Capa da publicação Maldição do vencedor na licitação: como evitar
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Melhores práticas na preparação de processos licitatórios:

viabilidade contratual e prevenção da maldição do vencedor

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21/11/2024 às 18:47
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A promoção de contratações sustentáveis, que garantam o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, é crucial para a preservação do erário e para a prestação de serviços de qualidade à sociedade.

Resumo: O presente artigo aborda as melhores práticas na orçamentação e preparação de processos licitatórios, com foco na garantia da viabilidade e sustentabilidade dos contratos administrativos, evitando o fenômeno conhecido como "maldição do vencedor". O estudo tem como objetivo geral identificar e analisar práticas que previnam a fixação de preços no limite da inexequibilidade, assegurando a sustentabilidade das contratações públicas. Os objetivos específicos incluem a fundamentação do conceito e evolução das licitações no Brasil, a compreensão do fenômeno da "maldição do vencedor", a análise de suas implicações e riscos para as contratações públicas, a investigação do impacto da utilização da mediana do painel de preços em novos processos licitatórios e a apresentação de propostas para mitigar o problema. A pesquisa utiliza metodologia teórico-empírica, combinando análise doutrinária, estudos de casos históricos e dados obtidos no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP). Foram analisados 40 processos licitatórios realizados na região Sul do Brasil em 2024, observando-se uma mediana de deságio de 30%. Os resultados apontam que o uso contínuo da mediana de preços de contratações anteriores pode levar à redução progressiva dos valores para níveis inexequíveis, agravando o fenômeno da "maldição do vencedor". O estudo conclui que soluções viáveis incluem a adoção de critérios alternativos, como o diálogo competitivo e a avaliação por técnica e preço, a capacitação de servidores públicos e a utilização de parâmetros mais flexíveis na pesquisa de preços, assegurando contratações públicas mais eficientes, sustentáveis e alinhadas ao interesse público.

Palavras-chaves: Licitação, maldição do vencedor, lei n.º 14.133/2021, orçamentação, preço inexequível.


INTRODUÇÃO

As licitações públicas desempenham um papel central na administração pública, funcionando como instrumento fundamental para garantir a contratação de serviços e a aquisição de bens de forma transparente, eficiente e competitiva. No Brasil, a Lei n.º 14.133/2021 (Lei Federal n.º 14.133, de 1º de abril de 2021), que substitui a antiga Lei n.º 8.666/1993 (Lei Federal n.º 8.666, de 21 de junho de 1993), trouxe importantes inovações no processo licitatório, visando aprimorar os mecanismos de contratação e fiscalização no âmbito da aquisição de bens e prestação de serviços. De acordo com Santos (2024), a nova legislação procura modernizar e tornar mais eficiente os processos licitatórios, buscando, entre outros aspectos, assegurar a qualidade das contratações e a proteção do erário.

No contexto das licitações para a prestação de serviços, a orçamentação e preparação dos processos licitatórios assumem uma relevância ainda maior, especialmente para evitar a prática de preços inexequíveis, que comprometem a execução dos contratos. Na opinião de Signor. et al, (2022), a "maldição do vencedor" conceito que descreve a situação em que o proponente vencedor de uma licitação apresenta um preço tão baixo que, ao longo do contrato, enfrenta dificuldades financeiras para cumprir suas obrigações é um risco real e recorrente, agravado pela falta de uma preparação orçamentária robusta. Assim, a viabilidade e sustentabilidade dos contratos administrativos dependem de uma orçamentação rigorosa e transparente, que reflita os reais custos da prestação do serviço, garantindo a continuidade e qualidade da execução contratual.

O argumento central deste artigo reside na necessidade imperativa de uma orçamentação eficaz nos processos licitatórios para prestação de serviços, com o objetivo de evitar que os valores propostos nas licitações beirem a inexequibilidade. A má precificação não apenas compromete a qualidade dos serviços prestados, mas também pode gerar prejuízos à Administração Pública e aos contratados, além de representar uma ameaça à integridade do contrato ao longo de sua execução.

Este artigo identifica as melhores práticas para a orçamentação e preparação de processos licitatórios, de modo a evitar que os preços praticados fiquem no limite da inexequibilidade, assegurando assim a viabilidade e a sustentabilidade dos contratos administrativos.

Além disso, o presente artigo investiga as causas e consequências do fenômeno conhecido como a “maldição do vencedor” no contexto da Lei nº 14.133/2021, com enfoque nos critérios de precificação e orçamentação aplicados a novos processos licitatórios. Para tanto, este artigo fundamenta o conceito das licitações públicas e sua evolução histórica, exemplifica as características da "maldição do vencedor" e analisa suas implicações e riscos para as contratações públicas. Além disso, investiga os impactos da utilização da mediana do painel de preços para a definição de valores referenciais, identificando possíveis limitações dessa prática. Com base nessa análise, o estudo propõe soluções que incluem a adoção de critérios alternativos, como o diálogo competitivo e a avaliação por técnica e preço, além da capacitação dos servidores e o uso de parâmetros mais flexíveis na pesquisa de preços, a fim de promover contratações públicas mais eficientes, sustentáveis e alinhadas ao interesse público.

Ainda, aborda o tema através de uma análise teórica e prática, revisitando doutrinas especializadas sobre o processo de licitação e contratação pública e examinando casos históricos recentes. Ao analisar a literatura vigente e as experiências práticas, foi possível identificar os desafios enfrentados pelos órgãos públicos e pelos prestadores de serviços na fase de orçamentação, bem como as consequências que a maldição do vencedor pode acarretar para ambas as partes envolvidas no contrato.

Este artigo realiza um comparativo dos dados empíricos obtidos através do Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), investigando as implicações da utilização da mediana de preços de contratações similares feitas pela Administração Pública para orçamentação em licitações futuras conforme disposto no Art. 23, § 1º, incisos I e II da Lei Federal n.º 14.133/2021, bem como, apresenta propostas alternativas, já previstas no dispositivo legal, para a elaboração de orçamentos mais realistas e ajustados às condições de mercado (Brasil, 2021).

O presente artigo está dividido em 3 (Três) capítulos, distribuídos da seguinte forma: o primeiro capítulo abordará sobre o conceito das licitações públicas no brasil e sua evolução histórica. No segundo capítulo, o objetivo será primeiramente conceituar a Maldição do Vencedor no contexto das licitações, dividindo este capítulo em duas subseções onde analisa suas implicações e riscos para as contratações administrativas e investiga os impactos da utilização da mediana do painel de preços para a definição de valores referenciais. No terceiro capítulo, o foco será em torno de propor soluções a fim de promover contratações públicas mais eficientes, sustentáveis e alinhadas ao interesse público.


1. CONCEITO DAS LICITAÇÕES PÚBLICAS NO BRASIL E SUA EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Segundo Meirelles (2016), o conceito de licitações públicas no Brasil tem suas raízes firmemente estabelecidas no princípio constitucional da impessoalidade, que visa garantir que a contratação de bens e serviços pela Administração Pública ocorra de maneira justa, transparente e competitiva, assegurando o melhor uso dos recursos públicos.

A licitação é, portanto, do ponto de vista de Gasparini (2016), o procedimento administrativo mediante o qual os órgãos públicos selecionam a proposta mais vantajosa, respeitando os princípios da legalidade, igualdade, publicidade e eficiência. Historicamente, a legislação que regulamenta as licitações no Brasil sofreu diversas transformações, refletindo as necessidades e desafios de cada época.

Para Carvalho Filho (2021), a Lei n.º 8.666/1993, conhecida como a Lei de Licitações e Contratos, representou um marco na sistematização dos procedimentos licitatórios no país, ao definir normas gerais para as licitações e a formalização dos contratos administrativos. Apesar de seu pioneirismo, essa legislação foi amplamente criticada por ser excessivamente formalista e por criar entraves burocráticos que, muitas vezes, comprometiam a agilidade e a eficiência das contratações públicas. Com o passar dos anos, a evolução da economia e a complexidade dos serviços contratados pela Administração Pública exigiram uma atualização do marco regulatório.

Assim, a Lei n.º 14.133/2021 foi sancionada com o objetivo de modernizar o sistema licitatório brasileiro, substituindo a antiga lei e consolidando um novo regime de contratações. Na visão de Di Pietro (2021), entre as principais inovações trazidas pela nova legislação estão a maior flexibilidade nos procedimentos licitatórios, a introdução de novas modalidades, como o diálogo competitivo, e o fortalecimento de mecanismos de governança, planejamento e controle.

A nova lei também reforça a importância da orçamentação adequada e do planejamento prévio para evitar a celebração de contratos com propostas inexequíveis, refletindo uma preocupação cada vez maior com a sustentabilidade financeira das contratações públicas.

Do ponto de vista de Vidal (2021), essa evolução normativa reflete a busca por maior eficiência e segurança jurídica nas licitações, de forma a garantir que os contratos celebrados sejam viáveis, economicamente equilibrados e benéficos para a sociedade como um todo.

Para Saadi (2021), a Lei n.º 14.133/2021, que regulamenta as licitações e contratos administrativos no Brasil atualmente, representa um marco na modernização do processo de contratação pública, trazendo significativas inovações em sua estrutura, princípios e aplicações.

Para tanto, a nova lei de licitações (Lei n.º 14.133/2021) se organiza estruturalmente de forma a cobrir todas as fases do processo licitatório e contratual, desde o planejamento e a orçamentação até a fiscalização e o encerramento dos contratos.

Desta feita, ela inclui dispositivos que tratam da governança pública, da responsabilidade dos agentes envolvidos, e da transparência, com a introdução de sistemas eletrônicos de licitação, visando maior controle social e redução de fraudes. Além disso, estabelece a criação de cadastros unificados e centrais de compras, buscando racionalizar os gastos públicos (Brasil, 2021).

A Lei n.º 14.133/2021, em seu artigo 5º reitera princípios essenciais como a legalidade, impessoalidade, publicidade e eficiência, ao mesmo tempo em que introduz princípios voltados para a inovação e sustentabilidade, como o desenvolvimento nacional sustentável, a economicidade e a competitividade (Brasil, 2021). Portanto, Silva (2021) alega que, esses princípios têm o objetivo de garantir que o processo licitatório seja justo, acessível e benéfico para a coletividade, equilibrando o interesse público com a viabilidade dos contratos.

A nova legislação é aplicável a todas as esferas da Administração Pública, incluindo União, Estados, Municípios, Distrito Federal, autarquias, fundações e demais entidades controladas pelo poder público. Ao passo que, segundo Silva e Almeida (2021) ela abrange a contratação de obras, serviços, compras e alienações, sendo flexível o suficiente para permitir a escolha entre diferentes modalidades de licitação, como o pregão e a concorrência, além de introduzir inovações como o diálogo competitivo, destinado a situações complexas em que a Administração precisa de maior interação com o mercado para obter a melhor solução.

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Ademais, essa lei enfatiza a relevância de uma orçamentação adequada e de um planejamento prévio eficaz, essencial para garantir a viabilidade econômica dos contratos e evitar problemas recorrentes, como a chamada “maldição do vencedor” nas licitações, onde propostas inexequíveis acabam prejudicando tanto o contratado quanto a Administração Pública.

Portanto, para Vidal (2021), a Lei n.º 14.133/2021, busca uma maior eficiência e transparência, oferecendo um modelo mais dinâmico e adequado às demandas contemporâneas da gestão pública.


2. O FENÔMENO DA MALDIÇÃO DO VENCEDOR

A maldição do vencedor é um fenômeno amplamente discutido em contextos de licitações públicas, no que Signor. et al, (2022) exemplifica que é à situação em que o licitante vencedor apresenta uma proposta com valores tão baixos que, ao longo da execução do contrato, enfrenta sérias dificuldades financeiras para cumprir suas obrigações.

Desta feita, a maldição do vencedor ocorre quando, na tentativa de garantir a adjudicação, o licitante subestima os custos reais do projeto ou serviço, resultando em um contrato com margens financeiras insuficientes para cobrir despesas operacionais e garantir a lucratividade. Esse fenômeno é especialmente comum em processos licitatórios que priorizam o critério de menor preço sem considerar adequadamente a viabilidade econômica das propostas (Signor et al, 2022).

2.1 Implicações e riscos nas licitações

De acordo com Silva, Pereira e Almeida (2024), como consequência, a "maldição do vencedor" pode gerar uma série de efeitos adversos que comprometem tanto a Administração Pública quanto os contratados, criando um ciclo prejudicial para a execução do contrato administrativo.

Para o contratado, esse fenômeno frequentemente resulta na subestimação dos custos necessários para a plena execução do objeto contratado, o que desencadeia problemas como execução inadequada dos serviços, atrasos significativos e redução da qualidade final. Além disso, os baixos valores praticados podem levar ao inadimplemento de obrigações trabalhistas, gerando passivos trabalhistas que afetam a credibilidade e a sustentabilidade financeira da empresa contratada. Outro efeito crítico é a dificuldade em honrar compromissos com fornecedores de insumos, ocasionando rescisões contratuais e prejudicando a cadeia produtiva associada à execução do contrato.

Para a Administração Pública, por sua vez, esses problemas implicam em paralisações de serviços essenciais, necessidade de novos processos licitatórios ou aditivos contratuais para corrigir falhas, além de potenciais prejuízos ao erário e ao interesse público. Assim, a "maldição do vencedor" transcende o âmbito econômico, impactando diretamente a eficiência, a moralidade e a continuidade das políticas públicas, reforçando a necessidade de medidas preventivas, como orçamentação precisa e fiscalização rigorosa, para mitigar seus efeitos.

As principais incidências do fenômeno da maldição do vencedor se intensificam especialmente, quando ocorrem falhas no planejamento e na orçamentação das contratações. A ausência de critérios rigorosos para a verificação de exequibilidade das propostas, somada à falta de transparência e controle por parte dos órgãos licitantes, aumentam a probabilidade de que propostas inexequíveis sejam vencedoras (Rodrigues, 2023).

A Lei nº 14.133/2021, ao substituir a antiga Lei nº 8.666/1993, introduziu inovações relevantes, estabelecendo mecanismos mais rigorosos para prevenir propostas inexequíveis, frequentemente associadas à "maldição do vencedor". A nova lei, determina que os órgãos públicos incluam no edital critérios claros de viabilidade, como planilhas de custos detalhadas e justificativas técnicas. Além disso, o art. 59 da lei permite a realização de diligências para esclarecer indícios de inexequibilidade, com possibilidade de desclassificação das propostas que não comprovarem sua viabilidade econômica (Brasil, 2021).

A legislação também fixa parâmetros baseados nos custos de mercado para identificar propostas inviáveis, que do ponto de vista de Giamundo Neto, (2024), fortalece o controle sobre a adequação econômica das ofertas e previne paralisações, aditivos onerosos e rescisões. Em suma, a Lei nº 14.133/2021, busca assegurar um processo licitatório mais seguro e sustentável, no qual a análise da exequibilidade desempenha um papel central para garantir contratações públicas eficientes, equilibradas e alinhadas ao interesse público.

Desta feita, critérios de controle da exequibilidade das propostas nas licitações são essenciais para garantir que as mesmas sejam viáveis tanto econômica quanto tecnicamente, evitando que contratos celebrados pela Administração Pública se tornem insustentáveis durante sua execução.

Na visão de Moreira (2024), esses riscos também são exacerbados por concorrências onde os prazos são apertados ou as exigências técnicas não são adequadamente avaliadas, criando um ambiente propício para que empresas façam ofertas precipitadas ou com bases irreais, visando apenas vencer o certame. Diante dessas considerações, a prevenção da maldição do vencedor passa pela adoção de práticas rigorosas de orçamentação e planejamento prévio, além de uma fiscalização mais efetiva sobre a exequibilidade das propostas, conforme prevê a Lei n.º 14.133/2021, que busca minimizar esses riscos e assegurar a viabilidade financeira das contratações públicas.

Para Cox (2024), a orçamentação e a preparação de processos licitatórios são etapas cruciais para o sucesso das contratações públicas, exigindo-se precisão e planejamento adequado para evitar falhas que possam comprometer a execução do contrato. Ainda, na opinião de Dias (2024), é comum que os órgãos públicos enfrentem dificuldades em estimar corretamente os custos dos serviços a serem contratados, seja pela falta de dados atualizados, seja pela complexidade dos serviços, ou pela limitação técnica das equipes envolvidas no planejamento. A insuficiência de parâmetros claros pode resultar em estimativas subvalorizadas ou superestimadas, o que afeta diretamente o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos.

Segundo Machado (2011), outro desafio importante está relacionado ao tempo e aos recursos disponíveis para a preparação dos editais, que muitas vezes são insuficientes, levando à elaboração de projetos básicos incompletos e à ausência de critérios rigorosos de exequibilidade. Além disso, a dinâmica do mercado também pode interferir nos preços orçados, exigindo uma adaptação constante dos valores referenciais, algo que, sem um acompanhamento efetivo, pode resultar em preços desatualizados ou inadequados.

Ademais, na opinião de Conceição (2019), as melhores práticas para a orçamentação e a preparação de processos licitatórios incluem uma série de medidas que visam garantir a eficiência e a viabilidade das contratações. Preliminarmente, é essencial que os órgãos públicos adotem uma política de planejamento detalhado e estruturado, onde cada etapa do processo licitatório seja minuciosamente analisada, considerando-se todas as variáveis envolvidas, desde os dispêndios com insumos até os custos operacionais. O uso de sistemas eletrônicos e bases de dados atualizados, como o Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), pode contribuir para a obtenção de informações mais precisas sobre os valores de mercado (Portal Direito e Cidadania, 2024).

Do ponto de vista de Justen Filho (2022), um ponto essencial, é a adoção de uma análise mais rigorosa da exequibilidade das propostas, prevenindo o risco de contratos celebrados com valores inexequíveis, um dos principais causadores da "maldição do vencedor". Na visão do doutrinador, a Lei n.º 14.133/2021 trouxe avanços significativos ao prever a importância do planejamento e da orçamentação adequada, reforçando a necessidade de elaboração de projetos básicos e executivos de qualidade, que sirvam como fundamento para a preparação de processos licitatórios sólidos e sustentáveis. Dessa forma, a nova lei inovou ao tornar explícitos os objetivos das licitações, entre os quais os principais para o presente artigo são transcritos:

Art. 11. O processo licitatório tem por objetivos:

[...]

I – assegurar a seleção da proposta apta a gerar o resultado de contratação mais vantajoso para a Administração Pública, inclusive no que se refere ao ciclo de vida do objeto;

[...]

III – evitar contratações com sobrepreço ou com preços manifestamente inexequíveis e superfaturamento na execução dos contratos;

[...] (Brasil, 2021).

No que se refere especificamente à prevenção de sobrepreços nas contratações públicas, a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, em seu artigo 23, estabelece diretrizes para garantir que os valores estimados para bens e serviços estejam alinhados aos preços de mercado. O dispositivo exige que o valor previamente estimado pela Administração seja compatível com os preços praticados no setor, considerando dados constantes nos bancos de dados públicos e outras fontes confiáveis, além de fatores como economia de escala e peculiaridades do local de execução (Brasil, 2021).

Bem como, a lei permite que a Administração utilize diferentes parâmetros para a definição dos preços de referência, tais como a mediana de itens semelhantes no painel de preços, contratações similares realizadas no último ano e pesquisas diretas com fornecedores, entre outras metodologias. Esses mecanismos foram pensados para proporcionar maior segurança e precisão nas estimativas de preços, inibindo práticas de sobrepreço que podem comprometer a eficiência e a transparência das contratações.

Art. 23. O valor previamente estimado da contratação deverá ser compatível com os valores praticados pelo mercado, considerados os preços constantes de bancos de dados públicos e as quantidades a serem contratadas, observadas a potencial economia de escala e as peculiaridades do local de execução do objeto.

§ 1º No processo licitatório para aquisição de bens e contratação de serviços em geral, conforme regulamento, o valor estimado será definido com base no melhor preço aferido por meio da utilização dos seguintes parâmetros, adotados de forma combinada ou não:

I - composição de custos unitários menores ou iguais à mediana do item correspondente no painel para consulta de preços ou no banco de preços em saúde disponíveis no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP);

II - contratações similares feitas pela Administração Pública, em execução ou concluídas no período de 1 (um) ano anterior à data da pesquisa de preços, inclusive mediante sistema de registro de preços, observado o índice de atualização de preços correspondente;

III - utilização de dados de pesquisa publicada em mídia especializada, de tabela de referência formalmente aprovada pelo Poder Executivo federal e de sítios eletrônicos especializados ou de domínio amplo, desde que contenham a data e hora de acesso;

IV - pesquisa direta com no mínimo 3 (três) fornecedores, mediante solicitação formal de cotação, desde que seja apresentada justificativa da escolha desses fornecedores e que não tenham sido obtidos os orçamentos com mais de 6 (seis) meses de antecedência da data de divulgação do edital;

V - pesquisa na base nacional de notas fiscais eletrônicas, na forma de regulamento.

[...] (Brasil, 2021).

Desta forma, segundo Dotti (2022, p. 349):

“O orçamento previamente estimado da contratação deverá ser compatível com os valores praticados pelo mercado, considerando os preços constantes de bancos de dados públicos e as quantidades a serem contratadas, observadas a potencial economia de escala e as peculiaridades do local de execução do objeto.”

Em suma, a aplicação das melhores práticas orçamentárias permite que a Administração Pública realize contratações mais eficientes, com menor risco de falhas contratuais, e contribui para a integridade e sustentabilidade dos contratos administrativos. Além disso, a capacitação técnica das equipes envolvidas na preparação dos editais é fundamental para assegurar que todos os detalhes do projeto sejam contemplados, o que também facilita a avaliação das propostas de forma mais criteriosa.

2.2 A consequência de utilizar a mediana do painel de preços para a orçamentação de novos processos licitatórios

Na visão de Signor. et al, (2022), o objetivo do painel de preços é auxiliar os gestores públicos na tomada de decisões relacionadas aos processos de compra, proporcionar transparência aos preços praticados pela administração e fomentar o controle social. Para evitar a responsabilização por eventuais sobrepreços, é esperado que os servidores públicos responsáveis pelas licitações adotem as medianas como limites máximos em suas estimativas de preço.

Porém, diferentemente do Sicro e do Sinapi, que são amplamente utilizados com sucesso como referências de preços para obras e serviços de engenharia, o painel de preços não se baseia em uma ampla pesquisa de mercado envolvendo órgãos públicos e privados com valores referenciais dos insumos e encargos sociais. Ele se restringe a registros de licitações realizadas por órgãos governamentais, conforme destacado no manual do sistema (Signor. et al, 2022 apud Rogério, 2018).

Ainda, conforme já mencionado, a Lei n.º 14.133, de 1º de abril de 2021, estabelece que os preços de bens e serviços devem ser estimados com base na mediana do item correspondente, conforme o painel de consulta de preços ou o banco de preços em saúde disponíveis no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP).

Este artigo demonstra que o uso da mediana do painel de preços, conforme previsto nos incisos I e II, §1º do art. 23 da nova lei (Lei n.º 14.133, de 1º de abril de 2021), tende a provocar um desequilíbrio indesejado nas aquisições de bens e contratações de serviços em geral. Ainda, evidencia que, ao utilizar exclusivamente as contratações anteriores do poder público para estabelecer o limite máximo de preços, surge o efeito indesejado de uma redução contínua dos valores até o mínimo exequível, o que acaba por fomentar a chamada “maldição do vencedor”, conforme conceitua Signor. et al, (2022).

O que se pretende esclarecer é que, ao basear os preços máximos dos editais às medianas das contratações públicas anteriores, os preços vencedores nas futuras licitações tendem a ser progressivamente reduzidos até o limite do mínimo exequível. Desta forma, Signor. et al, (2022) explicita seus pressupostos, que a inclusão sucessiva de valores iguais ou inferiores à mediana em uma futura contratação, inevitavelmente, resulta na manutenção ou redução da mediana na amostra subsequente, conforme demonstrado no gráfico 2.

Isso ocorre porque, os valores utilizados para alcançar a mediana e consequentemente o preço máximo do objeto almejado que ainda será licitado, já passou pela etapa de disputa num processo licitatório anterior, e já atingiu o seu limite de exequibilidade ou próximo dela.

Ao realizar uma pesquisa empírica no Portal Nacional de Contratações Públicas - PNCP (BRASIL, 2021), utilizando como parâmetros licitações finalizadas em 2024 nos estados da região sul do país (SC, PR e RS) e que tinham como objeto a manutenção de iluminação pública, foi analisada uma amostra de 40 processos licitatórios (APÊNDICE A). Nessa análise, foram observados os percentuais de deságio alcançados em cada certame, identificando-se uma variação que oscilou entre 0% e 66% de desconto. A mediana dos percentuais de deságio registrados foi de 30%, evidenciando uma considerável queda nos valores aplicados pelos licitantes ao longo dos processos investigados.

Gráfico 1 – Mediana dos percentuais de deságio

Fonte: Elaborado pelo autor através de pesquisa no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), disponível em: https://pncp.gov.br/app/editais

É evidente que, em determinado momento, a contínua redução dos preços dificultará, ou até mesmo inviabilizará, a contratação de serviços sujeitos a variações sazonais ou picos de custo. Embora essa limitação já represente um desafio significativo para a compra de bens, os efeitos mais prejudiciais da padronização dos preços ao mínimo exequível se manifestam na contratação de serviços onde se prioriza a mão de obra. A aplicação rígida dos incisos I e II, do § 1º, do artigo 23, da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, tende a gerar impactos negativos para os trabalhadores contratados por meio de empresas terceirizadas. Nesse cenário, na opinião de Signor. et al, (2022), há o risco de que tais trabalhadores sejam remunerados apenas com o salário-mínimo estipulado em seus respectivos acordos ou convenções coletivas, comprometendo a justa valorização da força de trabalho e a qualidade dos serviços prestados, e consequentemente a saúde financeira da empresa contratada.

Portanto, ao realizar a mediana de valores já contratados, o legislador deixou de observar que o referido orçamento será realizado com base ao valor final, ou seja, após a fase de lances, e já se encontra no limite monetário da execução do serviço. Pois, devido a concorrência da disputa da licitação anterior, a empresa vencedora do referido processo que foi utilizado como balizador dos preços de referência, já se obrigou a baixar os valores ao limite da exequibilidade, extinguindo-se praticamente toda margem de lucro da empresa que executará o contrato.

No cenário prático, como caracteriza Signor. et al, (2022) o valor será congelado no seu mínimo, e chegará há um ponto em que não será mais possível reduzir os valores em novas licitações, exceto em situações excepcionais, como a superoferta de um determinado produto ou quando um fornecedor, por razões específicas, decidir ofertar o item por um valor inferior ao seu custo, assumindo, assim, o risco de enfrentar a "maldição do vencedor".

Na análise de casos concretos, com base no Portal Nacional de Contratações Públicas - PNCP (BRASIL, 2021), utilizando como parâmetros licitações finalizadas em 2024 nos estados da região sul do país (SC, PR e RS) e que tinham como objeto a manutenção de iluminação pública, foi analisada uma amostra de 40 processos licitatórios, em que seus valores contratados após a disputa, variam de R$ 16.100,00 (dezesseis mil e cem reais) à R$ 4.028.706,51 (quatro milhões, vinte o oito mil, setecentos e seis reais e cinquenta e um centavos), tal discrepância desses valores se dá a diversos fatores, tais como, tamanho do município, número de pontos de Iluminação Pública que deverão ser atendidos e serviços complementares ao objeto principal.

Para tanto, foi realizado o cálculo da mediana dos processos licitatórios incluídos na amostragem, alcançando o valor de R$ 210.800,00 (duzentos e dez mil e oitocentos reais). Com base nesse valor, aplica-se uma margem de variação de 20% para mais e para menos, permitindo uma análise mais precisa dentro do intervalo previsto. Com base nesse critério, a amostragem é reduzida para 5 (cinco) processos licitatórios cujos valores se aproximam do intervalo previsto, possibilitando uma análise mais precisa e consistente (APÊNDICE B).

Nesta análise final, aplica-se a mediana de 30% dos percentuais de deságio identificados no estudo anterior a cada nova amostra e constatando-se que, ao longo do tempo, a aplicação contínua desse critério com base na mediana de contratações similares, conforme previsto no § 1º, inciso II, do artigo 23 da Lei nº 14.133/2021, poderá levar a um problema recorrente. Como esses valores já passaram pela etapa de lances realizados em licitações anteriores, a tendência é que, em um curto prazo, a Administração Pública publique editais com valores máximos progressivamente reduzidos, até o ponto de se tornarem inicialmente inexequíveis, comprometendo a viabilidade econômica das futuras contratações.

Gráfico 2 – Evolução dos valores utilizando a mediana de contratações similares

Fonte: Elaborado pelo autor através de pesquisa no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), disponível em: https://pncp.gov.br/app/editais

De acordo com Signor. et al, (2022), a velocidade com que ocorre o achatamento e a padronização dos preços dependerá, naturalmente, do volume de dados presentes na amostra original, da dispersão desses valores e do percentual de deságio obtido pela proposta vencedora em cada licitação, que neste exemplo, foi fixado em 30% com base no histórico de licitações realizadas no ano de 2024 para o objeto em questão.

Todavia, independentemente dessas variáveis, o resultado tende a ser inevitavelmente o mesmo, ou seja, a convergência dos preços para o mínimo exequível, o que representa um ponto de atenção relevante para os gestores públicos e é o principal alerta deste estudo.

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Sobre o autor
Carlos Eduardo Duarte

Graduando do curso de Direito da Unisociesc Centro Universitário.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DUARTE, Carlos Eduardo. Melhores práticas na preparação de processos licitatórios:: viabilidade contratual e prevenção da maldição do vencedor. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 29, n. 7813, 21 nov. 2024. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/111833. Acesso em: 22 nov. 2024.

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