É difícil negar que há certa anormalidade nas instituições partidárias atuais. Determinar se se trata de um delírio coletivo ou de outro fenômeno é tarefa complexa. O que se pode afirmar com segurança é que a concepção de democracia delineada pela Constituição de 1988 tem sido pressionada por determinadas agremiações partidárias que, de forma direta, questionam o regime democrático e a ideia de representatividade, e, de forma indireta, fragilizam a soberania nacional. Diante disso, torna-se necessário examinar como o ordenamento jurídico brasileiro disciplina o tema.
A Lei nº 9.096/1995 trata dos partidos políticos, estabelecendo os parâmetros para sua criação, funcionamento, direitos, garantias e obrigações. Já em seu artigo 1º, dispõe que:
“O partido político, pessoa jurídica de direito privado, destina-se a assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e a defender os direitos fundamentais definidos na Constituição Federal.”
O artigo 2º, na mesma linha, afirma:
“É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos cujos programas respeitem a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo e os direitos fundamentais da pessoa humana.”
Reforçando o princípio da soberania nacional, o artigo 5º estabelece:
“A ação do partido tem caráter nacional e é exercida de acordo com seu estatuto e programa, sem subordinação a entidades ou governos estrangeiros.”
Esse princípio é consolidado pelo artigo 31, que veda:
“O recebimento, direto ou indireto, sob qualquer forma ou pretexto, de contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade, proveniente de entidade ou governo estrangeiros.”
A violação dessas normas pode acarretar sanções, conforme o artigo 36:
“Constatada a violação de normas legais ou estatutárias, ficará o partido sujeito às seguintes sanções: (...) II - no caso de recebimento de recursos mencionados no art. 31, fica suspensa a participação no fundo partidário por um ano.”
Portanto, embora os partidos políticos gozem de autonomia, essa liberdade encontra limites nos princípios constitucionais, especialmente na defesa da soberania nacional. A transgressão dessas bases pode ensejar sanções, entre elas a suspensão do acesso ao fundo partidário.
O artigo 38 da Lei nº 9.096/1995 define o Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário), composto por:
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Multas e penalidades pecuniárias nos termos do Código Eleitoral e leis conexas;
Recursos financeiros destinados por lei, em caráter permanente ou eventual;
Doações de pessoas físicas ou jurídicas, por depósitos bancários na conta do Fundo;
Dotações orçamentárias da União, em valor proporcional ao número de eleitores inscritos.
Segundo o Tribunal Superior Eleitoral, o Fundo Partidário foi criado em 1965 e atualmente serve para custear despesas cotidianas das legendas, como contas de luz, água, aluguel, passagens aéreas e salários de funcionários. Trata-se, portanto, de recursos que garantem a manutenção institucional dos partidos, conforme os princípios constitucionais.
Atualmente, há exemplos de partidos que, em certa medida, questionam o regime representativo, desacreditando instituições como a Justiça Eleitoral. Tais condutas, ainda que indiretas, podem representar tentativas de subverter o regime democrático, especialmente quando não se aceita o resultado de eleições e se incita a militância a agir contra instituições como o Congresso Nacional e o Poder Judiciário.
Além disso, observa-se, em alguns casos, estímulo à ingerência de nações estrangeiras em assuntos internos, o que configura afronta à soberania nacional.
Diante da predominância de recursos públicos no financiamento partidário, e considerando que determinadas condutas atentam contra os fundamentos do Estado Democrático de Direito, a suspensão do acesso ao fundo partidário, quando comprovada a infração, é medida legítima e necessária.
Nota
1 https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2021/Novembro/fundo-eleitoralxfundo-partidario-entenda