Resumo: A Lei nº 12.846/2013 prevê, em seu art. 14, a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica em casos de utilização para dissimular ilícitos ou gerar confusão patrimonial. Este artigo examina a aplicabilidade das teorias maior e menor do direito empresarial ao regime de responsabilização da Lei Anticorrupção. Busca-se compreender como os critérios clássicos da desconsideração se adaptam ao contexto sancionador administrativo e civil, com foco no caráter híbrido dessa aplicação e sua indispensável ligação com a efetividade do combate à corrupção e ao fomento de programas de integridade.
Palavras-chave: Lei Anticorrupção. Desconsideração da personalidade jurídica. Teoria maior. Teoria menor. Responsabilidade de sócios e administradores. Efetividade. Compliance.
1. Introdução
A promulgação da Lei Federal nº 12.846/2013, a Lei Anticorrupção Empresarial, marcou um ponto de inflexão no combate à corrupção no Brasil. Essa norma estabelece um regime de responsabilização objetiva para pessoas jurídicas que pratiquem atos lesivos à Administração Pública.
Além disso, e crucialmente, prevê em seu art. 14 a desconsideração da personalidade jurídica para responsabilizar sócios e administradores. Essa previsão é fundamental para a efetividade da sanção, pois, sem a capacidade de atingir os verdadeiros beneficiários e operadores das condutas ilícitas, a mera punição da pessoa jurídica pode se mostrar inócua, frustrando os objetivos da lei e o alinhamento com padrões internacionais de combate à corrupção (como os da OCDE).
A desconsideração como instrumento de coibição do uso abusivo da personalidade jurídica para lesar o interesse público não é exclusiva da Lei Anticorrupção.
Outros diplomas do Direito Público, como a Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998, art. 4º), a Lei de Defesa da Concorrência (Lei nº 12.529/2011, art. 34), e a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 14.133/2021, art. 160), também a preveem, sendo ainda amplamente admitida pela jurisprudência na Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992). Essa convergência legislativa reforça a desconsideração como um instrumento vital para a proteção da res publica.
Este artigo busca analisar em que medida os conceitos consolidados das teorias maior e menor da desconsideração da personalidade jurídica, desenvolvidos no direito empresarial, podem ser transpostos para a interpretação do art. 14 da Lei 12.846/2013.
O objetivo é aprimorar a hermenêutica aplicada à responsabilização de indivíduos no âmbito da repressão à corrupção, com foco no caráter híbrido dessa aplicação e na necessidade de garantir a efetividade da lei.
2. A Personalidade Jurídica e sua Função no Direito Empresarial
A personalidade jurídica é uma construção dogmática que confere à empresa uma existência legal própria e autônoma, separando seu patrimônio do patrimônio dos sócios. Como destaca Thiago Bueno de Oliveira, "Quando uma pessoa jurídica nasce, forma-se, de imediato, sua autonomia em relação aos sujeitos que a criaram, passando a ser um centro autônomo de imputação de direitos e obrigações" (OLIVEIRA, 2011, p. 1). Essa autonomia patrimonial é central para a teoria da empresa, oferecendo segurança jurídica e incentivando o empreendedorismo ao limitar a responsabilidade dos investidores ao capital social (GONÇALVES NETO, 2023).
Contudo, essa proteção pode ser desvirtuada. Oliveira ressalta que o "escudo da pessoa jurídica" pode "incentivar a prática de abusos por parte deles [sócios]" (OLIVEIRA, 2011, p. 1). Para coibir tais desvios, o ordenamento jurídico desenvolveu o mecanismo da desconsideração.
3. Teoria Maior e Teoria Menor da Desconsideração da Personalidade Jurídica
A desconsideração da personalidade jurídica é o instituto que permite ao juiz "deixar de aplicar as regras de separação patrimonial entre sociedade e sócios, ignorando a existência da pessoa jurídica num caso concreto, porque é necessário coibir a fraude perpetrada graças à manipulação de tais regras" (COELHO, 2002, p. 40). A doutrina brasileira consolidou duas abordagens principais: a teoria maior e a teoria menor.
A teoria maior, positivada no art. 50 do Código Civil, exige a comprovação de abuso da personalidade jurídica, caracterizado por desvio de finalidade (uso da pessoa jurídica para fins diversos dos constituídos, com intenção de lesar) ou confusão patrimonial (inexistência de separação entre os patrimônios da pessoa jurídica e dos sócios).
Essa teoria se aplica "sempre que ela [a pessoa jurídica] tiver sido utilizada como expediente para a realização de fraude" (COELHO, 2002, p. 20), demandando rigorosa apuração de elementos subjetivos ou objetivos que demonstrem o uso indevido da pessoa jurídica.
A teoria menor, por sua vez, é adotada em legislações de caráter protetivo, como o Código de Defesa do Consumidor (art. 28) e a Consolidação das Leis do Trabalho. Ela dispensa a demonstração de abuso da personalidade jurídica, bastando que a pessoa jurídica esteja insolvente, que seu patrimônio seja insuficiente para satisfazer as obrigações ou que seja um obstáculo ao ressarcimento.
Essa flexibilização justifica-se pela hipossuficiência da parte protegida e pela necessidade de garantir a efetividade da norma protetiva, assegurando a reparação dos danos (COELHO, 2002, p. 46).
4. A Desconsideração em Outros Diplomas de Direito Público: Aspectos Comparativos
A desconsideração da personalidade jurídica, embora originária do Direito Empresarial e Civil, foi assimilada por diversas normas de Direito Público. A comparação com o art. 14 da Lei Anticorrupção revela as nuances interpretativas de cada diploma, moldadas pelo bem jurídico tutelado.
4.1. O Art. 50 do Código Civil (Teoria Maior)
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando este intervier no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso. (BRASIL, 2002)
O art. 50 do Código Civil é o fundamento da teoria maior, exigindo prova de "abuso" mediante "desvio de finalidade" ou "confusão patrimonial". Sua aplicação é rigorosa, demandando a demonstração de elementos subjetivos ou objetivos claros de desvirtuamento da pessoa jurídica.
4.2. O Art. 28 do Código de Defesa do Consumidor (Teoria Menor)
Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social.
A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração, ou ainda quando a personalidade jurídica for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores. (BRASIL, 1990)
O CDC adota a teoria menor, permitindo a desconsideração quando a pessoa jurídica for "obstáculo ao ressarcimento" ou em casos de insolvência por má administração. Essa flexibilização em prol do consumidor hipossuficiente foca na reparação do dano, e não primariamente nos elementos do abuso.
4.3. O Art. 4º da Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998)
Art. 4º A pessoa jurídica constituída ou utilizada preponderantemente com o fim de permitir, facilitar ou ocultar a prática de crimes ambientais terá a sua personalidade jurídica desconsiderada para responsabilizar os administradores e sócios com poderes de administração. (BRASIL, 1998)
Este dispositivo assemelha-se à Lei Anticorrupção ao focar na finalidade da pessoa jurídica: permitir, facilitar ou ocultar crimes. Embora não use os termos exatos do CC, a "utilização preponderante" já denota um abuso funcional que justifica a desconsideração para responsabilizar os sócios e administradores.
4.4. O Art. 34 da Lei de Defesa da Concorrência (Lei nº 12.529/2011)
Art. 34. A personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser desconsiderada quando utilizada para a prática de infração à ordem econômica. (BRASIL, 2011)
Com redação direta e objetiva, esta lei dispensa a comprovação de desvio de finalidade ou confusão patrimonial. Basta que a pessoa jurídica tenha sido "utilizada para a prática de infração à ordem econômica", sugerindo uma aplicação da desconsideração mais funcional ao propósito repressivo do direito concorrencial.
4.5. O Art. 160 da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 14.133/2021)
Art. 160. A desconsideração da personalidade jurídica, neste Título, observará o disposto no art. 50 do Código Civil. (BRASIL, 2021)
Aqui, o legislador optou por remeter expressamente ao art. 50 do Código Civil. Isso implica que, no contexto das sanções e reparação de danos da Nova Lei de Licitações, a desconsideração seguirá os critérios mais rígidos da teoria maior, exigindo prova de desvio de finalidade ou confusão patrimonial.
4.6. As Nuances do Art. 14 da Lei nº 12.846/2013 e seu Caráter Híbrido
A redação do art. 14 da Lei Anticorrupção é intrinsecamente híbrida. Ao exigir "abuso do direito" para "facilitar, encobrir ou dissimular a prática dos atos ilícitos previstos nesta Lei ou para provocar confusão patrimonial", a norma qualifica o abuso de forma específica. Isso indica que a instrumentalização da pessoa jurídica para a corrupção já configura o desvirtuamento que justifica a desconsideração, mesmo que não se prove o desvio societário clássico.
Essa abordagem funcional é crucial pela natureza de Direito Público, sancionatória e preventiva da Lei Anticorrupção, que visa primordialmente a proteção da probidade administrativa e do patrimônio público.
A dificuldade em obter prova direta dos elementos subjetivos do "abuso" (como dolo específico de desviar a finalidade social) nos complexos esquemas de corrupção impulsiona uma interpretação mais flexível, mas ainda fundamentada no abuso funcional da PJ. Um exemplo comum é a criação de novas empresas em nome de "laranjas" para desviar ativos ou ocultar o verdadeiro beneficiário dos ilícitos.
É importante notar que a Lei Anticorrupção se destaca por consagrar expressamente a possibilidade de a própria Administração Pública, no curso do Processo Administrativo de Responsabilização (PAR), avançar na desconsideração para atingir o patrimônio de sócios e administradores.
Enquanto a Lei de Defesa da Concorrência (Lei nº 12.529/2011) também permite a desconsideração em sede administrativa pelo CADE, outras leis apresentam nuances distintas.
A Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998), por exemplo, permite a desconsideração, e sua aplicação em processos administrativos ambientais é admitida, mas de forma menos detalhada em termos processuais.
Já a Nova Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021), ao remeter ao art. 50 do Código Civil, tende a uma interpretação que, embora permita a declaração de abuso na esfera administrativa, geralmente exige a via judicial para a efetiva extensão patrimonial da responsabilidade.
Por fim, na Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992), a desconsideração da personalidade jurídica é uma medida de natureza fundamentalmente judicial. A Lei Anticorrupção, assim, confere maior celeridade e efetividade ao combate à corrupção.
4.7. A Prática da CGU: Mapeamento da Jurisprudência Administrativa
Um estudo de Fernandes (2024) analisou a aplicação da desconsideração pela Controladoria-Geral da União (CGU), principal órgão federal aplicador da Lei Anticorrupção, em Processos Administrativos de Responsabilização (PARs). A pesquisa oferece uma visão da jurisprudência interna da CGU, identificando procedimentos e parâmetros.
A desconsideração foi aplicada em aproximadamente 38% dos PARs analisados, predominantemente em casos de financiamento/custeio de ilícitos (Art. 5º, II) e uso de pessoa interposta para ocultar interesses (Art. 5º, III). Esse dado indica que a desconsideração é uma ferramenta ativamente utilizada pela CGU para garantir a responsabilização e a recuperação do patrimônio público.
Apesar da busca por garantir o contraditório, Fernandes (2024) aponta controvérsias significativas. Em 2022, mais de 50% dos PARs condenatórios resultaram em desconsideração, um percentual elevado para uma medida excepcional. A autora atribui isso a um alargamento indevido do artigo 14 e à ausência de parametrização clara. A CGU frequentemente justifica a desconsideração pela "mera utilização da pessoa jurídica para praticar, facilitar ou dissimular atos lesivos", o que, para Fernandes, já constitui o ilícito, e não o abuso de personalidade para fins de desconsideração, gerando divergência interna na CGU.
A pesquisa também indicou que o escopo do Art. 14 foi ampliado indevidamente para condutas não previstas na Lei Anticorrupção ou com base em legislação diversa. Essa prática levanta o risco de ausência de isonomia no tratamento das empresas e ressalta a necessidade de aprimoramento e uniformização na aplicação do instituto.
As conclusões de Fernandes (2024) reforçam a importância da desconsideração administrativa, mas também sublinham a necessidade de maior rigor e uniformidade em sua aplicação pela Administração Pública, com a judicialização podendo contribuir para essa padronização.
5. O Regime da Desconsideração na Lei nº 12.846/2013: A "Teoria Maior Mitigada" em Ação
A aplicação do art. 14 da Lei Anticorrupção converge para uma "teoria maior mitigada", justificada pela natureza híbrida da norma. A distinção entre as teorias ganha relevância na análise da natureza das dívidas sancionatórias, que possuem função reparatória, exigindo uma abordagem que combine o rigor da teoria maior com a funcionalidade da teoria menor.
A lei permite atingir não apenas sócios e administradores, mas também outras sociedades do mesmo grupo econômico (formal ou informal), coligadas ou controladas, por meio da desconsideração lateral. Essa abrangência é vital diante da complexidade das estruturas empresariais envolvidas em esquemas de corrupção, que frequentemente usam múltiplas entidades para ocultar ativos, configurar desvio de finalidade ou confusão patrimonial, e dificultar a responsabilização.
Outro aspecto é a aplicação da desconsideração inversa, onde bens da pessoa jurídica são alcançados para satisfazer obrigações pessoais dos sócios. Essa ferramenta é crucial quando o agente corrupto utiliza a empresa para blindar seu patrimônio pessoal ou ocultar o produto do ilícito, visando "recuperar o crédito quando o patrimônio particular do devedor for inexistente ou insuficiente para solver a dívida" (OLIVEIRA, 2011, p. 1). Essa aplicação reforça o caráter funcional da desconsideração na Lei Anticorrupção.
Nesse cenário, o Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica (IDPJ), previsto nos artigos 133 e seguintes do Código de Processo Civil de 2015, é a via processual obrigatória em ações judiciais.
No entanto, para a aplicação da desconsideração no Processo Administrativo de Responsabilização (PAR), não se exige um "IDPJ" formal nos moldes do CPC.
Ainda assim, os princípios e garantias fundamentais subjacentes ao IDPJ – como o contraditório, a ampla defesa, a motivação e a oportunidade probatória – devem ser integralmente observados no rito administrativo, em estrita conformidade com o Art. 5º, LV, da Constituição Federal e a Lei nº 9.784/1999.
A Administração deve prever uma fase específica dentro do PAR para que a questão da desconsideração seja debatida e decidida, assegurando a legitimidade da medida (MOREIRA, 2018; CGU, 2022).
6. Jurisprudência Relevante Complementar
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem uniformizado o entendimento sobre a desconsideração na Lei Anticorrupção. O STJ reforça a necessidade de prova concreta de abuso da personalidade jurídica, seja por desvio de finalidade ou confusão patrimonial, alinhando-se à teoria maior, reiterando a natureza incidental da desconsideração, exigindo o devido processo legal, mesmo admitindo sua aplicação na esfera administrativa.
O STJ tem sinalizado que "indícios de fraude" e a utilização da empresa para "dificultar a fiscalização" podem fundamentar a desconsideração, sem exigir prova cabal do desvio ou confusão no sentido estrito do Código Civil, mas demandando robustez nas evidências (STJ, REsp 1.808.952/RN, 2024).
Tribunais de Justiça estaduais complementam esse cenário, aplicando a desconsideração em consonância com as diretrizes do STJ:
O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT, 2020) tem validado a inclusão de nomes no Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas (CEIS) com base em decisões da Lei Anticorrupção, refletindo a seriedade das sanções.
O Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR, 2022) tem mantido medidas cautelares de indisponibilidade de bens e desconsideração da personalidade jurídica em ações civis públicas da Lei Anticorrupção, quando demonstrados os requisitos legais e indícios de fraude à licitação.
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ). Agravo de Instrumento n. 00233958920188190000, Relatora: Desembargadora Lúcia Helena do Passo. Julgado em 12 set. 2018. Diário da Justiça Eletrônico, Rio de Janeiro, RJ, 2018. Este acórdão reforça a aplicação do art. 14 da Lei Anticorrupção, fundamentando a desconsideração em desvio de finalidade e confusão patrimonial, especialmente em casos de má gestão de recursos públicos por associações.
Tais entendimentos consolidam a aplicação da desconsideração como um instrumento ativo e efetivo para a recuperação de ativos e a responsabilização dos envolvidos.
7. Conclusão e o Fomento ao Compliance
A desconsideração da personalidade jurídica, no âmbito da Lei nº 12.846/2013, é um tema de estudo dinâmico e de crucial importância para a efetividade do combate à corrupção no Brasil.
A opção legislativa em prever a desconsideração demonstra o compromisso em ir além da mera responsabilização formal da pessoa jurídica, buscando atingir os indivíduos e as estruturas societárias que efetivamente se beneficiam ou orquestram os atos lesivos à Administração Pública.
O hibridismo do art. 14 da Lei Anticorrupção, que conjuga a terminologia da teoria maior com uma interpretação funcional e finalística, reflete a necessidade de adaptar o instituto às particularidades do Direito Público sancionador.
Essa "teoria maior mitigada" permite que, em face dos desafios probatórios e da complexidade dos esquemas de corrupção, a desconsideração seja aplicada de forma mais célere e eficaz, tanto no âmbito judicial quanto no administrativo, sempre resguardadas as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa.
A efetividade da Lei Anticorrupção, e consequentemente do combate à impunidade, depende diretamente da aplicação consistente e robusta da desconsideração da personalidade jurídica.
Somente ao permitir que as sanções e as medidas de reparação atinjam o patrimônio dos reais responsáveis, independentemente das blindagens societárias artificiais, o ordenamento jurídico brasileiro poderá concretizar os objetivos da lei, desestimular novas práticas corruptas e alinhar-se aos mais elevados padrões internacionais de governança e integridade. A desconsideração, portanto, não é um mero acessório, mas um pilar essencial para a concretização da justiça no cenário de combate à corrupção.
Além disso, a previsão da desconsideração da personalidade jurídica na Lei Anticorrupção impacta diretamente no fomento e valorização dos programas de compliance.
Ao estender a responsabilidade aos sócios e administradores que praticam abuso do direito ou se beneficiam da confusão patrimonial, a lei cria um poderoso incentivo para que as empresas implementem e aprimorem seus mecanismos internos de controle e integridade.
O compliance deixa de ser apenas uma mitigação de riscos para a pessoa jurídica e passa a ser uma salvaguarda para o patrimônio pessoal dos gestores, elevando o custo da não conformidade e impulsionando uma cultura de integridade nas organizações.