CONCLUSÃO
A interpretação conjunta dos artigos 23, II; 196; e 198, I, da CF/88 revela um modelo federativo de cooperação na área da saúde, onde todos os entes federativos compartilham responsabilidades na promoção e proteção desse direito fundamental.
A competência comum, o reconhecimento da saúde como direito de todos e as diretrizes de descentralização do SUS exigem uma atuação coordenada e integrada dos governos federal, estadual e municipal, visando à efetivação plena do direito à saúde no Brasil.
A correta interpretação da solidariedade na área da saúde pública é fundamental para garantir a adequada prestação dos serviços essenciais e a justa distribuição das responsabilidades entre os entes federativos. Embora a Constituição Federal estabeleça a solidariedade entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios no dever de garantir o direito à saúde, essa solidariedade não deve ser aplicada de maneira automática na fixação de honorários advocatícios sucumbenciais.
Trata-se de tema sensível e complexo, razão pela qual somente o E. STF foi instigado a se manifestar diversas vezes, a exemplo da STA 175, da STP 127 MC, do Tema 793 e do Tema 1234.
Verificou-se, ainda, a existência de diversos Enunciados, revelando que a doutrina e principalmente os operadores do Direito se preocupam, constantemente, em dar a melhor solução prática às questões de saúde pública.
O Tema 1234 do STF consolidou a necessidade de observar a repartição administrativa de competências para definir o responsável pelo custeio de medicamentos e tratamentos médicos. Dessa forma, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios deve seguir essa lógica, aplicando-se o princípio da causalidade para evitar que entes públicos que não deram causa à demanda sejam indevidamente onerados.
Apesar da relevância do tema, ainda há pouca jurisprudência consolidada sobre a correta destinação da verba sucumbencial em ações de saúde. Decisões recentes indicam uma tendência de evolução no entendimento dos tribunais, mas ainda há espaço para maior amadurecimento da matéria. O Enunciado 1 da I Jornada de Direito da Saúde da Justiça Federal, por exemplo, aponta no sentido de que apenas o ente com competência administrativa na política pública de saúde discutida na ação deve ser condenado ao pagamento da verba sucumbencial.
Diante desse cenário, é fundamental que os operadores do direito – especialmente os procuradores municipais e estaduais – atuem no sentido de instigar a evolução da jurisprudência sobre o tema. A tese da aplicação do princípio da causalidade na fixação dos honorários advocatícios deve ser amplamente debatida nos tribunais, permitindo que decisões futuras levem em consideração a real distribuição de competências entre os entes federativos.
Por fim, o estudo reforça a necessidade de que as decisões judiciais levem em conta não apenas o direito individual do cidadão à saúde, mas também a preservação do equilíbrio financeiro e administrativo do Sistema Único de Saúde. Somente assim será possível garantir a efetividade da prestação de serviços de saúde sem gerar distorções na responsabilidade financeira dos entes federativos.
REFERÊNCIAS
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Notas
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Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
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Disponível em: <https://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticianoticiastf/anexo/sta175.pdf>. Acesso em 05 março 2025.
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Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo;
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Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;
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Art. 264. Há solidariedade, quando na mesma obrigação concorre mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado, à dívida toda.
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Art. 275. O credor tem direito a exigir e receber de um ou de alguns dos devedores, parcial ou totalmente, a dívida comum; se o pagamento tiver sido parcial, todos os demais devedores continuam obrigados solidariamente pelo resto.
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Disponível em: <https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5690120>. Acesso em 05 março 2025.
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Abstract: This article analyzes the distinction between solidarity in civil law and public health, focusing on the responsibility for the payment of legal fees in cases involving the provision of health services. Based on a doctrinal and jurisprudential review, we seek to understand the topic, in order to encourage the courts to set the succumbence amount in accordance with the administrative division of powers, in accordance with the principle of causality.
Key words : Public Administration, Health, Solidarity, Casualty Fees; Principle of Causality, Topic 1234/STF.