O ativismo político-judicial

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06/09/2022 às 16:10
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10. PGR PEDE O STF O ARQUIVAMENTO DO IPL CONTRA EMPRESÁRIOS

No dia 31/08/2022, a Vice-Procuradora-Geral, Lindôra Araújo, determinou o envio de parecer ao STF, recomendando o arquivamento da ação judicial ajuizada por parlamentares, contra o grupo de empresários, com base em conversas de WhatsApp .

De acordo como a PGR, existem alguns fatores que respaldam a recomendação de arquivamento, a exemplo da ilegitimidade dos autores da ação; irregularidade na representação; a prática de persecução penal especulativa indiscriminada, conhecida como fishing expedition ; evidente exploração eleitoral e midiática da questão, assim como pelo desrespeito ao sistema acusatório.

O parecer da PGR foi encaminhada ao ministro-relator do inquérito, Alexandre de Moraes, que havia determinado várias medidas cautelares em detrimento do grupo de empresários apoiadores do Presidente da República, Jair Bolsonaro, por solicitação do coordenador de campanha do ex-presidente Lula da Silva, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), além de perseguidor compulsivo do Presidente da República.

Ademais, o parecer demonstra que os autores da ação não têm legitimidade para peticionar sobre o caso, uma vez que a legislação não admite a intervenção de pessoas ou de entidades que não possuam qualquer tipo de ligação com os substratos fáticos ora em apuração, conforme o texto abaixo:

“A prevalecer a argumentação dos senadores, mutatis mutandis, qualquer inquérito em curso perante o Judiciário poderia sofrer intervenções de ‘interessados’ ou de autoridades locais, para solicitar diretamente ao magistrado diligências investigatórias, o que o CPP não autoriza nem mesmo ao ofendido, que tem seus requerimentos de diligências examinados e sujeitos ao Juízo da autoridade investigativa (CPP, art. 14)”.

Destarte, além da carência de legitimidade dos autores, a manifestação demonstra que o requerimento apresentado possui viés de autopromoção dos agentes públicos, principalmente nesse período eleitoral. Enfatiza também que embora a PGR não tenha obtido acesso ao procedimento que cuida dos fáticos, um outro requerimento já havia veiculado na íntegra pela imprensa. Ratificando a manifestação, a PGR declarou que:

“Incabível o deferimento de transferência sigilosa a órgão político de supostos elementos de informação contidos na Petição 10.543, cujos autos a Procuradoria-Geral da República ainda não teve acesso, estando pendente de exame do relator o pedido de vista apresentado pela PGR no dia 24.8.2022 naquela Petição”.

A PGR destaca, ainda, que não se trata de direito de petição, uma vez que os parlamentares não podem de forma anômala, assumir a condução de uma investigação, sob pena de violação ao princípio da separação dos poderes, lembrando que a função típica dos autores parlamentares do requerimento é de legislar, afirmando que:

“A Constituição Federal não outorgou competências investigativas a parlamentares, que ficaram reservadas excepcionalmente às Comissões Parlamentares de Inquérito que só podem ser instaladas observados os requisitos do art. 58, § 3º, da Constituição Federal”.

Destaca também a PGR, que no pertinente aos pedidos apresentados no procedimento, têm com base apenas matéria jornalística, com fundamento exclusivo em supostos “diálogos antidemocráticos”, com o esteio de se valer de conjecturas e ilações para iniciarem e conduzirem frentes investigatórias com espetacularização midiática, sem o mínimo substrato fático e jurídico. Trata-se, porquanto, do expediente denominado de fishing expedition que não é admitido no ordenamento jurídico brasileiro, cuja vedação está prevista em diversos precedentes judiciais, inclusive do próprio STF.

Ademais, segundo a PGR, outro vício é destacado na petição inicial, é o fato de as assinaturas dos autores dos pedidos não possuírem certificação digital, ou seja, foram apenas digitalizadas, “o que não é admitido pela pacífica e pretérita jurisprudência do STF”. Assim, de acordo com o MPF, essa irregularidade de representação compromete a validade do documento, porque a advogada, como sendo a única que assinou com o certificado judicial, não tem procuração válida. Assim sendo, como o esclarecido na manifestação da PGR, na procuração que confere poderes à advogada, os senadores, também, limitaram-se a colocar a imagem digitalizada das assinaturas.

Neste sentido, diante de todos os vícios apontados, a PGR sustenta sobre a impossibilidade de dar andamento da presente questão, razão pela qual pede o arquivamento da exordial.


11. RESUMO DOS INQUÉRITOS INSTAURADOS CONTRA O PRESIDENTE

Perante o presente tópico, verifica-se que com a abertura de mais uma investigação, ocorrida na data de 12/08/2022, em torno do suposto vazamento de informações sigilosas da Polícia Federal, o Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, passou a ser investigado em 4 (quatro) inquéritos no âmbito do STF e mais um no Tribunal Superior Eleitoral.

Concernentemente no âmbito do STF, o Presidente da República responde as investigações seguintes:

1 – Suposta interferência do Presidente Bolsonaro na Polícia Federal.

Em síntese, na data de 27/04/2020, o ministro Celso de Mello do STF, autorizou a abertura de IPL visando investigar denúncias contra o Presidente produzidas pelo ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, quando ao anunciar sua saída do ministério na data de 24/04/2019, Moro afirmou que o Presidente Bolsonaro tentou interferir politicamente no trabalho da Polícia Federal, em inquéritos relativos a familiares.

2 – Suposto ato de prevaricação em torno de possível irregularidades na negociação da vacina Covaxin.

Em 12/07/2021, a Polícia Federal instaurou um inquérito para apurar se o Presidente Bolsonaro prevaricou, no caso das supostas irregularidades na negociação da vacina indiana Covaxin.

A referida investigação foi originada de informação prestada na CPI da Covid, em 25/06/2021, através de Luís Ricardo Miranda, funcionário do Ministério da Saúde, chefe de importação do departamento de logística, juntamente com seu irmão, deputado federal Luís Miranda (DEM-DF), os quais afirmaram ter avisado ao Presidente Bolsonaro sobre suspeitas de corrupção na negociação, para a compra da vacina Covaxin.

3 – Suposto vazamento de dados de inquéritos sigilosos da Polícia Federal.

Na data de 04/08/2021, deu-se a divulgação por parte do Presidente Jair Bolsonaro nas redes sociais, sobre um inquérito da Polícia Federal que apura suposto ataque ao sistema interno do TSE em 2018. Contudo, o próprio TSE noticiou que esse fato não representou qualquer risco às eleições. O referido IPL foi instaurado oito dias mais tarde, por determinação do ministro Alexandre de Moraes, afirmando que os dados não poderiam ter sido divulgados sem autorização da Justiça, determinando que o Presidente Bolsonaro seja investigado por vazamento de inquérito sigiloso da Polícia Federal.

4 – Suposto ataques às urnas eletrônicas.

Ressalte-se que a investigação no âmbito do TSE, por meio de um inquérito administrativo, está apurando supostos ataques, sem nenhuma prova, contra o sistema de votação eletrônico.

Na data de 04/08/2021, o ministro do STF, Alexandre de Moraes, determinou a inserção do nome do Presidente Bolsonaro na condição de investigado, no inquérito que apura a divulgação de fake news . Ressalte-se que a decisão de Moraes foi respaldada por unanimidade pelos membros do TSE.

Destarte, a precitada investigação administrativa foi convertida em inquérito, acrescentando o objeto de apuração, inserindo-se suposto abuso de poder econômico e político; uso indevido dos meios de comunicação social; corrupção; fraude; condutas vedadas a agentes públicos; e propaganda extemporânea.


12. ANÁLISE JURÍDICA QUANTO A COMPETÊNCIA JUDICIAL

Compulsando-se as regras de competência jurisdicional prevista na nossa Carta Fundamental de 1988, no pertinente a competência por prerrogativa de função, com o estabelecimento do processamento e julgamento de determinadas autoridades, há a previsão legal inserida no artigo 84 do Código de Processo Penal, prevendo a competência ratine personae , como sendo do Supremo Tribunal Federal (STF), do Superior Tribunal Federal (STJ), dos Tribunais Regionais Federais (TRFs), dos Tribunais de Justiça dos Estados (TJEs) e do Distrito Federal.

Pertinente a competência ratione personae do STF, ela tem a sua previsão legal prevista no artigo 102, inciso I, alíneas “b” e “c” da CF/88, prevendo sua competência como guardião da Carta Magna vigente, o processamento e julgamento do Presidente da República e dos demais membros do Congresso Nacional.

Com relação a competência ratione personae direcionada ao STJ, a sua previsão está na forma do artigo 105, inciso I, alínea “a”, da CF/88, incumbe-lhe ao processamento e julgamento nos crimes comuns praticados pelos governadores dos Estados.

Atinente a competência ratione personae dos TRFs, está prevista no artigo 108, inciso I, alínea “a”, da CF/88, competindo-lhes o processamento e o julgamento dos juízes federais e de sua jurisdição nos crimes comuns e de responsabilidade.

E, finalmente, a competência ratione personae dos TJEs e do Distrito Federal, prevista no artigo 29, inciso X e artigo 96, inciso III, da CF/88, competindo-lhes aos julgamentos dos prefeitos municipais.

Trata-se, porquanto, de um foro por prerrogativa de função ou simplesmente competência ratione personae , ou ainda, foro privilegiado, cujo instituto não soa muito bem no seio da sociedade brasileira, entendendo que a prerrogativa de função abriga a impunidade.

Neste sentido, preconiza a doutrina de Tourinho Filho (2006, pág. 270), in verbis:

“Há pessoas que exercem cargos de especial relevância no Estado, e em atenção a esses cargos ou funções que exercem no cenário político-jurídico da nossa Pátria gozam elas de foro especial, isto é, não serão processadas e julgadas como qualquer do povo, pelos órgãos comuns, mas pelos órgãos superiores, de instância mais elevada.”

Essa competência originária, tem a sua justificação em face não da pessoa em si, mas do cargo que está ocupando no Estado. Portanto, a competência é fixada, levando-se em consideração ao cargo ocupado na Administração Pública, seja Federal, Estadual ou Municipal. Esse foro por prerrogativa de função está previsto na Constituição Federal, conforme acima descrito, e não possibilita a extensão dessa competência funcional a demais autoridades, que não estejam indicadas na Carta Magna vigente, respeitadas as regras da conexão e continência.

Ademais, vale ressaltar que, a competência ratione personae não admite prorrogação por ser absoluta, enquanto que a relativa, ou seja, aquela que admite a prorrogação quando o juízo originalmente é incompetente, tornar-se-á competente prorrogando sua competência no caso concreto.

Por outro lado, as competências ratione materiae , a ratione personae e a funcional são casos de competência absoluta, enquanto que a competência ratione loci (em razão do local do crime), é reconhecida com relativa pela maior parte dos doutrinadores, embora o jurista Aury Lopes Jr, leciona que apesar da predominância civilista de que a competência em razão do local do crime ser relativa, este tem o entendimento de que a eficácia do princípio do juiz natural não admite que esta seja relativa, no pertinente ao critério de fixação de competência.

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Vale dizer que, o princípio do juiz natural dispõe que o juiz deve ter a sua competência, antes mesmo do fato ser julgado, não podendo ser indicado, designado ou nomeado para julgar determinado caso. Assim, nas comarcas com mais de um cartório, haverá distribuição por sorteio. Ademais, os magistrados não podem ser convocados pelos tribunais de segundo grau ou pelos tribunais superiores, sem que se obedeça às normas regulamentares e de quórum , sob pena de sofrer nulidade das decisões por violação das regras do princípio do juiz natural, conforme prevista no inciso XXXVII do artigo 5º da CF/88 reza: Não haverá juízo ou tribunal de exceção”.

No pertinente ao inciso LIII, dispõe que, “Ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”.

Na mesma inteligência, reza o Pacto de San José da Costa Rica, que foi promulgado pelo Decreto nº 678, de 1992, onde no seu artigo 80, nº 1, dispõe que, “Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza”.

Perante a leitura desse normativos legais, a regra da competência é quem concede a proteção ao princípio do juiz natural.

12.1. COMPETÊNCIA ABSOLUTA, RELATIVA E PRORROGAÇÃO DE COMPETÊNCIA

Tratando-se de Competência Relativa, como já observado alhures, ela é prorrogável, podendo ser prolongada, desde que não haja arguição oportuna ou prejuízo para as partes do feito.

É cediço que a incompetência do juízo configura causa de nulidade de acordo com o inciso I, do artigo 564 do CPP. Porquanto, a exceção de incompetência deve ser interposta dentro do prazo da defesa preliminar, de acordo com o § 10, do artigo 396-A, do CPP.

Na hipótese da alegação de incompetência relativa na comarca ou subseção onde tramita o processo, o prejuízo da parte pode dizer respeito à distância do local do fático e onde as provas se encontram, circunstância dificultosa para a apuração real dos fatos, conforme a leitura do artigo 567 do CPP, verbis :

“A incompetência do juízo anula somente os atos decisórios, devendo o processo, quando for declarada a nulidade, ser remetido ao juízo competente.”

No que pertine a competência absoluta, esta não admite prorrogação. Porquanto, a declaração de nulidade decorrente da incompetência absoluta, não depende de arguição oportuna, podendo ser reconhecida inclusive depois de transitado em julgado da sentença, mediante o remédio excepcional de habeas corpus . Uma vez que a competência absoluta constitui ato essencial, estrutural do processo, cuja carência caracteriza a nulidade absoluta, além do prejuízo ser presumido, em atenção a previsão do inciso I, do artigo 564 do CPP.

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Sobre o autor
Jacinto Sousa Neto

Advogo nas área de direito civil, trabalhista e em procedimentos administrativos (sindicância e processo administrativo), além disso sou escritor e consultor jurídico. Advogado – Consultor Jurídico – Literário

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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