Capa da publicação Execução fiscal de conselhos tem limite diferente da União
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A inaplicabilidade do Tema nº 1.184 do STF e da Resolução nº 547 do CNJ aos conselhos profissionais

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O Tema 1.184 do STF e a Resolução 547 do CNJ não se aplicam na execução fiscal pelos conselhos profissionais, que têm valor mínimo próprio para cobrar dívidas estabelecido na Lei 12.514/2011.

O STF1 fixou, no Tema 1.184, que é legítima a extinção de execução fiscal de baixo valor pela ausência de interesse de agir, posto que necessária a adoção de providências prévias, como conciliação ou outra solução administrativa; protesto do título, exceto se a medida se mostrar inadequada; e facultou ao exequente a suspensão do processo para a adoção de tais medidas.

Baseado no citado tema, o CNJ editou a Resolução 547, que acrescentou novos requisitos para o ajuizamento de execução fiscal e fixou que é legítima a extinção de execução fiscal de valor inferior a R$ 10.000,00 quando não houver movimentação processual útil há mais de um ano, sem a citação do executado ou, apesar de citado, não tenham sido localizados bens penhoráveis.

A ideia da Resolução 547 do CNJ foi instituir medidas de tratamento racional e eficiente na tramitação das execuções fiscais.

Entretanto, os entendimentos fixados no Tema 1.184 do STF e na Resolução 547 do CNJ não se aplicam aos Conselhos Profissionais, ante a existência de jurisprudência sedimentada e da Lei 12.514/2011.

A Suprema Corte tem entendimento jurisprudencial de que os Conselhos Profissionais são autarquias federais responsáveis por disciplinar, regulamentar, fiscalizar e garantir a qualificação dos profissionais no exercício de suas atividades, com o fim de conter os riscos dessas atividades para a sociedade.

Ao concluir o ensino superior, o profissional terá sua atuação condicionada à inscrição no respectivo Conselho Profissional, ente responsável pela fiscalização do exercício de suas atividades, que possui poder de polícia, de tributar e de punir, na forma do artigo 22, inciso XVI, da CF/88.

O financiamento e o custeio das atividades fiscalizatórias dos Conselhos Profissionais, de inquestionável relevância social, advêm de contribuições de natureza tributária, de caráter social e de interesse público, na forma do artigo 149 da CF/88, de dívidas não tributárias e outras receitas.

Já a cobrança do crédito dos Conselhos Profissionais deve observar a Lei 6.830/1980, a qual, no artigo 1º, aduz que a "cobrança da Dívida Ativa da União (...) e respectivas autarquias será regida por esta lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil". Além disso, deve seguir a Lei 12.514/2011, que "trata das contribuições devidas aos Conselhos Profissionais em geral", recentemente alterada e "atualizada" pela Lei 14.195/2021.

Segundo o artigo 7º da Lei 12.514/2011, os Conselhos Profissionais poderão deixar de cobrar, administrativa ou judicialmente, os valores definidos como irrisórios, irrecuperáveis ou de difícil recuperação, observados os limites estabelecidos pelo respectivo Conselho Federal.

Já o caput do artigo 8º da Lei 12.514/2011 expressamente estabeleceu o valor mínimo das execuções fiscais: "os Conselhos não executarão judicialmente dívidas, de quaisquer das origens previstas no artigo 4º desta lei, com valor total inferior a cinco vezes o constante do inciso I do caput do artigo 6º desta lei".

Por fim, o §1º do artigo 8º da Lei 12.514/2011 facultou aos Conselhos Profissionais a adoção de "medidas administrativas de cobrança, tais como a notificação extrajudicial, a inclusão em cadastros de inadimplentes e o protesto de certidões de dívida ativa".

Assim, ao editar a Lei 12.514/2011 e “atualizá-la” em 2021, percebe-se que o legislador considerou as singularidades e os parâmetros financeiros dos Conselhos Profissionais, visto que boa parte dos valores por eles cobrados é de montante reduzido, apresenta elevado índice de inadimplemento e constitui sua principal fonte de arrecadação, uma vez que não recebem dotação orçamentária da União.

Além disso, o STJ possui jurisprudência firme no sentido de que as regras da Lei 12.514/2011 devem ser aplicadas às execuções fiscais ajuizadas pelos Conselhos Profissionais, o que afasta a aplicação do Tema 1.184 do STF e da Resolução 547 do CNJ às ações movidas por tais entes.

No julgamento do REsp 2.043.494-SC2, ocorrido na vigência da alteração promovida pela Lei 14.195/2021, o STJ entendeu que as disposições da Lei 12.514/2011 são normas especiais e que o legislador fixou um valor mínimo para a cobrança judicial dos créditos dos Conselhos Profissionais.

A Corte entendeu, no citado recurso, que a "simples leitura dos artigos 4º, 6º e 8º da Lei 12.514/2011 permite concluir que o teto mínimo para o ajuizamento de execução fiscal independe do valor estabelecido pelos Conselhos de fiscalização profissional, pois o legislador optou pelo valor fixo do art. 6º, I, da Lei 12.514/2011, com a redação dada pela Lei 14.195/2021" 3.

Tal entendimento ratificou a jurisprudência consolidada no STJ, que, antes da alteração promovida pela Lei 14.195/2021, já era no sentido de que a execução fiscal ajuizada pelos Conselhos Profissionais deve observar a Lei 12.514/2011.

No julgamento do REsp 1.524.930-RS, o STJ entendeu que a contagem do prazo prescricional para a cobrança dos débitos dos Conselhos Profissionais deve observar o previsto na Lei 12.514/2011, pois o "prazo prescricional para a cobrança das anuidades pagas aos conselhos profissionais tem início somente quando o total da dívida inscrita, acrescida dos respectivos consectários legais, atingir o patamar mínimo estabelecido pela Lei n. 12.514/11".4

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Na Edição nº 135 da Jurisprudência em Teses, que tratou dos Conselhos Profissionais, o STJ fixou, no Tema 9, que a Ordem dos Advogados do Brasil se submete "ao disposto no art. 8º da Lei n. 12.514/2011, que determina que os conselhos de classe somente executarão dívida de anuidade quando o total do valor inscrito atingir o montante mínimo correspondente a quatro anuidades." 5

Noutra ocasião, ao julgar o REsp 1.338.247-RS, o STJ aplicou o princípio da especialidade e reconheceu que a natureza dos Conselhos Profissionais é de autarquia federal. Entretanto, eles não gozam de isenção no recolhimento de custas processuais como os demais entes da Federação e suas respectivas autarquias e fundações públicas, por força do previsto no artigo 4º, parágrafo único, da Lei 9.289/1996, que prevalece sobre as demais.6

Também é importante destacar a Súmula nº 583 do STJ7, que fixou que "o previsto no art. 20. da Lei nº 10.522/2002, dirigido aos débitos inscritos como dívida ativa da União pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional ou por ela cobrados, não se aplica às execuções fiscais movidas pelos conselhos de fiscalização profissional ou pelas autarquias federais".

Dentre os leading cases utilizados para fixar o entendimento da Súmula 583, há o REsp 1.363.163-SP, no qual o STJ entendeu pela inaplicabilidade da Lei 10.522/2002, que determina o arquivamento das execuções fiscais abaixo de R$ 10.000,00, aos Conselhos Profissionais, em razão das regras específicas previstas na Lei 12.514/2011.

Destarte, conclui-se que o Tema 1.184 do STF e a Resolução 547 do CNJ não se aplicam aos Conselhos Profissionais, por expressa previsão da Lei 12.514/2011, a qual concedeu aos Conselhos Federais a competência para definir os créditos considerados irrisórios, irrecuperáveis ou de difícil recuperação e fixou o valor mínimo das execuções fiscais ajuizadas pelos Conselhos Profissionais, facultando a cobrança extrajudicial do crédito.

A imposição das regras previstas no Tema 1.184 do STF e na Resolução 547 do CNJ, em detrimento da Lei 12.514/2011, além de contrariar a regra da especialidade das normas, prejudicará as atividades finalísticas dos Conselhos Profissionais. Isso porque os créditos relativos às anuidades, multas e outras fontes dificilmente atingirão a quantia mínima de R$ 10.000,00 para o ajuizamento, o que poderá levar, por via indireta, à redução da atividade fiscalizatória por falta de recursos, ao aumento do inadimplemento, à propagação social de condutas antiéticas, ao exercício ilegal de profissões e à extinção de vários Conselhos.


Notas

1 Supremo Tribunal Federal. ([s.d.]). Jus.br. Recuperado 13 de junho de 2024, de https://portal.stf.jus.br/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=6291425&numeroProcesso=1355208&classeProcesso=RE&numeroTema=118

2 ([S.d.]). Jus.br. Recuperado 13 de junho de 2024, de https://processo.stj.jus.br/jurisprudencia/externo/informativo/?acao=pesquisar&livre=RESP+2.043.494-SC&livre=@docn&operador=e&b=INFJ&thesaurus=JURIDICO&p=true&tp=T

3 [S.d.]-b). Jus.br. Recuperado 13 de junho de 2024, de https://processo.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?livre=%28RESP.clas.+e+%40num%3D%222043494%22%29+ou+%28RESP+adj+%222043494%22%29.suce.

4 ([S.d.]-c). Jus.br. Recuperado 13 de junho de 2024, de https://scon.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?livre=%27201500763839%27.REG.

5 ([S.d.]-d). Jus.br. Recuperado 13 de junho de 2024, de https://www.stj.jus.br/internet_docs/jurisprudencia/jurisprudenciaemteses/Jurisprud%C3%AAncia%20em%20Teses%20135%20-%20Conselhos%20Profissionais%20-%20I.pdf

6 ([S.d.]-e). Jus.br. Recuperado 13 de junho de 2024, de https://processo.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=201202206786&dt_publicacao=24/04/2013

7 ([S.d.]-f). Jus.br. Recuperado 13 de junho de 2024, de https://scon.stj.jus.br/SCON/sumstj/toc.jsp?livre=%27583%27.num.&O=JT

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Sobre o autor
Pedro Henrike Franco Souza Naves

Procurador do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Goiás - CREA/GO. Lotado na Subprocuradoria da Dívida Ativa. Membro da Comissão de Direito Constitucional e Legislação da OAB/GO (biênio 2018/2019).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NAVEZ, Pedro Henrike Franco Souza Naves. A inaplicabilidade do Tema nº 1.184 do STF e da Resolução nº 547 do CNJ aos conselhos profissionais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 30, n. 8039, 5 jul. 2025. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/110544. Acesso em: 8 jul. 2025.

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