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ACP para cumprimento de lei sobre tempo máximo em filas de bancos

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Agenda 15/11/2005 às 00:00

Petição inicial de ação civil pública para garantir o cumprimento de lei municipal que dispõe sobre tempo máximo de permanência dos usuários nas filas e condenar instituições bancárias em danos morais coletivos.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA __ VARA CÍVEL DA COMARCA DE GURUPI – TO.

            "É que interessa ao direito e à sociedade que o relacionamento entre os entes que contracenam no orbe jurídico se mantenha dentro dos padrões normais de equilíbrio e respeito mútuo. Assim, em hipóteses de lesionamento, cabe ao agente suportar as conseqüências de sua atuação, desestimulando-se, com a atribuição de pesadas indenizações, atos ilícitos tendentes a afetar os referidos aspectos da personalidade humana." (

Carlos Alberto Bittar)

            O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO TOCANTINS, por seu Promotor de Justiça, no uso de suas atribuições legais e constitucionais, vem, com fundamento no artigo 127, "caput", e 129, incisos II e III, da Constituição Federal, no artigo 25, inciso IV, alínea "b", da Lei nº 8.625/93, e seu correspondente na Lei Complementar Estadual nº 12/96, nas disposições contidas nas Leis nº 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública ou dos Interesses Difusos e Coletivos), e nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), e Resolução n. 2878, do BACEN e, sobretudo, à vista do apurado no procedimento preliminar n. 013/05, que segue em anexo, propor a presente

            AÇÃO CIVIL PÚBLICA, com pedido de antecipação liminar da tutela,

            em face das seguintes instituições bancárias:

            1 - BANCO DO BRASIL S/A, sociedade de economia mista, inscrito no CNPJ sob o n. 00.000.000/0001-91, com agência situada na Rua Presidente JK (antiga rua 05), esq. com Av. Pará, n. 1.192, centro, Gurupi, neste ato representado pelo Gerente de Administração desta, o Sr. ...., brasileiro, casado, bancário, portador do RG n. .../TO, inscrito no CPF/MF sob o n. ...;

            2 – BANCO BRADESCO S/A, sociedade de economia mista, inscrito no CNPJ sob o n. 60.746.948/0001-12, com agência situada na Avenida Goiás, s.n., centro, Gurupi, neste ato representado pelo Gerente Geral desta, o Sr. ..., brasileiro, casado, bancário, portador do RG n. .../GO, pelos fatos e fundamentos que passa a expor:


I.- DOS FATOS

            1 - O Ministério Público do Estado do Tocantins, através da Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor, instaurou Procedimento Preliminar para averiguar a forma como as Agências Bancárias de Gurupi estavam prestando seus serviços, notadamente, no que tange ao cumprimento de Lei Municipal n. 1.367/2000, que prevê que as agências bancárias e seus postos de serviços disponham de funcionários suficientes no setor de caixa, para que o atendimento a seus usuários seja prestado em tempo razoável, ou seja, em até 15 (quinze) minutos em dias normais; e, em até 30 (trinta) minutos em véspera de feriado prolongado ou no dia imediato a este e em dias de pagamento dos funcionários públicos municipais, estaduais e federais, nos bancos que prestam esse serviço.

            2 – Das diligências realizadas em todas as agências bancárias de Gurupi, verificou-se, constantemente, nas agências das instituições requeridas, a formação de longas filas de usuários à espera de atendimento junto ao setor de caixa, com a extrapolação do tempo máximo permitido, nos termos da legislação municipal, em face da falta de pessoal suficiente designado para prestá-lo, desfalcando, então, a prestação do serviço de atendimento ao público, tornando-o lento e ineficaz.

            3 – É o que se pode comprovar das declarações prestadas pelo Sr. Antônio Lázaro Lima Sampaio, nesta Promotoria de Justiça, no dia 03/05/05, in verbis:

            "Que comparece espontaneamente nesta Promotoria a fim de formular reclamação relativa à demora no atendimento bancário; Que o declarante por várias vezes foi à Agência do Banco do Brasil necessitando de atendimento direto (caixas) dos funcionários; que a agência disponibiliza somente três pessoas para prestar esse tipo de atendimento, sendo que, uma delas atende apenas os clientes em situações especiais (idosos, gestantes e deficientes físicos), restando dois para o atendimento do público; (...) que o declarante já chegou a ficar, em pé, mais de duas horas aguardando atendimento". (fl. 23) (grifou-se)

            4.- O resultado desta prática foi, por sua vez, constatado no curso de inspeção oficial realizada, no dia 04/05/05, quando todas as agências bancárias de Gurupi foram submetidas à fiscalização, sendo certo a constatação de que somente nas agências de ambas as requeridas, verificou-se o descumprimento legal. Em ambas, foram constatados apenas 04 caixas de atendimento, cada uma, para o atendimento de dezenas de pessoas que esperavam, em pé, em "filas gigantescas", sendo o tempo médio de espera na fila, no Banco do Brasil, acima de 1h (uma hora), e, no Banco Bradesco, aproximadamente, 40min. (quarenta minutos) (fls. 33 e 41, 36 e 44).

            5 – Pelo depoimento da Sra. Daniele Nolte e do Sr. Jenks Nunes, quando da vistoria na agência do Banco do Brasil, (fl. 33), constatou-se o seguinte:

            "A primeira entrevistada alegou que encontra-se na fila por mais de quarenta minutos e a expectativa é mais 25 minutos. O segundo entrevistado ratificou as informações da primeira e salientou que o atendimento e muito vagaroso, seja ele em qualquer dia, e principalmente, dias que ocorre pagamentos, sejam eles municipais ou estaduais".

(grifos nossos)

            6 – Pelo depoimento do Sr. Newton Filho P. Barros, mesmo sendo entrevistado em outra agência, cujo problema não foi constatado, as imensas filas da agência do Banco do Brasil forma lembradas, (fl.37), vejamos:

            "(...)O segundo entrevistado reforçou que o atendimento do Banco do Brasil é péssimo e, nos dias de pagamento, fica inviável até andar dentro daquela agência.

(grifos nossos)

            7 – A situação na agência do Banco Bradesco não é muito diferente, como se constatou da entrevista dos Srs. Luiz Márcio Pimentel Souza e Jaime Bulbolz e da Sra. Eva S. de Azevedo, quando da vistoria em referida agência (fl. 36), vejamos

            "Todos os entrevistados alegaram que a demora na fila é imensa, chegando a ficarem, por mais de 02 ou 03 horas na fila, porém, nesta data, estão considerando o atendimento mais rápido que o normal, cerca de 30 ou 40 minutos de espera".

(grifos nossos)

            8 – Nesse contexto, até a OAB – Ordem dos Advogados do Brasil, por intermédio da Subseção de Gurupi, que recebeu várias reclamações a respeito do atendimento ao público por parte da primeira requerida, solicitou a esta Promotoria de Justiça a tomada de providências sob o cunho de resolver o problema das longas filas que se formam, no setor de caixas, da Agência local do Banco do Brasil (fl. 47).

            9 – No intuito de obter uma solução para o impasse, os representantes das instituições bancárias requeridas foram notificados a comparecer na Promotoria de Justiça, tendo, contudo restado em vão, pois, nesta oportunidade, os mesmos, apesar de estarem cientes da existência da Lei Municipal n. 1.367/2000, bem como das constantes reclamações de usuários que esperam por muito tempo, em longas filas, para serem atendidos diretamente pelos funcionários do setor de caixas, não demonstraram qualquer preocupação com tais consumidores e, muito menos, com o cumprimento da legislação em vigor.

            10 – Tais representantes informaram, por conseguinte, que, dentre as providências a serem tomadas, tanto pelo Banco do Brasil (fl. 52), quanto pelo Banco Bradesco (fl. 57) não estariam a contratação de mais funcionários para trabalhar como caixas, e, tampouco, a distribuição de senhas, o que, de fato, possibilitaria a diminuição de filas, mas, por outro lado, somente o incentivo ao uso de meios alternativos, tais como caixas automáticos e Internet.

            11 - Seria simples solucionar esta questão caso estivessem as requeridas imbuídas do espírito de respeito ao direito do consumidor. Como já se constata que não têm o intuito de cumprirem a lei municipal, que, ao menos se propusessem a criar mecanismos, ainda que não implicassem na efetiva prestação do serviço bancário de forma mais célere, mas que permitissem que não se abusasse da capacidade física daqueles usuários de permanecer em pé até que finalmente chegasse a vez de serem atendidos.

            12.- Isto porque, ainda que sem aumentar o número de caixas destacados para o atendimento preferencial, as agências das instituições requeridas poderiam, pelo menos, disponibilizar assentos de onde os usuários referidos pudessem aguardar, sem esforço, a prestação do serviço de que necessitam, tal como fazem outras agências de Gurupi (HSBC, fl. 40; BASA, fl. 42, CEF, fl. 43). De outro lado, poderia ser distribuído senhas, para que os usuários não permanecessem longo tempo nas filas, diminuindo, assim, o descaso para com o cidadão, visto que estes não têm sido respeitados como consumidor.

            13.- Como não foi possível solucionar o problema, devidamente acionada por esta Promotoria de Justiça, a Coordenadoria de Fiscalização do Município de Gurupi tratou de notificar, no dia 30/05/05, todas as Agências bancárias desta Comarca (fls. 63/68), sob o cunho de garantir o cumprimento dos dispositivos da Lei n. 1.367/2000, ou melhor, manter à disposição dos usuários, funcionários suficientes no setor de caixa, para possibilitar atendimento em tempo razoável.

            14 – Não obstante as notificações acima, de caráter preventivo, o problema das longas filas, que já era cediço nas agências de ambas as instituições requeridas, não foi solucionado, tanto é que, em nova fiscalização realizada pela Coordenadoria de Fiscalização do Município de Gurupi, nos dias 10 e 14/06/05, constatou-se, novamente, que apenas as agências das instituições requeridas permaneciam descumprindo as determinações da lei n. 1.367/2000, de modo que, na agência do Banco do Brasil, uma usuária, que foi acompanhada pelos fiscais, permaneceu, em pé, por 46min. (quarenta e seis minutos), na fila, até ser atendida (fls. 103/107), e, na agência do Banco Bradesco, um usuário, também acompanhado pelos fiscais, permaneceu, em pé, por 28min. (vinte e oito minutos), na fila, até ser atendido (fls. 98/102). Configurado o flagrante, nos termos do art. 5º, da Lei n. 1.367/2000, lavrou-se o competente auto de constatação para aplicar-lhes a multa administrativa cabível.

            15 – Ademais, em fiscalização realizada pelo Procon, em todas as Agências Bancárias de Gurupi, entre os dias 20 e 22/06/05, constatou-se, novamente, que apenas nas agências das instituições requeridas, o tempo máximo de espera nas filas ultrapassava os limites permissíveis pela Lei n. 1.367/2000. Mesmo sendo normais os referidos dias de fiscalização, constatou-se que, na agência do Banco do Brasil, o tempo médio de atendimento era de 28min. (vinte e oito minutos), enquanto na agência do Banco Bradesco, o tempo médio de atendimento era de 2h40min (duas horas e quarenta minutos), conforme fls. 81/91.

            16.- Aliás, convém destacar que a cultura de desrespeito às leis em vigor nutrida pelas requeridas, sobretudo àquelas que digam respeito à proteção ao consumidor, pode ser detectada não só pelo descumprimento disseminado da lei em questão pelas mesmas, mas também pela audaz iniciativa do Banco do Brasil em obter, perante a Vara dos Feitos das Fazendas e Registro Público da Comarca de Palmas, uma liminar, em Mandado de Segurança (fls. 19/22), suspendendo os efeitos da Portaria n. 04/03 do Procon, que determinava a fiscalização pelo mesmo, das agências de Palmas, Araguaína e Gurupi, bem como suspendendo os autos de infração contra si lavrados, de modo a situar a atividade bancária fora do âmbito de incidência do próprio Código de Defesa do Consumidor.

            17.- Assim, a situação ganha contornos até patéticos com o impedimento, no dia 20/06/05, por parte do gerente da agência do Banco do Brasil, em Gurupi, do simples monitoramento das filas pelos fiscais do Procon, alegando a "existência de uma liminar, que impede a realização desse trabalho pelo Procon" (fl. 81). Somente no dia seguinte, ‘o gerente achou por bem autorizar o trabalho do Procon’ (fl. 82), sendo que no dia 22/06/05, foi possível a realização do monitoramento de tal agência pelos referidos agentes, do qual restou comprovado, mais uma vez, o descumprimento da lei n. 1.367/2000 (fl. 85), conforme relatado acima.

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            18 - Consoante o apurado, conclui-se que tais práticas adotadas pelas instituições requeridas no sentido de, simplesmente, recusar a cumprir as medidas determinadas pela Lei Municipal n. 1.367, em pleno vigor desde os idos de 2000, frustram as disposições da ordem econômica, em especial, a defesa do consumidor, conforme reza o artigo 170, inciso V, da Constituição Federal e diversos dispositivos do Código de Defesa do Consumidor, comprometendo a saúde dos consumidores usuários do serviço de atendimento no caixa, em Gurupi, que se viram à mercê de práticas atentatórias aos bens jurídicos pertencentes à toda a coletividade.


II – DO DIREITO

            II.I – DA LEGITIMIDADE "AD CAUSAM"

            19 – A tutela dos interesses transindividuais erigiu-se com o advento da Lei 7.347/85 que regulamentou a ação civil pública. O artigo 5º, deste diploma legal, assegurou legitimidade ao Ministério Público para a proteção difusa e coletiva dos consumidores, conforme art. 1º inciso II.

            20 – Na nuance da carta política de 1.988, foi conferido ao Ministério Público, além da continuidade das funções primitivas, o dever de zelar pelas relações de consumo e proteção ao consumidor, quer pugnando por sua defesa em face dos danos sofridos, quer prevenindo-o de futuros prejuízos decorrentes da postura tendenciosa à conduta incivil por parte de certos fornecedores. Esse é o substrato dos arts. 5°, inc. XXXII, art. 127, art. 129, inciso III e 170, V, todos da Constituição Federal de 1988.

            21 - Foi instituída, na Constituição, em função das notáveis mudanças na ordem da tutela jurisdicional, a devida ampliação do alcance processual, criado anteriormente na lei n. 7.347/85, para que a Ação Civil Pública tivesse, por escopo, o de ser, também, uma demanda substitutiva de múltiplos feitos individuais quando estes cuidassem de interesses individuais homogêneos ou direito difusos, atendendo, dessa forma, direitos complexos e comuns a uma generalidade de pessoas.

            22 -Ademais, a legitimidade extraordinária do Ministério Público foi novamente afirmada no Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 82, garantindo, em seu artigo 81, a defesa dos interesses ou direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos dos consumidores por meio de "todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela" (artigo 83, da Lei n. 8.078/90).

            23 - Posto isso, tem o Ministério Público legitimidade para acionar demanda que visa tutelar tanto o direito difuso, coletivo e individuais homogêneos e, de acordo com o salutar dizer do Prof. Hugo Nigro Mazzilli, vejamos:

            "(...) Negar o interesse geral da sociedade na solução de litígios coletivos de larga abrangência ou repercussão social, e exigir que cada lesado comparecesse a juízo em defesa de seus interesses individuais, seria desconhecer os fundamentos e objetivos da ação coletiva ou da ação civil pública"

            24 - O mesmo Autor dispõe, ainda, que:

            "Enfim, se em concreto a defesa coletiva de interesses transindividuais assumir relevância social, o Ministério Público estará legitimado a propor a ação civil pública correspondente. Convindo à coletividade como um todo a defesa de um interesse difuso, coletivo ou individual homogêneo, não se há de recusar ao Ministério Público".

            25 – No caso em análise, o direito difuso está relacionado a todos os consumidores, efetivos ou em potencial, da utilização do serviço de atendimento no caixa das agências requeridas, sendo, pois sujeitos indetermináveis em função da prerrogativa que todo o consumidor indeterminável tem em exigir seus direitos básicos, tais como a proteção da saúde contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de serviços considerados nocivos (Lei n. 8.078/90, art.6°, inc.I), bem como a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos (Lei n. 8.078/90, art. 6º, inc. VI)

            26 - Nesse contexto, o Ministério Público é parte legítima para o ajuizamento desta ação, sendo evidente a necessidade de sua propositura para que as requeridas sejam compelidas a cumprir as disposições da Lei n. 1.367/2000, e reparar os danos causados à coletividade, prevenindo a ocorrência de outros danos possíveis, pois difusa a natureza dos interesses em jogo, haja vista ser indeterminado o número de seus titulares, membros da coletividade como um todo, potencial usuária dos serviços bancários, que tem direito a exigir das requeridas o cumprimento das disposição legal referida.

            II. II - DA CONSTITUCIONALIDADE DA LEI N.º 1.367/2000 E DO SEU INJUSTIFICADO DESCUMPRIMENTO PELAS REQUERIDAS

            27.- O Procedimento Preliminar em que se alicerça a presente foi instaurado, em 12 de abril de 2.005, com a finalidade de garantir o cumprimento da Lei Municipal n. 1.367/2000 (fls. 10/11), tendo em vista que as instituições bancárias requeridas, simplesmente, a descumpriam de maneira injustificada, talvez por julgá-la inconstitucional, tal como se extrai dos fundamentos da liminar concedida, por uma juíza da Capital, em favor do Banco do Brasil para impedir a fiscalização e aplicação de sanções administrativas pelo Procon às suas agências, quanto ao cumprimento dos dispositivos legais que estabeleciam o tempo máximo de permanência dos usuários nas filas até o atendimento (fls. 19/22)

            . 28.- O fundamento era de que as leis municipais que dispunham sobre tempo de permanência de usuários nas filas dos bancos fugiam da competência do Município, uma vez que a competência era exclusiva da União (fl. 21), visto que o art. 192, inciso IV, da Constituição da República reza que:

            "Art. 192 – O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, será regulado em lei complementar, que disporá, inclusive, sobre:

            (...)

            IV – a organização, o funcionamento e as atribuições do Banco Central e demais instituições financeiras públicas e privadas";

            29.- Tal argumento, contudo, está fadado ao insucesso, pois as leis municipais, ao legislar sobre o tempo máximo de permanência dos usuários nas filas dos bancos, tratam de assunto, predominantemente, local e que se insere na competência legislativa municipal e não sobre o horário de funcionamento das agências bancárias, pois, neste caso, a competência é da União, como muito bem estabelece a lei n. 4.595/64. Assim, a obrigação dos bancos conferirem tratamento digno ao consumidor está dentro da mais estrita e absoluta esfera legislativa municipal prevista no art. 30, inciso II, da Constituição Federal de 1988.

            30 – A criação de regras para a prestação de serviço de utilidade pública, cujo âmbito é o interesse local, insere-se na esfera de atuação do município. Isto porque nada tem a ver com as regras do sistema financeiro nacional, que se referem, por sua vez, à captação de poupança, atuação no mercado financeiro etc.

            31.- Logo, ao disciplinar o tema, impondo aos bancos o ônus de oferecer um serviço público digno, com o objetivo de coibir filas intermináveis, regrando o tempo máximo de permanência dos munícipes nas mesmas, o legislador municipal visou tão-somente a diminuir o desconforto, o prejuízo e o constrangimento físico e emocional provocado pelas longas filas. Não pode isso implicar interferência no sistema financeiro nem, tampouco, no funcionamento unificado da rede bancária, pois a competência exclusiva da União para legislar sobre o funcionamento e fiscalização da rede bancária não torna os bancos imunes à ação das outras esferas de governo (estados federados e municípios), no tocante às suas competências constitucionalmente asseguradas.

            32 - Saliente-se, por oportuno, que a Lei Municipal n. 1.367/2000, em questão, nada aborda quanto a questões financeiras, monetárias, creditais etc. Visa, isto sim, fixar prazo máximo a que se pode submeter o consumidor gurupiense para ser atendido em uma agência bancária, assunto, como visto, de interesse, predominantemente, local e que não contrasta com o funcionamento do sistema financeiro.

            33.- Nesta esteira, tem se posicionado o Excelso Supremo Tribunal Federal, senão vejamos:

            "14/06/2005 - 18:27 - 1ª Turma entende que município catarinense pode legislar sobre atendimento em agências bancárias

            A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a legitimidade do município de Criciúma (SC) para criar a Lei Municipal 4188/01, que dispõe sobre o tempo de atendimento ao público nas agências bancárias da cidade

. A decisão da Turma foi unânime ao dar provimento a Recurso Extraordinário (RE 432789) interposto pelo Procon de Criciúma contra o Banco do Brasil.

            O BB sustentou que o município extrapolou suas atribuições ao editar a norma relativa ao funcionamento dos bancos. Alegou que isso é matéria de competência privativa da União.

            No entanto, a Turma considerou que a lei municipal não diz respeito ao horário de funcionamento das agências bancárias, como estabelece a Lei Federal 4595/64, mas sim ao tempo que os usuários passam na fila, à espera de atendimento, e à colocação de banheiros para os clientes.

            Ao apresentar o seu relatório, o ministro Eros Grau citou sentença de primeiro grau que considerou válida a norma municipal, em respeito à pessoa e à preservação da dignidade, conforme prevê o artigo 1º, inciso III da Constituição Federal" (fl. 78).(grifos nossos)

            "Íntegra da decisão do ministro Celso de Mello sobre tempo de espera em fila de banco

            8/7/2005

            O ministro Celso de Mello do Supremo Tribunal Federal (STF) negou seguimento a uma ação cautelar (AC 767) ajuizada pelo Banco do Brasil S/A contra a atuação do Procon/DF que vinha determinando o fechamento de agências bancárias que desrespeitassem a Lei Distrital 2.547/2000. A norma prevê, entre outras garantias ao consumidor, tempo razoável para atendimento nas instituições bancárias.

            Nessa decisão, o ministro Celso de Mello entendeu, com apoio em precedentes do Supremo Tribunal Federal, que o Distrito Federal e os municípios dispõem de competência para editar, com fundamento na própria Constituição Federal, leis que exijam dos Bancos maior conforto e segurança aos usuários. A decisão acolheu entendimento do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios TJDFT que manteve eficácia da lei". (fl. 79) (grifos nossos)

            34.- Nem outra poderia ser a orientação da jurisprudência do Pretório Excelso, afinal, ao sistema financeiro e à atividade econômica, temas que, por óbvio, só a União tem o poder de disciplinar e que, com efeito, os ditames da Lei Municipal n. 1.367/2000 não têm a pretensão de regular. Atém-se, esta, isto sim, à referida adequação do sistema bancário ao melhor atendimento da coletividade, matéria de interesse, predominantemente, local, daí porque está em pleno vigor e deve ser obrigatoriamente cumprida pelas instituições bancárias requeridas.

            II. III - DA VIOLAÇÃO CONCOMITANTE A PRECEITOS ESPECÍFICOS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR:

            35 - Em primeiro lugar, o Código de Defesa do Consumidor, por determinação expressa, é aplicável ao serviço bancário que as entidades requeridas fornecem, ex vi do art. 3º, § 2º, do referido Diploma legal, que dispõe:

            "Art. 3º – Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços

            (...)

            § 2o – Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista." (grifos nossos)

            36 - Logo, considerando que o direito que as disposições da Lei Municipal em vigor (Lei n.º 1.367/2000) visam proteger, também foi objeto da preocupação do próprio Código de Defesa do Consumidor, verifica-se que as requeridas não escapam do dever de prestar atendimento adequado ao consumidor. Esse é o entendimento do Pretório Superior Tribunal de Justiça quando da análise da matéria, senão vejamos:

            "BANCOS. SUJEIÇÃO AO REGIME DO CDC. O CDC é aplicável a todas as operações bancárias, sejam elas os contratos de financiamento ou até mesmo os serviços oferecidos pelas instituições financeiras a seus clientes.

O CDC incide sobre todas as relações e contratos pactuados pelas instituições financeiras e seus clientes e não apenas na parte relativa a expedição de talonários, fornecimento de extratos, cobrança de contas, guarda de bens e outros serviços afins. As relações existentes entre os clientes e os bancos apresentam nítidos contornos de uma relação de consumo". (
STJ – 4ª. T. – Resp 213.825/RS – Rel. Min. Barros Monteiro D. j. 22.08.2000) (grifos nossos)

            37 – Consolidando tal entendimento, de maneira a não mais surgir subsídios para questionamentos quanto à aplicabilidade do CDC às instituições financeiras, o STJ editou a Súmula n. 297, in verbis:

            Súmula n. 297 do STJ, de 09/09/2004:

            "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".

(grifos nossos)

            38.- Neste sentido, verifica-se que a prestação de serviços bancários com a designação de pessoal insuficiente para permitir o atendimento ao consumidor de forma rápida e eficiente provoca riscos à saúde contra os quais as requeridas, na qualidade de fornecedoras daqueles serviços, têm o dever de protegê-lo. Não é outra a dicção do art. 6º, inciso I, do CDC, senão vejamos:

            "Art. 6º – São direitos básicos do consumidor:

            I – a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos"

. (grifos nossos)

            39.- Essa preocupação do legislador com a saúde do consumidor é tão relevante que aparece ainda no art. 8º, do mesmo Diploma legal, que dispõe que:

            "Art. 8º – Os produtos e serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão riscos à saúde ou à segurança dos consumidores, exceto os considerados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição, obrigando-se os fornecedores, em qualquer hipótese, a dar as informações necessárias e adequadas a seu respeito."

(grifos nossos)

            40 – Evidente que, ao submeter o consumidor a permanecer, em pé, em filas intermináveis, pelo prazo superior a 2h (duas horas), conforme relatado acima, impõem as requeridas aos usuários dos serviços bancários, desconforto, prejuízo e constrangimento físico e emocional, que deveriam, pelo teor do dispositivo legal referido acima, evitar.

            41.- Isto se repete, com maior gravidade, quanto ao consumidor em desvantagem (idosos, gestantes e deficientes) que, apesar de não gozarem de estado de saúde que recomende que permaneçam em pé por longos períodos, por vezes são obrigados a fazê-lo à falta de assentos em que pudessem aguardar sentados pela prestação do serviço bancário.

            42 - O desrespeito aos direitos básicos do consumidor é tão flagrante que, na agência do Banco do Brasil, o setor de caixas está localizado em seu andar superior, o que obriga os deficientes, os idosos ou as gestantes a despender esforço descomunal para obter o atendimento bancário que necessita, à falta de outro acesso aos referidos caixas, que não por escadas que somam, ao todo, 24 degraus.

            43.- Como se vê, a implementação das medidas determinadas pela lei municipal gurupiense decorre, por outro lado, de comando do próprio Código de Defesa do Consumidor, o que, a uma só vez, demonstra que o respeito ao consumidor recebeu especial tratamento da ordem jurídica pátria (arts. 5º, inc. XXXII, 150, §5º e 170, V, todos da Constituição Federal de 1988), mas nem por isso tem merecido a necessária consideração das entidades requeridas.

            II. IV - DA VIOLAÇÃO CONCOMITANTE À RESOLUÇÃO DO BANCO CENTRAL N.º 2.878, DE 26/06/2001

            44.- Embora, como já destacado, o Pretório Superior Tribunal de Justiça haja recentemente decidido que as instituições bancárias não estão acima da Lei Consumerista, o Banco Central, entidade responsável pela execução e administração da política financeira e econômica do País, formulada pelo Conselho Monetário Nacional, baixou em 26 de julho de 2001, a resolução n.º 2.878 (fls. 112/117).

            45.- Logo, se houvesse qualquer dúvida quanto a aplicabilidade das disposições da Lei n.º 8.078/90 quanto aos serviços prestados pelas entidades requeridas, apesar do art. 3º, do referido Diploma, havê-los contemplado, expressamente, e a jurisprudência pátria ter declarado sua total aplicabilidade, quanto à resolução, não poderia ser levantado questionamento pelas agências bancárias, uma vez que foi formulada pelo próprio Banco Central, entidade que detém o controle e fiscalização das mesmas.

            46.- Entretanto, ainda que a adequação dos estabelecimentos bancários para melhor atendimento da coletividade também esteja regulamentada por referida resolução do Banco Central, nem mesmo esta as instituições requeridas dispõem-se a cumprir. O art. 1º, inc. V, da resolução n.º 2.878, estabelece que as instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil ‘devem adotar medidas que objetivem assegurar’:

            ‘V – efetiva prevenção e reparação de danos materiais e morais causados a seus clientes e usuários".

(grifos nossos)

            47.- Ora, é clara violação ao dever referido permitir que o consumidor permaneça à espera de atendimento bancário por período superior a 15 (quinze) minutos, visto que, a uma, o mesmo terá de ter se afastado de suas tarefas laborativas e, pois, deixado de auferir a remuneração respectiva; a duas, desola o consumidor constatar o desprezo impune que lhe dedicam as instituições requeridas quanto a seus mais básicos direitos, ainda que disponham de meios materiais suficientes para respeitá-los, mantendo, pelo menos, número suficiente de funcionários no setor de caixa, para uma eficaz prestação de serviço.

            48.- Por outro lado, o espírito do art. 9º, inc. I, alíneas "a", "b", "c" e "d", da resolução referida, tampouco é preservado pelo atendimento preferencial que as instituições requeridas praticam hoje. Com apenas um guichê exclusivo para atender pessoas em desvantagem, por vezes, o tempo de espera não é adequadamente reduzido de modo a poupar àqueles o sacrifício de se manterem em pé até que o atendimento se realize. Razoável fosse possibilitado que tais consumidores permanecessem sentados em assentos ou que recebessem senhas, para que não tivessem de despender esforço na espera pela prestação do serviço bancário, estando, assim, concretizada a vontade do Presidente do Banco Central, assim como a dos Legisladores municipal e federal.

            49.- Como se vê, sem que as requeridas manifestem qualquer preocupação em adequar a prestação do serviço bancário ao respeito ao direito do consumidor, violam elas todas as disciplinas legais acerca do assunto, como se ao poder econômico que detêm, nada nem ninguém pudesse se opor. Referido comportamento, verdadeira política institucional, não só não se compadece com o Estado Democrático de Direito, mas, sobretudo, promove o desequilíbrio econômico e social cujo aprofundamento por certo compromete a estrutura do Pacto Social e a dignidade da pessoa humana.

            II. V – DO DANO MORAL COLETIVO E DA NECESSIDADE DE SUA REPARAÇÃO

            50 – Frente às contínuas irregularidades praticadas, as requeridas devem ser responsabilizadas haja vista o descumprimento não só da Lei Municipal n. 1.367/2000, que dispõe sobre o tempo máximo de permanência dos usuários nas filas dos bancos, mas também, dos dispositivos da Resolução n. 2.878 do BACEN, do Código de Defesa do Consumidor e, concomitantemente, da Constituição Federal de 1988.

            51 - Atualmente, tem-se constatado, nas agências requeridas, de um lado, a redução do quadro funcional, principalmente de caixas, e a instituição da "fila única", tornando mais facial para qualquer caixa "enrolar" no atendimento de um cliente, já que não existe mais o espírito de competitividade entre eles, fato que ocorria quando cada caixa possuía sua fila, o que acarretou no surgimento de extensa fila única, em que os consumidores permanecem, em pé, por várias horas, até serem atendidos; e de outro, o estímulo do uso do auto-atendimento, da internet e outros meios tecnológicos, como forma de garantir a "satisfação", "comodidade" e a "agilidade".

            52 - A argüição destas possíveis justificativas pelas requeridas, para o uso de meios tecnológicos, chegaria a ser uma ofensa à nossa inteligência, bastando lembrar que inúmeros são os clientes que, infelizmente, não possuem cultura suficiente para "entender" o funcionamento das máquinas, o que joga por terra os itens "satisfação" e "agilidade". De outro lado, dado o crescente número de ilícitos praticados em caixas eletrônicos e na Internet, em igual proporção aumenta a inibição dos clientes em fazerem uso desse sistema, pelo que o item "comodidade" nem há de ser considerado.

            53 - Ademais, não bastassem todos esses inconvenientes, ainda que o cliente seja culto, saiba operar a máquina de forma correta e queira correr o risco de ser abordado por criminosos ao fazer uso do caixa eletrônico, tem ele, ainda, que contar com a "sorte" de encontrar um caixa eletrônico que funcione perfeitamente, uma vez que, é quase regra, a constatação de máquinas desligadas, ultrapassadas ou com defeito.

            54 - Por fim, nos termos do art. 15, da Resolução n. 2.878 do BACEN, faz-se necessário a manutenção de funcionários, nos guichês de caixa, em número suficiente para atender a demanda de usuários, em contrapartida ao incentivo pelo uso dos meios tecnológicos, pois as instituições financeiras não podem negar ou restringir ao usuário o atendimento pelos meios convencionais, senão vejamos:

            "Art. 15. Às instituições referidas no art. 1, é vedado negar ou restringir, aos clientes e ao público usuário, atendimento pelos meios convencionais, inclusive guichês de caixa, mesmo na hipótese de atendimento alternativo ou eletrônico

" (grifos nossos)

            55 - Assim, cabe ao Judiciário atuar para que a legislação vigente seja cumprida, independente do poderio econômico que as requeridas detêm, evitando o desconforto das intermináveis esperas, em pé, em longas filas e, conseqüentemente, a exposição da saúde e, talvez, da própria vida dos consumidores aos graves riscos que poderão surgir. O meio pelo qual a tutela pode ser efetuada é pela indenização do DANO MORAL COLETIVO.

            56 - O art. 1º, inc. V, da Resolução n. 2.878, do BACEN dispõe que as instituições financeiras devem adotar medidas que objetivem assegurar:

            ‘V – efetiva prevenção e reparação de danos materiais e morais causados a seus clientes e usuários;’

            57 - Num sentido mais amplo, o art. 6º, do CDC, dispõe que:

            "Art. 6.º.

São direitos básicos do Consumidor:

            (...)

            VI – a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos; (grifos nossos)

            58 – Tanto a Resolução n. 2.878, quanto o Código de Defesa do Consumidor, expressamente, dão guarida à efetiva prevenção e reparação ao dano moral e, que o Código de Defesa do Consumidor, num sentido mais amplo, dá guarida tanto à teoria do dano moral individual como à do dano moral coletivo, cuja reparação e prevenção afigura-se como um direito básico dos consumidores.

            59 - O nexo causal que demonstra o dano ensejador de dano moral coletivo decorre do ato ilícito de não observância, pelas requeridas, das normas protetivas do consumidor, tidas como de ordem pública, o que, in casu, ofende os valores da boa-fé objetiva, causando evidente desequilíbrio da relação de consumo, além de colocar em risco a saúde dos consumidores.

            60 - A falta do cumprimento dos aludidos dispositivos legais, pelas requeridas, com a formação de longas filas de usuários, em pé, à espera de atendimento, da qual resulta uma má prestação de serviço, apesar de terem tido tempo suficiente para cumpri-los, pois a Lei n. 1.367, entrou em vigor em 2.000, a Resolução n. 2.878, do BACEN, em 2.000 e Código de Defesa do Consumidor, em 1990, tem gerado o total descrédito, angústia, indignação, aborrecimento, intranqüilidade, perda de tempo, revolta, ansiedade e desprezo nos consumidores, pois estão vendo seu dia passar, seus compromissos pendentes e tantas outras coisas para fazer, enquanto permanecem "presos" a uma fila de banco.

            61 – Nota-se, desta forma, total descaso e desatenção das requeridas para com os consumidores, tanto daqueles que chegaram a utilizar o serviço bancário, como de qualquer outro com potencialidade para utiliza-lo, em total ofensa aos DIREITOS DA PERSONALIDADE e, conseqüentemente, à DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, além de estar contrapondo-se aos ditames do princípio da BOA-FÉ OBJETIVA, quais sejam: LEALDADE + CONFIANÇA e do EQUILÍBRIO NAS RELAÇÕES DE CONSUMO, o que acarreta o Dano Moral Coletivo.

            62 - Verifica-se, pois, que o precário serviço de atendimento no caixa prestado pelas requeridas à sociedade de Gurupi, além de, muito freqüentemente, ter a origem na falta de pessoal suficiente designado para prestá-lo, indubitavelmente, dá mostras de que valores que toda a sociedade esperava fossem respeitados, tais como a defesa dos direitos do consumidor, em verdade, foram esquecidos, pois, de outro lado, é notório que as requeridas têm tido os mais expressivos marcos de crescimento econômico do País, sem que a crise que o assola venha também a atingi-las – antes, parece açodar-lhes a expansão do lucro.

            63 - Enquanto, os CONSUMIDORES se deparam, numa drástica situação, pois têm que se SUBMETER ÀS LONGAS FILAS, EM PÉ, NAS REFERIDAS AGÊNCIAS, DEVIDO À FALTA DE MAIS FUNCIONÁRIOS PARA DESEMPENHAR TAIS FUNÇÕES, vê-se, de outro lado, a crescente expansão econômica das respectivas instituições bancárias, já que apenas O LUCRO LÍQUIDO DO BANCO DO BRASIL (fl. 118), no primeiro semestre de 2.005, foi de R$1,97BILHÃO (UM BILHÃO, NOVECENTOS E SETENTA MILHÕES DE REIAS), sendo 39,3% superior ao apresentado no período correspondente em 2.004, E DO BRADESCO (fl. 119), no mesmo período, foi de 2,621BILHÕES (DOIS BILHÕES, SEISCENTOS E VINTE E UM MILHÕES DE REAIS), 109,7% superior ao apresentado no período correspondente em 2.004. Portanto, em desleal afronta ao critério da boa-fé objetiva e do equilíbrio das relações de consumo, caracterizado está o DANO MORAL COLETIVO.

            64 - Essa espera, em pé, em uma fila bancária, é fato inadmissível e inaceitável na sociedade moderna. Em pleno horário comercial de um dia útil, é lógico presumir-se que as pessoas possuem muitos compromissos e obrigações a cumprir, não sendo tolerável que permaneçam mais de 30 minutos em uma fila bancária; não nos dias de hoje, na vida moderna!

            65 – E, se na esteira dos argumentos acima, já há decisão, no âmbito individual, de fixação de dano moral em favor de cliente que esperou por mais de duas horas em fila de banco, por que não tutelar o DANO MORAL em favor de toda sociedade de Gurupi que vem sofrendo, diariamente, com tamanho despautério cometido pelas requeridas? Vejamos, na íntegra, o recente acórdão proferido pela Quarta Turma Recursal de São Luiz/MA:

            "1. — RECURSO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. Recurso que se insurge contra a condenação em danos morais pelo fato noticiado na inicial dando conta de que o recorrido havia esperado mais de duas horas em fila do estabelecimento bancário o que teria contrariado a Lei Municipal n.º 42/2000. 02 - DANO MORAL - Danos morais são lesões sofridas pelas pessoas físicas ou jurídicas, em certos aspectos da sua personalidade, em razão de investidas injustas de outrem. São aqueles que atingem a moralidade e a afetividade da pessoa, causando-lhe constrangimento, vexames, dores, enfim, sentimentos e sensações negativa, podendo, muita das vezes, resultar em angústia e abalo psicológico, resvalando no ferimento de valores e bens jurídicos tutelados como honra, liberdade, saúde, integridade psicológica, causando sofrimento, tristeza, vexame e humilhação à vítima. Em análise ao caso noticiado nos autos, vejo como uma espera em fila de Banco causou desassossego, dissabor, contrariedades e perda de tempo que o recorrido não deu causa. Nesse sentir, o acontecimento é apto para dar ensejo à reparação pecuniária. 04. Quantum - A penosa missão de tarifar o dano moral é da exclusiva responsabilidade do juiz, que deve atuar, em face do caso concreto, com moderação e prudência, não perdendo de vista que a indenização deve ser a mais completa possível, mas não pode tornar-se fonte de lucro indevido, desse modo, a quantia de R$ 4500,00(quatro mil e quinhentos reais) se revela por demais excessiva e fora de razão quando confrontada com os fatos que narram a reclamação e a concorrência da recorrida no desencadeamento dos eventos. Nesse sentir, entendo que a quantia de R$ 2500,00 (dois mil e quinhentos reais) é proporcional ao dano sofrido alcançando sua exata extensão nos termos do artigo 944 o Código Civil e seu parágrafo único. 05 - Recurso conhecido e improvido. 06 - Súmula do julgamento que serve de acórdão. 07 — Inteligência do art. 46, segunda parte, da Lei 9.099/95".

(Quarta Turma Recursal Cível de São Luiz/MA, Recurso n. 6.135/04, Acórdão n. 9862/05, Rel. Dra. Maria do Socorro Mendonça Carneiro, D.j. 12/08/2005) (grifos nossos)

            66 - Nestes parâmetros consideráveis da reparação moral coletiva, o ilustre CARLOS ABERTOS BITTAR leciona que:

            "(...)chega-se a conclusão de que o dano moral coletivo é a injusta lesão da esfera moral de uma dada comunidade, ou seja, é a violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos. Quando se fala em dano moral coletivo, está-se fazendo menção ao fato de que o patrimônio valorativo de uma certa comunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira absolutamente injustificável do ponto de vista jurídico: quer isso dizer, em última instância , que se feriu a própria cultura, em seu aspecto imaterial."

            67 - Em sendo certo que a sistemática consumerista acolheu referidos valores no intuito de buscar a justiça contratual, demonstrada no equilíbrio das relações de consumo entre fornecedor e consumidor, bem como a efetiva segurança jurídica das mesmas, não se pode chegar a outra conclusão, senão a de que o ilícito levado a efeito pelas requeridas lesou toda uma coletividade em seu patrimônio valorativo, dando causa ao que a doutrina chama de DANO MORAL COLETIVO e o sistema, por sua vez, o consagra em todos os seus aspectos.

            68 - Tem-se, portanto, que os agrupamentos humanos, considerados como um todo, são passíveis de sofrerem danos morais, vez que seus valores se identificam na sociedade, quando da luta por ideais comuns, e, conseqüentemente, podem sofrer também os resultados negativos de fatos lesivos, inclusive aqueles ligados às práticas daqueles que detêm o poder econômico em nosso país, e destes originados. Surge, então, um desprestígio ou um desconforto, no seio da coletividade, em face dos serviços prestados pelas requeridas, bem como ao caráter imperativo de nossas leis, pois, CAUSA A FALSA IMPRESSÃO DE QUE SOMENTE OS MENOS ABASTADOS ESTÃO SUBMETIDOS AOS SEUS DITAMES E RESPECTIVAS SANÇÕES.

            69 - Ademais, é importante destacar que, em âmbito coletivo, para aferição do dano moral, é preciso identificar os valores culturais comuns ao grupo social que foram lesados em razão da conduta ilícita. A prova desta está nos autos, pois há a demonstração, em várias inspeções realizadas nas agências das requeridas, de que os dispositivos da Lei Municipal n. 1.367/2000, da Resolução n. 2.878/2000 e os dispositivos do Código de Defesa do Consumidor não estão sendo respeitados, com a lesão da garantia do princípio da boa-fé objetiva, da segurança da relação contratual e com a submissão dos consumidores aos vários inconvenientes, acima referidos, e a possíveis riscos à saúde.

            70 - Finalmente, cabe ressaltar que a conduta das requeridas lesam os consumidores de Gurupi diretamente e, ainda, potencialmente, sendo necessário a condenação das requeridas à reparação dos DANOS MORAIS COLETIVOS, pois é a medida de que dispõe o ordenamento jurídico, para proteger as relações sociais de consumo e manter o equilíbrio de forças entre as partes, mediante a intervenção do Estado na defesa do hipossuficiente – o consumidor.

            II. VI – DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA DAS REQUERIDAS E DOS CRITÉRIOS PARA A FIXAÇÃO DO DANO MORAL COLETIVO A TÍTULO DE INDENIZAÇÃO

            71 - Demonstrou-se, até aqui, a conduta lesiva das requeridas, a produção de danos morais na ordem difusa e a plena relação de causalidade entre as práticas reiteradas das mesmas em não cumprir os referidos dispositivos legais e a emergência dos danos.

            72 - Embora evidenciado pelos elementos constantes do procedimento preliminar 013/05, em anexo, o intenso dolo das requeridas no contexto fático violador, cumpre destacar que, em se tratando de produção de danos na esfera dos direitos do consumidor, a RESPONSABILIDADE É OBJETIVA, o que torna despiscienda a comprovação do dolo ou da culpa.

            73 - Nesse sentido, reza a melhor jurisprudência, senão vejamos:

            "BANCO – FORNECEDOR DE SERVIÇOS – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – DEFEITO DE CONSUMODever de indenizar. Os bancos ou instituições financeiras, como prestadores de serviços, estão submetidos às disposições do CDC e, na relação de consumo, a responsabilidade do fornecedor é objetiva, afastada apenas nas hipóteses de inexistência do defeito de consumo ou se comprovada a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros (art. 14, parágrafo 3º, inciso II do CDC)"

. (TJBA – AC 30.275-0/02 – (25.239) – 4ª C.Cív. – Rel. Des. Paulo Furtado – J. 09.10.2002) JCDC.14 JCDC.14.3.II ) (grifos nossos)

            74 - Assim, comprovado o dano moral e sua relação de causalidade com as condutas das requerida, deve a sociedade de Gurupi ser ressarcida, a fim de que seja feita a devida justiça, especialmente, no que tange à devida reparação associada ao princípio da proporcionalidade, culminando, assim, na sanção do agente lesionador para que se veja inibido de repetir tal prática lesiva, na devida compensação às vítimas do mencionado despautério, exaustivamente demonstrado, em observância à capacidade econômica do agente, para que sejam mantidos os mais íntegros valores sociais da pessoa humana, considerados de forma coletiva.

            75 - Desta forma, quanto ao fim a que se destina a sanção civil relativa à causação de danos morais coletivos no mercado de consumo, convém, analisar: primus, o provimento da indenização realiza o papel reparatório de devolver, ainda que indiretamente, o equilíbrio nas relações de consumo. Por outro lado, cumprindo uma função preventiva, possibilita a desestimulação da prática reiterada da ação ilícita, coibindo a proliferação dos mesmos atos lesivos para o mercado.

            76 – Outrossim, deve-se levar em conta critérios que exijam a capacidade de reflexão e análise conjuntural do julgador. São eles: a) a repercussão do dano na esfera da coletividade lesada; b) o potencial econômico-social do lesante (compatível com o presente pleito) e c) as circunstâncias do caso, para, finalmente, se chegar ao justo valor da indenização, aquele hábil a compensar a parte lesada e a punir a parte lesante de forma equilibrada.

            77 - Isto posto, como as reiteradas práticas das requeridas de descumprirem as disposições legais referidas causaram estupenda agressão à coletividade, de forma indivisível, fazendo-se surgir uma total desconfiança na proteção do consumidor, necessário se faz constituir a indenização em face dos danos morais coletivos, que deverá ser revertida para o Fundo Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor, nos termos do artigo 13, da Lei n° 7.347/85 c/c a Lei Estadual n.12.207/93 (regulamentada pelo Decreto Estadual, n. 4.163/94).

            78 - Inclinando sua atenção para o disposto e para os critérios supracitados, o Ministério Público sugestiona a condenação pela reparação do DANO MORAL COLETIVO, de cada uma das Requeridas, em valor não inferior a R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), por entender que esta é a medida certa de justiça.

Sobre o autor
Marcelo Lima Nunes

Promotor de Justiça no Tocantins.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NUNES, Marcelo Lima. ACP para cumprimento de lei sobre tempo máximo em filas de bancos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 867, 15 nov. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16650. Acesso em: 18 nov. 2024.

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