            Com efeito, se ao tempo da propositura da demanda ou da resposta era adequada a posição assumida pela parte que veio a ser derrotada, apenas em decorrência da nova situação jurídica, nada mais justo do que isentá-la de eventuais custas e honorários, já que, na oportunidade, agira corretamente, haja vista que não havia o fato que determinou seu insucesso. [57]

            Portanto, de acordo com o princípio da causalidade, aquele que é derrotado no processo, exclusivamente em razão do evento superveniente, não deverá ser condenado a pagar as despesas do processo, uma vez que ele não deu causa a instauração da lide. Essa regra não será aplicada se a demanda já era infundada à época do ajuizamento da ação, independente do fato novo, devendo quem lhe deu causa arcar com o ônus da sucumbência.

            Dessa maneira, a dificuldade reside apenas em saber se o fato ou direito superveniente foi a causa exclusiva de acolhimento ou não da demanda. Se o fato superveniente não for acolhido, examina-se o mérito da lide como ela foi posta de início para saber quem deu causa indevida à ação, que será o sucumbente. Se for relevante o fato superveniente, da mesma maneira, examinar-se-á o mérito da lide, ainda que, superficialmente, para se saber quem deu causa ao processo independente do fato novo, pois será ele quem deverá arcar com o ônus da sucumbência.

            Infundada a demanda, mas procedente a alegação do fato extintivo – por exemplo, a reprovação em concurso público realizada com apoio em liminar antecipatória -, há convergência entre o juízo hipotético quanto ao mérito e o reflexo do fato superveniente, provocando a sucumbência do autor. Nas hipóteses de divergência, igualmente bastará o exame do mérito in status assertionis: desaparecida a utilidade da prestação jurisdicional requestada, conquanto fundada a demanda na perspectiva da inicial, responderá o réu pelas despesas. [58]

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            Assim também vem se orientando a jurisprudência pátria:

            PROCESSO CIVIL. HONORÁRIO. PRINCÍPIOS DA SUCUMBÊNCIA E DA CAUSALIDADE. FATO SUPERVENIENTE. PERDA DO OBJETO.

            Se a ocorrência de fato novo, não atribuível a qualquer litigante, esvazia completamente o objeto da ação, não havendo vencido nem desistente, não pode recair sobre nenhum deles a responsabilidade pelo pagamento do advogado do outro. Recurso não conhecido. [59]

            FATO SUPERVENIENTE – REMISSÃO.

            Ocorrendo a remissão da dívida antes de seu julgamento é de se extinguir o processo sem julgamento de mérito, por falta de interesse processual superveniente, não se devendo falar em parte sucumbente e em condenação em custas e honorários advocatícios. [60]

            Visto que o princípio da causalidade se revela mais adequado como regra da responsabilidade processual pelas despesas no julgamento por fato novo superveniente, resta saber agora como ele é aplicado diante das peculiaridades do julgamento com base na teoria do fato consumado, espécie de julgamento por fato novo superveniente.

            Conforme foi dito, o fato consumado é um fato novo superveniente extintivo do direito, assemelhando-se muito com o fenômeno previsto no Código português da impossibilidade ou inutilidade da lide.

            Não obstante o desaparecimento do direito material vindicado, mister se faz que haja uma análise do mérito do processo pelo juiz, ainda que superficialmente, para que se possa decidir quanto ao capítulo da sentença relativo ao ônus da sucumbência.

            Procede-se, como bem salienta o prof. Yussef Cahali, [61]

            (...) a um ‘’julgamento hipotético’’ da lide, embora extinta a ação pela causa superveniente, de modo que a ocorrência do fato extintivo superveniente apenas prejudica ao pedido principal, provocando-lhe a extinção, mas não interfere no exame da responsabilidade pelo ônus da sucumbência.

            No mesmo sentido, o profº Ovídio Batista: [62]

            A jurisprudência, no entanto, tem procurado mitigar a rigidez do princípio inscrito no art. 20 do CPC, orientando-se no sentido de atribuir a responsabilidade pelas despesas judiciais, na hipótese de aplicação do art. 462, à parte que perderia a demanda, se o fato ou direito supervenientes não tivessem ocorrido, bem como nos casos em que fique evidente não ter o réu dado causa à demanda. O sistema não admite que a verdadeira causa da demanda tenha sido a obscuridade da norma legal, ou a insuperável e constante controvérsia dos tribunais sobre sua interpretação. O pressuposto iluminista, é o de que a lei é sempre clara, de sentido transparente, de modo que o sucumbente teria dado causa à demanda em virtude de ter sobre ela uma concepção equivocada que não se justificava. Este é o verdadeiro fundamento da chamada responsabilidade objetiva.

            Esse entendimento também já foi compartilhado no Supremo Tribunal Federal [63], quando em julgamento se afirmou:

            A sucumbente, na espécie, é a parte que sucumbiria se a demanda prosseguisse, isto é, se fosse julgada sem consideração pelo direito superveniente. Para defini-lo, deve o juiz apreciar o mérito da pretensão, dizer de sua procedência ou improcedência, e, baseado nisso, julgar qual seria na espécie a parte vencedora se não proviesse o novo direito, e, desse modo, julgar a respeito de tais ônus.

            Mas, no julgamento com base na teoria do fato consumado, não é difícil se auferir quem será o responsável pelas despesas do processo. Ao revés, a análise é muito mais fácil do que quando se trata do gênero do julgamento por fato novo superveniente.

            Isto porque tem-se que levar em consideração o fato consumado no seu conceito clássico, exposto no capítulo introdutório, como o ‘’argumento judicial utilizado para validar, em sentenças, as atividades ilegais protegidas por liminares’’ [64].

            Ora, se o autor da demanda é beneficiado por uma medida liminar, que é reconhecida posteriormente na sentença como ilegal, mas confirmada apenas em respeito à situação consolidada pelo tempo, obviamente que ele deu causa indevida à instauração do processo e, conseqüentemente, deverá responder pelas despesas deste.

            Cumpre ressaltar que essa conclusão lógica somente se dará quando a teoria do fato consumado é invocada exclusivamente como justificativa para o acolhimento da demanda. Se o juiz, equivocadamente, decidir por relevar o fato consumado, porém afirmar também que, além dele, o direito postulado procede, certamente ele deverá condenar o réu, e não o autor, no ônus da sucumbência.

            Assim, a orientação tanto da doutrina quanto da jurisprudência é que se aplique o princípio da causalidade como regra da responsabilidade processual pelas despesas no julgamento por fato superveniente. E quando esse fato superveniente for o fato consumado, o beneficiário da medida liminar ilegal, mesmo vitorioso, deverá ser responsável pelo ônus da sucumbência.


5. O DEBATE JUDICIAL

            No capítulo introdutório, afirmou-se que a jurisprudência continua vacilando sobre a matéria em discussão. E o erro de uma decisão conserta-se com o recurso, como foi feito em inúmeros casos que ora serão analisados.

            Da mesma maneira que a consideração a fatos supervenientes no julgamento se justifica por uma questão de economia processual, o recurso de embargos de declaração revela-se como o primeiro meio mais adequado de corrigir o capítulo da sentença relativo ao ônus da sucumbência nos julgamentos com base na teoria do fato consumado.

            Isto porque as custas do processo constituem um capítulo da sentença à parte, pois, como adverte o prof. Dinamarco [65]:

            Basta pensar na condenação do vencido pelo custo financeiro do processo (custas, honorários da sucumbência), a qual se resolve em um preceito, contido no dispositivo da sentença, que não se confunde com o julgamento do conflito que motivou o demandante a valer-se dos serviços do Poder Judiciário; (...)

            Se as custas do processo constituem um capítulo autônomo da sentença, não se discute que ele é acessório, secundário ao pedido principal. Ora, se as despesas processuais derivam do próprio processo, não existindo forma de pleiteá-las de forma autônoma, obviamente que deverá ser considerado como um capítulo secundário da sentença.

            É por isso que os embargos de declaração se revelam como o recurso ideal para, em respeito ao princípio da economia processual, solucionar tal capítulo acessório logo na primeira instância, com o necessário efeito modificativo do julgado.

            E podem ser utilizados como fundamentos dos embargos tanto o vício da contradição, previsto no inciso I do art. 535 Código de Processo Civil, quanto ao vício da omissão, previsto no inciso II do mesmo artigo.

            Consoante ensina o mestre Barbosa Moreira [66], também ‘’pode ocorrer contradição entre alguma proposição enunciada nas razões de decidir e o dispositivo’’.

            Dessa maneira, pergunta-se se existe decisão mais contraditória do que aquela que, fundamentando-se na teoria do fato consumado, reconhece que direito algum assiste ao demandante, portanto, quem deu causa indevidamente ao processo, e, ao final, condena justamente àquele que o direito assiste (logo, não deu causa à lide) ao ônus da sucumbência?

            Assim, se a sentença adota como exclusiva fundamentação fato novo superveniente (art. 462 do CPC), consistente na situação fática consolidada pelo tempo, sem acolher o direito invocado na exordial, contraditória é a condenação da parte contrária no ônus da sucumbência, principalmente quando ela não der causa à demora no julgamento do feito.

            Também a omissão pode ser fundamento dos embargos.

            Conforme foi dito, no segundo capítulo, a autorização do juiz conhecer de-ofício o fato superveniente previsto no art. 462 não significa que o órgão judiciário deverá surpreender as partes no julgamento. Com efeito, feita a alegação do fato superveniente por uma das partes interessada, a outra deverá ser intimada para se manifestar, respeitando, assim, o princípio do contraditório.

            Tal contraditório é a oportunidade para a parte, ainda que seja em respeito ao princípio da eventualidade, requerer ao menos a isenção do ônus da sucumbência caso seja reconhecido o fato superveniente.

            Portanto, feito o pedido expresso de isenção do ônus da sucumbência, o Magistrado deverá se manifestar sobre ele, ainda que para rejeitá-lo, sob pena de incorrer no vício da omissão passível de correção através dos embargos.

            Seja pela omissão, seja pela contradição, o mérito do recurso deverá ser julgado, ou seja, ele deverá ser conhecido, mesmo que não seja provido, como ocorreu no julgamento dos embargos de declaração na Ação Declaratória nº 140.98.631959-2 [67], sob o seguinte argumento:

            Noutro diapasão, por força do prescrito no art. 20, caput, do Código de Ritos, impossível juridicamente se apresenta o pedido empreendido pela embargante, atinente a desoneração da instituição recorrente quanto ao ônus da sucumbência.

            (...)

            Do exposto, rejeito os presentes Embargos Declaratórios, por se afigurarem eles manifestamente improcedentes, mantendo, integralmente, a Sentença originária por seus próprios fundamentos.

            Com todo o respeito ao digno Magistrado, o mesmo cometeu o erro mencionado, no capítulo terceiro, ao identificar no art. 20 do CPC a regra pura da sucumbência, olvidando-se da causalidade que deveria nortear o caso concreto. Sua decisão foi reformada pelo Tribunal de Justiça da Bahia.

            Mas da mesma forma que os embargos de declaração podem ser rejeitados, os mesmos podem ser acolhidos. E o próprio Magistrado da decisão acima transcrita, revendo o seu posicionamento anterior, acolheu outro recurso da Universidade nos seguintes termos:

            De outra parte, em respeito ao princípio da causalidade, só poderia ser a instituição de ensino embargante responsabilizada em arcar com o ônus sucumbencial acaso tivesse sido responsável pelo atraso e decurso de tempo

que oportunizou, de sua hora, a ocorrência de fato consumado consistente na conclusão do curso de graduação pela embargada.

            (...)

            Do exposto, acolho, integralmente, os presentes embargos de declaração, por se afigurarem eles manifestamente procedentes, suprimindo do julgado embargado, por via de conseqüência, a condenação da embargante no ônus da sucumbência. [68] (grifos nossos)

            Digna de louvor à reconsideração do entendimento do Magistrado acima transcrito, aplicando, agora, o princípio da causalidade como regra de distribuição da sucumbência. Entretanto, faltou afirmar que o julgamento com base na teoria do fato consumado implica reconhecer que o autor deu causa indevida ao processo.

            Observe-se, ainda, no julgamento dos embargos de declaração opostos nos autos da Ação Declaratória tombada na 24ª Vara Cível de Salvador sob nº 140.00.739583-7 [69], que a juíza acolheu o recurso argumentando que:

            Com acerto, a entidade embargante insurge-se contra sua condenação no ônus da sucumbência. Tendo a sentença fundamento na consolidação do estado de fato, decorrente da demora na prestação jurisdicional e conclusão do curso universitário pela parte autora, não há justiça em impor o ônus da sucumbência a universidade acionada, até mesmo porque se a fundo se analisar, sucumbência inexistiu.

            (...)

            Ante o exposto, acolho embargos de declaração opostos às fls. 64/69 e às fls. 80/81, para suprimir da parte dispositiva da sentença de fls. 59/62 a condenação da ré, Universidade Católica do Salvador – UCSAL, no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, bem como para integrar a referida decisão com as razões acima expressadas.

            (grifos nossos).

            A referida decisão utiliza o fundamento da ‘’justiça’’ para afastar o ônus da sucumbência, o que não deixa de estar correto, porém a mesma peca ao afirmar que ‘’sucumbência inexistiu’’, quando poderia ter invocado o princípio da causalidade ao caso concreto para melhor fundamentar a decisão.

            Outra decisão proferida, nos embargos de declaração opostos em face da sentença que julgou, simultaneamente, as Ações Cautelar e Declaratória ajuizadas na 18ª Vara Cível sob nºs, respectivamente, 140.99.066107-3 e 140.99.682180-1 [70], o ilustre juiz de Direito pronunciou-se da seguinte maneira:

            Assiste razão à colenda instituição Embargante. Deu-se como fundamento para arrimar a decisão de mérito a evidência da consolidação da situação fática, ante o lapso temporal que importou na conclusão do curso de Direito pela acionante. Sem dúvida, a demora na entrega da prestação jurisdicional vem de coincidir com a conclusão da jornada da formação acadêmica, o que não autoriza condenação nas verbas da sucumbência. (grifo nosso)

            Apesar de correto o resultado de tal decisão, careceu ela de fundamentação, pelo que poderia até ser considerada nula por ignorar a exigência constitucional de motivação das decisões judiciais.

            Ainda em sede de embargos, o douto Magistrado da 12ª Vara Cível de Salvador acolheu os embargos de declaração opostos contra sentença na Ação Ordinária com Pedido de Antecipação dos Efeitos da Tutela nº 140.99.682258-5 [71], in litteris:

            Razão assiste à Embargante porquanto a procedência da ação decorreu de fato novo superveniente consubstanciado na consolidação no tempo da situação fática face a conclusão dos estudos do autor sob o manto da decisão liminar

, situação esta a que nossos Pretórios vêm dando guarida com o objetivo de não prejudicar o estudante. Em vista disto, não é justo penalizar a instituição de ensino ré por uma situação a que não deu causa e nem concorreu para tanto.

            (...)

            Pelas razões expostas, conheço dos embargos declaratórios para acolhê-los, in totum, reformando a decisão na parte por eles objurgada isentando a Embargante do pagamento do ônus da sucumbência. (grifos nossos)

            Trata-se de uma decisão razoável, pois além de se fundamentar na eqüidade, dispõe que a ré não deu causa nem concorreu para esta situação.

            Mas se os embargos de declaração, como primeira opção de recurso, forem rejeitados ou não conhecidos, certo é que a apelação, com a sua ampla devolutividade de matéria recorrível, também serve como meio de impugnação do capítulo da sentença relativo ao ônus da sucumbência nos julgamentos fundamentados na teoria do fato consumado.

            E foi justamente no Tribunal de Justiça da Bahia que foi obtido as melhores e mais fundamentadas decisões acerca da matéria. Nesse particular, transcreve-se a ementa do julgado [72] que se acredita mais se aproximar com as premissas postas neste trabalho:

            EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. APELAÇÃO CÍVEL. EXISTÊNCIA DE OMISSÃO. TRANSFERÊNCIA DE ESTUDANTE. CONCLUSÃO DE CURSO. CAUSA SUPERVENIENTE. PERDA DE OBJETO. AFASTAMENTO DA SUCUMBÊNCIA. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE.

            I. Tendo em vista o princípio da causalidade, o fato superveniente, qual seja, a conclusão do curso de graduação do interessado/apelado, esvaziando a demanda, com a perda do objeto e fazendo prevalecer a teoria da convalidação dos atos, a sua causa não podendo ser atribuída a nenhuma das partes, torna incompatível a fixação de honorários de advogado.

            II. O afastamento do ônus da sucumbência do embargante, não exclui a autora de arcar com as custas processuais, porquanto foi quem deu início à causa.

            EMBARGOS ACOLHIDOS. (grifos nossos).

            Realmente, perfeita a decisão: aplicou o princípio da causalidade como regra de distribuição da sucumbência no julgamento por fato superveniente, além de reconhecer que o autor deu causa indevida ao processo, ainda que vencedor no feito originário, por conta da teoria do fato consumado.

Sobre o autor
Daniel Martins Felzemburg

Procurador Federal, atualmente exercendo a chefia da Procuradoria Federal Especializada do INCRA no Estado do Tocantins. Graduado em Direito pela Universidade Salvador – UNIFACS (2003). Especialista em Direito Processual Civil pelas Faculdades Jorge Amado (2005), em Salvador-BA. Sócio honorário da Academia Brasileira de Direito Processual Civil desde 2006. Pós-graduando Lato Sensu em Direito Público pela Universidade de Brasília - UNB

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FELZEMBURG, Daniel Martins. O fato consumado e o ônus da sucumbência. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1043, 10 mai. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8378. Acesso em: 22 dez. 2024.

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