Os sistemas fiscais dos Estados adotam estratégias para atrair capital, que levam à instalação de um ambiente de guerra fiscal interestadual. Porém, se os governos abrem mão das receitas tributárias relacionadas com o patrimônio e a renda, precisarão utilizar outros meios de angariar receitas para atender às necessidades da população.
Nesse cenário, as fazendas públicas estaduais buscam obter os recursos necessários às suas obrigações por meio da retenção na fonte dos assalariados e, principalmente, pela tributação indireta dos bens de uso e consumo. Com isso, a tributação deixa de basear-se na justiça fiscal e na capacidade contributiva para fundar-se em critérios utilitaristas que apenas visam à praticidade da arrecadação. É o fenômeno da neotributação.
Deste modo, a carga fiscal acaba por ser muito mais suportada pelos pobres do que pelos ricos, sendo este um elemento agravador da concentração de renda nas mãos dos mais abastados no Brasil. Entretanto, não há que se propor a superação do capitalismo, mas, sim, adequar o sistema tributário, pois o problema do aumento de desigualdade se instaura, na medida em que a taxa de rendimento do capital torna-se maior do que a taxa de crescimento da renda e da produção nacionais.
Para haver um real combate às desigualdades sociais pela via da tributação, faz-se necessária a distribuição de rendas, com fulcro na divisão justa do ônus fiscal pela capacidade contributiva, a fim de evitar a concentração de renda pelas classes ricas apenas.
É possível promover alterações para realizar uma reforma tributária igualitária. Dentre elas, pode-se destacar a modificação para que se proceda a uma maior incidência de tributos sobre a renda do que sobre o consumo, de forma a possibilitar a concretização do princípio da progressividade tributária insculpido em nossa Magna Carta.
A partir da promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, o fenômeno das contribuições parafiscais aumentou. Apesar de a carga tributária brasileira não se caracterizar por ser alta, sendo comparável à média dos países desenvolvidos, tributamos muito mais o consumo do que a renda, quando comparado com os sistemas tributários de outros países.
É fácil perceber que a tributação sobre o consumo, embora dirigida à população por inteiro, atinge em maior parte os mais pobres, que acabam por gastar quase todos os seus rendimentos na aquisição de bens e serviços essenciais à sua própria sobrevivência. Já a tributação da renda possibilita alcançar a classe alta, incidindo proporcionalmente mais sobre os rendimentos mais elevados.
Por essas razões, a tributação sobre o consumo não favorece a acumulação de capital pelas pessoas financeiramente menos favorecidas, sendo um meio inferior de promoção da justiça distributiva, pois tem um efeito regressivo, na medida em que essas camadas excluídas não conseguem poupar o suficiente para formar patrimônio a ser tributado.
Há que se inferir que a tributação sobre o consumo atende muito mais aos interesses de arrecadação do Estado, a partir da perspectiva liberal de eficiência econômica, do que à ideia de justiça fiscal, combate à desigualdade e fortalecimento do Estado Social.
A progressividade na tributação da renda representa, portanto, o mais importante instrumento de redistribuição de recursos em um Estado Social, sendo que em países em que há maior desigualdade social, a progressividade dos impostos sobre a renda é a medida exigida pelos princípios da liberdade, da igualdade equitativa de oportunidades e do respeito à diferença.
Assim sendo, uma reforma necessária no Brasil para o imposto de renda de pessoa física consiste na previsão de uma progressividade com a introdução de um maior número de alíquotas, que cheguem a patamares mais elevados para os altos rendimentos, a fim de levar a tributação da renda praticada no Brasil a padrões internacionais e utilizar tal mecanismo como política de redistribuição de rendas. Para além, caberia a desoneração dos tributos da União incidentes sobre o consumo, como o IPI, o PIS e a COFINS, sem comprometer a arrecadação própria dos Estados e dos Municípios no que tange aos tributos de suas competências.
Ainda, outra forma de combater a desigualdade social pela via da tributação é a introdução de um imposto sobre as grandes fortunas, como medida para redistribuir o capital, promovendo o maior equilíbrio entre os segmentos sociais. Trata-se aqui da função distributiva, uma vez que se buscaria regular o capitalismo limitando a extrema concentração de renda nas mãos de poucos.
Destaque-se que é a própria Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 que prevê a criação do imposto sobre grandes fortunas (IGF). De acordo com o art. 153, VII, da CRFB/88, o IGF deve ser instituído por lei complementar, todavia, esta lei nunca foi aprovada no Brasil.
Vale ressaltar que o maior obstáculo para a instituição do citado tributo não é de ordem normativa, mas de ordem política e econômica, uma vez que a classe mais alta da sociedade possui grande influência no Congresso Nacional.
Com isso, urge discutir, no Brasil, tais medidas, com vistas à conquista de uma verdadeira reforma tributária socialmente igualitária.