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Processo legal devido no âmbito disciplinar.

(Des)necessidade de defesa técnica?

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11/01/2009 às 00:00
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Esta análise não pode prescindir da discussão das Súmulas 343 do STJ e a Vinculante nº 5 do STF, divergentes no que toca à obrigatoriedade de intervenção do advogado na defesa do servidor.

Sumário:Introdução. 1. Regime jurídico administrativo: os princípios da Administração. 1.1 Princípios constitucionais expressos. 1.2. Princípios reconhecidos. 2. Do processo administrativo. 2.1. Noções gerais. 2.2. Questão terminológica: processo ou procedimento?. 3. Processo Administrativo Disciplinar. 4. Das Garantias Fundamentais no Processo Administrativo. 5.1. Noções gerais. 5.2. Do Devido Processo Legal. 5. Intervenção Obrigatória do Advogado. 6. Tratamento Jurisprudencial do Tema. 6.1. O Caráter Obrigatório da Súmula. 7. Considerações Finais. 8. Referências Bibliográficas.


RESUMO

Constitui freqüente preocupação a abordagem das garantias fundamentais dos indivíduos, mormente quando se trata da relação travada com o Poder Público. Neste caso, a regência por normas de Direito Público faz surgir privilégios para o Estado em detrimento do indivíduo, como se verifica, v.g., com a supremacia do interesse público sobre o privado. O caráter cogente do regime jurídico de Direito Público, entretanto, não tem o condão de afastar, plenamente, os direitos e garantias individuais asseguradas pelo Estado Democrático de Direito. Neste contexto, o presente estudo tem por objeto breve análise acerca do processo administrativo disciplinar no âmbito da Administração Pública Brasileira e das garantias deferidas ao servidor processado, principalmente o devido processo legal, e seus consectários lógicos do contraditório e da ampla defesa. Esta análise, por óbvio, não pode prescindir da discussão em derredor das súmulas 343 do Superior Tribunal de Justiça e a vinculante nº 05 do Supremo Tribunal Federal, divergentes entre si no que toca à obrigatoriedade de intervenção do advogado na defesa do servidor processado.

PALAVRAS CHAVE: Processo Administrativo Disciplinar. Garantias Fundamentais. Devido Processo Legal. Participação obrigatória de advogado.


RESUMEN

Constituye frecuente preocupación el abordaje de las garantias fundamentales de los individuos, sobre todo cuando se trata de la relación com El Poder Publico. Em este caso, regirse por normas de Derecho Publico hace surgir privilégios para El Estado em perjuicio del individuo, como se verifica, v.g. con la supremacia del interes publico sobre el privado. El carácter impositivo del régimen jurídico de Derecho Publico, sin embargo no tiene el poder de alejar, plenamente, los derechos y garantias individuales aseguradas por el Estado Democrático de Derecho. En este contexto, el presente estúdio tiene por objetivo um breve análisis respecto al proceso administrativo disciplinário em el âmbito de la Administración Publica Brasilera y de lãs garantias ofrecidas al servidor procesado, principalmente el debido proceso legal, y sus consecuentes lógicos de lo contradictório y de la amplia defensa. Este análisis, obviamente, no puede prescindir de la discusión en torno de las sumulas 343 del Superior Tribunal de Justicia y la vinculante No. 05 del Supremo Tribunal Federal, divergentes entre si respecto a la obligatoriedad de la intervención del abogado em defensa del servidor procesado.

PALAVRAS CHAVE: Procedimiento Administrativo Disciplinario. Garantias Fundamentales. Debido Proceso Legal. Obligatoriedad de la intervención del abogado.


INTRODUÇÃO

Desde que se consolidaram as bases do Estado Democrático de Direito, vêm-se buscando garantir, cada vez mais, e a um maior número de indivíduos, o pleno exercício dos direitos fundamentais [01].

Nesse sentido, afigura-se de grande relevância, a abordagem do processo administrativo, pois se torna inadmissível o exercício da função administrativa sob resquícios de governos ditatoriais e a depender, exclusivamente, do arbítrio do administrador público.

No sistema administrativo brasileiro ainda se notam reminiscências de arbitrariedades, maculando direitos fundamentais e ensejando a busca pelas contendas judiciais, de modo a se permitir o exercício de tais direitos.

A este respeito, é de se reconhecer que a Constituição Federal de 1988, amparada nas bases do Estado Democrático de Direito, trouxe em seu texto a garantia do regular processo, tanto na esfera judicial, como administrativa [02].

Percebe-se, daí, o atual paradigma do processo administrativo, tendente à publicização da função administrativa, mas traduzida como uma garantia constitucional dos administrados perante outrem e, notadamente, em face da Administração Pública. [03]

À guisa de esclarecimento, cumpre registrar a existência de dissenso no que tange à terminologia "processo administrativo". Para uns, cuida-se de procedimento administrativo, relegando-se a expressão "processo" apenas para as lides judiciais. Para outros, cujo entendimento se encontra perfilhado no curso deste trabalho, "processo" é expressão utilizada na totalidade das atividades estatais, como mecanismo de legítimo exercício do poder. [04]

Na sistemática doutrinária atual, sobrevive, em caráter minoritário, a expressão procedimento administrativo [05], em detrimento da terminologia "processo", malgrado ainda se observem reminiscências daquel’outra, v.g. da lei paulista, que opta por utilizar "procedimento administrativo". [06]

Ressalte-se, contudo, que tal incidência permeia a disciplina geral do processo administrativo, impondo-se, por conseguinte, a menção àqueles de aplicação específica na órbita disciplinar [07]. A este respeito, tanto mais se faz imperiosa a observância à "razoável duração do processo", inserta pela EC 45/04, entre as garantias processuais fundamentais, não obstante se lhe deva fazê-lo em consonância com os princípios basilares do Direito Administrativo, notadamente a legalidade e a supremacia do interesse público sobre o privado.

Assim, embora exista regramento normativo genérico acerca do processo administrativo (lei 9784/99), o objeto desta análise estará restrito à seara administrativo-disciplinar, sob amparo da Lei Federal 8112/90, e das legislações estaduais atinentes aos servidores públicos.

Carvalho Filho, após discorrer sobre os princípios da proporcionalidade e da motivação como base do sistema punitivo da Administração Pública, acrescenta-lhes "o princípio do contraditório e da ampla defesa, fundado no art. 5º, LV da CF, que, além de não poder ser postergado, deve incidir toda vez que a Administração aplica sanção a seus servidores" [08]

Cumpre registrar a decisão do TJ-SP:

A aplicação de penas de repreensão a servidores, sem que lhe seja dada oportunidade de defesa, é inadmissível em face do direito constitucional assegurado a todos, previsto no art. 5º, LV da CF (AP. Civ. Nº 008.025/0, 4ª Cam. de Direito Público, Rel. Dês. Aldemar Silva, j. em 11/12/1997).

Como forma de se assegurar a efetividade das garantias do contraditório e da ampla defesa, vinha-se compreendendo a necessidade de patrocínio dos processos administrativos disciplinares por profissional habilitado, entendimento este que chegou a ser sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça:

Súmula 343 STJ: é obrigatória a presença de advogado em todas as fases do processo administrativo disciplinar.

Contudo, pouco tempo após a edição da supramencionada súmula, o Supremo Tribunal Federal, órgão de cúpula do Poder Judiciário, utilizou-se do instrumento de uniformização introduzido pela EC 45/2004 – súmula vinculante 05 para estabelecer, em caráter vinculante, que a "falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo não ofende a Constituição".

Desse modo, é de se compreender a validade dos processos disciplinares sem a participação dos advogados, relegando a defesa, nestes casos, ao "patrocínio" por servidores defensores dativos, ou ao próprio servidor, quando não lhe acudam recursos necessários à contratação do profissional.

Assim, estará o Poder Judiciário afastado do controle dos atos decisórios, ou ainda se poderão argüir princípios constitucionais ou o livre convencimento do juiz, para se garantir a ampla e devida defesa?


1.REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO

Amparada pelas bases principiológicas do Estado de Direito, a discussão em derredor da criação do Direito Administrativo permeia a modificação da própria ideologia vigente à época. Ao permitir-se a limitação dos poderes do soberano [09], percebe-se a transmutação do sentido do "governo do Rei" em detrimento do "governo da Lei".

Desse modo, é de se reconhecer que o princípio existencial do Direito Administrativo é, especificamente, a garantia dos direitos dos administrados, outrora cognominados súditos, frente aos demais e também perante a própria Administração Pública.

Acerca da formação do Direito Administrativo, leciona Osvaldo Aranha Bandeira de Mello:

Constitui disciplina própria do Estado Moderno, ou, melhor, do chamado Estado de Direito, porque só então se cogitou de normas delimitadoras da organização do Estado-Poder e da sua ação, estabelecendo balizas às prerrogativas dos governantes, nas suas relações recíprocas e, outrossim, nas relações com os governados. Na verdade, o Direito Administrativo só se plasmou como disciplina autônoma quando se prescreveu processo jurídico para atuação do Estado-poder, através de programas e comportas na realização das suas funções [10].

Perfilhando este entendimento, defende Celso Antônio Bandeira de Mello

Portanto, o Direito Administrativo não é um Direito criado para subjugar os interesses ou os direitos dos cidadãos aos do Estado. É, pelo contrário, um Direito que surge exatamente para regular a conduta do Estado e mantê-la afivelada às disposições legais, dentro desse espírito protetor do cidadão contra os descomedimentos dos detentores do Poder estatal [11]

A adoção de regime jurídico pela Administração Pública traz a lume, principalmente, a inserção de prerrogativas especiais em seu favor e sob fundamento da proteção ao interesse público.

No âmbito da doutrina alienígena, destaca-se a concepção da potestade administrativa preponderante no regime jurídico de direito público trazida por Juan Carlos Cassagne:

La prerrogativa se ubica es un plano superior a la relación jurídica singular siendo un poder abstracto general e irrenunciable, cuyo fundamento emana del ordenamiento juridico del Estado. No hay que confundir, entonces, la prerrogativa con El acto de su ejercicio respecto de una relación jurídica determinada o individualizada, porque ella no es un elemento de la relación, como es el derecho subjetivo o el interés legitimo [12]

Nesta esteira de entendimento, conquanto se admita a observância do regime jurídico de direito privado, marcado pela horizontalidade na relação jurídica, a predominância na Administração Pública é do regime jurídico administrativo, emanado das normas de direito público, donde ressaltam, sobremaneira, os princípios da supremacia do interesse público sobre o privado, e da indisponibilidade do interesse público.

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Discorrendo acerca das peculiaridades incidentes sobre a atividade administrativa, Renato Alessi entende que a posição de superioridade conferida à Administração Pública, no exercício do poder de império, tem seus efeitos relacionados à satisfação dos interesses públicos. Assim,

"mientras el ejercicio de los poderes conferidos al particular no puede tener eficácia más allá de la esfera jurídica de su titular, o de sus titulares cuando se trate de manifestaciones plurilaterales (dada la situación de igualdad de los particulares entre si, situados en un mismo plano), el ejercicio del poder conferido a la Administración publica, en cambio, dada su supremacia jurídica, puede entenderse a la modificación de la esfera jurídica de sujetos extraños, subordinados, mediante manifestaciones unilaterales de poder, por parte de la Administración" [13]

A este respeito, Osvaldo Aranha Bandeira de Mello expõe a manifestação unilateral de vontade como regra nas relações estatais, inclusive no que concerne aos ajustes bilaterais estabelecidos em razão de acordo de vontades entre o Estado e particulares, pois, também neles, incide o regime jurídico de caráter estatutário. Para ele,

Portanto, a autonomia de vontade só existe na formação do ato jurídico. Porém, os direitos e deveres relativos à situação jurídica dela resultante, sua natureza e extensão, são regulamentados por ato unilateral do Estado, jamais por disposições criadas pelas partes – isto é, através de processos técnicos de imposição autoritária da sua vontade, estabelecendo as normas adequadas e conferindo poderes próprios para atingir seu fim de realização do bem comum [14].

Neste sentido, e consoante se mencionou alhures, enquanto no direito privado as relações jurídicas apresentam características de horizontalidade, amparadas sob o manto da igualdade, no âmbito do direito público, o Estado assume, de regra, uma relação de superioridade frente aos particulares com os quais se envolve, a tal ponto que a aquiescência destes às cláusulas unilateralmente determinadas pelo Poder Público é a única forma de manifestação volitiva numa relação contratual.

A este respeito, Celso Antônio Bandeira de Mello:

O regime jurídico de direito público resulta da caracterização normativa de determinados interesses como pertinentes à sociedade e não aos particulares considerados em sua individuada singularidade.

Juridicamente, essa caracterização consiste, no Direito Administrativo, segundo nosso modo de ver, na atribuição de uma disciplina normativa peculiar que, fundamentalmente, se delineia em função da consagração de 2 princípios:

a)supremacia do interesse público sobre o privado;

b)indisponibilidade, pela Administração, dos interesses públicos [15].

Nesta análise, há que se perquirir sobre a atuação administrativa do Estado, sobretudo no que tange à supremacia do interesse público, sob pena de se consolidarem situações de abuso de poder estatal sob a alegação de se tratar de preponderância do interesse coletivo.

Por isso, tanto maior deve ser a exigência da aferição legal nos atos administrativos, encontrando-se referências da observância da legalidade como requisito de validade da atuação da Administração Pública. [16].

Aliás, como dito alhures, o Direito Administrativo se traduz em importante mecanismo de proteção dos cidadãos contra arbitrariedades do Poder Público.

Interessante é observar a análise de Celso Antônio Bandeira de Mello no que pertine ao interesse público, considerado como "interesse do todo", "função qualificada do interesse das partes", em detrimento d’outra concepção donde exsurge como "realidade independente", desatrelada do aspecto social. Assim, leciona:

Veja-se um indivíduo pode ter, e provavelmente terá, pessoal – e máximo – interesse em não ser desapropriado, mas não pode, individualmente, ter interesse em que não haja instituto da desapropriação, conquanto este, eventualmente, venha a ser utilizado em seu desfavor [17].

Nesta via interpretativa, e consoante já mencionado, o interesse público se constitui em um plexo resultante das vontades individuais dos componentes daquele corpo social, razão pela qual se haverá que distinguir o interesse público do interesse do Estado, posto que este somente será legitimamente considerado se se equiparar àquele interesse resultante da vontade coletiva e para o qual se admite a minoração dos interesses individualizados.

Desse modo, os princípios, como "vetores" a serem seguidos no desenvolver de um ramo jurídico, remontam à norma de orientação dos aplicadores e intérpretes do Direito [18].

1.1. Princípios Constitucionais Expressos:

A este respeito, e considerando a importância do Direito Administrativo na organização sócio-política do país, coube à Constituição Federal, no "caput" do artigo 37, elencar os cinco princípios basilares: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, os quais, erigidos ao patamar constitucional, constituem-se em sustentáculos do desenvolvimento e estudo da atividade administrativa estatal.

É de se reconhecer, inicialmente, que o princípio da legalidade assume feição distinta daquela referenciada no inciso 2º do artigo 5º da Constituição Federal. Aqui, o paradigma da legalidade adota concepção estrita, através da qual o comportamento do administrador público deve estar discriminado pela norma, enquanto que, no artigo 5º, a garantia da legalidade permite aos cidadãos atuar livremente, salvo quando existir determinação legal em sentido contrário.

No Estado de Direito, a Administração Pública se encontra atrelada aos regramentos normativos, subsumindo sua atuação à vontade do legislador. A este respeito, calha a transcrição do entendimento de Renato Alessi, presente nas lições de Celso Antônio Bandeira de Mello:

"tal subordinação [do administrador à lei] que concretiza o princípio da necessária legalidade da atividade administrativa, é entendida antes de mais nada em sentido negativo: vale dizer, no sentido de que a atividade administrativa encontra um limite formal insuperável na lei, a qual pode estabelecer proibições a determinadas atividades, tanto no que concerne às finalidades a cumprir quanto no que respeita os meios e às formas a serem seguidas para tal escopo; mas, é entendida, além disso e sobretudo, em sentido positivo: e isto não apenas no sentido de que a lei pode vincular positivamente a atividade administrativa a determinados meios ou formas, mas, ademais, no sentido de que, como melhor se verá na ocasião oportuna, a administração, particularmente no que concerne a atividade de caráter jurídico, pode fazer tão somente o que a lei consente" [19]

Assim, ressalvadas as situações excepcionais da discricionariedade administrativa, tolhida, de todo modo, pelos limites impostos pela lei, o administrador público haverá de se ater à conduta vinculada disposta na norma, como um dos fundamentos de sua atuação enquanto gestor do patrimônio coletivo.

A menção constitucional ao princípio da impessoalidade advém de uma faceta da isonomia constitucional, vedando à Administração Pública o tratamento diferencial aos administrados, quando apresentados em igual situação jurídica. Isto é, o princípio da impessoalidade importa no tratamento equânime aos administrados, afastando-se a concessão de privilégios para uns em detrimento de outros, e do próprio interesse público.

De outra sorte, o princípio da moralidade importa na aplicabilidade dos preceitos éticos para o exercício da função administrativa, valendo-se mencionar que:

Segundo o STF, o princípio da moralidade administrativa revela-se como valor constitucional impregnado de substrato ético e erigido à condição de vetor fundamental que rege as atividades do Poder Público, que representa o verdadeiro pressuposto de legitimação constitucional dos atos emanados do Estado, como resulta da proclamação inscrita no art. 37 caput da Constituição da República. Nesse contexto, o desrespeito ao princípio da moralidade administrativa faz instaurar situações de inconstitucionalidade [20].

Neste raciocínio, prossegue Dirley da Cunha Júnior:

Ainda em consonância com aquela Corte, atividade estatal, qualquer que seja o domínio institucional de sua incidência, está necessariamente subordinada à observância de parâmetros ético-jurídicos que se refletem na consagração constitucional do princípio da moralidade administrativa. Esse postulado fundamental, que rege a atuação do Poder Público, confere substância e dá expressão a uma pauta de valores éticos em que se funda a ordem positiva do Estado. É por essa razão que o princípio constitucional da moralidade administrativa, ao impor limites ao exercício do poder estatal, legitima o controle jurisdicional de todos os atos do Poder Publico que transgridam os valores éticos que devem pautar o comportamento dos órgãos e agentes governamentais [21]

Respeitando-se a valoração ético-jurídica da atividade administrativa, o princípio da publicidade decorre da ampla necessidade de transparência administrativa, tanto mais quando se admite a possibilidade de controle desta atividade pelos demais Poderes do Estado e pelo próprio cidadão. Neste diapasão, exige-se, portanto, que todos os atos administrativos sejam públicos, através dos mecanismos oficiais (Diário Oficial, sítio na Internet), ressalvando-se somente as situações em que tal publicidade importar em prejuízos à Segurança Nacional ou violação dos direitos de personalidade dos indivíduos, hipóteses nas quais se admitirá a sua mitigação.

Por fim, o princípio da eficiência advém da reforma administrativa introduzida pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998, podendo ser traduzido, na esteira do entendimento de Maria Silvia Zanella Di Pietro em dois aspectos:

pode ser considerado em relação ao modo de atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atribuições, para lograr os melhores resultados; e em relação ao modo de organizar, estruturar, disciplinar a Administração Pública, também com o mesmo objetivo de alcançar os melhores resultados na prestação do serviço público [22]

Em verdade, esta reforma administrativa implementada pelas Emendas Constitucionais 19 e 20 na Carta Brasileira buscou a modificação do paradigma do Estado, que passaria da gestão burocrática para o modelo gerencial da máquina administrativa, utilizando-se de instrumentos típicos do Direito Privado para a melhoria das atividades administrativas, as quais, de forma lamentável, tradicionalmente, vêem-se impregnadas pela lentidão, incompetência e descaso, típicos do exercício da atividade pública.

A eficiência, portanto, tal como o significado do próprio vocábulo, impõe ao servidor público o dever de agir com presteza, atuando de forma a atingir a finalidade intencionada pela lei, o atendimento do interesse público, traduzido como o real interesse da comunidade.

1.2. Princípios reconhecidos:

Conquanto não se possam definir taxativamente todos os princípios que são reconhecidos no âmbito do Direito Administrativo, optou-se, para os fins específicos deste trabalho, por ressaltarem-se somente os princípios da supremacia do interesse público sobre o privado e da indisponibilidade do interesse público, considerados como basilares do regime jurídico de direito público.

Deste modo, pode-se considerar como marco da supremacia do interesse público, o abandono das concepções individualistas do ordenamento jurídico no final do século XIX, quando o Estado passou a significar também o instrumento de consecução da justiça social. Assim é que se considera o referido princípio como aquele através do qual os interesses individuais dos administrados são mitigados em razão da preponderância do interesse público, considerado como o plexo resultante das vontades individualizadas.

Por seu turno, o princípio da indisponibilidade do interesse público advém da finalidade pública determinante da atividade administrativa pois, no exercício da função administrativa, é vedado ao administrador o uso de práticas com intuito pessoal em detrimento da coletividade, sob pena de se caracterizar o desvio da finalidade pública.

A indisponibilidade do interesse público, por conseguinte, se constitui na impossibilidade de disposição ou transação da finalidade coletiva pelo administrador, sendo forçoso reconhecer que o gestor não administra os recursos estatais como próprios, mas se deve entender como instrumento de efetivação dos interesses gerais da sociedade que representa.

Analisado, ainda que superficialmente, o regime jurídico da Administração Pública, passar-se-á agora à abordagem da temática da função administrativa, especificamente no que tange à formalização procedimental de sua atuação.

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Sobre a autora
Bartira Pereira Dantas

Doutoranda em ciências jurídicas e sociais pela Universidade Del Museo Social Argentino,especialista em direito pela Escola de magistrados da Bahia- EMAB/UCSAL, Servidora pública do Tribunal de Justiça da BA, professora universitária

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DANTAS, Bartira Pereira. Processo legal devido no âmbito disciplinar.: (Des)necessidade de defesa técnica?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2020, 11 jan. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12190. Acesso em: 23 abr. 2024.

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