1. Restrição de Direitos Fundamentais pelo Poder Legislativo
O legislador ordinário não pode ir além do que lhe foi autorizado pelo Poder Constituinte. Pode-se dizer, com a devida proporcionalidade, que a norma constitucional está para a lei regulamentadora tal qual o decreto está para a lei que lhe exige especificação: contém-se no seu interior, mas não lhe pode contrariar, vai apenas até o limite que a norma de hierarquia superior lhe permite, se coordena sem quebrar a coerência do sistema. Não pode, portanto, a norma regulamentadora ir além da que lhe dá significado, esta contém o princípio, a ratio, o telos pelo qual aquela está vigendo indo além do que lhe é autorizado, impossível é admitir-se sua validade.
Pontes de Miranda, aliás, salienta que "se a lei, em relação à Constituição, ou o decreto ou regulamento, em relação à lei, reproduz a regra jurídica hierarquicamente superior, com podamento, acréscimo, substituição, ou pontuação deformante, o Poder Legislativo, que editou tal lei, ou o Poder Executivo, que lançou tal decreto ou regulamento, exorbitou das suas funções, e é nulo o que se afasta do texto inserto, deturpando-o (2)" (grifo no original).
Jorge Miranda, emérito constitucionalista português, assim ensina: "afigura-se que existem dois vícios quanto ao conteúdo dos actos legislativos (em paralelo com os vícios dos actos administrativos): violação de lei constitucional e desvio de poder legislativo aquela patenteada através da pura e simples contradição entre o objecto e o sentido do acto e a norma constitucional, este na contradição entre o seu fim (havendo discricionariedade do legislador) e o fim ou interesse constitucionalmente assumido".
E prossegue, analisando exatamente o tema aqui em relevo: "o Parlamento, órgão legislativo por excelência, pode também exceder os seus poderes, usando das faculdades que a Constituição lhe confere na realização de fins diversos dos que a mesma Constituição tinha em vista ao conceder-lhe a competência. Os actos jurídicos não podem apreciar-se desligando-os do fim que os determinou, sejam ou não actos do Parlamento (3)" (grifo no original).
Não há de se falar, portanto, que, a partir da interpretação teleológica da norma principal, a norma inferior regulamentadora tem poderes plenos para especificar, quando apenas lhe é dado colocar em prática, detalhar, conformar o preceito constitucional com a realidade. A conformação de direitos fundamentais não significa que o legislador possa dispor deles; significa apenas a necessidade da lei para "garantir" o exercício de direitos fundamentais (4).
Essencial, posto isso, é observar que a individualização da pena não está, e não deve ser, definida pela Lei Ordinária. Diz-se, apenas, que esta deve regulá-la; fornecer condições para que seja colocada em prática, dar voz à norma constitucional que lhe outorga a razão de ser. É bem diferente ler-se, no art. 5º, XLVI: "A lei regulará a individualização da pena", do que "A lei individualizará a pena", ou mesmo "a lei definirá a individualização da pena". Quando se usou o verbo regulará estabeleceu-se que a individualização já tem conceito, a ser apenas regulado (garantido) pela lei ordinária.
A individualização não é um poder outorgado do legislador constituinte ao Poder Legislativo, mas sim um direito fundamental previsto no tábua do art. 5º, devendo apenas ser posto em prática, adaptado, pelo Congresso Nacional. A LEP é uma regulamentação da individualização executiva da pena. A lei dos crimes hediondos ultrapassa o limite que lhe é dado, vedando a individualização. Esta lei ordinária, verdadeira aberração no ordenamento, é da mesma envergadura da norma constitucional, define uma outra individualização, que não a constitucional (aliás, o que ela define sequer é uma individualização, senão o seu contrário). Vai além dos limites, extrapola os direitos fundamentais da pessoa humana. Manifestadamente, é inconstitucional.
Nesse sentido, não é outra a lição de Alberto Silva Franco: "embora a Carta Magna afirme que a lei regulará a individualização da pena, força é convir que a lei pode dar parâmetros para a atuação judicial, mas não poderá, de modo algum, obstar que se realize a individualização punitiva (5)".
O telos da norma constitucional não é o de declinar competência para o órgão legislativo ordinário, dando margem à arbitrariedade legiferante é, isso sim, conformar direitos fundamentais, adaptando às exigências específicas da realidade. Salienta, com razão, Jorge Miranda, que "os órgãos de fiscalização da constitucionalidade devem raciocinar não tanto com base em juízos lógico-formais quanto em juízos valorativos, procurando soluções constitucionais adequadas; e há-de ser através destes juízos, descendo ao fundo das coisas e não se contentando com quaisquer aparências, que os órgãos de fiscalização devem apreciar a constitucionalidade das leis concretizadoras de normas constitucionais programáticas ou, por exemplo, das que se contendam com os princípios da igualdade e da proporcionalidade e com os limites e restrições a direitos fundamentais (6)".
2. Da Execução da Pena enquanto fase de sua Individualização (7)
A LEP contém a regulamentação adequada para a individualização da pena, em nível de execução. Agravar a execução é uma coisa; destituir o juiz do poder de particularizar o regime é outra. Se o legislador considerava branda demais a Lei n. 7210/84, que estabelecesse novas regras para a individualização, não que a impedisse. Se queria dar tratamento rigoroso a essa "etiqueta" de delinqüentes, que o fizesse, mas usufruindo de seus meios, e não invadindo a competência do Judiciário.
De fato. Poderia o legislador, agravando ao máximo a situação desses delinqüentes, estabelecer, em tese, que o juiz poderia, inclusive, estabelecer regime integralmente fechado. Dizendo que ele assim deve fazer, infringiu norma que estabelece a separação dos poderes, já que invadiu competência jurisdicional.
O inciso XLVI, art. 5º, da CRFB, não concede o direito à progressão de regime, e sim direito à individualização da pena, o que, na legislação infraconstitucional, se faz a partir da progressão (8) (solução que se tem mostrado mais eficaz para a ressocialização do delinqüente). O legislador não pode individualizar a pena, vedando a progressão somente o juiz poderia. Isso, é evidente, em tese, porque tal decisão também entraria em conflito com o princípio da humanidade das penas.
Desta feita, conclui-se, inclusive, que existem evidentes antinomias no ordenamento não podendo uma norma prescrever que a execução penal tem por objetivo (...) proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado (art. 1º. da Lei n. 7210/84) (9), e outra estabelecer regime integralmente fechado (art. 2º, § 1º, da Lei n. 8072/90), segregando indivíduos que, inevitavelmente, voltarão ao fluxo social (por via legal ou ilegal).
Ressalte-se que, de tal maneira norteia a aplicação da lei penal o princípio da ressocialização da pena, ratificado pelos avanços criminológicos que demonstram, efetivamente, que a pena privativa de liberdade não melhora e sim piora, estigmatizando (labeling aproach (10)) observando que, quanto menor o tempo possível de mantimento de delinqüentes enclausurados, menor probabilidade haverá de uma resposta insatisfatória no retorno à sociedade, que se formou corrente jurisprudencial no sentido da prevalência da ressocialização do delinqüente sobre o dispositivo inconstitucional (11).
Luís Flávio Gomes, com clareza e objetividade costumeiras, assim descreve esse fenômeno: "concluiu-se que a pena de prisão não é capaz de ressocializar o delinqüente, como, pior, é altamente dessocializadora: esta é... a conclusão das ciências sociais, particularmente da Penologia e da Criminologia. A idéia de tratamento, sobretudo em regime fechado, entrou, em conseqüência, em crise (12) (grifos nossos)".
O legislador abusou de seu poder, atuou como constituinte, estabeleceu uma individualização à parte, porque sequer é individualização. A medida baseada na ideologia do "Direito Penal Simbólico" está ancorada em generalização da pena, em caráter evidentemente oposto à individualização que CRFB prevê.
Júlio Fabbrini Mirabete, embora partidário da Lei Hedionda (13), assim pondera acerca da execução da pena: "como já se tem decidido, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, a execução da pena, além de se constituir numa atividade administrativa, adquire status de garantia constitucional, como se depreende do art. 5º, XXXIX, XLVI, XLVII, XLVIII e XLIX, tornando-se o sentenciado sujeito de relação processual, detentor de obrigações, deveres e ônus, e, também, titular de direitos, faculdades e poderes (grifo nosso) (14)".
A pena está na sua execução, diz Bettiol. "De nada serve estabelecer, em teoria, critérios de individualização da pena, ver consagrados nas sentenças dos juizes penais esses critérios se, depois, tudo que fora normativamente estabelecido e jurisdicionalmente determinado, não é, através da execução da pena, observado" (15).
Disso tudo se deduz o fato de que a individualização da pena, com o benefício do regime prisional progressivo, insere-se no tronco comum do processo individualizador que se inicia com a atuação do legislador, passa pela ação do juiz e se finda, ao atingir o nível máximo de concreção, na execução penal (16).
Embora relativamente óbvia, a questão é de suma relevância, uma vez que um dos argumentos principais do STF, ao declarar constitucional o dispositivo legal, é de que a fixação do quantum da pena já é suficiente para sua individualização (17).
Ora, na medida em que o critério de individualização não pode ser restringido, uma vez que é direito fundamental do condenado, é impossível ao legislador suprimir tal fase, fazendo uma exacerbação do seu poder. O fulcro da questão está na presença da individualização na CRFB, devendo apenas ser garantida pelo Congresso Nacional. O ministro Paulo Brossard, em decisão acerca do assunto (18), coloca como legítimo o Parlamento nacional para tal fixação in abstracto, já que a CRFB lhe outorga tais poderes. Já vimos, contudo (item 1), que esse poder não existe, é lhe dada apenas a conformação. O direito à individualização está fixado na Constituição. Individualizar é tarefa jurisdicional, competência exclusiva do Poder Judiciário.
Quando o ministro (19) diz que a individualização seria regulada pelo legislador ordinário, dentro da discricionariedade que lhe foi outorgada, argumentou contra si próprio, porque a discricionariedade é um poder controlado, e, sem sombra de dúvida, o Congresso Nacional ultrapassou os limites que lhe foram impostos quando invadiu competência jurisdicional. A jurisdição é atividade exclusiva do Poder Judiciário.
A propósito, ensina Ada Pellegrini Grinover que "a função jurisdicional, que é uma só e atribuída abstratamente a todos os órgãos do Poder Judiciário, passa por um processo gradativo de concretização, até chegar-se à determinação do juiz competente para determinado processo: através das regras constitucionais e legais que atribuem a cada órgão o exercício da jurisdição com referência a dada categoria de causas (regras de competência), excluem-se os demais órgãos jurisdicionais para que só ele deva exercê-la, em concreto" (20). A via concreta para execução da pena, aos poucos, vai adquirindo cada vez maior grau de jurisdicionalização, sendo apenas complementada pela via administrativa. Não há de falar, em nível de individualização, de interferência do Poder Legislativo, portanto.
3. Violação do Princípio da Humanidade das
Penas e do Princípio da Proporcionalidade
Canotilho afirma que "o princípio da proibição do excesso (ou da proporcionalidade em sentido amplo)... constitui um limite constitucional à liberdade de conformação do legislador... no exercício do seu poder ou liberdade de conformação dos pressupostos das restrições de direitos, liberdades e garantias, o legislador está vinculado ao princípio material da proibição do excesso" (21) (grifo no original).
Desvirtuando a individualização da pena, generalizando o que deve ser individualizado, excedeu o legislador ordinário o seu poder, infringindo o princípio da proporcionalidade. Os meios do legislador, ao estabelecer regime integralmente fechado para os apenados por crimes hediondos, ao invés de irem ao encontro dos fins da norma constitucional, desviaram-se, adquiriram um rumo imprevisto, guiado por uma política criminal retributiva e simbólica. Não há, propriamente, um excesso de meios, causando desproporção; há, isso sim, meios inadequados, até opostos ao fim da norma, impedindo, consequentemente, sua concretização. O legislador ordinário não resguardou proporção simplesmente ignorou-a, tomou a regulamentação como restrição, e, ao invés de conformar, adaptar, regulamentar a norma, restringiu-a, abusando de seus meios, senão até fugindo deles (22).
O princípio da humanidade das penas, na lição de Jescheck, citado por Luís Flávio Gomes, impõe que "todas as relações humanas que o Direito Penal faz surgir no mais amplo sentido se regulem sobre a base de uma vinculação recíproca, de uma responsabilidade social frente ao delinqüente, de uma livre disposição à ajuda e assistência sociais e de uma decidida vontade de recuperação do condenado... dentro dessas fronteiras, impostas pela natureza de sua missão, todas as relações humanas reguladas pelo Direito Penal devem estar presididas pelo princípio da humanidade" (23).
Posto isso, pergunta-se: há, por acaso, alguma humanidade ou tentativa de ressocialização em estabelecer-se regime integralmente fechado a um apenado? Evidentemente não. A ideologia que norteou a feitura deste absurdo jurídico-penal é a baseada no sistema punitivo-expiatório (24), onde sequer preocupou-se em colocar a pena como defesa, e sim como "mal pelo mal", retribuição, quando não até vingança. Certamente, aliada ao terrorismo penal da prevenção geral, negativa ou positiva (a pena como coação psicológica, cf. Feuerbach, ou como meio simbólico de integração social, cf. Durkheim e Jakobs, respectivamente), vigorou a ideologia da retribuição na sua feição mais antiga, talional, na forma que viram Kant e Hegel (25).
Ignorou o legislador, inclusive, que mais efetiva que a pena elevada é a pena certa, mais intimidante que a sanção rigorosa é a sanção eficaz. A pena somente quando é justa e quando é aplicada de modo infalível e rapidamente é que pode gerar algum efeito preventivo (26).
Pena executada, com um único e uniforme regime prisional, significa pena desumana, porque inviabiliza um tratamento penitenciário racional e progressivo; deixa o recluso sem esperança alguma de obter a liberdade antes do termo final do tempo de sua condenação e, portanto, não exerce nenhuma influência psicológica positiva no sentido de seu reinserimento social; e, por fim, desampara a própria sociedade na medida em que devolve o preso à vida societária após submetê-lo a um processo de reinserção às avessas, ou seja, a uma dessocialização (27).
4. Dos Reflexos e da Efetividade da Lei n. 8.072/90
Não se trata, embora já fosse o bastante, de um argumento ético-humanitário (28), mas também de uma ponderação utilitária à sociedade. O criminoso preso em regime integralmente fechado, vivendo sob a égide de um sistema prisional falido, certamente não cumprirá integralmente a pena: a rebelião e a fuga são duas das mais prováveis conseqüências danosas (29). Mas o próprio ordenamento penal possui outras soluções: o livramento condicional (30) e o sursis (31).
Ora, mesmo do ponto de vista utilitarista, sem dúvida norteador da elaboração desta lei, é preferível reinserir gradualmente o condenado a vê-lo recolocado no meio social sem qualquer processo de readaptação, bruscamente, gerando um perigo muito maior do que haveria se fosse adotado o sistema progressivo. Agamenon Bento de Amaral salienta com precisão: "é oportuno ainda registrar a incoerência e açodamento do legislador ordinário na elaboração apressada da disposição restritiva, pois, dispondo logo depois sobre a possibilidade do agente criminoso em tais circunstâncias, obter livramento condicional desde que cumpridos dois terços (2/3) da pena, não sendo reincidente, permitiu o mais quando proibiu o menos. Nesse sentido, constata-se que, o legislador nacional, apercebendo-se do seu lamentável equívoco na edição da aludida norma draconiana, quis abrandar o seu rigorismo fazendo inserir no texto legal a nova disposição atenuadora e permissiva" (32).
A lei n. 8.072/90 seria eficaz se evitasse a criminalidade: enquanto executada, é um desastre, tanto para o criminoso, quanto para a sociedade.
Alberto Silva Franco, sem dúvida o maior representante do sentimento de ojeriza que perpassa na doutrina penal moderna em relação à Lei n. 8072/90, enfrenta a sua efetividade, afirmando: "cedo, comprovou-se a inutilidade da lei dos Crimes Hediondos e seu efeito meramente simbólico tornou-se transparente. Amiudaram-se os fatos criminosos etiquetados como hediondos e a aplicação da lei revelou-se frustrante. Os "déficits de funcionamento" incentivaram o aumento da repressão (more of the same), com igual insucesso" (33).
5. Conclusão Das Lesões à CRFB da Lei n. 8.072/90: Restrições infraconstitucionais a direitos fundamentais e infringência do Princípio da Separação dos Poderes
Padece, sem qualquer sombra de dúvida, em que pese a douta jurisprudência dominante (34), ratificada, inclusive, pela Suprema Corte (35) do vício de inconstitucionalidade o art. 2º, § 1º, da Lei n. 8.072/90, quando estabelece que "A pena por crime previsto neste artigo será cumprida integralmente em regime fechado". Infringe, com efeito, o art. 2º (já que invadiu competência jurisdicional) e o art. 5º, XLVI, instituídos como cláusulas pétreas pelo art. 60, § 4º, III e IV, da CRFB. Fere, além disso, o princípio da humanidade das penas, constitucionalmente representado mas não exaurido no art. 5º, XLVII; e o princípio da proporcionalidade.
Como já foi dito, houve restrição de direito fundamental, quando a única autorização era de conformar-se o direito, fato aquele absolutamente vedado pela CRFB. Canotilho, aliás, ressalta: "o legislador não tem, no ordenamento jurídico-constitucional português (e igualmente no brasileiro), uma autorização geral de restrição de direitos, liberdades e garantias. A lei fundamental individualizou expressamente os direitos subjetivos a reserva de lei restritiva. Esta individualização expressa tem como objectivo obrigar o legislador a procurar sempre nas normas constitucionais o fundamento concreto para o exercício de sua competência de restrição de direitos, liberdades e garantias, e criar segurança jurídica nos cidadãos, que poderão contar com a inexistência de medidas restritivas de direitos fora dos casos expressamente considerados pelas normas constitucionais como sujeitos a reserva de lei restritiva" (36) (grifo e obs. nossos). Sem essa autorização, não podia o Congresso Nacional restringir a individualização da pena, quando sua tarefa era apenas regulá-la.
Destarte, não há cabimento em entender revogado o que é nulo. Refiro-me à hipótese de revogação do art. 2º., § 1º, da Lei n. 8.072, pelos arts. 10º, da Lei n. 9.034/95 e 1º, § 7º, da Lei n. 9.455/97 (37). Com razão argumenta o Des. Tupinambá Pinto de Azevedo:
"Dispondo sobre a repressão ao crime organizado, a Lei 9.034/95 disciplina o regime carcerário inicial, impondo o início do cumprimento da pena em regime fechado (art. 10).
"Ora, o texto legal trata de crimes resultantes de ações de quadrilha ou bando. Desimporta a natureza ou o quantum da pena. A característica destacada pelo legislador é a conexão com o delito do art. 288 do Código Penal.
"Imaginando-se, pois a prática de crime hediondo, através de quadrilha ou bando, incidirá o art. 10 da Lei 9.034/95, e não o art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/90. Seria totalmente ilógico que o quadrilheiro - praticando, p. exemplo, extorsão mediante seqüestro - fosse beneficiado pela progressão, ficando o autor solitário submetido a regime fechado todo o tempo.
"A aplicação da lei não pode levar à incongruência. Muito menos, à injustiça. A única conclusão possível é a da revogação do § 1º, art. 2º, da Lei dos Crimes Hediondos"(38).
Tem razão porque a incongruência tem sido, sem qualquer dúvida, uma praxe na edição de normas penais (v.g., em relação a aplicabilidade das penas alternativas aos crimes hediondos) pelo legislador pátrio, que basta para isso observar as últimas leis penais (v.g. Lei n. 9.099/95, n. 9.714/98) de certa forma, tem tomado outros rumos na política criminal, na busca sadia de uma opção mais humana.
Os crimes hediondos, no entanto, só estão equiparados nos termos do inciso XLIII, art. 5º, da CRFB, em relação à graça, anistia e inafiançabilidade, e não em relação ao regime de pena. Não fere o princípio da isonomia diferenciar o que não é igual. Tampouco procede a analogia, que só pode ser feita em face de lacuna.
De qualquer sorte, não é necessário recorrer ao argumento de revogação para o que, diante da CRFB, não existe, embora seja louvável a atitude dos defensores da tese, certamente afeiçoados à melhor política criminal de ressocialização do criminoso.
De resto, parece absurdo admitir-se os argumentos do STF em prol da constitucionalidade da vedação de individualização executiva da pena, senão por razões políticas, já que o Excelso Pretório vem se mostrando afeto à ideologia de law and order seguida pelo Congresso Nacional. Lembramos, no entanto, aos eméritos julgadores da Suprema Corte, que o Código Penal e, evidentemente, a Constituição da República, constituem-se limites a qualquer política criminal (Von Lizst), não podendo ser violados, mesmo havendo consenso absoluto sobre o tema (39).