O Ministro Marco Aurélio de Mello declarou que a Instrução Normativa da Fazenda, relacionada ao sigilo bancário, é manifestamente inconstitucional. Contrariando uma tradição da Casa de não antecipar julgamentos, considerou-a tão dramaticamente maculadora da lei maior, que não teve dúvidas de enviar um recado à Receita Federal, pela violação perpetrada.
A sua manifestação representa, de rigor, uma clara sinalização de que há possibilidade de a Lei Complementar n. 105, em seus arts. 5º e 6º, ser considerada inconstitucional, visto que, por ela, determinadas autoridades fiscais, em casos de suspeição, poderiam acessar dados bancários sem autorização judicial.
Na verdade, a Lei Complementar n. 105/01 violou a jurisprudência da Suprema Corte Federal que, ao interpretar o art. 5º, inc. XII, da Lei Suprema, apenas admite a quebra do sigilo após exame, por parte de magistrado, dos argumentos e fatos apresentados pela autoridade fiscal. Nesta linha, estaria a sociedade protegida contra o arbítrio fiscal, e, o fisco, contra os sonegadores. Só a um Poder neutro é dado o direito da quebra pretendida.
O Ministro Carlos Mário Velloso, em voto histórico, chegou a dizer que nem mesmo o Ministério Público poderia agir sem autorização judicial, pois é parte no processo e não juiz.
Ora, a IN. 802/07 da Receita Federal conseguiu não apenas ferir a Constituição Federal e a jurisprudência da Suprema Corte, como, o que é pior, ferir a própria Lei Complementar n. 105/01, visto que esta apenas permite a quebra de sigilo bancário, em casos de suspeita, por um limitado grupo de especialistas do Erário. O novo ato torna todos os contribuintes brasileiros suspeitos.
É, portanto, nitidamente ilegal –fere a lei complementar n.105/07- e manifestamente inconstitucional –fere o art. 5º, inc. X e XII da Lei Suprema, assim como dissente da maciça jurisprudência daquela Casa.
É de se lembrar que a I.N. 802/07 sequer conta com o suporte dos tempos da CPMF, pois o tributo deixou de existir desde 31/12/07.
Muitas vezes, tenho a impressão de que a máxima de Mussolini, no auge do fascismo italiano, é seguida rigorosamente pelos atuais detentores do poder: "nada contra o Estado, nada fora do Estado, tudo dentro do Estado".
À evidência, atos como este, denunciado pelo Ministro, em nada contribuem para o fortalecimento da democracia do país.
Espero que, na retomada dos trabalhos da Suprema Corte, terá, o melancólico e arbitrário ato do governo, o destino preconizado pelo Ministro Marco Aurélio de Mello.