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Barragens de mineração: a (in)eficiência da fiscalização pelo poder público

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Analisam-se os casos de Mariana e Brumadinho para investigar a (in)eficácia da legislação ambiental e de segurança em barragens de rejeitos no Brasil.

Resumo: O presente artigo tem como objetivo realizar um recorte acerca dos casos de Mariana e Brumadinho, para analisar a (in)eficácia da legislação ambiental e de segurança em barragens de rejeitos no Brasil. São objetivos específicos: analisar as possíveis medidas de segurança e precaução trazidas pela Lei nº 14.066/20; verificar à luz do preceito da defesa do meio ambiente o que orienta a legislação atual brasileira; elencar quais eram os aspectos legais para a normatização da segurança de barragens de rejeitos no Brasil na época das tragédias de Mariana e Brumadinho. O problema é: em que medida a proteção ao meio ambiente pôde ser garantida, na prática, através da Política Nacional de Segurança de Barragens, nos casos de Mariana e Brumadinho? O presente estudo é de natureza qualitativa. O método científico que sustentou esta pesquisa foi o exploratório através do levantamento bibliográfico. Conclui-se que a proteção ao meio ambiente não pôde ser garantida, na prática, através da Política Nacional de Segurança de Barragens, nos casos de Mariana e Brumadinho, devido às fragilidades técnica e política dos órgãos públicos ambientais, como também às falhas do processo de gestão de riscos por parte das corporações.

Palavras-chave: Legislação. Meio ambiente. Barragens. Mineração. Fiscalização.

Sumário: Introdução. 1 Desenvolvimento. 1.1 Do direito ambiental: conceito e noções gerais. 1.2 Da responsabilidade civil: à luz dos princípios constitucionais ambientais. 1.2.1 Dos princípios. 1.2.2 Da responsabilidade civil objetiva e subjetiva. 1.2.3 Direitos difusos, coletivos em sentido estrito e individual homogêneo. 1.3 A proteção ao meio ambiente no Brasil: Política Nacional de Segurança de Barragens. 1.3.1 Da Lei nº 12.334, de 20 de setembro de 2010. 1.3.2 Segurança em barragens no Brasil: aspectos legais para a sua normatização. 1.3.3 Classificação de barragens. 1.3.4 Classificação quanto à categoria de risco. 1.3.5 Classificação quanto ao dano potencial associado. 1.3.6 Classificação quanto ao volume. 1.3.7 PSB – Plano de Segurança em Barragem. 1.3.8 Revisão Periódica de Segurança de Barragem. 1.4 Inspeções Regulares de Segurança de Barragens – IRSB. 1.5 A (in)eficácia da legislação ambiental e de segurança em barragens no Brasil: um olhar sobre Mariana e Brumadinho. 1.6 Da Lei nº 14.066, de 30 de setembro de 2020. Conclusão. Referências.


Introdução

Há muitos relatos de desastres ambientais ocorridos no mundo e que atingiram a sociedade de forma a lhe causar grande impacto negativo. Contudo, os desastres de Mariana e Brumadinho se constituíram, na história recente de Minas Gerais e do Brasil, em grande preocupação em virtude da extensão de todos os danos provocados à fauna, à flora, às vidas humanas, perdidas nesses desastres, ao meio ambiente e também à economia do Estado e do Brasil. Nessa direção há que se considerar que todo desastre ambiental causa danos tanto à economia quanto à vida e ao meio ambiente, pois é “inconcebível a dissociação entre a preservação do meio ambiente, o crescimento econômico e a equidade social” (SILVA, 2015, p. 32).

O presente trabalho tem como objetivo geral realizar um recorte acerca dos casos de Mariana e Brumadinho, para analisar a (in)eficácia da legislação ambiental e de segurança em barragens no Brasil.

Tem-se, portanto, como objetivos específicos: analisar as possíveis medidas de segurança e precaução trazidas pela Lei nº 14.066/20; verificar à luz do preceito da defesa do meio ambiente o que orienta a legislação atual brasileira com a finalidade de possibilitar a coexistência de desenvolvimento econômico e manutenção da qualidade ambiental; elencar quais eram os aspectos legais para a normatização da segurança de barragens no Brasil na época das tragédias de Mariana e Brumadinho.

O problema conduz a um questionamento, que é: em que medida a proteção ao meio ambiente pôde ser garantida, na prática, através da Política Nacional de Segurança de Barragens, nos casos de Mariana e Brumadinho?

A escolha pelo tema, sob o título “Barragens de mineração: a (in)eficiência da fiscalização pelo Poder Público”, levou em conta principalmente o interesse das pesquisadoras em refletir e analisar como se dá na prática a observância da norma jurídica, no que concerne ao direito ambiental brasileiro. Na academia, estudando a normativa brasileira, pode-se perceber que no dia a dia, na prática, a norma jurídica tem sido negligenciada, o que tem favorecido a existência de acontecimentos como as tragédias de Mariana e Brumadinho. Por esse motivo considerou-se necessário estudar esse tema, realizando, para tanto, uma investigação de natureza qualitativa.

Quanto ao método científico que sustentou esta pesquisa, a opção foi pelo método exploratório. Como procedimento foi realizado o levantamento bibliográfico em livros e periódicos que possibilitaram a investigação do tema em estudo. Gil (1994, p. 71) explica que a principal vantagem da pesquisa bibliográfica reside no fato de permitir ao investigador a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar diretamente.

A par da decisão do método, julgou-se mais conveniente a adoção da pesquisa qualitativa e bibliográfica. Para esse tipo de pesquisa, utiliza-se de elementos ou categorias teóricas já manipulados por outros pesquisadores e devidamente registrados (SEVERINO, 2007, p. 122).

A estrutura da pesquisa foi elaborada em seis tópicos: O primeiro aborda o direito ambiental: conceito e noções gerais. O segundo trata da responsabilidade civil objetiva e subjetiva. Já o terceiro tópico trata da proteção ao meio ambiente no Brasil: Política Nacional de Segurança de Barragens. O quarto tópico aborda as inspeções regulares de segurança de barragens. O quinto, por sua vez, contempla o foco da pesquisa, analisando a (in)eficácia da legislação ambiental e de segurança em barragens no Brasil: um olhar sobre Mariana e Brumadinho. O sexto e último tópico trata da Lei nº 14.066, de 30 de setembro de 2020.

A relevância deste trabalho está no fato de poder contribuir para a reflexão de um tema de grande importância no aspecto do direito ambiental brasileiro. Essa contribuição se fundamenta na ideia de que “os homens de cada período histórico assimilam os resultados científicos das gerações anteriores, desenvolvendo e ampliando alguns aspectos novos” (CERVO, 1983, p. 9).


1. Do direito ambiental: conceito e noções gerais

Diferentes normas e leis compõem o arcabouço legal brasileiro no que diz respeito à segurança de barragens. Diversos órgãos fiscalizadores têm a incumbência de garantir a adequação e a padronização do sistema de segurança em âmbito nacional. Neste item serão tratadas as definições dos termos técnicos que norteiam o trabalho e que visam à segurança de barragens, bem como à garantia do sucesso da normativa.

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Nessa direção, a Lei nº 12.334/2010, que estabelece a Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB), em seu artigo 2º assim dispõe: “Art. 2º Para os efeitos desta Lei, são estabelecidas as seguintes definições: I - barragem: qualquer estrutura em um curso permanente ou temporário de água para fins de contenção ou acumulação de substâncias líquidas ou de misturas de líquidos e sólidos, compreendendo o barramento e as estruturas associadas; II - reservatório: acumulação não natural de água, de substâncias líquidas ou de mistura de líquidos e sólidos” (BRASIL, 2010).

Diante da definição supracitada se entende que a legislação em vigor busca diferenciar barragem de reservatório para que fique claro a finalidade de cada um. A barragem é a estrutura que detém, ou seja, prende o curso d’água com a finalidade de armazenagem. Já o termo “reservatório” diz respeito ao espaço onde se encontra a água represada.

Ainda no artigo 2º, aparece também a definição do termo “segurança de barragem”: “III - segurança de barragem: condição que vise a manter a sua integridade estrutural e operacional e a preservação da vida, da saúde, da propriedade e do meio ambiente” (BRASIL, 2010). Assim, para efeitos da lei fica claro que a segurança de barragem é a condição de garantia de um gerenciamento seguro, pelo qual a integridade da estrutura da barragem deve ser prioritariamente preservada para bem das comunidades em seu entorno e da sociedade em geral.

No texto da referida lei aparece também a figura do empreendedor, que nada mais é que: “IV- (...) agente privado ou governamental com direito real sobre as terras onde se localizam a barragem e o reservatório ou que explore a barragem para benefício próprio ou da coletividade.” (BRASIL, 2010). Ou seja, o empreendedor tão somente é o proprietário e/ou o administrador da barragem.

Outro termo presente na legislação referente à segurança de barragens é “órgão fiscalizador”, esse nada mais é que: “V- (...) autoridade do poder público responsável pelas ações de fiscalização da segurança da barragem de sua competência” (BRASIL, 2010). Assim, compreende-se que órgão fiscalizador, nos termos da referida lei, é o órgão, a entidade ou a autoridade responsável por monitorar, avaliar, fiscalizar periodicamente o cumprimento da legislação vigente na barragem e/ou reservatório e garantir que a lei seja cumprida e a segurança seja estabelecida.

Mais um termo que a lei apresenta em seu artigo 2º é “gestão de risco”, pelo qual se compreende: “VI- (...) ações de caráter normativo, bem como aplicação de medidas para prevenção, controle e mitigação de riscos” (BRASIL, 2010). Diante disso, entende-se que o gerenciamento de risco é caracterizado pela observância da legislação, bem como pela adoção de práticas seguras, métodos eficientes e assertivos com vistas a minimizar os riscos existentes.

A lei traz também o conceito de dano potencial associado à barragem: “VII- (...) dano que pode ocorrer devido a rompimento, vazamento, infiltração no solo ou mau funcionamento de uma barragem” (BRASIL, 2010). Assim, o denominado dano potencial associado à barragem pode ser compreendido como sendo o desastre, o acidente, o dano que pode ocorrer à barragem e fazer com que ali haja vazamento.

A lei trata ainda do plano de segurança da barragem, que se constitui em: “(...) um instrumento da Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB), previsto no art. 6º, inciso II, da Lei nº 12.334/2010, de implementação obrigatória pelo empreendedor (de barragem inserida no escopo da lei), cujo objetivo é auxiliá-lo na gestão da segurança. Deve conter dados técnicos da barragem, de construção, operação, manutenção e panorama do estado atual da segurança por meio das inspeções realizadas, devendo, principalmente, servir como uma ferramenta de planejamento de gestão da segurança da barragem” (BRASIL/ANA, 2016, p. 9).

Diante do exposto, compreende-se que o plano supracitado perpassa pelas fases de construção e operação da barragem e tem por finalidade auxiliar no processo de gestão da segurança, pois esse plano será elaborado conforme a classificação de risco da barragem. Seu modelo é estabelecido por normativa própria e, por ser um documento formal, poderá ser consultado pelas entidades de fiscalização (BRASIL/ANA, 2016).


2 Da responsabilidade civil: à luz dos princípios constitucionais ambientais

2.1 Dos princípios

O uso indiscriminado dos recursos naturais, ao longo dos tempos, gerou a preocupação mundial com o meio ambiente e sua defesa. Por conseguinte, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado foi estabelecido também na Constituição Federal de 1988. Assim, a Carta Magna, em seu artigo 225º, reza que: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações” (BRASIL, 1988). Nesse sentido, o direito a um meio ambiente saudável, considerado direito da coletividade, comum a toda a sociedade, está orientado sob os princípios da indivisibilidade, interdependência e solidariedade (BERTOLDI, 2000).

O Direito ambiental pode ser conceituado como a parte do direito que visa regulamentar a tomada dos bens presentes no meio ambiente com fins econômicos e financeiros, com a finalidade de garantir a sustentabilidade dos recursos naturais sem ferir o processo de desenvolvimento econômico e social (ANTUNES, 2015).

Diante da complexidade das atitudes e ações humanas, a norma jurídica não consegue prever tudo o que possa vir a ocorrer, por esse motivo foram estabelecidos princípios que visam nortear a aplicação dessas normas e leis. Por “princípio” se entende “o alicerce ou fundamento do direito” (MACHADO, 2014, p. 61). Nesse contexto, vale destacar também que “os princípios têm valor normativo, e não apenas valorativo, interpretativo ou argumentativo, de maneira que se encontram hierarquicamente superiores a qualquer regra” (FARIAS, 2007). Assim, dentre os princípios gerais do direito ambiental destacam-se: o princípio da dignidade da pessoa humana; o princípio de desenvolvimento sustentável; princípio da participação comunitária ou cidadã; princípio da precaução; princípio da prevenção; princípio do poluidor-pagador; princípio da proibição do retrocesso ambiental; princípio da responsabilidade (ANTUNES, 2015).

Por princípio da dignidade humana se entende o direito que todo ser humano possui à dignidade, ao respeito, à consideração por parte do Estado e da sociedade, sendo intrínseca nesse direito a garantia das condições básicas de vida e saúde e participação nas decisões sobre a sua própria vida e destino em comunhão com os seus pares (SARLET, 2001).

Já o princípio de desenvolvimento sustentável estabelece o uso racional e equilibrado dos recursos naturais, para que se possa atender às necessidades humanas do presente sem se comprometer os recursos naturais que poderão ser usados futuramente por outras gerações (SILVA, 2013).

Quanto ao princípio da participação comunitária ou cidadã, entende-se que esse princípio pressupõe: “tomar parte em alguma coisa, agir em conjunto” (FIORILLO, 2013, p. 126). Assim sendo, compreende-se que esse referido princípio parte da necessidade de se garantir a todo cidadão o uso equilibrado do meio ambiente, considerando o dever de todos de participar da defesa do mesmo (GARCIA; THOMÉ, 2015).

De origem grega, o princípio da precaução significa ter cuidado. Esse princípio trata das atitudes que o ser humano precisa apresentar para proteger a si mesmo e à natureza. Considera que diante da incerteza deve-se levar em conta a avaliação de risco, e essa avaliação deve considerar o nível de risco aceitável, tomando como base o nível de contaminação que pode ser evitada. Assim, “na dúvida, opta-se pela solução que proteja imediatamente o ser humano e conserve o meio ambiente (in dubio por salute ou in dubio pro natura)” (MACHADO, 2014, p. 108). Esse princípio estabelece como dever do Estado e da sociedade considerar, em caso de dúvida, a necessidade primária de se resguardar, defender e preservar o meio ambiente.

O princípio da prevenção tem por finalidade diminuir o risco do dano ambiental em caso de haver “elementos seguros para afirmar que uma determinada atividade é efetivamente perigosa” (MILARÉ, 2013, p. 264). Trata-se, portanto, “de princípio da certeza científica. Trabalha-se com o risco certo, conhecido ou concreto” (AMADO, 2015, p. 33). Ao contrário do princípio da precaução, que trata da imprevisibilidade, o princípio da prevenção trabalha com a hipótese de um risco ambiental já conhecido pela ciência (MILARÉ, 2013).

No que concerne ao princípio do poluidor-pagador, pode-se dizer que esse princípio trata da obrigatoriedade de que aquele que causa dano ao meio ambiente (o poluidor) possa arcar com os custos das despesas causadas pelo processo de reparação do dano ao meio ambiente. Esse “é um princípio orientador da política ambiental preventiva” (ARAGÃO, 1997, p. 27).

Já o princípio da proibição do retrocesso ambiental pretende evitar que haja, por parte do poder executivo e/ou dos entes federativos, eventuais recuos no exercício do dever de proteção ambiental. O que acarreta a impossibilidade de o Estado extinguir os órgãos ambientais, salvo criando outros com a mesma ou superior eficácia” (GAVIÃO FILHO, 2005, p. 91-92). Portanto, caso haja violação desse princípio, isso resultará na eventual necessidade de reparação por via judicial.

Conforme o princípio da responsabilidade, “qualquer violação do Direito implica a sanção do responsável pela quebra da ordem jurídica” (ANTUNES, 2015, p. 52). Assim, ocorrendo o dano ambiental, haverá também a responsabilização pelo mesmo e sua consequente reparação.

2.2 Da responsabilidade civil objetiva e subjetiva

A natureza jurídica da responsabilidade civil repousa na seara da obrigatoriedade de se reparar o dano causado. Assim, a obrigação de indenizar vai decorrer ou da culpa ou do risco, sendo a culpa subjetiva e o risco objetivo. Porém, o direito civil não considera mais a culpa como um elemento essencial para se estabelecer responsabilidade, tomando como elementos essenciais básicos a conduta humana, o dano e o nexo de causalidade (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2003).

Nesse sentido, quanto ao risco, a responsabilidade de indenizar vai depender da existência de nexo causal entre a ação que gerou o prejuízo ou dano e o dano sofrido. Nesse contexto, pode-se entender que “a doutrina objetiva encontra maior supedâneo na doutrina do risco” (STOCO, 2004, p. 78).

Assim, o juiz pode imputar a responsabilidade civil objetiva mesmo quando não houver culpa, mas simplesmente quando o indivíduo tiver assumido o risco de provocar dano a terceiros. Em seu artigo 927º, o Código Civil Brasileiro, Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, institui que: “Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único: Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem” (BRASIL, 2002).

Diante disso, o Código Civil de 2002 passa a considerar que a responsabilidade civil e a reparação do dano devem ocorrer independentes da culpa ou do dolo praticado pelo agente. Portanto, culpa e dolo passam a ser irrelevantes diante da relação do efeito causado pelo dano à vítima, pois o agente ao causar esse dano terá assumido o risco pelo ocorrido. E a relevância estará na atitude do agente causador desse dano.

2.3 Direitos difusos, coletivos em sentido estrito e individual homogêneo

A responsabilidade civil decorre das mais variadas espécies de danos como os danos difusos, coletivos e individuais homogêneos. Acerca dos direitos coletivos, o parágrafo 81º do Código de Defesa do Consumidor assim dispõe: “A defesa dos direitos e interesses dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo. A defesa coletiva ocorrerá quando se tratar de interesses difusos” (BRASIL, 2017). Tais direitos, no sentido estrito, são, por sua vez, determinantes do sujeito titular desses direitos, ou seja, um grupo ou uma categoria de pessoas, por exemplo. Pessoas essas que estarão, por sua vez, unidas em uma relação jurídica comum (BENJAMIN, 1995).

Os direitos metaindividuais ou coletivos em sentido amplo “marcam o desaparecimento da individualidade e egocentrismo do ser humano, que agora passa a pensar na coletividade, na solidariedade e no bem-estar social” (LEITE, 2008, p. 47).

Já os direitos individuais homogêneos são passíveis de tutela coletiva, pois possuem a mesma causa jurídica, apesar de terem titularidade definida. São também denominados acidentalmente coletivos, pois decorrem de uma origem comum. Seu objeto é divisível (BENJAMIN, 1995).

Assim, os direitos difusos individuais homogêneos não apresentam uma base definida, são transindividuais, pois não dizem respeito a somente um indivíduo, pertencem a mais de um, estando embasados apenas em um vínculo entre as pessoas e à conjuntura que as une. Tais vínculos podem ser acidentais, simplesmente, e/ou mutáveis (GRINOVER, 1984).

É fato que a prática da atividade mineradora representa riscos ao meio ambiente. Dentre outros problemas, destacam-se a devastação de matas e florestas, a poluição dos rios, nascentes, e outras fontes de água, causando assim impacto negativo sobre a natureza (VAZ; MENDES, 1997).

Atualmente, no Brasil o licenciamento ambiental tem como principal finalidade assegurar, em âmbito federal, estadual ou municipal, o controle do processo de exploração do meio ambiente (FARIAS, 2007).

Em vista disso, no que tange à proteção ao meio ambiente, prevista na Constituição Federal de 1988, no seu capítulo VI, título VIII, artigo 225º, e seus parágrafos e incisos (artigo já citado neste trabalho), a violação ao direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado praticada por um indivíduo atinge a coletividade, pois o bem ambiental é um bem comum. Além disso, a responsabilidade pela defesa do meio ambiente é de todos os cidadãos brasileiros. Assim, a proteção, defesa, preservação do meio ambiente é competência de todos (BARROS, 2017).

Já o artigo 4º, inciso I, da Lei nº 6.938/81, cita como objetivo da política do meio ambiente a “compatibilização do desenvolvimento econômico social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico” (BRASIL, 1981). Com isso, entende-se que o preceito da defesa do meio ambiente orienta a legislação atual com vistas a possibilitar a coexistência de desenvolvimento econômico e manutenção da qualidade ambiental.

Diante da dificuldade de equilibrar o desenvolvimento econômico e a exploração mineral, a legislação brasileira manteve sua preocupação com o meio ambiente estabelecendo o dever de recuperar a área degradada, pois “impôs ao minerador a responsabilidade de ‘recuperar o meio ambiente degradado’, segundo solução técnica exigida pelo órgão público” (MILARÉ, 2013, p. 205).

Considerando o exposto, entende-se que o legislador, ciente da importância da atividade de mineração para a economia do país, e também ciente de que essa atividade, devido à sua natureza, provocaria danos ambientais em seu entorno, estabeleceu o critério da recuperação ambiental como compensação pelos danos causados e, também, como tentativa de reparação.

Sobre as autoras
Karina Pinheiro de Castro

Mestre em Direito Privado, professora de Direito Civil do Centro Universitário Una, advogada, autora de obras e artigos jurídicos.

Keila Maria Basilio

Formanda no Curso de Direito do Centro universitário UNA – Cidade Universitária / Campus Aimorés

Eva Lopes de Almeida

Acadêmica do Curso de Direito no Centro Universitário Una.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CASTRO, Karina Pinheiro; BASILIO, Keila Maria et al. Barragens de mineração: a (in)eficiência da fiscalização pelo poder público. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6355, 24 nov. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/86975. Acesso em: 2 nov. 2024.

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