Artigo Destaque dos editores

ON, PN (sem direito de voto ou com sua restrição) e o poder de controle em companhias abertas com alto nível de governança corporativa.

Direito, economia e política

Exibindo página 1 de 3
05/09/2008 às 00:00
Leia nesta página:

Por que é necessário vedar PNs sem direito de voto ou com restrição a este direito nas estruturas das companhias listadas no Novo Mercado da Bovespa? Existe relação entre Democracia e Eficiência?

SUMÁRIO: 1. Introdução – 2. Operacionalidade básica das espécies de ações e motivos pelos quais a proporcionalidade ON/PN (sem direito de voto ou com sua restrição) depende do estágio de desenvolvimento econômico do mercado e das próprias sociedades – 3. Visão macroeconômica: panorama do atual mercado de capitais brasileiro – 4. Por que uma sociedade formada apenas com ON é mais eficaz no controle do risco de investimentos? – 5. Visão microeconômica: as etapas do desenvolvimento econômico-governamental da companhia – 6. Conclusão – Bibliografia.

Resumo: Por que é necessário vedar PNs sem direito de voto ou com restrição a este direito nas estruturas das companhias listadas no Novo Mercado da Bovespa? Por que estas ações são necessárias em outros níveis do mercado de capitais? Existe relação entre Democracia e Eficiência? Estes são os principais temas desenvolvidos neste artigo.

Abstract: Why is necessary not permit preferred stock without voting or with restriction to this right in the structures of companies listed in the Bovespa’s New Market? Why this type of stock is necessary in another levels of the capital market? Is there relation between Democracy and Efficiency? These are the main issues developed in this paper.

Palavras-chave: Ação Preferencial, Companhias Abertas, Poder de Controle, Democracia, Eficiência, Risco.

Keywords: Preferred Stock, Public-held Companies, Democracy, Power to Control, Efficiency, Risk.


1. Introdução

Analisar o poder de controle do destino de uma sociedade envolve, em um primeiro plano, interpretação sistemática dos diversos dispositivos estatutários e legais que a constituem e regem. No entanto, para se responder motivadamente a questão "Quem deve possuir o poder de decidir?" precisamos ir além de uma leitura formalista, utilizando-se de visão interdispiclinar que agregue conhecimentos oriundos da Economia e da Política.

E além desta visão interdisciplinar é preciso saber aplicar todo este instrumental teórico de diversas áreas do conhecimento nos casos concretos, de modo a transformar aquilo que se está fazendo na prática, com vistas a melhorá-la, e, concomitantemente, de modo a averiguar o grau de consistência destes conceitos quando de sua aplicação às novas situações que emergem do mercado e que devem ser racionalizadas. Teoria e prática são esferas indissociáveis e que se lapidam mutuamente. (1)

Assim, quando atentamos para o Regulamento de Listagem do Novo Mercado, em sua Seção III (Autorização para negociação no Novo Mercado), item 3.1 [01], e quando, a título de exemplo, atentamos para o Estatuto Social da Bovespa Holding S.A., em seu artigo 5º, Parágrafo Único [02], estamos a atentar para o resultado de um processo histórico no qual teorias de várias áreas do conhecimento e a prática do mercado cunharam a noção de que um mecanismo de democratização do poder de controle via pulverização traz maior eficiência para as sociedades que estão em mercados desenvolvidos, mais dinâmicos. Deste modo, também é preciso entender o desenrolar teórico e prático que tornou a pulverização necessária.

A atual vedação no Novo Mercado da Bovespa de ações preferenciais na composição do capital social, com vistas a inviabilizar trocas entre (a) a totalidade ou parte dos direitos de voto sobre o destino da sociedade e (b) a prioridade no recebimento de dividendos e/ou reembolso do capital, explicita a idéia de que é necessário, sempre que for possível, agregar ao capital o componente organizacional-corporativo denominado decisão. Segundo este mecanismo, quem tem a propriedade é quem deve decidir. (2)

Entender o porquê desta vedação de PNs consiste em um dos objetivos deste estudo.


2. Operacionalidade básica das espécies de ações e motivos pelos quais a proporcionalidade ON/PN (sem direito de voto ou com sua restrição) depende do estágio de desenvolvimento econômico do mercado e das próprias sociedades

Primeiramente, é preciso delimitar o tema ressaltando que estamos a tratar de PN sem direito a voto ou com restrição a este direito, e não de outras classes de PNs que poderiam atribuir, por exemplo, direito de eleger, em votação separada, um ou mais membros dos órgãos de administração, como possibilita o artigo 18 da Lei 6.404 [03].

O conceito de PN não está necessariamente relacionado com a supressão do direito de voto, mas, sim, com as diferenças que possui em oposição ao conceito de ON (ações ordinárias, as que são tidas como as ações normais). Portanto, a PN caracteriza-se pela diferenciação (anormalidade) no modo como seu detentor participa na sociedade, e justamente por existirem várias maneiras desta participação se concretizar, sendo impossível prever todas em lei [04], é que se deve explicitar pormenorizadamente no estatuto social os elementos que a distinguem, como dita o artigo 19 da Lei 6.404 [05].

Segundo Tavares Borba, "Cada classe de preferenciais tem sempre alguma coisa a mais ou a menos...caracterizam-se, então, por oferecer a seus titulares: a) vantagens e desvantagens, cumulativamente; b) apenas vantagens..." [06]. (para mais artigos do Autor, visite www.rafaeldeconti.pro.br)

Vejamos, então, a operacionalidade básica da ON e da PN sem direito de voto ou com sua restrição.

Na ON, os elementos propriedade e decisão não delegada (soberana) sobre esta propriedade se encontram na mesma pessoa, ao contrário do que ocorre na PN sem direito de voto ou com sua restrição. Em outras palavras, o acionista, quando o é por meio de uma PN deste tipo, não pode decidir sobre o próprio destino dos bens de que é dono, decisão esta que fica a cargo de outrem. Esta distância entre o acionista e seu patrimônio, por si só, é geradora de risco. (3)

Sob um certo ângulo, o valor de venda do poder de voto é muito atrativo, pois, por exemplo, a prioridade no recebimento de dividendos é um mecanismo que possibilita o acionista com ações preferenciais retirar lucro da empresa de modo seguro (pois rápido) no acelerado capitalismo de mercado, o que parece lógico partindo-se da premissa que empresas são como organismos vivos, os quais ora estão saudáveis ora estão doentes em razão, muitas vezes, não só de elementos internos, endógenos, como má administração que traz prejuízo para a sociedade, mas, também, em razão de elementos alheios as suas próprias atitudes, como as constantes (porque regulares) crises econômicas, o nível de desemprego e a taxa de juros. (4a)

O sujeito que enxerga sob este ângulo é o investidor que quer alta liquidez em suas aplicações, que quer lucrar rápido, arriscando, para tanto, entregar o controle de sua propriedade para outrem, consistindo exatamente nesta dação seu principal risco, e, portanto, a medida que deve ser tomada como base do valor da perda de direitos políticos. (4b)

Provavelmente, este investidor está mais atrelado ao imediatismo, o qual tanto é oriundo da sua necessidade de sobreviver, pois como todo e qualquer ser humano ele é vulnerável, quanto é oriundo da sua ânsia de maximização, pois, como todos, tal investidor busca maximizar seus benefícios para se tornar menos vulnerável e, conseqüentemente, aumentar suas chances de sobrevivência e de qualidade de vida.

E isto não exclui a sua racionalidade, pois ela é justamente a via pela qual calculamos o futuro para manter os níveis de segurança requisitados pela nossa sobrevivência e prover novos níveis de conforto. (4c) Assim, é possível racionalizar o argumento de que as PNs são necessárias no mercado ao se estabelecer uma causa natural, ou seja, da natureza humana. Tal argumento é importante tanto do ponto de vista de naturalizarmos o investimento de risco (que é uma das sementes do empreendedorismo) quanto do ponto de vista de isentarmos naturalmente o ser humano de qualquer juízo de valor sobre esta atividade.

Um exemplo de sujeito que enxerga PN sem direito a voto ou com restrição deste com bons olhos é aquele que se encontra na situação (de sobrevivência) do empresário brasileiro das décadas de 60 e 70, o qual, ante a abertura do mercado nacional para a concorrência globalizada de empresas muito mais eficientes, precisava de rápida capitalização cumulada com possibilidade de tomada de decisão ágil, porque concentrada nas mãos dos poucos detentores de ON.

A tomada de decisão ágil, sob esta perspectiva, é vislumbrada, então, como sinônimo de diminuição do nível de conflito de interesses, os quais retardam o processo deliberativo, via diminuição da possibilidade de negociação.

A Exposição de Motivos da Lei 6.404 que, em 1.976, aumentou de 50% para 2/3 a viabilidade de PN sem direito a voto ou com restrição deste na composição do capital social, traz como motivações para esta política econômica não apenas a liberdade empresarial e a necessidade de rápida capitalização, mas, também, a necessidade da proteção nacional, a qual, em última instância, pode ser vista como o interesse de todo e qualquer cidadão brasileiro, visto que a perda de controle dos meios privados para estrangeiros implica, necessariamente, em perda de soberania.

Segundo a Exposição de Motivos da referida lei, "recomendam este aumento de limite: a) a orientação geral...de ampliar a liberdade do empresário privado nacional na organização da estrutura de capitalização da sua empresa; b) o objetivo de facilitar o controle, por empresários brasileiros, de companhias com capital distribuído no mercado; c) a conveniência de evitar a distribuição, na fase inicial de abertura do capital de companhias pequenas e médias, de duas espécies de ações, em volume insuficiente para que atinjam grau razoável de liquidez"). Assim, os tipos de PN sob análise guardariam sua importância também em argumentos assentados sob uma perspectiva da coletividade que engloba a sociedade empresária e por esta é constituída em parte, ou seja, sob uma perspectiva da Teoria Geral do Estado. (para mais artigos do Autor, visite www.rafaeldeconti.pro.br)

É interessante notar que a estruturação do Estado [Pessoa Jurídica (sociedade) de Direito Público] guarda relação com a estruturação da sociedade empresária [Pessoa Jurídica (sociedade) de Direito Privado].

A partir das evidentes semelhanças entre os significados técnicos da Política e do Direito que estes dois entes fenomênicos guardam, podemos questionar: A comunhão de interesses que constitui a pessoa jurídica é aquela que deve geri-la?

Tanto a Política, que se ocupa em criar uma teoria da representação que embasa racionalmente a democracia indireta, procurando dar valor ao voto do cidadão, quanto o Direito Societário, que se ocupa em criar também uma teoria da representação, só que para embasar racionalmente o seu dirigismo no capitalismo de mercado, o que é feito via decisões em assembléias gerais, a ciência e a filosofia destas duas disciplinas (Política e Direito Societário) dirão que sim, que a comunhão de interesses que constitui a pessoa jurídica é aquela que deve geri-la.

Isto porque uma PN com restrição a este direito é o mesmo que o cidadão poder votar no Presidente, mas não poder votar no Prefeito, ou ao contrário, e isto não faz sentido, porque os níveis de poderes são, constitucionalmente, independentes, não existindo meio voto para eleger aqueles que governaram os diferentes níveis de espaço público em que o cidadão está inserido.

De um ponto de vista político-tributário, o cidadão-contribuinte paga tributos na esfera federal, estadual e municipal. Deste modo, é direito do cidadão-contribuinte escolher quem vai governar o dinheiro que ele, enquanto membro da comunidade política, investiu no Estado, o qual, como a sociedade empresária, é um meio do ser humano sobreviver e obter mais conforto em sua vida.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

A relação entre o ente estatal é a sociedade empresária é tão grande do ponto de vista organizacional que podemos pensar as estruturas de uma Sociedade Anônima analogicamente com o Estado no seguinte sentido:

(i) a Assembléia Geral representa o Poder Legislativo, que funciona como mecanismo de expressão da vontade do Povo (constituídos por aqueles com capacidade jurídica para votar), que utiliza tal mecanismo por meio do legislador. O conjunto de acionistas com poder de voto, no caso, é o mesmo que o Povo;

(ii) o Conselho de Administração e a Diretoria representam o Poder Executivo, os quais devem tomar as decisões de gestão que mais viabilizem a satisfação da vontade do Povo (conjunto de acionistas com poder de voto);

(iii) o Conselho Fiscal averigua e denuncia se a execução da gestão orquestrada pelos conselheiros e diretores está conforme as regras do estatuto e os ditames da lei, o que o aproxima de um Poder de Polícia do Estado (Poder Executivo) e defesa de sua ordem (Poder Judiciário).

(iv) o Conselho Nacional de Justiça pode ser entendido como os mecanismos de auditorias externas das Sociedades Anônimas. (4d)

Ocorre que, tanto em relação ao indivíduo acionista e cidadão [07] , quanto em relação à sociedade empresária e política, existem argumentos igualmente sustentáveis em sentido contrário.

Contra as PN sem direito a voto ou com restrição ao exercício deste, podemos dizer, sob a perspectiva do indivíduo, que não apenas as partes sempre estarão melhor quanto melhor estiver o todo (devendo o interesse da sociedade ser visto em primeiro plano), como, também, é coerente pensar que não é prudente deixar alguém dispor de um bem de sua propriedade, ainda que em seu nome, em um ambiente no qual erros são de dificílima reparação, mesmo que houvesse seguro para tanto, o que, necessariamente, representaria um custo e, assim, diminuição de patrimônio. Metaforicamente, pode-se dizer que o investidor que opta por adquirir ações preferenciais deixou seu patrimônio à deriva (sem controle algum de sua parte), pois, simplesmente, deixou de ter a competência para decidir nas Assembléias Gerais sobre o destino de alocação dos seus recursos. (5a)

E quando analisamos pelo prisma da coletividade (tanto da sociedade civil da qual fazemos parte quanto das companhias), verificamos que, a longo prazo, em razão daquelas mesmas citadas intempéries exógenas que inevitavelmente atingem à sociedade, e também em razão dos problemas endógenos acima citados, como má administração, o que acaba por permitir a salutabilidade financeira da empresa é, justamente, impossibilitar a retirada rápida de seu capital, bem como, é fortalecer o comprometimento daqueles que tem a propriedade sobre ela, como ficará melhor explanado no tópico 4 deste artigo.

O preferencialista que, por exemplo, tenha direito de receber dividendo 10% maior do que o atribuído à ação ordinária não apenas está corroborando para o desequilíbrio estrutural da sociedade, que deixa de estar solidamente voltada para a acumulação de capital que seria aplicado em futuras expansões, mas tal preferencialista está, também, menos vinculado e, portanto, menos comprometido com o desenvolvimento sustentável da companhia. (5b)

Bloquear esta relação parasitária (e necessária em certas conjunturas) do acionista para com a sociedade é uma atitude típica de mercados mais velhos, desenvolvidos.

A analogia com a Política, neste ponto, é que, em uma sociedade desenvolvida do ponto de vista cultural, a maior noção de que o voto é aquilo que vincula a vontade do representado à ação do representante político, que foi eleito por afinidade de interesses, tal maior noção é aquilo que fortalece o comprometimento do cidadão para com o Estado. O sentimento de patriotismo é, analogicamente, aquele que o sócio exige que o outro tenha para com a empresa, ou seja, tanto em um nível relacional de cidadão-Estado, quanto em um nível relacional de sócio-empresa, encontramos a necessidade do ser humano de fazer parte de um todo e de torcer para e lutar por este todo. (para mais artigos do Autor, visite www.rafaeldeconti.pro.br)

Deste modo, existem tanto justificativas plausíveis para a defesa no uso das PNs sem direitos de voto ou com este restrito no Novo Mercado, como, também, existem ótimas justificativas para não as utilizar. Isto fica claro quando analisamos a racionalidade permeada no desenvolvimento histórico da proporção entre ações ordinárias e ações preferenciais do subtipo sob análise e verificamos que ora se fez necessário dar incentivo à prevalência destas PNs, ora se fez necessário reprimir seu uso. A primeira inferência que podemos tirar disto é que a solução perfeita só é perfeita para determinada(s) situação(ões), mas não para toda e qualquer situação. A segunda inferência é a de que a noção econômica segundo a qual existe uma constância no acontecimento de crises, havendo uma natural oscilação do mercado, é aquilo que torna necessária a alteração das normas que regulam o mercado, estando o Direito e a Economia em constante interação de lapidação mútua. (6a)

Ao analisarmos o desenvolvimento histórico da legislação, verificamos que, primeiro, o Decreto 21.526, de 15.06.1.932, que trouxe para o ordenamento jurídico brasileiro a PN, não estabelecia limites para a emissão desta espécie de ação, depois, verificamos que o Decreto-lei 2.627, de 26.09.1940, em seu Artigo 9º, § Único [08], limitou a emissão de ações preferenciais sem direito de voto em 50% do capital social, como terceiro movimento histórico, verificamos que a Lei 6.404, de 15.12.1.976, em seu Artigo 15, § 2º [09], alargou o limite de 50% de ações preferenciais sem direito a voto para 2/3 do capital social e acrescentou, ainda, que qualquer restrição do direito de voto deve observar este limite de 2/3, e, por fim, verificamos que a Lei 10.303, de 31.10.2.001, dando nova redação para o referido § 2º [10], retornou o limite para 50%, mantendo o acréscimo feito pela lei anterior de se também vedar neste limite qualquer restrição do direito de voto.

O movimento percorrido pela lei é o que Hegel (filósofo alemão do século XVIII/XIX) denomina de movimento dialético, o qual pode ser explanado como a passagem de uma tese para uma anti-tese que resulta em uma síntese, que será uma nova tese, em um processo com prazo de duração indeterminado. Assim, primeiro não se estabeleceu limite algum (tese), depois, estabeleceu-se uma negação desta tese com o limite de 50% para a expedição de ações preferenciais (anti-tese). Da interação dialética da tese com a anti-tese, elevou-se o limite para 2/3 (síntese) e, desta síntese, a qual é uma nova tese, foi contraposta uma nova anti-tese com a Lei 10.303, que retornou o limite de ações preferenciais para 50%. (6b)

O que é importante neste movimento dialético é que há uma racionalidade na história e, portanto, no modo como o mercado e as normas evoluem. Porém, ante a natural impossibilidade de se determinar o futuro a partir da análise do caos, a não ser precariamente, temos um limite de previsibilidade dos acontecimentos do mercado e, assim, não conseguimos apreender a racionalidade na história a não ser nos voltando para o passado. Os economistas sabem que as crises acontecem periodicamente, mas não sabem determinar exatamente quando.

Além dos economistas, os historiadores também compreendiam este mecanismo de racionalidade na história e compreendiam que havia uma natural degradação e ressurgimento das coisas, inclusive dos regimes políticos.

Políbio, historiador grego que viveu na Antiguidade (203 a.C. – 120 a.C.) e se dedicou a estudar como em quase cinqüenta anos o povo romano dominou todos os povos vizinhos, criou uma teoria política sobre o melhor regime de governo segundo a qual o regime misto explicitado pela constituição romana de sua época (em que tanto os cônsules, quanto o senado e o povo participavam de processos decisórios) seria o melhor. Tal governo misto seria o melhor, porque, dentre outros argumentos, retardava a natural degradação dos regimes políticos puros causada pela nata instabilidade que cada um destes regimes trazia em seu bojo. Assim, em razão de haver um processo circular na história pelo qual se passava de uma forma de governo para outra, e, após um ciclo completo, retornava-se para a primeira forma, era preciso mesclar todas estas formas para retardar à inevitável ação do tempo. Por exemplo, um regime de governo em que apenas os aristoi (= melhores, por isto Aristocracia) decidem já carrega em si um germe de degradação. Por isto, para Políbio, cônsules, senado e povo (cada um como sendo ator principal das formas de governo por ele identificadas) deviam estar juntos na tomada das decisões do destino da sociedade [11].

O que Políbio tem a nos ensinar, junto com os economistas, é que a oscilação entre desenvolvimento e recessão é um processo inevitável e circular, que, no entanto, pode ser acelerado ou desacelerado pelo ser humano. Este pode, em certa medida, interferir no meio em que se encontra, sendo a regulação do mercado prova disto. (6c)

Quando pensamos em sociedades com alta quantidade de PNs sem direito a voto ou com restrição a este direito, estamos a vislumbrar um processo (necessário para a viabilização de empresas de grande porte) que consiste na aceleração da capitalização empresarial, pois empresa que não tem patrimônio para crescer acaba sendo extinta. Em contra partida, o baixo índice de ONs na composição do capital social indica distanciamento do processo democrático de pulverização do poder de controle da sociedade.

Neste sentido, podemos dizer que a utilização de PNs dos subtipos que estamos analisando consiste em uma etapa natural de desenvolvimento da sociedade empresarial (questão analisada no item 4 deste artigo) e de desenvolvimento do mercado, os quais tem suas devidas importâncias nos devidos tempos e que, portanto, têm prazo determinado de duração, que pode ser dilatado ou contraído, até certo ponto, por um corpus jurídico tanto externo quanto interno à companhia. (6d) (para mais artigos do Autor, visite www.rafaeldeconti.pro.br)

A partir destas explanações, a questão que devemos levantar para conseguirmos responder motivadamente a questão colocada no início ("Quem deve possuir o poder de decidir?") é: "Em que estágio de desenvolvimento nosso mercado de capitais está, tanto econômica quanto regularmente?".

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Rafael Augusto De Conti

Advogado Empresarial e Filósofo Político

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CONTI, Rafael Augusto. ON, PN (sem direito de voto ou com sua restrição) e o poder de controle em companhias abertas com alto nível de governança corporativa.: Direito, economia e política. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1892, 5 set. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11682. Acesso em: 28 mar. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos