6. TRIBUNATO E MINISTÉRIO PÚBLICO
Embora o tribunato proposto por Rousseau não seja o mesmo tribunato da plebe, existe uma grande semelhança entre eles, assim como com o Ministério Público.
De fato, Rousseau disse que o tribunato não faria parte da pólis e não deveria possuir qualquer porção de poder executivo ou legislativo. Ora, a configuração atual do Ministério Público brasileiro é aproximadamente esta. Ele não faz parte dos Poderes executivo, legislativo ou judicial, nem possui poder de executar as leis ou de legislar. Só administra os recursos públicos destinados à sua própria manutenção, por conta da sua autonomia orçamentária (art. 127, § 2º, da CF/88, com redação dada pela EC n. 19/98).
Assim como o tribunato, o Ministério Público tem a função de “sustentar o governo contra o povo”, através da responsabilização criminal dos infratores da Lei (ele tem a privatividade da ação penal pública). Mas também é um defensor do povo, uma vez que tem legitimidade para propor ações civis públicas que visem beneficiar a sociedade, assegurando a proteção de direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos, tais como educação, saúde, moradia e assistência social (art. 129, incisos I, II e III, da CF/88).
Rousseau escreveu que o tribunato, “não podendo fazer nada, tudo pode impedir”, o que entendemos ser uma das melhores maneiras de definir a maneira de atuar do Ministério Público em defesa da democracia e da sociedade. Embora os membros do Ministério Público não tenham o poder de veto, tal como o possuía o tribuno, podem propor ações para impedir atos ilegais ou contrários ao interesse público, assim como expedir recomendações e celebrar termos de ajustamento de conduta com o mesmo fim.
Outra semelhança entre os dois órgãos é a função de verificar a conformidade das leis editadas com a ordem jurídica. No caso dos tribunos, o controle que se fazia era baseado na existência de prejuízo à plebe em determinada lei ou decisão. No caso do Ministério Público, este deve observar se as leis e as decisões da administração pública estão em conformidade com a Constituição Federal. De tal modo, sendo a isonomia e a busca da igualdade social princípios constitucionais a serem seguidos por qualquer lei ou decisão administrativa, tais atribuições acabam se equiparando. A diferença estaria apenas na forma de atuação: o tribuno da plebe atuava de forma independente e podia propor ou vetar leis. Já o Ministério Público necessita propor uma ação direta de inconstitucionalidade/constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal ou os Tribunais de Justiça (no caso de leis estaduais).
Rousseau entendia que o tribunato não poderia constituir um corpo permanente, para prevenir abusos e usurpação de poder. Segundo ele:
O melhor meio de prevenir as usurpações de um corpo tão temível – meio sobre o qual nenhum Governo até hoje refletiu – seria não tornar esse corpo permanente, mas estabelecer certos intervalos durante os quais ficaria suprimido. Tais intervalos, que não devem ser suficientemente grandes para permitir que os abusos encontrem tempo de ser fortalecer, podem ser fixados pela lei de modo a tornar fácil, caso necessário, o abreviá-los por meio de comissões extraordinárias. Esse meio me parece sem inconvenientes, porque, como já disse, não fazendo o tribunato parte da constituição, pode ser afastado sem que ela sofra com isso. Tal coisa me parece muito eficaz, pois que um magistrado, novamente reinstalado, assim não parte em absoluto do poder de que dispunha um seu predecessor, mas daquele que a Lei lhe dá (ROUSSEAU, 1991, p. 132-133).
O receio de Rousseau de que o Tribunato seja permanente decorria do seu poder, igual ao dos antigos tribunos da plebe, de vetar leis, decisões do poder Executivo e sustar o efeito de decisões do pretor.
Entretanto, na instituição que entendemos adequada a um regime democrático, tais medidas só poderiam ser tomadas pelo titular de todo o poder: o povo, através dos mecanismos de democracia direta, quais sejam: plebiscito e referendo. Por meio de um plebiscito ou referendo o povo tem o poder de vetar leis, derrubar decisões do Poder Executivo e até do Poder Judiciário (que possuam caráter normativo), pois este exerce uma parcela do poder soberano, que pertence, num regime republicano, ao povo. Se o poder soberano pertence ao povo, este pode tornar inválida até uma decisão judicial, desde que tenha natureza normativa.
Mesmo assim, apesar de todas essas semelhanças, não existe uma igualdade de poderes entre o tribunato e o Ministério Público. Este não pode vetar qualquer decisão do Poder Público por conta própria. Sequer pode aplicar uma multa num procedimento administrativo, mesmo se se deparar com uma ilegalidade praticada por agentes públicos em algum procedimento de sua competência. Nesse caso, pode tão só recomendar a correção do ato. E o controle da constitucionalidade das leis fica a cargo do judiciário.
Ocorre que, para corrigir os males da democracia representativa, garantindo o respeito à soberania popular, à vontade do povo, uma vez que o Poder Executivo exerce um papel de preponderância em relação aos Poderes Legislativo e Judiciário, acreditamos que é preciso restabelecer, na instituição Ministério Público, alguns dos poderes dos antigos tribunos da plebe, de forma que se possa estabelecer um “termo médio entre o príncipe o povo”.
O Ministério Público já é um espaço público onde a população pode expressar seus desejos e reclamações a respeito da gestão dos governantes e dialogar com seus representantes, mas só exercerá a função de defensor da democracia e da sociedade, como um novo tribunato, se lhe forem assegurados mais alguns poderes.
7. O MINISTÉRIO PÚBLICO COMO NOVO TRIBUNATO
Embora caiba ao Ministério Público a privatividade da ação penal pública, competência muito importante, cumpre-lhe, acima de tudo, defender a ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis, como previsto no art. 127, caput, da Constituição Federal de 1988.
O Ministério Público, sendo detentor de tais deveres, pode ter seu regime jurídico alterado, para melhor realizá-los. Às suas prerrogativas e atribuições atuais podem ser somadas outras. Uma vez que ele é o defensor da sociedade, da ordem jurídica e do regime democrático, deveria, por exemplo, poder apresentar projetos de lei de interesse social, através do Procurador-Geral da República. Se ele é o defensor da sociedade, também deveria poder propor leis em benefício desta.
Por outro lado, imagine-se uma lei votada pelo Congresso Nacional que seja inconstitucional ou injusta, prejudicial à sociedade, mas ainda assim receba a sanção do Presidente da República e não seja declarada inconstitucional pelo Poder Judiciário. Ou uma situação contrária: uma lei benéfica, que atende aos interesses sociais e aos princípios constitucionais, mas que seja vetada pelo Poder Executivo. Caso o Congresso Nacional não derrube tal veto, o que na prática dificilmente ocorre, uma vez que o Governo controla boa parte do Poder Legislativo, poderia o povo, através de um plebiscito ou referendo, apreciar diretamente o projeto de lei, convocado pelo Ministério Público.
Os instrumentos de democracia direta podem encontrar no Ministério Público uma forma de serem deflagrados, de modo que a sociedade possa apreciar as decisões de seus representantes, uma vez que todo o poder emana do povo e em seu nome é exercido, e o Congresso Nacional não tem realizado um controle eficaz sobre o Poder Executivo, conforme Medauar (2007):
registra-se descrença genérica quanto à eficácia e mesmo operacionalidade da fiscalização parlamentar. Paradoxal, assim, que se afirme, ao mesmo tempo, a relevância da função de controle do Legislativo e a escassez de resultados dessa atuação. Salvo atuações episódicas (no Brasil, impeachment de um Presidente da República), o controle parlamentar da Administração apresenta-se inefetivo. Vários fatores vêm apontados para justificar esse quadro: falta de interesse político na realização concreta e eficaz da vigilância, para não desagradar ao detentor do Poder Executivo; ausência, em geral, de sanção, pois nem o Congresso, nem suas comissões podem anular ou modificar atos administrativos ou aplicar sanções a administradores.
Dessa forma, o Procurador-Geral da República, representante maior do Ministério Público, escolhido pelo Presidente da República dentre integrantes da carreira, poderia ter legitimidade para, dentro do atual sistema democrático, apresentar projetos de lei ou convocar plebiscito e referendo.
Além disso, o Procurador-Geral poderia ser escolhido por voto popular, entre os membros da classe. Assim teria mais independência em relação ao Poder Executivo e aos demais poderes do Estado. Esse processo não traria qualquer prejuízo à vedação ao membro do Ministério Público de exercer atividade político partidária, uma vez que os candidatos só poderiam concorrer ao cargo de Procurador-Geral, e a mais nenhum outro, para o que não seria preciso se filiar a partido político.
Também poderia permanecer o processo de escolha atual. Se os Ministros do Supremo Tribunal Federal não são eleitos e podem declarar uma lei inconstitucional, não haveria porque não poder o Procurador-Geral da República convocar plebiscito para apreciar a constitucionalidade de uma lei, mesmo sem ser eleito.
Além de poder propor leis e convocar o povo, o Ministério Público precisa ter meios mais eficazes de fiscalizar os outros poderes e a administração pública. No momento, o Ministério Público apenas recomenda a correção de irregularidades. Se não for atendido, tem que ir ao judiciário para impedir sua ocorrência.
Melhor seria, então, que o membro do Ministério Público tivesse o poder de paralisar, sem necessidade de recorrer ao judiciário, atos manifestamente ilegais de autoridades públicas, que violem a ordem jurídica, o regime democrático ou os direitos fundamentais dos cidadãos. O Ministério Público não deveria ter que precisar, todas as vezes que não é atendido, recorrer ao judiciário.
Essas e outras propostas serão apresentadas a seguir, com mais detalhes, para melhor apreciação e crítica.
8. COMPETÊNCIAS QUE PODEM SER ATRIBUÍDAS AO MINISTÉRIO PÚBLICO
O pleno desenvolvimento da democracia brasileira reclama um incremento das funções do Ministério Público, para que ele possa melhor exercer o papel de defensor do regime democrático e dos direitos do cidadão. A seguir iremos apresentar algumas sugestões nesse sentido.
8. 1 – propor leis de interesse público ou social, assim como propostas de emenda à Constituição, com o mesmo teor;
Conforme Alves (1995), as leis em Roma eram votadas nos comícios por centúrias e por tribos, que não se confundiam com as assembléias da plebe, concilia plebis, onde só votava a plebe, convocada pelos seus magistrados: o tribuno e o edil. Suas deliberações eram chamadas de plebiscito.
Os tribunos tinham o direito de apresentar resoluções, diante das assembléias da plebe, com caráter administrativo, político ou militar. Depois de 286 a.C. os plebiscitos passaram a ter força de lei e os tribunos tinham a atribuição tanto de propor como de vetar leis.
Tomando este exemplo, deveria ser possível ao Ministério Público, através do Procurador-Geral da República e dos Procuradores-Gerais de Justiça nos Estados, ter competência para apresentar ao Congresso Nacional e às Assembleias Legislativas, respectivamente, projetos de lei de interesse público, e até de emendas à Constituição, uma vez que exerce a função de defensor da democracia e da sociedade como um todo.
A total dedicação dos procuradores e promotores de justiça à defesa do interesse social permite-lhes saber quais sãos as medidas legislativas necessárias para melhorar as políticas públicas e garantir a defesa da sociedade.
Como órgão do Estado, o Ministério Público se confunde com ele. Sua existência está ligada à pessoa jurídica do Estado, com autonomia de vontade e objetivos que também fazer parte deste, razão pela qual os representantes maiores de cada instituição ministerial, a nível federal e estadual, devem ter a mesma legitimidade dos Poderes Executivo e Legislativo para propor leis e alterações legislativas.
O Ministério Público tem como função a defesa dos direitos sociais e garantir que os poderes públicos respeitem os direitos assegurados na Constituição ao povo. Ele é uma das instituições que garantem o desenvolvimento do regime democrático, acompanhando de perto o processo eleitoral, a fim de que as políticas governamentais dependam de eleições e respeitem a manifestação do povo. Dessa forma, ninguém melhor para ter a competência para apresentar projetos de lei de interesse social que o Ministério Público.
8.2 – sustar a execução de atos ilegais praticados por autoridades policiais;
O controle externo da autoridade policial é a única função de controle expressamente atribuída pela Constituição ao Ministério Público.Diz o texto constitucional, in verbis:
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
VII – exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no artigo anterior;
Há duas espécies de controle: o de correção e o de fiscalização. Através do primeiro é possível eliminar do ordenamento jurídico o ato ilegal, anulando ou sustando seus efeitos. O segundo consiste em verificar a prática de uma irregularidade, sugerir sua correção, e caso não atendido, requerer a outros órgãos que sanem o vício.
Além do Poder Judiciário, exerce controle de correção no Brasil o Tribunal de Contas da União. O art. 71 da Constituição Federal diz que compete ao TCU:
Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxilio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete:
IX – assinar prazo para que o órgão ou entidade adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, se verificada ilegalidade;
x – sustar, se não atendido, a execução do ato impugnado, comunicando a decisão à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal;
Assim, embora o Tribunal de Contas da União não seja parte do Poder Judiciário, pode sustar a execução de atos ilegais que digam respeito à gestão de recursos públicos, depois de ultrapassado o prazo concedido para regularização do problema.
Então, também poderia o Ministério Público, que tem a função de exercer o controle externo da atividade policial, após superado prazo estipulado para a correção de alguma irregularidade praticada por uma autoridade policial, sustar a execução do ato ilegal, principalmente quando ferir direito fundamental de algum cidadão. A Constituição não disse que o controle externo exercido pelo Ministério Público seria apenas de fiscalização, podendo a lei complementar conceder-lhe o poder de anular ou sustar atos ilícitos praticados por policiais.
O Ministério Público poderia tornar sem efeito atos relacionados à atividade-fim das polícias, como: a) apreensões de bens sem ordem judicial; b) decisões a respeito da não abertura de inquérito policial (o Ministério Público poderia determinar à autoridade policial que instaurasse o inquérito, cassando a decisão que resolveu não o instaurar), dentre outros. Ficariam de fora do controle externo do Ministério Público os atos relativos ao exercício de competência administrativa.
Tal poder não estaria isento de controle pelo Poder Judiciário, em caso de incorreto exercício. Assim, não há argumento jurídico válido que impeça que tal competência seja atribuída ao Ministério Público, o que tornaria mais eficiente o controle da atividade policial.
8.3 – convocar plebiscito e referendo para aprovação de leis, atos do Poder Executivo ou decisões judiciais;
Segundo Ferreira Filho (2006, p. 96), plebiscito é uma “consulta extraordinária e excepcional exprimindo a opinião popular sobre medidas de base ou de princípio, tais como forma de Estado ou de governo, etc.” Já o Referendo é “a decisão popular sobre lei discutida e votada pelos representante do povo. O cidadão, ao votar sim ou não a respeito do projeto oriundo do Parlamento, daria aceitação ou rejeição à medida legislativa proposta”(2006, p. 96).
Embora fosse possível pensar na possibilidade do Procurador-Geral da República poder vetar leis, tal como o fazia o tribuno da plebe, considerando que atualmente o Presidente da República é quem possui a competência de vetar leis, por questão de interesse público, outra atribuição, mais democrática, pode ser pensada.
Assim como o antigo tribuno podia convocar os comícios da plebe, onde eram votados os plebiscitos, poderia o Procurador-Geral da República ou o Procurador-Geral de Justiça nos Estados, ter competência para convocar plebiscito ou referendo, para que o povo apreciasse uma lei que pudesse contrariar os interesses sociais, e não fosse declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal ou vetada pelo Presidente da República.
O povo, mediante plebiscito, poderia igualmente apreciar decretos do Presidente da República e decisões dos tribunais superiores, como o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior Eleitoral, que tenham caráter de ato legislativo.
Exemplos desses instrumentos de democracia direta, pouco utilizados: consulta sobre o sistema de governo, ocorrida em 21/4/1993 e o plebiscito referente à proibição de comercialização de armas de fogo.
A forma de convocação, disciplinada em lei, estabeleceria requisitos como prévia aprovação por órgão colegiado do Ministério Público, assim como o número de vezes que poderia ocorrer ao ano. A convocação de plebiscito ou referendo também poderia ser feita pelo Congresso Nacional, por proposta do Ministério Público.
Institutos de democracia direta tão importantes como esse não devem ter seu uso dependente, exclusivamente, da iniciativa do Congresso Nacional. O Ministério Público, como defensor da democracia e dos direitos do cidadão, também deveria ter o poder de suscitá-los, mesmo que dependesse tal ato de autorização do Congresso Nacional, pois o povo é o verdadeiro detentor do poder, conforme diz a Constituição, em seu art. 1º, parágrafo único: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.
A possibilidade de se ampliar a possibilidade de participação popular no cenário político, através do uso de instrumentos como referendo e plebiscito, foi defendida por Benevides (1994, p. 9-10):
tenho discutido a possibilidade, no Brasil, de se ampliarem os direitos políticos para a participação direta do cidadão no processo das decisões de interesse público. É esse o sentido da defesa que faço dos mecanismos institucionais referendo, plebiscito e iniciativa popular, acolhidos na nova Constituição brasileira. Levando-se em conta a importância de tais institutos, creio que a seu respeito ainda há muito o que discutir e propor.
Isso possibilitaria ao povo brasileiro um maior controle sobre a atividade de seus representantes, nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, o que contribuiria para a efetividade do regime democrático e tornaria o povo mais presente na vida política da nação.
8.4 – aplicar multas para assegurar o exercício de suas funções;
A necessidade de o Ministério Público recorrer ao Poder Judiciário para permitir o exercício regular de suas funções faz dele uma instituição fraca, além de constituir um contratempo.
Segundo a Constituição, o Ministério Público tem competência para:
Art. 129. Omissis.
VI – expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva;
Constitui algo extremamente burocrático, uma violação ao princípio da eficiência, que procuradores e promotores, quando não são atendidos nas suas requisições, tenham que ingressar com um mandado de segurança para obter um documento.
O membro do Ministério Público deveria ter o poder de aplicar multas no exercício de suas competências extrajudiciais, como na requisição de informações, documentos e diligências. Se não atendida uma requisição, poderia ser imposta multa, em valor que não excedesse o teto dos juizados especiais cíveis, contra o responsável pela omissão. Prestada a informação, apresentado o documento ou cumprida a diligência, a multa perderia sua eficácia.
Tal instrumento seria bastante útil também na função de controle externo da atividade policial. Essa importante função hoje é exercida com bastante dificuldade pelo Ministério Público, visto que ele não pode determinar (mas apenas recomendar) às autoridades policiais que desconstituam seus atos, mesmo quando verifica um claro o desrespeito à lei. Deveria ser possível a aplicação de multa, após verificação de cometimento de alguma ilegalidade, com o objetivo de que fosse corrigida (a multa seria executada como título executivo extrajudicial, passado o prazo dado para correção do ilícito).
Se um guarda de trânsito pode impor uma multa, unilateralmente, caso constate violação a uma regra de trânsito, porque não pode o representante do Ministério Público, caso não seja atendido no exercício regular de uma requisição de informações e documentos, também poder aplicá-la?
Pode-se alegar que o Ministério Público não possui o poder de impor multas, pois não faz parte do Poder Executivo. Ocorre que os Tribunais de Contas igualmente não fazem parte do Poder Executivo e podem impor multas ao agente responsável pela ocorrência de dano ao patrimônio público, na forma do art. 71, inciso VIII, da CF.
A aplicação de multa, pelo Ministério Público, não teria o caráter de sanção. A multa seria um instrumento para assegurar o exercício de suas funções constitucionais. Seria imposta ao final de um procedimento formal, com ampla possibilidade de defesa e de questionamento junto ao Poder Judiciário.