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Tributação e cidadania.

Projetos de lei ameaçam o contribuinte

25/11/2007 às 00:00
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O que é bom para o cidadão

O epíteto acima bem explica os entulhos autoritários que têm sido despejados no seio da sociedade, nos últimos anos, pelo Parlamento Nacional, aparentemente, em nome do povo que o representa.

Esquecidos de que o Estado é meio, e não fim, os nossos legisladores têm elaborado, com freqüência cada vez maior, instrumentos normativos dos mais truculentos, que anulam e aniquilam por completo o Estado Democrático de Direito.

Para continuar alimentando o Estado paquidérmico – que, de regra, só serve aos detentores do poder, dentre os quais os obedientes parlamentares –, parece não ter fim a escalada da violência perpetrada contra os indefesos contribuintes, que não têm a quem recorrer, a não ser aos foros internacionais. É um verdadeiro horror, que nos faz lembrar a pranteada obra do poeta Castro Alves.

Depois da medida cautelar fiscal de arrolamento; da penhora on line; da indisponibilidade universal de bens (Detrans, Bolsa de Valores, Registros de Imóveis); protestos de certidão de dívida ativa; inscrição do nome do contribuinte no SERASA; responsabilização solidária de sócios de micro e pequenas empresas, sem culpa subjetiva; diminuição do prazo para ação de repetição de indébito tributário nos tributos de lançamento por homologação; impossibilidade de compensação tributária antes do trânsito em julgado da decisão em que se discute o tributo; edição de norma antielisiva geral etc. – estão em discussão no Congresso Nacional outras medidas aterradoras.

Uma delas é o Projeto de Lei nº 5615/05, de autoria do nobre Deputado CELSO RUSSOMANNO, que simplesmente abole a execução judicial, substituindo-a pela execução administrativa.

Ao que tudo indica, o projeto legislativo em tela deve ter contado com a ajuda de um doutor da Sorbonne. Como o Judiciário tarda para a efetiva cobrança do tributo, o nobre deputado encontrou um meio processual para agilizar essa cobrança. A Fazenda, que é parte na relação jurídico-tributária, faz o papel de cobrador e de distribuidor da justiça ao mesmo tempo. É bem mais simples e rápida. Cobrança armada seria, ainda, mais rápida e eficaz!

Felizmente, na última vez que verificamos o andamento desse malsinado projeto legislativo ele estava com o parecer da Comissão de Trabalho, de Administração e de Serviço Público da Câmara dos Deputados pela sua merecida rejeição.

Outra proposta estarrecedora é o Projeto de Lei Complementar de nº 75/03 apresentado pelo Deputado EDUARDO CUNHA, que altera os incisos IV e V do art. 151 do Código Tributário Nacional, a fim de condicionar a concessão de medida liminar em mandado de segurança ou de medida liminar ou tutela antecipada em outras espécies de ações judiciais ao prévio depósito do montante integral do tributo até o trânsito em julgado da decisão do mérito.

Ora, a medida liminar ou antecipação de tutela decorre do poder cautelar do juiz, ínsito na jurisdição, que se constitui em monopólio estatal do Poder Judiciário – donde decorre o absurdo jurídico da medida proposta, que tenta, em vão, aniquilar o remédio processual de natureza constitucional.

Contudo, o que é claro como a luz solar para alguns pode ser nebuloso, difícil e complexo para outros, quer por desconhecimento da matéria, quer por conveniência política.

O projeto legislativo em questão já passou pela Comissão de Finanças e Tributação, que opinou pela sua aprovação, encontrando-se, atualmente, na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados.

Se for para valer a denominação dada a essa Comissão, o parecer só pode ser pela rejeição da proposta, que atenta contra a cidadania. Mas, na Câmara dos Deputados tudo é possível acontecer, pois há o predomínio das paixões políticas fomentadas e estimuladas pelo Executivo. Lá, tudo é tolerado. Veja-se o episódio lamentável da prorrogação da CPMF contra a vontade soberana do povo brasileiro.

Esse projeto legislativo, além de representar um retrocesso legislativo da pior espécie, pois, o momento atual, em termos processuais, é marcado pela adoção de medidas tendentes à efetividade da jurisdição, carrega consigo o vírus da pior das endemias, pois, na prática, pode abolir o recurso heróico em matéria tributária. Ele atenta contra o art. 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal. Sem a medida liminar, nos casos de periculum in mora e de relevância jurídica da fundamentação aduzida no writ, o remédio constitucional previsto passa a ser uma letra morta, na conjuntura atual, em que o trânsito em julgado de uma decisão judicial leva mais de cinco anos.

É preferível pagar e submeter-se ao império da ilegalidade eficaz, e esquecer o princípio da legalidade tributária que a ditadura legislativa, praticamente, já aboliu.

Por fim há, ainda, um anteprojeto de lei, elaborado pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, menos radical do que a proposta legislativa do Deputado CELSO RUSSOMANNO, que institui um sistema híbrido de cobrança de tributos. Provoca a dança dos processos de execução de uma repartição para outra, reservando ao Judiciário tarefas menos relevantes. O leilão de bens penhorados, por exemplo, independe de atuação do juiz, que, preocupado com a questão de justiça, poderia atrapalhar a rápida realização da receita pública.

Sobre esse projeto em gestação, já escrevemos inúmeras vezes, e apresentamos, inclusive, uma proposta alternativa incorporando a penhora como um pré-requisito da execução fiscal, de sorte a ir para o Judiciário apenas as execuções viáveis, devidamente aparelhadas, com o que, certamente, desaparecerá a queixa da Fazenda de que o Judiciário leva mais de doze anos para solucionar a pendência tributária.

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Finalizando, é preciso exercer a cidadania, guardando na memória os nomes de parlamentares que conspiram contra a cidadania, que patrocinam projetos de interesse do governo e deles próprios em detrimento dos mais elementares direitos dos contribuintes, inclusive, os protegidos no âmbito de cláusula pétrea.

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Sobre o autor
Kiyoshi Harada

Jurista, com 26 obras publicadas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HARADA, Kiyoshi. Tributação e cidadania.: Projetos de lei ameaçam o contribuinte. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1607, 25 nov. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10626. Acesso em: 22 nov. 2024.

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Título original: "Tributação e cidadania".

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