Resumo: Este artigo analisa a possibilidade de rescisão do contrato de trabalho por prazo determinado de uma empregada gestante pelo decurso de seu termo, à luz do artigo 10, inciso II, alínea "b", e § 1º, das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) da Constituição Federal de 1988, do Tema 497 do Supremo Tribunal Federal (STF) e da Súmula 244 do Tribunal Superior do Trabalho (TST). O foco principal é esclarecer se o Tema 497 do STF aborda a ciência do empregador sobre o estado gravídico da empregada ou o tipo de contrato de trabalho, e como isso impacta a estabilidade provisória da gestante. Conclui-se que o Tema 497 prioriza a anterioridade da gravidez à dispensa sem justa causa, sem abordar diretamente a modalidade contratual. Contudo, decisões recentes dos Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) indicam que a estabilidade é aplicável a contratos por prazo determinado, garantindo indenização substitutiva, embora contratos temporários regidos pela Lei nº 6.019/1974 sejam frequentemente excluídos dessa proteção.
1. Introdução
A proteção à empregada gestante é um princípio constitucional fundamental no ordenamento jurídico brasileiro, previsto no artigo 10, inciso II, alínea "b", do ADCT, que veda a dispensa arbitrária ou sem justa causa desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. O § 1º do mesmo artigo sugere que a estabilidade não se aplica a contratos por prazo determinado, salvo disposição legal em contrário, gerando debates sobre a rescisão desses contratos pelo decurso de seu termo. Este artigo examina a aplicabilidade da estabilidade provisória à gestante em contratos por prazo determinado, com ênfase na interpretação do Tema 497 do STF (STF, Tema 497) e da Súmula 244 do TST, considerando a jurisprudência recente e a controvérsia sobre o foco do Tema 497: a ciência do empregador ou o tipo de contrato.
2. Fundamentação Legal
2.1. Artigo 10, inciso II, alínea "b", e § 1º, do ADCT
O artigo 10, inciso II, alínea "b", do ADCT estabelece:
"Fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa: [...] b) da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto."
Essa norma visa proteger a maternidade e o nascituro, assegurando a subsistência da trabalhadora durante o período gestacional e puerperal. O § 1º, por sua vez, dispõe:
"Até que seja promulgada a lei complementar referida no art. 7º, inciso I, da Constituição, a estabilidade prevista neste artigo não se aplica aos contratos de trabalho por prazo determinado."
Essa redação sugere que o término natural de um contrato por prazo determinado não configuraria dispensa arbitrária, mas a jurisprudência evoluiu para reinterpretar essa disposição em favor da proteção à gestante.
2.2. Súmula 244 do TST
A Súmula 244 do TST, em sua redação atual, estabelece:
Súmula 244. Gestante. Estabilidade Provisória.
I - O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade (art. 10, II, "b", do ADCT).
II - A garantia de emprego à gestante só autoriza a reintegração se esta se der durante o período de estabilidade. Do contrário, a garantia restringe-se aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade.
III - A empregada gestante tem direito à estabilidade provisória prevista no art. 10, inciso II, alínea "b", do ADCT, mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por tempo determinado.
O item III é central, pois estende a estabilidade provisória a contratos por prazo determinado, incluindo contratos de experiência e temporários, harmonizando a proteção constitucional com a natureza temporária desses vínculos.
2.3. Tema 497 do STF
No julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 629.053, com repercussão geral (Tema 497), o STF fixou a tese:
"A incidência da estabilidade prevista no art. 10, inc. II, do ADCT, somente exige a anterioridade da gravidez à DISPENSA SEM JUSTA CAUSA."
O foco principal do Tema 497 foi determinar se o desconhecimento do estado gravídico pelo empregador afasta o direito à estabilidade provisória. O STF concluiu que a estabilidade se aplica desde que a gravidez seja anterior à dispensa sem justa causa, independentemente de o empregador ter ciência da gravidez. A tese não aborda diretamente a questão do tipo de contrato, seja por prazo determinado ou indeterminado, mas a menção à "dispensa sem justa causa" gerou interpretações divergentes sobre sua aplicação ao término natural de contratos por prazo determinado.
2.4. Tema 542 do STF
Embora não seja o foco principal, o Tema 542 do STF (STF, Tema 542), julgado em 2023, é relevante por reforçar a proteção à gestante. No julgamento do RE 842844, o STF reconheceu o direito de gestantes contratadas pela administração pública por prazo determinado ou em cargos em comissão à licença-maternidade e à estabilidade provisória. Essa decisão sugere que a proteção à gestante transcende a modalidade contratual, influenciando a interpretação do Tema 497.
3. Análise Jurídica
3.1. Foco do Tema 497: Ciência do Empregador ou Tipo de Contrato?
O Tema 497 do STF concentra-se na questão da ciência do empregador sobre o estado gravídico da empregada. A tese fixada esclarece que a estabilidade provisória não depende do conhecimento prévio do empregador, mas apenas da anterioridade da gravidez à dispensa sem justa causa. A controvérsia surge porque a tese menciona "dispensa sem justa causa", o que levou alguns tribunais a interpretar que a estabilidade não se aplica ao término natural de contratos por prazo determinado, pois esses não envolvem uma dispensa arbitrária, mas o esgotamento do prazo contratual.
Essa interpretação, no entanto, é questionada. O artigo de Calixto e Andreoni (Equivocada Interpretação do Tema 497) argumenta que o STF não fez distinção entre modalidades contratuais no Tema 497, e a Constituição também não limita a estabilidade a contratos por prazo indeterminado. Assim, a exclusão de contratos por prazo determinado seria uma interpretação restritiva, contrária à proteção constitucional à maternidade.
3.2. Aplicação da Estabilidade em Contratos por Prazo Determinado
O contrato por prazo determinado, regido pelos artigos 443 e 445 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), extingue-se automaticamente ao atingir seu termo, sem iniciativa do empregador. A Súmula 244, item III, do TST (Súmula 244, TST) estabelece que a estabilidade provisória se aplica a esses contratos, garantindo à gestante reintegração ou indenização substitutiva. Contudo, decisões do TST, como no caso relatado por Conexão Trabalho (TST Nega Estabilidade, 2024), interpretaram que o Tema 497 superou a Súmula 244, item III, negando a estabilidade em contratos por prazo determinado, especialmente em contratos de aprendizagem.
Por outro lado, decisões recentes dos TRTs contrariam essa interpretação. Em 2024, o TRT-5 (TRT-5 Estabilidade, 2024) confirmou a estabilidade de uma empregada grávida em contrato por prazo determinado, concedendo indenização substitutiva de R$ 6.600,00. A decisão destacou que o Tema 497 não abordou a questão dos contratos por prazo determinado, mantendo a validade da Súmula 244. Da mesma forma, o TRT-24 (TRT-24 Estabilidade, 2024) reconheceu a estabilidade de uma trabalhadora grávida, determinando indenização pelos salários e direitos do período de estabilidade.
3.3. Contratos Temporários: Uma Exceção?
Para contratos temporários regidos pela Lei nº 6.019/1974, a jurisprudência do TST é mais restritiva. Em 2019, no Incidente de Assunção de Competência (IAC-5639-31.2013.5.12.0051), o TST fixou que a estabilidade provisória não se aplica a esses contratos, devido à sua natureza transitória (TST Nega Estabilidade, 2024). Essa posição foi reiterada em 2024, quando a 4ª Turma do TST manteve a inaplicabilidade da estabilidade em contratos temporários, mesmo após o Tema 542 do STF.
3.4. Consequências Jurídicas
Quando o contrato por prazo determinado termina durante o período de estabilidade, a empregada gestante tem direito a:
Reintegração, se viável, durante o período de estabilidade, conforme item II da Súmula 244 do TST. No entanto, a reintegração é frequentemente inviável em contratos por prazo determinado, devido à sua natureza temporária.
-
Indenização substitutiva, abrangendo salários, décimo terceiro, férias e depósitos de FGTS referentes ao período de estabilidade, caso a reintegração não seja possível.
Por exemplo, se o contrato termina no terceiro mês de gravidez, a empregada terá direito a indenização pelos meses restantes até cinco meses após o parto, calculada com base nos salários e benefícios que receberia.
3.5. Tabela de Direitos e Obrigações
Tipo de Contrato |
Estabilidade Aplicável |
Direito em Caso de Término Durante Estabilidade |
Observação |
---|---|---|---|
Contrato por Prazo Determinado Geral |
Sim, conforme Súmula 244 |
Indenização substitutiva (salários, direitos) |
Reintegração inviável, compensação |
Contrato de Trabalho Temporário |
Não, em alguns casos |
Geralmente sem estabilidade, conforme TST |
Regido pela Lei nº 6.019/1974 |
Contrato de Experiência |
Sim, conforme TRTs |
Indenização substitutiva ou reintegração |
Controvérsia após Tema 497 |
4. Discussão
A interpretação do Tema 497 do STF gerou controvérsia significativa. Alguns tribunais, como a 4ª Turma do TST, entenderam que a menção à "dispensa sem justa causa" exclui a estabilidade em contratos por prazo determinado que terminam naturalmente (TST Nega Estabilidade, 2020). No entanto, decisões mais recentes dos TRTs, como as de 2024 do TRT-5 e TRT-24, reforçam a aplicação da estabilidade, argumentando que o Tema 497 não abordou diretamente a questão dos contratos por prazo determinado, mantendo a validade da Súmula 244.
O Tema 542 do STF, ao reconhecer a estabilidade para gestantes em contratos temporários na administração pública, sugere uma tendência de ampliar a proteção à gestante, independentemente da modalidade contratual. Essa decisão pode influenciar futuras interpretações do Tema 497, reforçando a proteção constitucional à maternidade.
A controvérsia reflete a tensão entre a proteção trabalhista e a flexibilidade dos contratos por prazo determinado. A Súmula 244 do TST busca uniformizar a aplicação da estabilidade, mas decisões contrárias em contratos temporários indicam a necessidade de maior clareza legislativa ou jurisprudencial.
5. Conclusão
O Tema 497 do STF foca na exigência de que a gravidez seja anterior à dispensa sem justa causa, sem abordar diretamente a questão do tipo de contrato. Embora haja controvérsia, a tendência jurisprudencial, conforme decisões do TRT-5 e TRT-24 em 2024, é reconhecer a estabilidade provisória da gestante em contratos por prazo determinado, garantindo indenização substitutiva pelos salários e direitos do período de estabilidade. Para contratos temporários regidos pela Lei nº 6.019/1974, a jurisprudência do TST é mais restritiva, frequentemente negando a estabilidade. Assim, o término natural do contrato por prazo determinado é lícito, mas a gestante provavelmente terá direito à indenização, salvo em contratos temporários. Recomenda-se que empregadores consultem a legislação e a jurisprudência aplicáveis ao caso concreto para evitar litígios trabalhistas.
Referências
Supremo Tribunal Federal - Recurso Extraordinário 629.053 – Tema 497
Tribunal Superior do Trabalho - Súmula 244
TRT-5 - Confirmação de Estabilidade de Gestante em Contrato por Tempo Determinado 2024
TRT-24 - Direito à Estabilidade em Contrato por Prazo Determinado 2024
Supremo Tribunal Federal - Recurso Extraordinário 842844 – Tema 542
Conjur - Equivocada Interpretação do Tema 497 do STF
Conexão Trabalho - TST Nega Estabilidade de Gestante em Contrato por Prazo Determinado 2020
Migalhas - TST Nega Estabilidade a Gestante em Contrato Temporário 2024