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Transexualidade e os reflexos previdenciários no Brasil ano 2020

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4. SISTEMA BINÁRIO X INCLUSÃO DOS TRANSEXUAIS NO DIREITO PREVIDENCIÁRIO

A CF/88 criou uma conjuntura de regras para se ter acesso a previdência social. As modalidades que compõem esse mecanismo de regas são: aposentadoria por idade (65 anos + 20 de contribuição para homens e 62 + 15 de contribuição para mulheres) e aposentadoria rural (60 anos homens e 55 para as mulheres + a comprovação de 15 anos de contribuição. A contribuição atinge 2,1% de sua produção comercializada conforme a lei nº 8.212/1991 no art. 25, I e II.). Cada modalidade estabelecida possui critérios específicos e compartilham de diferenças para o sexo feminino, sendo o principio de justiça o responsável por essa diferença. Os fundamentos se encontram nas desigualdades que os gêneros possuem, tais como produção social, atividades econômicas desenvolvidas e reprodução social.

A desigualdade intitulada é reservada a mulher, visto que a demanda de produção social seria maior (dúplice ou tríplice jornada de trabalho, cominando os afazeres domésticos) e de menor remuneração, bem como o da reprodução social (cuidados com proles e membros familiares). O sistema binário não é só compensatório como reconhecimento e valoração dos trabalhos realizados pelo gênero feminino, vejamos a seguir:

[...] A Previdência Social é, hoje, a principal política que realiza a conexão econômica entre a esfera produtiva e a esfera reprodutiva, conferindo um bônus pelo sobretrabalho feminino acumulado ao longo da vida ativa. Esse reconhecimento econômico por meio do Estado, na forma de um direito, é em si transformador porque relativiza a hierarquia entre trabalho produtivo e reprodutivo, e altera sua correlação de forças. (MOSTAFA et al., 2017. p. 5)

O reconhecimento ademais visa diminuir a dificuldade que o gênero possui em acumular contribuição.

[...] O que tem impelido as mulheres a aposentarem-se por idade é precisamente a dificuldade de acumular anos de contribuição em número suficiente para se elegerem à aposentadoria por tempo de contribuição. De acordo com as concessões de 2014, as mulheres contribuem, na mediana, 22 anos para a Previdência Social, enquanto os homens, 35 anos. Por isso, a mudança de 15 para 25 anos de contribuição como critério de acesso à aposentadoria trará uma intensa elitização e masculinização do sistema de previdência, refletindo a imensa desigualdade do mercado de trabalho em nosso país.(MOSTAFA et al., 2017. p. 6)

Portanto, ao estabelecer um sistema binário assegura a dignidade da pessoa humana, incluindo as mulheres, de acordo com a capacidade física, biológica, bem como o desempenho de mais atividades além do trabalho de cada gênero.

O sistema binário surgiu com a função de distinguir a feminilidade e a masculinidade.

Os transexuais por sua vez, não se encaixam nessas identidades específicas, pois ao impor um dos dois gêneros, restringem os a um determinado padrão deixando de os referirem como os transexuais se enxergam e se expressam na sociedade. 

 Esses adjetivos (feminino e masculino) são aparatos para entender as ações humanas. O conflito de gênero com o sexo biológico deve ser tratado com dignidade, sem caracterizar os gêneros em caixinhas. O Psiquiatra SAADEH (2019) ao realizar uma palestra da USP Talks expõe que “o problema não é ter caixinhas; e se resumir em caixinhas”. 

Hodiernamente o estado democrático brasileiro não possui nenhuma jurisprudência apta a lidar com as causas de transexuais, salvo os que já aposentaram em regime de contribuição diferente do RGPS. Mesmo em regime diferente, ainda encontraram problemas para reconhecer um direito já adquirido. Vejamos o caso concreto da Servidora Pública do MPSP:

“Após trabalhar por 32 anos, 6 meses e 24 dias como servidora no MPSP (Ministério Público de São Paulo), Mary Fernanda Mariano, 54, se aposentou. Oficial de promotoria, ela foi a primeira transexual da instituição paulista que recebeu o benefício. (Folha de São Paulo , 2019)

Em 2020, uma reportagem no mesmo estado informa que a aposentadoria de um transexual fora suspensa por dúvidas jurídicas, note-se:

O estado de São Paulo lida pela primeira vez com um pedido de aposentadoria de uma pessoa trans e analisa se o tempo de trabalho a ser considerado é aquele estabelecido para homens ou mulheres. Enquanto isso, o servidor público em questão foi mandado de volta ao trabalho no Centro de Detenção Provisória do Butantã. (G1, São Paulo 2020)

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Ambos enfrentaram o mesmo problema habitual do transexual em relação à previdência social. Sejam por dúvidas jurídicas, falta de documentos, modificações nos documentos, tempo de contribuição, sempre ocorrerão problemas ao reconhecer um direito já adquirido.

A descrição do gênero de outra forma, ao ser estabelecido apenas dois padrões específicos permitem a opressão e discriminação com os demais, sendo importante uma análise de todo o aparato social, bem como seu desenvolvimento para atualizar as leis, pautando sempre na inclusão.

Pontua SAVARIS e GONÇALVES (2018) que existem formas para proteção civil a qual objetiva a “garantia de liberdades fundamentais e asseguração dos bens e pessoas no contexto de um Estado democrático e a proteção social no qual oferece cobertura contra os principais riscos suscetíveis de gerar uma degradação da situação dos indivíduos”. Nesse sentido, a previdência social é uma seguridade implementada por meio de políticas publicas para promover a segurança social de modo amplo.

Para auferir a melhor condição de integração no âmbito legislativo necessita-se de uma legislação que faça a inclusão ao sistema com seu próprio gênero. Na previdência social seria necessário efetivar através de ferramentas tecnológicas, campos onde o transexual possa inserir informações, bem como laudos sobre suas condições psíquicas, físicas, biológicas e a alteração junto ao RGPS. Essa transigência deixa a salvo a possibilidade para eventuais modificações a depender do próprio transexual.

Outra funcionalidade segundo Ribeiro (2019) seria viável ainda uma espécie de conferência da vida do segurado, tendo em vista que o princípio da dignidade humana, bem como o direito da personalidade resguarda a impossibilidade de atribuir a mudança apenas no sexo biológico ou no registro público. Para a inclusão, então, é adotada uma formatação de um sistema misto, contabilizando o critério tempo e idade proporcionalmente ao gênero escolhido, sendo uma regra de três simples.  Esse cálculo será responsável por adequar a realidade social dos trangêneros ao contabilizar a idade e o tempo de contribuição como homem e como mulher.

In casu, um transexual que tenha a idade de 60 anos e + 13 anos de contribuição: Se homem e se identifica como uma mulher teria que atingir a idade de 62 anos e + 2 anos de contribuição, em contra partida, se mulher e se identifica como homem, teria que ter a idade de 65 anos e contribuir por 7 anos de forma complementar. Portanto, há redução das contribuições, bem como a idade para o posterior sexo feminino e para o sexo masculino, um aumento.  A aposentadoria por idade e idade rural não possui tanta diferença, visto que versará 55 anos para o sexo feminino e 60 para o masculino, em conjunto com os 15 anos de contribuição, conforme o sistema binário vigente no sistema previdenciário. Veja-se que não há prejuízo nenhum a autarquia Federal, por outro lado, há complemento, passando a ter mais contribuições.

Outra hipótese seria a conversão do sistema binário disposto na CF/88 em um sistema único, sem diferença de idades, atribuições ou diferenças biológicas. Em exemplo a idade de aposentadoria e contribuição seria igual para todos. No entanto, fazendo essa conversão estaria prejudicando o sexo feminino, uma vez que possuem e passam por diferenças biológicas, sociológicas e culturais abordadas. A solução, portanto, seria fazer um estudo clínico para acoplar de forma igualitária todos os gêneros, sem dificuldades ou exclusão.

Essas e inúmeras formas de atuação do Estado democrático de direito, pautando nos princípios e o rol de direitos previsto na Constituição seria eficiente e trariam uma evolução jurídica para os trangêneros incluindo e enquadrando-os como gênero que são.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho explanou pontos e considerações importantes sobre o sistema previdenciário e os transexuais. A seguridade social no ordenamento jurídico brasileiro possui o intuito de salvaguardar as pessoas, como sua função protetora, assim, é capaz de garantir uma vida digna e promover bem estar e a paz social aos seus dependentes.

Em propósito do presente trabalho, discussões que permeiam a inclusão dos transexuais no direito previdenciário, pauta-se na Constituição Federal e princípios fundamentais, tais como dignidade de qualquer pessoa humana e o direito a personalidade.

As lacunas são recorrentes quando o assunto é a aposentadoria dos transgeneros, visto que o mesmo tem diferentes aspectos e não se encaixam no sistema binário, sendo, portanto, responsável em termos pelo problema ao comprovar tempo de contribuições como determinado gênero, idade, e ensejar a aposentadoria.

Expostos casos concretos que noticiados e demonstrados o constrangimento, obtém o condão de demonstrar as problemáticas que os transexuais enfrentam para se aposentar, mesmo com o cumprimento dos requisitos e sendo um direito já conquistado e adquirido inerente a qualquer pessoa.

Diante a tudo que fora exposto, infere-se que o judiciário e doutrinadores, devem dispor acerca dos pormenores desse gênero com mais habitualidade em função do aumento e da dificuldade que os transexuais encontram em se integrar na sociedade, em atenção as suas particularidades, visando decisões coerentes, e buscando o fim da lei: a justiça e a regulamentação das normas da sociedade. De interesse público, o Estado deve intervir, retirando os legisladores da inércia.

Em conclusão ao estudo realizado, aguarda discussões em torno do tema, para que as questões acerca da falta de legislação, e mudanças no sistema previdenciário sejam passíveis de harmonização.


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Sobre os autores
Leonardo Navarro Aquilino

Possui graduação em Direito pelo Centro Universitário de Rio Preto (1997) e especialização em Direito das Obrigações pela UNESP. Atualmente é professor da Fundação UNIRG nas áreas de Direito Empresarial e Processo Civil, havendo ministrado aulas em Direito Civil, Direito Empresarial, Direito Tributário e Prática Forense, bem como, professor da Universidade Católica do Tocantins, em Palmas, ministrando aulas em Direito do Trabalho, Direito Tributário e Prática Trabalhista. Professor da Faculdade Serra do Carmo, ministrando Direito Empresarial. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em direito empresarial e tributário. Vice Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Subseção de Gurupi, Estado do Tocantins 2007/2009. Membro do Conselho Acadêmico Superior do Centro Universitário UNIRG Biênio 2008/2010. Conselheiro Estadual da Ordem dos Advogados do Brasil, Secção Tocantins, Triênio 2010/2012. Mestre em Direito pela Universidade Católica de Brasília. Membro do Grupo de Pesquisa Terceiro Setor e Tributação Nacional e Internacional. Membro do Corpo Editorial da Revista de Direito da Escola Superior da Advocacia OAB Tocantins.

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