EXTORSÃO
A exemplo do delito de roubo, a extorsão apresenta-se também como crime complexo, de modo que a tutela jurídica abarca a liberdade individual, o patrimônio e a integridade física e psíquica da pessoa. É também delito comum: o sujeito passivo e o sujeito ativo podem ser quaisquer pessoas. Podem figurar no pólo passivo aquele que sofre lesão patrimonial, aquele que não sofre lesão patrimonial, e, ainda, a pessoa jurídica, de modo que seus representantes legais podem ser coagidos, nos ditames do artigo 158 pelo sujeito ativo. Observe-se que se o crime for praticado por funcionário público, em razão de sua função, o delito será o de concussão (artigo 316).
Assim como no roubo, é possível na extorsão haver dois sujeitos passivos: um que sofre a lesão patrimonial e outro que é vítima da violência. Deve-se destacar que a conduta do agente é uma só, isto é, o seu desígnio é autônomo: ele constrange alguém a fazer, a tolerar que se faça ou a deixar de fazer alguma coisa, mediante o emprego de violência física ou moral, com a finalidade de obter para si ou para outrem vantagem econômica indevida. Portanto, o sujeito ativo responderá por extorsão em relação aos dois sujeitos passivos, isto é, mesmo que constraja um e provoque dano material a outrem.
Do exposto, faz-se necessário apresentarmos o conceito de extorsão. O artigo 158 dispõe que extorqüir é constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa. Assim, temos as seguintes elementares: constranger alguém a fazer/tolerar que se faça/deixar de fazer algo (artigo 146), mediante violência (artigo 129) ou grave ameaça (artigo 147), com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica. A pena em abstrato é de reclusão, de quatro a dez anos, e multa.
A finalidade do constragimento (dolo genérico), no delito sob estudo, é o de obter indevida vantagem econômica, para si ou para outrem (especial fim de agir). Conforme destaca BITENCOURT: "a extorsão é muito semelhante ao crime de roubo, oferecendo, inclusive, grande dificuldade prática para definir, in concreto, se determinado fato pode ser classificado como roubo ou como extorsão [54]". Assim, temos de procurar uma característica que possibilite a distinção entre os dois delitos: tal caracterísitica se refere à obtenção de indevida vantagem patrimonial, para si ou para outrem, a qual não se restringe a apenas a coisa alheia móvel, mas também a qualquer interesse ou direito patrimonial alheio.
Estabelecemos acima que a obtenção de indevida vantagem econômica, para si ou para outrem, não é objeto do dolo, e sim elemento subjetivo especial do tipo, isto é, especial fim de agir. Objeto do dolo é a consciência e vontade de constranger alguém, a fazer/tolerar que se faça/deixar de fazer alguma coisa. A obtenção de indevida vantagem econômica, para si ou para outrem é, pois, uma especificadora do dolo, e, a grave ameaça ou a violência física é o meio de constranger alguém.
A extorsão apresenta o comportamento da vítima como o seu momento consumativo, de modo que se torna desnecessária a obtenção de indevida vantagem econômica, de modo que é suficiente que seja insinuada [55]. Assim, estabelecemos mais uma premissa do delito de extorsão: é necessária a participação da vítima coagida; e diferenciamos, a extorsão do roubo: "neste, o autor toma a coisa pessoalmente", "naquela, faz com que ela lhe seja entregue ou colocada à sua disposição [56]".
A Súmula 76 do Superior Tribunal de Justiça dispõe que o crime de extorsão consuma-se independentemente da vantagem indevida. Ora, isto importa dizer que o crime de extorsão é de natureza formal, devido, sobremaneira, à expressão presente no caput do artigo 158: com o intuito de. Ocorrendo a indevida obtenção de vantagem econômica, ter-se-á apenas o exaurimento da extorsão, a qual já se encontrava consumada [57]. Portanto, para que possamos diferenciar o delito de extorsão do delito de constrangimento ilegal, é preciso restar comprovada a intenção de o sujeito passivo obter, para si ou para outrem, indevida vantagem econômica: havendo a intenção, o tipo é o do artigo 158, caso inexista a intenção, o tipo é o do artigo 146. NUCCI ensina que há três fases para o cometimento da extorsão. Na primeira, o agente constrange o sujeito passivo, mediante violência própria. Na segunda, o sujeito passivo, constrangido, se sente coagido a fazer/tolerar que se faça/deixar de fazer alguma coisa. Na terceira, o sujeito ativo obtém a indevida vantagem econômica [58].
A extorsão tentada é admissível, de modo que se estiverem presentes todas as demais elementares, mas a vítima, em virtude do constrangimento sofrido, não ceder à vontade do autor, não há que se falar em consumação do delito (artigo 14, II). Observe-se que, como o crime é formal, a tentativa só será possível se o crime for cometido por escrito. Ora, o uso da violência própria, a qual não seja idônea para constranger o indivíduo, não produz a consumação do crime: se a ameaça foi enviada por escrito o sujeito passivo, e, por circunstâncias alheias à vontade do sujeito ativo, não veio a chegar às mãos da vítima, haverá a tentativa; de outro modo, se o sujeito ativo enviou a ameaça ao sujeito passivo e esta chegou às mãos deste, o delito terá se consumado; terceira e última hipótese: se a ameaça por escrito chega às mãos do sujeito passivo e este não se sente ameaçado: entendemos que haverá tentativa, porque o elemento constrangimento (núcleo do tipo) não foi atingido por motivos alheios à vontade do agente.
A pena prevista no caput do artigo 158 será aumentada de um terço até metade se o crime for cometido por duas ou mais pessoas ou se for cometido com o emprego de arma. Portanto, vejamos cada causa de aumento da pena:
Extorsão cometida por duas ou mais pessoas. Note que a redação do § 1º não faz menção ao concurso de duas ou mais pessoas, de modo que, na extorsão, a co-autoria é causa de aumento de pena, enquanto a participação não provoca tal aumento. Portanto, faz-se indispensável a participação efetiva e presencial na execução material do tipo penal, mesmo que um dos co-autores seja inimputável. Com isto, estabelecemos que o delito de extorsão é de natureza jurídica monossubjetiva, ou de concurso eventual
Extorsão cometida com o emprego de arma. O emprego de arma imputa maior temor à vítima, diminuindo-lhe a capacidade de resistência. Arma, deve-se salientar, não é apenas aquele instrumento destinado ao ataque ou à defesa (arma própria), mas também qualquer outro instrumento que possa ser utilizado com o fim de diminuir a capacidade de resistência da vítima (arma imprópria). O emprego de arma, mesmo que não efetue disparo, propicia ao agente maior êxito na ação delituosa, acentuando a gravidade do injusto, bastando, pois, que o sujeito ativo porte a arma ostensivamente, isto é, não é preciso que faça uso da arma.
Questão tormentosa é a das armas de brinquedo e das armas desmuniciadas. O problema do porte se estende ao Estatuto do Desarmamento (Lei nº 10.826/03), o qual revogou expressamente a Lei nº 9467/97, a qual previa como crime o porte de arma de brinquedo ou de simulacro, lei esta que era coadunada pela Súmula 174 do Superior Tribunal de Justiça: nos crimes de roubo, a intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o aumento da pena, tal Súmula foi, todavia, revogada pelo mesmo Tribunal, de modo que se operou a abolitio criminis em relação à arma de brinquedo. Duas são as correntes para a questão da arma de brinquedo e da arma desmuniciada.
A corrente minoritária, defendida por CAPEZ (2005: 295), entende que "se o porte é ostensivo, usado com o propósito de infundir medo, ocorre a majorante". Isto é: no caso da arma de brinquedo, mesmo que o porte desta não seja mais previsto como crime, se ela for utilizada para infundir medo na vítima, ocorre a majorante do § 1º. Ora, há que se observar a redação do artigo 157, § 2º, I: se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma. De acordo com esta redação, tanto faz se a arma é própria ou imprópria, e tanto faz se a violência é física ou moral, o importante é que a violência própria seja provocada mediante o emprego de arma, de modo a, idoneamente, facilitar a finalidade de subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem. BITENCOURT (2003: 86-87), apesar de não fazer coro ao posicionamento de CAPEZ, faz importante ponderação: "a simulação de estar armado ou a utilização de arma de brinquedo, quando desconhecida ou não percebida pela vítima, constituem grave ameaça, suficientemente idônea" para poder reduzir o sujeito passivo à impossibilidade de resistência. Ora, não se pode exigir da vítima, que esta saiba ou não que a arma é de brinquedo, ou que a arma esteja desmuniciada.
A corrente francamente majoritária argumenta que a razão de ser da qualificadora está sedimentada na potencialidade lesiva e no perigo que a arma real causa, e não no maior temor infligido à vítima. O Ministro Sepúlveda Pertence, em seu voto no julgamento do RHC 81.057 (25/ 05/ 2004 – Informativo 385, Supremo Tribunal Federal), afirma que a teoria moderna do direito penal, partindo dos princípios da necessidade da incriminação, da lesividade e da ofensividade, mesmo que o crime seja de mera conduta (para a sua configuração não é necessário resultado material exterior à ação), não se pode admitir a existência de delito sem que haja lesão efetiva ou potencial ao bem jurídico tutelado. Para que haja a ofensividade típica (aquela reprovável pela norma penal), é preciso que estejam aliadas a danosidade real do objeto (arma real – no sentido de não ser de brinquedo – e municiada, ou com possibilidade real de ser municiada) e a conduta criadora de risco proibido relevante (isto é, o dolo do agente).
Assim, podemos depreender que, para a corrente francamente majoritária, a inaptidão da arma (seja ela de brinquedo, seja ela desmuniciada) proporciona a atipicidade da conduta, haja vista que não há potencialidade lesiva da arma de fogo simulada, de brinquedo ou desmuniciada. Além disso, o sistema penal brasileiro tem por escopo punir a culpa lato sensu do agente, e, como no delito sob estudo só há a forma dolosa, a análise deverá recair sobre o dolo do agente, ou seja, sobre a conduta criadora de risco proibido relevante do agente, risco este que inexiste quando o agente porta arma de brinquedo ou arma desmuniciada, haja vista que tais armas não produzem a ofensividade típica definida alhures.
São dois posicionamentos que apresentam argumentos fortes, de modo que, por ora, nos posicionamos favoráveis à linha de entendimento majoritária.
A extorsão apresenta-se qualificada ou por lesão corporal grave ou por morte. Vejamos cada qualificadora:
Extorsão qualificada por resultado lesão corporal grave. Se a extorsão for praticada mediante violência física, e desta resultar lesão corporal grave, a pena será de sete a quinze anos de reclusão e multa. A lesão corporal que qualifica a extorsão é aquela prevista pelo artigo 129, §§ 1º e 2º, de modo que, necessariamente, deve o resultado qualificador decorrer pelo menos de conduta culposa do agente (artigo 19). O sujeito ativo só responde pela extorsão qualificada pelo resultado lesão corporal, se esta for grave, independentemente de a ter produzido mediante conduta culposa (caso em que o delito seria preterdoloso) ou mediante conduta dolosa.
Extorsão qualificada por resultado morte. Se a extorsão for praticada mediante violência própria, e desta resultar morte, a pena será de vinte a trinta anos de reclusão e multa. Não há extorsão qualificada pelo resultado morte quando há a morte de co-autor do delito de extorsão, uma vez que a morte do co-autor "não é meio, modo ou forma de agravar a ação desvalisosa" do delito qualificado; ora, o tipo penal exige que a violência seja cometida contra o sujeito passivo, e não contra um dos sujeitos ativos [59]. Deve-se, contudo, tomar cuidado com o erro quanto à pessoa (artigo 20, § 3º): se o agente, pretendendo matar a vítima, acabar matando o co-autor, responde pelo crime de extorsão qualificada, como se tivesse atingido quem realmente queria atingir. Quando há a morte de terceiro resultante da troca de tiros entre policiais e assaltantes, para que haja a qualificadora, deve-se comprovar que um dos assaltantes foi quem efetuou o disparo da bala que atingiu o terceiro; entretanto, havendo dúvida, os assaltantes não podem ser responsabilizados, em virtude do princípio in dubio, pro reo [60].
Ainda na extorsão qualificada pelo resultado morte, há duas observações a fazer. A Lei nº 8.072/1990, em seu artigo 1º, III, assim dispõe: são considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados no Decreto-Lei nº 2.84º, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, consumados ou tentados: III – extorsão qualificada pela morte (art. 158, § 2º). A segunda observação a fazer se refere à consumação e tentativa: não se pode aplicar a Súmula 610 do Supremo Tribunal Federal (há crime de latrocínio, quando o homicídio se consuma, ainda que não realize o agente a subtração de bens da vítima) ao crime de extorsão qualificado pelo resultado morte, haja vista que é crime formal, o qual independe da obtenção de vantagem econômica indevida (caso em que seria crime material) para a sua consumação, de modo que devemos aplicar, portanto, a Súmula 96 do Superior Tribunal de Justiça: o crime de extorsão consuma-se independentemente da obtenção da vantagem indevida.
Além do artigo 157, § 2º, V, podemos dizer que o artigo 158, caput, é um dos exemplos de seqüestro-relâmpago, figura atípica, mas que encontra três exemplos no Código Penal, de modo que o terceiro é o do caput do artigo 159. A doutrina cita o exemplo de Tício que, encontra-se na agência de certo Banco, às 20h00 de um sábado, sacando dinheiro e é surpreendido por Mélvio, o qual o constrange, mediante uso de arma, a entregar-lhe o cartão magnético e lhe fornecer a senha do mesmo, de modo a acompanhar Mélvio a vários caixas eletrônicos existentes na Cidade, para sacar dinheiro, para si, da conta de Tício.
EXTORSÃO MEDIANTE SEQÜESTRO
A exemplo dos delitos dos artigos 157 e 158, o delito de extorsão mediante seqüestro é crime complexo e pluriofensivo. Pluriofensivo porque os bens jurídicos tutelados são o patrimônio do indivíduo, a liberdade pessoal e a integridade física e psíquica da pessoa. Complexo porque engloba os crimes de extorsão (artigo 158) e de seqüestro (artigo 148). Deste modo, temos de prestar atenção ao nomen iuris dado pelo legislador ao tipo previsto no artigo 159: extorsão mediante seqüestro, ou seja, a definição trazida pelo caput do artigo 159 deve ser interpretada com cautela [61].
Verifica-se, de plano, com o aludido nomen iuris do tipo penal, que se trata de modalidade especial do delito de extorsão: muda-se o verbo constranger pelo verbo seqüestrar, de modo que a finalidade é a mesma: obter, para si ou para outrem, indevida vantagem econômica. De se ressaltar que tal vantagem serve como condição ou como preço do resgate do seqüestrado.
Na extorsão mediante seqüestro o momento consumativo ocorre com o seqüestro da vítima, de modo que se torna desnecessária a obtenção de indevida vantagem econômica, de modo que é suficiente que seja insinuada. Reproduzimos, assim, a Súmula 76 do Superior Tribunal de Justiça, uma vez que o crime sob estudo é modalidade especial do delito de extorsão: o crime de extorsão consuma-se independentemente da vantagem indevida, o que importa dizer que se trata de crime formal (basta observar a expressão no caput do artigo 159: com o fim de, a qual é a mesma do caput do artigo 158, com o intuito de). Ocorrendo a indevida obtenção de vantagem, ter-se-á apenas o exaurimento do delito, o qual já se encontrava consumado. Portanto, para que possamos diferenciar o delito de extorsão mediante seqüestro do delito de seqüestro/cárcere privado, é preciso restar comprovada a intenção de o sujeito passivo obter, para si ou para outrem, indevida vantagem: havendo a intenção, o tipo é o do artigo 159, caso inexista a intenção, o tipo é o do artigo 148. A priori, a tentativa faz-se possível, embora, in concreto, seja difícil sua configuração, uma vez que seqüestrada a pessoa, o crime já terá se consumado, a não ser que o agente inicie a execução do crime e, por circunstâncias alheias à sua vontade, o delito não se consuma.
Reproduzimos a lição dada quando tratamos de crimes contra a liberdade pessoal, mas especificamente quando tratamos de seqüestro e de cárcere privado. O artigo 148, que trata do delito de seqüestro e de cárcere privado, tutela a liberdade física individual, de modo que, como a liberdade é um bem jurídico disponível, não haverá crime quando, para o cerceamento da liberdade, houver consentimento válido da vítima, mas, se em algum momento houver dissentimento da vítima, restará configurada a liberdade cerceada e o tipo penal em questão. O seqüestro consiste, segundo a lição doutrinária, na privação da liberdade de locomoção do sujeito passivo, não implicando em seu confinamento.
Para haver, efetivamente, o seqüestro, é preciso que o agente atue com a intenção de seqüestrar, ou seja, é necessária a presença do dolo específico de privar a pessoa de sua liberdade. De acordo com MIRABETE, "se tal elemento subjetivo estiver ausente, ou seja, se o agente atua por outro intento que não o de seqüestrar a vítima, não se configura o seqüestro", o mesmo se dando em relação ao cárcere privado, de modo que o crime será de constrangimento ilegal [62]. Na mesma esteira, ensina HELENO FRAGOSO: a privação da liberdade mediante seqüestro ou cárcere privado é espécie subsidiária ao delito de constrangimento ilegal, já que se impede a liberdade de locomoção do sujeito passivo [63]. Ao que aduz CAPEZ: se "a finalidade for coagir outrem para que faça ou deixe de fazer algo, o crime será de constrangimento ilegal [64]".
Depreendemos, pois, que se o agente não tiver o dolo de seqüestrar, e sim o de coagir outrem para que faça/tolere que se faça/deixe de fazer alguma coisa, haverá o crime de extorsão (artigo 158), e não o de extorsão mediante seqüestro (artigo 159).
Difere-se o delito do artigo 159 do delito do artigo 148 pela seguinte razão: no crime de seqüestro/cárcere privado, o agente tem o dolo de privar a liberdade da vítima, sem disso pretender auferir qualquer vantagem patrimonial; no crime de extorsão mediante seqüestro, o agente tem o especial fim de obter vantagem econômica indevida. Assim, temos o que corriqueiramente se chama seqüestro-relâmpago, em um de seus exemplos no Código Penal.
Como se trata de crime comum, o sujeito passivo, bem como o sujeito ativo, pode ser qualquer pessoa. Repetimos a lição dada alhures de que todo crime complexo pode apresentar dois sujeitos passivos: aquele que sofre a lesão patrimonial e aquele que sofre o seqüestro. A pessoa jurídica pode figurar como sujeito passivo da lesão patrimonial, mas não do seqüestro.
Em sua forma simples, a extorsão mediante seqüestro apresenta como pena in abstrato a reclusão de oito a quinze anos. Pena esta que poderá ser qualificada de acordo com uma das situações seguintes: a) a pena será de reclusão de doze a vinte anos, se o seqüestro durar mais de vinte e quatro horas, se o seqüestrado for menor de dezoito anos, se o seqüestrado for maior de sessenta anos, ou se o crime for cometido por bando ou quadrilha; b) a pena será de reclusão de dezesseis a vinte e quatro anos se do seqüestro cuja finalidade seja a extorsão resultar lesão corporal de natureza grave; c) a pena será de reclusão de vinte e quatro a trinta anos se do seqüestro cuja finalidade seja a extorsão resultar morte. Vejamos cada qualificadora:
Se o seqüestro durar mais de vinte e quatro horas. A duração do seqüestro por mais de um dia aumenta o sofrimento da vítima, bem como de seus familiares.
Se o seqüestrado for menor de dezoito anos. A lei presume que o menor de dezoito tem sua resistência diminuída em relação ao sujeito ativo do crime. Deve-se ter em mente que o sujeito passivo deve ser menor de dezoito anos e maior de quatorze anos, haja vista que a Lei nº 8.072/90, traz a previsão de aumento da pena de metade se o sujeito passivo for menor de quatorze anos de idade. Assim, a qualificadora só incidirá se o sujeito for maior de quatorze anos e menor de dezoito anos na data do delito; se for menor de quatorze anos, incidirá o caput do artigo com aumento de metade da pena prevista.
Se o seqüestrado for maior de sessenta anos. A lei presume que o maior de sessenta anos tem sua resistência diminuída em relação ao sujeito ativo do crime. A inclusão do idoso nesta qualificadora decorre do Estatuto do Idoso.
Se o crime for cometido por bando ou quadrilha. A definição de quadrilha ou bando encontra-se no artigo 288: associação de mais de três pessoas, com a intenção de formar bando ou quadrilha, para o fim de cometer crimes. Deve-se prestar atenção ao objetivo da quadrilha ou do bando ser o de cometer mais de um crime, de modo que se mais de três pessoas tiverem como objetivo a prática de um único crime, não há que se falar em bando ou quadrilha, e, por conseguinte, na incidência da qualificadora.
Se do crime resultar lesão corporal de natureza grave. A doutrina tem entendido que tal situação pode ser tanto preterdolosa quanto dolosa, de modo que é indiferente para a cominação da pena se o resultado mais grave foi produzido por culpa (involuntariamente) ou por dolo (voluntariamente) do agente. E mais: se o resultado mais grave decorreu do seqüestro ou da extorsão. Em qualquer desses casos incidirá a qualificadora.
Se do crime resultar morte. O resultado morte resultante do seqüestro ou da extorsão no crime em apreço, produz o tipo penal mais severamente punido, in abstrato, no Código Penal brasileiro. Repetimos que é indiferente para a cominação da pena se o resultado adveio de culpa (caso preterdoloso) ou de dolo (caso doloso).
O § 4º, por fim, apresenta uma causa de diminuição de pena (minorante), apresentando a seguinte redação: se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do seqüestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços. Para a concessão da minorante, são necessários três requisitos: a) o crime deve ser cometido em concurso de pessoas (artigo 29); b) um dos concorrentes deve denunciar o crime à autoridade; c) a denúncia deve facilitar a libertação do seqüestrado. Trata-se do instituto da delação premiada. Como se pode depreender dos requisitos, o escopo da delação premiada, a despeito do nome que lhe é dado, é o de facilitar a libertação da vítima seqüestrada e punir os demais criminosos, e não o de premiar o delator.