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A abstrativização do controle concreto de constitucionalidade e o papel do Senado Federal

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11/02/2009 às 00:00
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3 A ABSTRATIVIZAÇÃO DO CONTROLE CONCRETO DE CONSTITUCIONALIDADE E O PAPEL DO SENADO FEDERAL

Cumprindo uma formalidade, mas aproveitando o ensejo para despertar curiosidade para nossa proposta, temos por bem abrir as razões pelas quais, no universo do Direito Público, simpatizamos pelo controle de constitucionalidade, com ênfase à matéria afunilada.

Nos tempos atuais, são incontestes a relevância e a visibilidade do controle constitucional das leis no cenário nacional, seja porque o ofício constitui função precípua do Supremo Tribunal Federal, que, diga-se de passagem, atravessa período de reformulação de sua jurisprudência, mormente pela alteração de sua composição, seja em razão da repercussão de seus excertos na mídia e na sociedade, ou, quiçá, pelo ressabido insucesso da produção legiferante brasileira.

Concertamos que é mais fácil e prazeroso casarmos com assuntos novos em vez dos remotos, os quais têm de ser conhecidos, mas se revelam pouco atraentes para o aprofundamento.

Nosso ensaio foi projetado a partir desta auto-reflexão: o sistema tradicional pátrio de controle das normas evoluiu? Realmente existe o fenômeno de aproximação dos controles concreto e abstrato?

Adiantamos que o tema é polêmico, envolvendo a doutrina e a jurisprudência do STF. Todavia, avoca-se a responsabilidade de cotejar a mais atualizada coletânea, a qual propiciará a melhor visualização do contexto.

Julgamos de grande valia, para o início desta trajetória, o exame da participação do Senado Federal na jurisdição constitucional pátria.

3.2 O SENADO FEDERAL E O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE BRASILEIRO

Aspiramos, com este ponto, favorecer a inserção do âmago do trabalho. Seria desconfortante avançarmos com a celeuma desprovidos desses conceitos.

Rememorando, aludimos, no primeiro capítulo, que, via de regra, as decisões incidentais do STF possuem efeitos inter partes e ex tunc. Por outro lado, são despidas de eficácia vinculante.

Na ocasião, salientamos os aspectos negativos desse modelo, quais sejam, o crescimento das demandas e o risco de decisões conflitantes. Cogita-se de tais problemas pelo fato da ausência de eficácia geral e vinculativa dos pronunciamentos difusos, simplesmente porque o Brasil não incorporou essa orientação do stare decisis norte-americano.

Para solucionar o impasse, a Constituição Federal de 1934 presenteou as decisões do STF com os reivindicados efeitos erga omnes e vinculante através da outorga, ao Senado Federal, de competência para suspender a execução da norma declarada inconstitucional pela Corte [194].

A citada Lei Máxima impingiu modificações nas prerrogativas do Órgão Legislativo. Realçamos a que lhe conferiu a veste de Coordenador dos Poderes entre si, alocando-o acima das três funções do Estado. Forte nisso, entendia-se que a atribuição para suspender a execução das normas declaradas inconstitucionais pela Corte estava em perfeita sintonia com o status assumido pelo Senado.

Nesse sentido, anota Castro que a participação da Alta Casa Legislativa "no controle de constitucionalidade das leis não colidia com o sistema de controle exercido pelo Poder Judiciário, nem com o princípio da separação dos Poderes" [195]. Muito ao contrário, servia, justamente, para manter a integridade da tripartição das funções do Estado.

O motivo pelo qual se entabulou a intervenção senatorial foi o temor que representava, na época, o fantasma do chamado "governo dos juízes". Buscou-se, então, intensificar a fiscalização incidental, harmonizando as competências do Poder Judicante, sem depreciar o Legislativo [196].

É oportuno mencionar que, com exceção da Lei Magna de 1937, todas as demais mantiveram o texto normativo, com pequeno acréscimo apenas. As Constituições de 1946, 1967, a EC nº 1/69, inclusive a atual, de 1988, deram nova redação ao dispositivo, adicionando a expressão "por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal" [197].

A propósito, veja-se o teor do art. 52, X, da atual CF, verbis:

Compete ao Senado Federal:

X – suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal [198].

Ressaltadas as feições históricas, debruçar-nos-emos sobre os aspectos práticos da atividade senatorial no cotejo das normas.

Preliminarmente, queremos arredar a incerteza que paira sobre a extensão desse mister. Afinal de contas, a competência do Senado Federal está circunscrita ao controle difuso ou atinge, também, o controle concentrado? Podemos antecipar que a resposta é relativamente tranqüila [199].

Ainda sob a égide constitucional anterior, o STF entendia que a comunicação ao Senado era obrigatória tão-somente nas hipóteses de declaração incidental de inconstitucionalidade, dispensando-a para o reconhecimento principal, já que essa decisão, por si só, afastava a norma incompatível [200].

Esse entendimento prevalece até os dias presentes, mesmo porque as decisões definitivas em controle concentrado foram brindadas com os efeitos erga omnes e vinculante pelo próprio texto constitucional vigente – vide § 2º do art. 102.

Dessarte, quando estivermos aventando a participação do Senado Federal no cotejo das normas, sinal que o controle difuso está em pauta.

A competência para notificar o Órgão Legislativo acerca da decisão final está franqueada não só ao STF, o qual deverá fazê-lo após o trânsito em julgado [201]. A doutrina [202] imputa, igualmente, ao Procurador-Geral da República a atribuição de cientificar aquele órgão. A própria Casa Legiferante, tomando conhecimento da decisão da Corte, poderia instaurar, de imediato, procedimento para a suspensão da lei inconstitucional [203].

Avançando, o instrumento do qual se vale o Senado para afastar a lei incompatível é a resolução. A esse respeito, asseveram Paulo e Alexandrino [204]:

Essas matérias da competência privativa do Senado Federal são disciplinadas por resolução dessa Casa Legislativa, promulgada pelo presidente de sua Mesa, sem nenhuma interferência da Câmara dos Deputados ou do Presidente da República.

Observa-se, desde logo, que a tarefa analisanda é exclusivamente para suspender a execução da lei e não para declarar a própria inconstitucionalidade. Repisa-se que a Constituição de 1988 adotou o sistema jurisdicional misto. A conferência feita ao Senado não é capaz de transmudar o sistema para misto, no qual o controle é judicial e político. Já superamos esses poréns no capítulo inaugural.

Encontra-se, bem assim, divergência firmada sobre a amplitude da expressão "lei", contida no art. 52, X, do mandamento constitucional.

No caminho da doutrina predominante [205], estão abrangidos pela regra os atos normativos desconformes com a Constituição. Não há como negar que o Senado Federal possui aptidão para apartar a execução de quaisquer leis ou atos normativos declarados inconstitucionais, incidenter tantum, pelo Supremo Tribunal Federal, sejam federais, estaduais, distritais ou municipais.

Remanesce debate entre os especialistas acerca da exegese da manifestação "no todo ou em parte", constante da Constituição, no mesmo artigo acima aludido. Poderia o Senado ampliar, interpretar ou restringir a extensão da decisão do STF?

Posição minoritária sustenta que o Órgão Legiferante não está condicionado aos limites delineados pela Corte [206]. Entretanto, majoritariamente, desconhece-se que tal órgão possua superpoderes, de maneira que estaria ele, sim, adstrito aos parâmetros da decisão do STF.

Nesse sentido, posiciona-se Lenza [207]:

se toda a lei foi declarada inconstitucional pelo STF, em controle difuso, de modo incidental, se entender o Senado Federal pela conveniência da suspensão da lei, deverá fazê-lo "no todo", vale dizer, em relação a toda a lei que já havia sido declarada inconstitucional, não podendo suspender menos do que decidido pela Excelsa Corte.

Esgotamos, aqui, as noções genéricas da contribuição do Senado Federal para o controle concreto de constitucionalidade. Não se olvide que, voluntariamente, seccionamos a matéria, reservando para exame mais detalhado os temas afetos à proposta central.

3.3 OS EFEITOS SUBJETIVO E VINCULANTE DAS DECISÕES DO STF EM CONTROLE CONCRETO

Eis o cerne do trabalho.

À medida que avançarmos com os novos estudos, as indagações pendentes nos capítulos anteriores quedar-se-ão solvidas. É chegado o momento de apagarmos as dúvidas e incertezas, bem como saciarmos as expectativas.

Com o escopo de facilitar a compreensão da problemática, demarcamos a abordagem da seguinte forma: analisaremos duas frentes, uma que chamaremos clássica (positivista) e outra moderna (construtivista), cada qual a seu tempo.

Livre da pretensão de ser evasivo e/ou contraditório, por questão didática, opta-se por introduzir o tema através de nova indagação: é imprescindível que haja a suspensão da execução da lei ou ato normativo pelo Senado Federal para que as decisões concretas do Supremo Tribunal Federal atinjam eficácia erga omnes e efeito vinculante?

Tudo dependerá da teoria adotada.

3.3.1 Teoria clássica ou positivista

Levando-se em conta a estrutura sobre a qual se alicerça esta teoria – reavive-se o que foi trabalhado no item 3.2 supra – sim, seria indispensável a edição da resolução pelo Senado para que os pronunciamentos incidentais do STF alcançassem os efeitos erga omnes e vinculante.

Não se ignora que as decisões concretas da mais Alta Corte prestam-se a vincular tão-somente as partes litigantes. Com efeito, a expansão do decisium será atingida logo que suspensa, pelo Senado Federal, a executoriedade da lei declarada inconstitucional. Esse é o comando do art. 52, X, da CF, norma que está em plena vigência.

Partindo-se da afirmação da competência do Senado no cotejo difuso, a doutrina clássica hesita sobre a natureza dessa atribuição, a qual poderia ser vinculada ou discricionária.

A questão é tormentosa. Os positivistas dividem-se em duas facções. Vejamo-las.

Predomina a interpretação de que a suspensão da execução da lei inconstitucional é questão optativa do Órgão Legislativo. Atividade discricionária, portanto.

Para essa vertente, o conceito de obrigatoriedade (vinculação) seria incompatível com a natureza jurídica do ato em si, que é política.

Dentre os simpatizantes do entendimento estão Luiz Alberto David Araújo, Michel Temer, Paulo Napoleão Nogueira da Silva, Nagib Slaibi Filho e o ex-Ministro Paulo Brossard [208]; Oswaldo Aranha Bandeira de Mello, Themístocles Cavalcanti, Elival da Silva Ramos, Celso de Mello Filho e Alexandre de Moraes [209]; Pedro Lenza [210], Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino [211], Sylvio Motta e Gustavo Brachet [212 entre outros.

Exemplificativamente, anote-se a lição de Siqueira Jr. [213]:

Podemos concluir que a suspensão da execução de lei declarada inconstitucional é atividade privativa e discricionária do Senado Federal. O Senado atua como órgão político, verificando por critérios de conveniência e oportunidade o momento adequado para suspender a execução da norma. O Senado exerce função política e sua independência, que se traduz na não-obrigatoriedade da suspensão da execução, tem como fundamento o princípio da separação dos poderes.

No seio jurisprudencial, o próprio STF comunga dessa orientação [214], argumentando com a cláusula da separação dos Poderes. Enfim, não se poderia coagir o órgão legislativo a exercer o mister.

Outrossim, não é outra a posição do Senado Federal, o qual, inclusive, certa feita, negou-se a cumprir seu desiderato [215].

Por outro lado, minoritariamente, alguns renitentes sustentam a vinculatividade da tarefa do Senado Federal, dentre os quais sobressaem-se Lúcio Bittencourt, Manoel Gonçalves Ferreira Filho, Alfredo Buzaid, Celso Bastos, Zeno Veloso e Lenio Streck [216].

Consoante esse expoente, a Alta Casa Legiferante não teria a faculdade, mas o "dever jurídico-constitucional de suspender a execução do ato declarado inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal" [217].

Demais, os extremos também discordam quanto à existência de prazo para o Senado Federal editar a resolução suspensiva.

A primeira – pela discricionariedade da atuação senatorial –, advoga a inexistência de lapso para manifestação legislativa. Logra-se vitoriosa, porquanto a Constituição Federal não prevê prazo algum para o desempenho da competência, muito menos sanção por descumprimento.

Por outro lado, a que sustenta a vinculatividade não esquece a carência formal de prazo, porém, aconselha que a publicação da resolução deva se dar "logo após a ciência pelo Senado da decisão do Supremo Tribunal" [218].

Verificamos celeuma, igualmente, na possibilidade de o Senado Federal revogar a resolução suspensiva.

Pela negativa, busca-se referência a acórdão antigo do STF, o qual exara que a resolução seria irrevogável, uma vez que o Senado esgotaria sua competência no instante em que deliberasse pela suspensão [219]. A doutrina respalda esse entendimento [220].

Em contrapartida, os defensores da viabilidade da revogação, cingem-se aos casos de mudança na jurisprudência da Suprema Corte.

Afinal, impõe-se um último registro sobre a teoria clássica, concernente ao efeito temporal da resolução legislativa.

Tratamos do assunto no capítulo exordial. Entretanto, nunca é demais rememorar que a doutrina [221] é simpática à produção de efeito ex nunc – prospectivo ou pro futuro – pela resolução senatorial, a qual suspende a execução da lei inconstitucional.

Essas são as linhas tracejadas pela primeira corrente, a qual atribuímos a qualidade dominante, porque alicerçada na praxe forense e, sobretudo, na vigência do art. 52, X, da Constituição Federal.

3.3.2 Teoria moderna ou construtivista

Pela nomenclatura podemos conceber que esta teoria contrapõe-se, radicalmente, à anterior.

O estudo dessa tese revela o objetivo maior desta monografia. Por conta disso, preencherá fartas páginas até o encerramento do capítulo.

Compulsando a bibliografia pertinente, a depender do autor explorado, o assunto pode tomar denominações variadas. Contemplem-se algumas: teoria da transcendência dos motivos determinantes da sentença no controle difuso [222]; objetivação do recurso extraordinário [223]; concentração da justiça constitucional via generalização dos efeitos do recurso extraordinário [224]; predominância do controle concentrado em relação ao controle difuso [225]; abstrativização do controle concreto [226].

Preferimos a última, simplesmente pela crença de que sua tradução, por si, fornece uma visão ampla da matéria em pauta. O título mostra-se auto-revelador, pois abstrativizar o controle concreto passa uma idéia de aproximação entre os modelos, de modo que a hegemonia penderia para o controle abstrato.

Os modernistas procuram responder à indagação lançada no item 3.3, in fine, a partir de uma construção argumentativa, a qual prega não só a dispensabilidade da participação substancial do Senado Federal na jurisdição constitucional pátria, como a produção dos efeitos erga omnes e vinculante, de per si, pela decisão concreta do STF.

Para a consecução desses objetivos, lança mão da necessidade da reparação de eventuais incoerências constantes do sistema brasileiro de cotejo das normas, mormente do controle concreto.

A principal desarmonia estaria na dicção do art. 52, X, da CF. A teoria moderna propõe uma releitura do papel do Senado Federal no controle concreto, notadamente porque a interpretação que lhe fora conferida não se coadunaria mais com a ordem constitucional coetânea, revelando exemplo clássico de mutação constitucional [227].

Essa corrente vem encabeçada pelo atual Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Gilmar Ferreira Mendes, pioneiro no estudo [228].

Realçamos dois motivos pelos quais a tese de Mendes assume contornos atraentes na órbita constitucional: primeiro, porque ano a ano vem galgando espaço

dentre os doutrinadores de peso na seara constitucionalista, os quais serão nomeados oportunamente; depois, pelo fato de que essa tendência bateu às portas da Suprema Corte, a qual, embora timidamente, aplicou o novel modo de pensar o controle concreto.

Para facilitar o acompanhamento, elegemos pontuar todos os fundamentos que embasam esta corrente, apartando as críticas para o final.

Em primeiro lugar, assentam os construtivistas que o motivo pelo qual a Constituição de 1934 inseriu a participação do Senado Federal no controle concreto – a separação dos Poderes – encontrar-se-ia superado, em face da ampliação do controle abstrato. A intervenção legislativa no cotejo das normas, nos dias de hoje, exemplificaria uma incoerência sistêmica.

Nesse sentido, registra Cunha Júnior [229]:

De efeito, num sistema em que se adota um controle concentrado-principal, e as decisões de inconstitucionalidade operam efeitos erga omnes e vinculantes, a participação do Senado para conferir eficácia geral às decisões do Supremo Tribunal Federal, prolatadas em sede de controle incidental, é providência anacrônica e contraditória.

Desde a década de trinta, a jurisdição constitucional objetiva evoluiria gradualmente, cujo marco seria a instalação definitiva do controle concentrado no País, em 1965, com a EC nº 16 à Constituição de 1946. Ter-se-ia iniciado uma marcha pela fortificação desse modelo.

A mola propulsora teria sido a ampliação da legitimidade para a propositura da ADI, pelo art. 103 da Constituição Federal de 1988. Ao tempo em que se retirava o monopólio do Procurador-Geral da República, estar-se-ia alargando a importância do modelo concentrado, o qual passaria a solucionar praticamente todas as questões constitucionais relevantes afetas ao STF.

Anos mais tarde, por intermédio da EC nº 3, de 17 de março de 1993, ampliou-se o rol das ações diretas, com o advento da ADC. Agregar-se-ia força ao complexo objetivo de cotejo das normas.

A propósito, a objetividade característica do controle concentrado permitir-lhe-ia vestir os adjetivos da presteza e celeridade, a exemplo da prerrogativa da suspensão liminar da eficácia do ato normativo impugnado – § 1º do art. 11 da Lei nº 9.868/99. Como se denota, essa medida exalaria efeitos gerais. Em contrapartida, ressabido que o modelo difuso não conta com tal privilégio.

Sobre esse apontamento, reflete Mendes [230]:

Se o Supremo Tribunal Federal pode, em ação direta de inconstitucionalidade, suspender, liminarmente, a eficácia de uma lei, até mesmo de emenda constitucional, por que haveria a declaração de inconstitucionalidade, proferida no controle incidental, valer tão-somente para as partes?

Na esfera da ADPF o resultado não seria diferente. Como será aferida em grau principal, e não incidental, suas decisões emanariam efeito erga omnes. Em contrapartida, os excertos difusos que apreciassem igual matéria circunscrever-se-iam às partes litigantes. Seria essa mais uma impropriedade do sistema vigorante [231].

Conjugando-se os raciocínios expendidos, como querem os modernistas, deparar-nos-íamos com o enfraquecimento do modelo concreto, o qual caminharia, segundo Mendes [232], para um "processo de obsolescência".

A desproporção entre os modelos componentes do sistema misto também é sentida por Agra [233]:

Atualmente, a Constituição Cidadã de 1988 agasalha cinco ações abstratas, dotadas de efeitos erga omnes e vinculantes. Uma vez decidido em qualquer uma das ações diretas, nenhum outro juiz ou instância pode contraditar o teor do que fora prolatado.

De forma inexorável, há uma mitigação às decisões do controle difuso haja vista que os juízes têm que obedecer ao que ora determinado pelo Supremo Tribunal Federal. Além do que, nas questões que mais suscitam controvérsias ou que provocam grande repercussão sempre o Colendo Tribunal é instado a se posicionar, no mais das vezes através de liminar, que também acarreta efeito vinculante. Assim, resta pouca seara de atuação para que o controle difuso possa incidir [...].

Arrematando, o atual Presidente do STF [234] coloca na berlinda o sistema vigente quando assevera: "se continuamos a ter um modelo misto de controle de constitucionalidade, a ênfase passou a residir não mais no sistema difuso, mas no perfil concentrado".

Em segundo, a teoria moderna ataca uma possível falta de coesão do nosso modelo concreto de aferição das normas.

Muito embora tenhamos recepcionado o sistema norte-americano, não logramos incorporar o princípio do stare decisis, instrumento que confere efeito vinculante às decisões das Cortes Superiores.

Como vimos, esse postulado assegura às decisões incidentais da Corte a derradeira palavra sobre o processo de anulação das leis no país. Os efeitos pertinentes serão erga omnes e vinculante, uma vez que o Judicial Review está fundado na teoria da nulidade. Como se reveste de carga declaratória, reconhece situação preexistente e atinge o plano da validade dos atos, por isso, o efeito temporal será ex tunc.

Diferentemente, no Brasil, ressabemos que as decisões difusas do STF somente atingirão os efeitos geral e vinculante por intermédio da resolução do Senado Federal. Esse foi o caminho encontrado pelo legislador para suprir a lacuna havida.

Todavia, os modernistas rechaçam a solução legiferante, sobretudo a conformação dada ao ato senatorial pela doutrina e pela Corte Máxima, decisiva, conforme alegam, para a não-concretização da teoria da nulidade no ambiente do controle concreto pátrio.

Esse é o ensinamento de Mendes [235]:

A suspensão da execução pelo Senado não se mostrou apta para superar essa incongruência, especialmente porque se emprestou a ela um sentido substantivo que talvez não devesse ter. Segundo entendimento amplamente aceito, esse ato do Senado Federal conferia eficácia erga omnes à declaração de inconstitucionalidade proferida no caso concreto.

E, complementa o mestre [236]:

Ainda que se aceite, em princípio, que a suspensão da execução da lei pelo Senado retira a lei do ordenamento jurídico com eficácia ex tunc, esse instituto, tal como foi interpretado e praticado, entre nós, configura antes a negação do que a afirmação da teoria da nulidade da lei inconstitucional. A não-aplicação geral da lei depende exclusivamente da vontade de um órgão eminentemente político e não dos órgãos judiciais incumbidos da aplicação cotidiana do direito. Tal fato reforça a idéia de que, embora tecêssemos loas à teoria da nulidade da lei inconstitucional, consolidávamos institutos que iam de encontro à sua implementação.

Para findar com essa desarmonia, esta corrente propõe uma fórmula que visa prestigiar a aplicação da teoria da nulidade no meio concreto, tal como no sistema americano.

A nova receita, em linhas últimas, conduz a uma equiparação dos efeitos oriundos das decisões concretas e abstratas. Segundo a concepção moderna, a própria decisão incidental definitiva do STF emanaria os efeitos erga omnes e vinculante, independentemente da resolução do Senado. Reservar-se-ia ao ato legislativo a função essencial de publicizar aquela decisão [237].

Enfim, o pronunciamento concreto, de per si, teria força normativa.

A tese divulgada apagaria a velha discussão sobre a discricionariedade ou vinculatividade da competência do Órgão Legiferante, uma vez que a resolução deixaria de ser ato substantivo para assumir a conotação de mera atividade formal de divulgação dos pronunciamentos do STF.

Além disso, na esteira da teoria da nulidade, diferentemente da teoria clássica, o efeito temporal do excerto da Suprema Corte, via de regra, seria ex tunc, atingindo a lei na origem.

Essa construção é apoiada por Mendes [238]:

Uma orientação dogmática consistente haveria de encaminhar-se nesse sentido, até porque a atribuição de funções substantivas ao Senado Federal era a própria negação da idéia de nulidade da lei devidamente declarada pelo órgão máximo do Poder Judiciário.

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Ressalta-se que todo o desdobramento da tese moderna está enraizado na investigação do sentido jurídico do art. 52, X, da CF. No seu entender, o dispositivo enquadra-se perfeitamente no conceito de mutação constitucional.

Novelino [239] elucida o que vem a ser esse fenômeno:

Diversamente da emenda, que é um processo formal de alteração da Lei Fundamental (art. 60), a mutação ocorre por meio de processos informais de modificação do significado da Constituição sem alteração de seu texto. Alterando-se o sentido da norma constitucional, sem a modificação das palavras que a expressam. Esta mudança pode ocorrer com o surgimento de um novo costume constitucional ou pela via interpretativa.

As mutações constitucionais resultam da evolução dos costumes e dos valores, os quais acabam por exigir uma atualização da interpretação das regras postas, propiciando o acompanhamento, pela Constituição, do caminhar natural da sociedade [240].

Em voto-vista na Reclamação nº 4335-5/AC, o Ministro Eros Grau resume perfeitamente o sentido que os modernistas atribuem ao artigo em comento [241]:

passamos em verdade de um texto [pelo qual] compete privativamente ao Senado Federal suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal, a outro texto: compete privativamente ao Senado Federal dar publicidade à suspensão da execução, operada pelo Supremo Tribunal Federal, de lei declarada inconstitucional, no todo ou em parte por decisão definitiva do Supremo.

No final das contas, "o Senado Federal, segundo esta construção normativa, passaria a ser mero órgão chancelador das decisões do STF" [242].

Em terceiro, a tese moderna vislumbra uma tendência de objetivação do recurso extraordinário a partir de certas manifestações.

Vale lembrar o conceito de demanda objetiva:

trata-se de processo destituído de partes em litígio; não conta com a presença de lide, contendores, tampouco de interesses intersubjetivos em choque. Não cuida do julgamento de um caso concreto, mas, sim, da constitucionalidade da lei em tese, de uma relação de validade de normas. [243]

Haveria um processo de transformação do recurso excepcional através do qual suas originárias feições subjetivas estariam sendo abandonadas para assumir conotações objetivas, idênticas às ações diretas.

A novel corrente enxerga o STF analisando a constitucionalidade das leis em tese, por meio do recurso extraordinário. Visa, sobretudo, erigir aquela Casa a verdadeira Corte Constitucional, esquivando de sua apreciação as causas sem a mínima relevância. Ao mesmo tempo, resguarda suas forças para os impasses de grande vulto.

Aponta-se a lição de Mendes no Processo Administrativo nº 318.715/STF, o qual culminou na Emenda nº 12 ao RISTF, de 17 de dezembro de 2003:

O recurso extraordinário deixa de ter caráter marcadamente subjetivo ou de defesa de interesses das partes, para assumir, de forma decisiva, a função de defesa da ordem constitucional objetiva. Trata-se de orientação que os modernos sistemas de Corte Constitucional vêm conferindo ao recurso de amparo e ao recurso constitucional (Verfassungsbeschwerde).

A função do Supremo nos recursos extraordinários – ao menos de modo imediato – não é a de resolver litígios de fulano ou beltrano, nem a de revisar todos os pronunciamentos das Cortes inferiores. O processo entre as partes, trazido à Corte via recurso extraordinário, deve ser visto apensa como pressuposto para uma atividade jurisdicional que transcende os interesses subjetivos. [244]

Poder-se-iam concatenar, à luz da tese examinanda, algumas manifestações exemplificativas dessa ocorrência.

O primeiro passo teria sido dado pela Lei nº 8.038/90 [245], a qual permitiu ao relator, afora outras hipóteses, negar seguimento ao recurso que contrariasse súmula persuasiva do Supremo. Parênteses: a súmula resulta de inúmeras decisões difusas, servindo de orientação para os tribunais inferiores, mas capaz de vincular apenas a própria Corte.

Anos mais tarde, a Lei nº 9.756/98 acrescentou o § 1º-A ao art. 557 do Código de Processo Civil, autorizando o relator, agora, a prover o recurso extraordinário caso a decisão recorrida esteja contrastando súmula ou jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do STF ou de Tribunal Superior.

A subsunção das leis à tese provém das observações de Mendes [246]:

Também aqui parece evidente que o legislador entendeu possível estender de forma geral os efeitos da decisão adotada pelo Tribunal, tanto nas hipóteses de declaração de inconstitucionalidade incidental de determinada lei federal, estadual ou municipal – hipótese que estaria submetida à intervenção do Senado –, quanto nos casos de fixação de uma dada interpretação constitucional pelo Tribunal.

Ainda que a questão pudesse comportar outras leituras, é certo que o legislador ordinário, com base na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, considerou legítima a atribuição de efeitos ampliativos à decisão proferida pelo Tribunal, até mesmo em sede de controle de constitucionalidade incidental.

O procedimento do recurso extraordinário no âmbito dos Juizados Especiais Federais (JEF) [247] também seria dotado de peculiaridades muito similares às previstas para o controle abstrato. Haveria a possibilidade da intervenção de interessados no debate concreto [248], de modo que essa participação assemelhar-se-ia, em muito, à figura do amicus curiae, tantas vezes referida neste trabalho. Demais, as decisões do STF teriam força vinculante perante as turmas recursais do JEF [249], para as quais sobrariam dois caminhos: retratar-se ou declarar prejudicado o RE interposto com base em tese não acolhida pela Corte.

Ainda, existiria a concessão de medida cautelar para suspender outros recursos fundados em controvérsia idêntica à invocada em outro RE, o qual ataca decisão desconforme à súmula ou jurisprudência dominante do STF. É a previsão do art. 321, § 5º, I, do RISTF. Essa medida ter-se-ia inspirado no art. 21 da Lei nº 9.868/99 – ADC.

Merece acurada atenção, tendo em vista a robustez com que tratado pela tese moderna, o mais novo requisito de admissibilidade do recurso extraordinário – a repercussão geral (art. 543-A do CPC), da qual cuidamos no anterior capítulo.

A partir do registro de Novelino [250], podemos mensurar a importância do recém-chegado instituto para essa doutrina:

Esta exigência demonstra a orientação gradativamente adotada no sentido de que este instrumento vem perdendo seu caráter eminentemente subjetivo, para assumir uma função de defesa da ordem constitucional objetiva.

Por meio da repercussão geral da questão versada no recurso extraordinário, o legislador estaria exigindo que o inconformado expressasse "de que maneira a sociedade será beneficiada pela atuação do Tribunal" [251]. Com tal medida, o RE teria renunciado seu caráter egoístico para servir de palco a debates mais abrangentes, de real vitalidade para a ordem constitucional.

A prova dessa realidade sobreviria do § 1º do art. 543-A do CPC, que não prescinde da verificação da relevância e transcendência dos interesses subjetivos em litígio.

Implementada a repercussão, o recurso extraordinário somente será recebido caso a matéria diga respeito, segundo Grau [252]:

a um grande espectro de pessoas ou a um largo segmento social, uma decisão sobre assunto constitucional impactante, sobre tema constitucional muito controvertido, em relação a decisão que contrarie orientação do STF, que diga respeito à vida, à liberdade, à federação, à invocação do princípio da proporcionalidade (em relação à aplicação do Texto Constitucional) etc., ou, ainda, outros valores conectados a Texto Constitucional que se alberguem debaixo da expressão repercussão social.

A transcendência dos motivos determinantes no controle difuso seria a demonstração cabal da produção do efeito erga omnes pela decisão máxima em recurso extraordinário, porque, inevitavelmente, atingiria um sem-número de pessoas, identificadas com o caso concreto.

Além disso, aludem os construtivistas que as razões manejadas pela parte no recurso, a fim de demonstrar a repercussão, não vinculariam o STF, o qual poderia entender pela relevância e transcendência da matéria por fundamento diverso, situação recorrente nas ações objetivas de controle da constitucionalidade.

Outro fundamento sobreviria do § 6º do art. 543-A do CPC, o qual veio incutir a figura do amicus curiae na discussão da repercussão geral. O novel dispositivo teria premiado o controle difuso com instituto próprio do controle concentrado (art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/99) [253], indicando, mais uma vez, a aproximação dos modelos.

Essa previsão estaria na onda da maximização da feição objetiva do controle difuso. Franqueando-se aos interessados a possibilidade de manifestação sobre a questão posta em juízo, estar-se-ia ampliando a discussão para além das partes. Posto isso, os efeitos oriundos da coisa julgada extrapolariam o caso concreto para atingir a todos.

Estar-se-ia frente a hipótese que aponta na direção do efeito erga omnes no controle concreto, via recurso extraordinário, sem participação do Senado Federal.

Verificaríamos, por meio da cogência do art. 543-A, § 5º, do CPC, que trata da negativa de existência de repercussão geral, mais um traço objetivo agregado ao recurso excepcional.

Dispõe o regramento que, caso não preenchido o binômio relevância/transcendência da matéria, será negado seguimento ao RE. Demais, essa decisão valeria para todos os recursos sobre matéria idêntica, o que importaria em não-admissão liminar dos mesmos.

Nessa senda é a doutrina de Marinoni e Mitidiero [254]:

O não-conhecimento da repercussão geral da determinada questão tem efeito pan-processual (sic), no sentido de que se espraia para além do processo em que fora acertada a inexistência de relevância e transcendência.

Por detrás disso, segundo a corrente em análise, estaria a conferência de efeito vinculante às decisões concretas da Suprema Corte.

É o que conclui Moraes [255]:

Para garantir a efetividade das decisões do STF, bem como a celeridade processual, a lei estabelece que, negada a existência de repercussão geral, a decisão valerá para todos os recursos sobre matéria idêntica, reconhecendo efeitos vinculantes a essa decisão.

Ainda sobre a repercussão geral, é reclamada a referência ao julgamento dos recursos extraordinários fundados em idêntica controvérsia – art. 543-B, do CPC.Prevê a norma que, quando houver a reprodução de recursos fundados na mesma controvérsia, a repercussão geral será aferida por amostragem. Selecionar-se-ão um ou mais recursos extremos, enquanto que os demais ficarão sobrestados, aguardando a sorte daqueles.

Contudo, a ênfase da questão está alocada na eficácia desse julgamento. Segundo predispõe o § 3º do art. 543-B do CPC, admitida a repercussão geral e julgado o mérito recursal, os tribunais inferiores poderão retratar-se ou declarar prejudicados os recursos paralisados.

A última hipótese, consoante entendem Marinoni e Mitidiero [256], tratar-se-ia de causa negativa de provimento ao recurso, a qual revelaria, no mínimo, vinculação persuasiva. Concluem os mestres que, se perante o Pleno do STF são praticamente idênticos os procedimentos para a declaração de inconstitucionalidade nos modelos concreto e abstrato, cercados pela objetividade procedimental, não haveria razão bastante para que apenas o último fosse dotado de efeito vinculante [257].

Entretanto, a mais importante novidade adviria do § 2º do art. 543-B da Lei Formal. Consigna a negativa de existência da repercussão geral e seus desdobramentos. Resumidamente, não-conhecida a relevância e transcendência da questão, o recurso excepcional não será recebido, e os demais, suspensos na origem, serão automaticamente não-admitidos. Significaria a derrocada de inúmeros extraordinários a partir de uma única decisão da Corte Máxima.

Esse final estaria reforçando a presença dos efeitos geral e vinculante das decisões difusas do STF, pois aos tribunais inferiores não seria legítimo enviar à Máxima Instância recursos que versassem sobre matéria idêntica àquela despida de repercussão geral, já que estariam "vinculados verticalmente à decisão do Supremo Tribunal Federal" [258]. E o mais relevante, sem a participação do Senado Federal. Vejam-se as lições de Moraes [259]:

Na hipótese do Supremo Tribunal Federal não conhecer a existência de repercussão geral, todos os recursos extraordinários suspensos serão automaticamente não admitidos, reafirmando o caráter geral da decisão da Corte e seus efeitos vinculantes.

Para o fechamento, representando as idéias dessa corrente, chamamos à colação os ensinamentos de Didier Jr. [260]:

É possível concluir, sem receio, de que o incidente para a apuração da repercussão geral por amostragem é um procedimento de caráter objetivo, semelhante ao procedimento da ADIN, ADC E ADPF, e de profundo interesse público, pois se trata de exame de uma questão que diz respeito a um sem-número de pessoas, resultando na criação de uma norma jurídica de caráter geral pelo STF. É mais uma demonstração do fenômeno de "objetivação" do controle difuso de constitucionalidade das leis [...].

Sobre a indagação pendente ao final do ponto 2.2 [261], a teoria modernista responde que sim. Em vista das peculiaridades do instituto da repercussão geral, o recurso extraordinário teria abandonado sua modelagem antiga e assumido novo caráter de processo objetivo. Conseqüentemente, os modelos de controle de constitucionalidade concreto e abstrato teriam sofrido uma aproximação substancial.

Quanto à repercussão geral, era isso.

Reivindica-se um registro final sobre a transformação do recurso extraordinário, concernente a jurisprudencialização do fenômeno.

A teoria moderna vem ocupando espaço cada vez maior na jurisprudência pretoriana. Analisaremos, pois, o leading case de Mira Estrela [262].

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE), baseando-se na decisão concreta do STF, atribuiu-lhe eficácia erga omnes e editou a Resolução nº 21.702/2004. Contra ela foram ajuizadas duas ADIs – nº 3.345 e 3.365 –, as quais foram rejeitadas, "sob o argumento de que o TSE, ao expandir a interpretação constitucional definitiva dada pelo STF, ‘guardião da Constituição’, submeteu-se ao princípio da força normativa da Constituição" [263].

Relata Gomes [264] que:

o STF acabou proclamando que essa eficácia (erga omnes) extraída de uma decisão proferida em RE, estava absolutamente correta (porque, afinal, o RE deve ser visto na atualidade não só como instrumento para a tutela de interesses das partes, senão, sobretudo, como defesa da ordem constitucional objetiva).

Além da consagração dos mencionados efeitos subjetivos expansivos e vinculantes, o STF aplicou a técnica da modulação dos efeitos temporais no caso concreto. Lembremos que esse modus operandi é previsto, no art. 27 da Lei nº 9.868/99 tão-somente para o controle abstrato de constitucionalidade.

In casu, a Corte Suprema reduziu o número de vereadores do Município de Mira Estrela, porém, firmou que os efeitos atingiriam somente a legislatura posterior. Houve limitação dos efeitos da declaração pro futuro.

A partir desse precedente, outros casos concretos seguiram a mesma linha, vide o RE-AgR 434.222/AM e o MS 22.357/DF.

Como essa problemática é acessória, apenas faremos um intróito para dar coesão ao assunto principal.

Defendem os construtivistas a possibilidade da flexibilização da teoria da nulidade para aceitar, em certas circunstâncias, a limitação dos efeitos pro futuro ou ex nunc no controle concreto. Em outros termos, questionam a aplicabilidade incondicional da teoria absolutista da Judicial Review.

Indaga Cappeletti [265]:

Como ficariam todos os atos praticados, durante longos anos, sob a vigência de uma lei que venha a ser declarada inconstitucional? Como resolver a questão de um contrato que tenha sido celebrado e servido de base para a prestação de um serviço público por longos anos? Como ficarão os efeitos da lei? Como sustentar o cumprimento de uma pena que tenha fundamento em lei que venha a ser declarada inconstitucional? O que fazer com os efeitos já consolidados? E a coisa julgada? E o mínimo de certeza e estabilidade que todas as relações jurídicas devam ter?

Essa preocupação surgiu no próprio país de origem do controle difuso, com o leading case Likletter v. Walker, apreciado pela Suprema Corte americana em 1965. Desde então, avança o pensamento que confere ao Judiciário o poder sobre a limitação dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade [266].

Cunha Júnior [267], dissertando sobre a previsão de modulação apenas para o controle concentrado, posiciona-se:

em que pese os preceitos acima mencionados constarem de leis reguladoras do processo e julgamento das ações diretas do controle concentrado-abstrato de constitucionalidade, não temos dúvidas que eles podem servir de supedâneo para a modulação da eficácia temporal também no âmbito do modelo de controle difuso-incidental de constitucionalidade.

Consoante Lenza, o STF realiza, nesses julgamentos, efetiva ponderação de valores. Utiliza-se de fundamentos como os princípios da segurança jurídica, da confiança, da ética jurídica, da boa-fé, todos constitucionalizados. Entende ser imprescindível esta tendência de mitigação do princípio da nulidade, tanto em sede de controle concentrado, como em sede de controle difuso [268].

A modulação dos efeitos temporais da decisão em controle concreto, para a teoria examinanda, significaria fortíssima demonstração da necessidade de reinterpretação da cláusula do art. 52, X, da CF.

Tal é a conclusão de Mendes [269]:

observe-se que a adoção da técnica da declaração de inconstitucionalidade com limitação de efeitos parece sinalizar que o Tribunal entende estar desvinculado de qualquer ato do Senado Federal, cabendo tão-somente a ele – Tribunal – definir os efeitos da decisão.

A contar do caso paradigmático, sucederam-se outros tantos no mesmo sentido da imperiosa necessidade de se reinterpretar a função do recurso extraordinário no cenário constitucional contemporâneo, o qual se teria agregado ao rol dos processos objetivos. Anotem-se o AI nº 375.011, da relatoria da Ministra Ellen Gracie [270], e o RE nº. 298.694, Relator Ministro Sepúlveda Pertence, DJ 23 de abril de 2004.

Nesse último, por maioria, autorizou-se o STF julgar recursos extremos com base em fundamento diverso daquele enfrentado pelo tribunal a quo. À semelhança do que ocorre nos processos objetivos, a causa petendi seria aberta, possibilitando-se à Corte reconhecer a inconstitucionalidade por fundamento não invocado pelas partes contendoras.

Damos por esgotado o tratamento da objetivação do recurso constitucional.

Em quarto, os construtivistas inconformam-se com ínfimo alcance do art. 52, X, da CF, porquanto cingido apenas às decisões declaratórias de inconstitucionalidade, cujo escopo é arredar a lei do ordenamento jurídico [271].

A resolução senatorial revelar-se-ia incapaz de assegurar eficácia erga omnes e vinculante às decisões do STF que não apreciassem a inconstitucionalidade de lei, a propósito daquelas que se restringem a fixar uma interpretação a determinado dispositivo. Como não haveria reconhecimento de incompatibilidade vertical da norma, prescindir-se-ia da movimentação do Senado Federal. Ao fim e ao cabo, a decisão restaria desnuda de efeitos gerais e vinculante, abarcando somente as partes litigantes.

Idêntico resultado seria experimentado quando a Corte Máxima adotasse as técnicas da interpretação conforme e da declaração de inconstitucionalidade parcial sem redução de texto. Naquela, o Tribunal limitar-se-ia a declarar a constitucionalidade da norma, desde que interpretada em determinado sentido. Reconheceria o sentido unívoco da lei e, reflexamente, afastaria as interpretações que conduziriam à incompatibilidade. Por sua vez, na declaração de inconstitucionalidade parcial, o caminho seria inverso. A Corte apontaria que determinada exegese contrasta com a Constituição e a afastaria para preservar a regra posta.

Muito embora com propósitos contrários, em ambos os casos o fim seria idêntico: não haveria declaração de inconstitucionalidade da norma, concomitantemente, dispensar-se-ia a intervenção suspensiva do Senado Federal.

Resultado: os pronunciamentos pretorianos não teriam como contar com os efeitos erga omnes e vinculante, ao passo que, na seara abstrata, o art. 28 da Lei nº 9.868/99 garante tais consectários às decisões principais.

Em quinto, podemos conceber que a súmula vinculante é supervalorizada pela teoria moderna. O seu advento ao ordenamento vigente daria credibilidade à idéia de aproximação entre os modelos de controle pátrios. Ter-se-ia enxertado o efeito vinculante no controle difuso.

Com efeito, os enunciados da súmula, aprovados pelo STF, passaram a obrigar os órgãos do Poder Judiciário e a Administração Pública em todas as esferas. Alerta-se: essa possibilidade, até então, era exclusiva do modelo abstrato. Caso a súmula dite a inconstitucionalidade de preceito ou sua interpretação, o efeito imediato será a vinculação vertical do ordenamento jurídico, à exceção do próprio STF e do Legislativo, como vimos oportunamente. Tornar-se-ia despicienda a participação do Senado Federal, pois, desde a publicação da súmula na imprensa, os efeitos gerais e vinculante emergiriam da decisão da própria Corte.

Assim entende Harada [272]:

Embora tenhamos visto artigos de estudiosos em sentido contrário, entendemos que descabe falar-se de suspensão de eficácia pelo Senado Federal quando o pronunciamento de inconstitucionalidade ocorrer no bojo dos autos de controle difuso de inconstitucionalidade, na forma do art. 103-A da CF [...].

Mendes reforça a tese [273]:

Desde já, afigura-se inequívoco que a referida súmula conferirá eficácia geral e vinculante às decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal sem afetar diretamente a vigência de leis declaradas inconstitucionais no processo de controle incidental. E isso em função de não ter sido alterada a cláusula clássica, constante do art. 52, X, da Constituição, que outorga ao Senado a atribuição para suspender a execução de lei ou ato normativo declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal.

Preconiza a doutrina moderna que o instituto em exame seria mais um testemunho do enfraquecimento da competência da Casa Legislativa, porque, embora vincule os tribunais inferiores e a Administração Pública e exale efeitos gerais, não elimina formalmente a lei do ordenamento jurídico.

Quando cuidamos desse instrumento no capítulo antecedente, levantamos alguns aspectos que, na perspectiva moderna, realçariam seus contornos objetivos, próprios do modelo abstrato.

O primeiro trata da legitimidade para incitar sua aprovação, revisão ou cancelamento – § 2º do art. 103 da CF. Por essa regra, teria havido a equiparação dos legitimados para instaurar o controle abstrato (ADI e ADC) e para provocar o examine da súmula vinculante (controle concreto), com a ressalva de que o rol da última foi elastecido pelo art. 3º da Lei nº 11.417/07.

Estabeleceu-se, através do § 2º do art. 3º da referida lei, a possibilidade da intervenção de amicus curiae no procedimento de apreciação da súmula com efeito vinculante. Como tal experiência é oriunda do controle concentrado – art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/99 –, ora incorporada ao controle difuso, isso revelaria um aprimoramento da jurisdição constitucional, com ênfase à aproximação entre os modelos.

A juntar-se a tais detalhes, o art. 4º da Lei nº 11.417/07, inusitadamente, trouxe para dentro do arcabouço da súmula vinculante a técnica da modulação dos efeitos da decisão. Pela norma, o STF, mediante dois terços de seus membros, poderá restringir os efeitos naturais do enunciado ou assentar que se operem a partir de outro momento, levando em conta as razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse público. Mais um instituto importado do modelo concentrado de constitucionalidade, previsto no art. 27 da Lei nº 9.868/99.

Por último, não menos inédito, o § 3º do art. 103-A da CF inseriu na esfera da súmula vinculativa um instrumento capaz de assegurar sua operacionalidade, a reclamação constitucional.

Tradicionalmente, essa ação sempre resguardou o controle abstrato – vide art. 102, I, l, da Lei Maior. Após a Reforma do Judiciário, qualquer desrespeito a enunciado da súmula em comento estará afrontando a autoridade das decisões da Corte Maior, autorizando o manejo da reclamatória.

Inserindo neste contexto o questionamento feito ao final do ponto 2.3, na visão dos construtivistas, a súmula vinculante influiu sobremaneira para um maior entrosamento entre os modelos concreto e abstrato. Apontem-se as conclusões de Leite [274]:

As súmulas vinculantes estabelecem uma conexão entre a jurisdição constitucional difuso-concreta, já que demandam a existência de uma controvérsia atual entre órgãos do Poder Judiciário, ou entre eles e a Administração pública, e reiteradas decisões do Supremo Tribunal Federal em um mesmo sentido, e a concentrado-abstrata, em razão do efeito vinculante. Em outros termos, ela promove a generalização, com força obrigatória, da jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal. Dessa maneira, elas contribuem para um maior entrosamento da jurisdição difuso-concreta com a concentrado–abstrata, atenuando a conhecida tensão dialética que caracteriza a convivência desses modelos.

Em sexto, estudaremos os desdobramentos do HC nº 82.959-7/SP.

Discutiu-se, no âmbito pretoriano, a constitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos), o qual exigia o cumprimento da pena em regime integralmente fechado. Leia-se, vedava a progressão de regime.

Até 2004, era firme o entendimento da Suprema Corte pela constitucionalidade do dispositivo, muito embora, difusamente, alguns tribunais, calcados no princípio da razoabilidade, mitigavam o bloqueio legal para afastar o excesso.

Devido à alteração na composição do STF essa posição modificou-se rapidamente, e o palco foi, justamente, o habeas corpus focalizado.

Em julgamento plenário, o STF reconheceu, no dia 23 de fevereiro de 2006, a inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei dos Crimes Hediondos, por seis votos a cinco. Favoravelmente, o relator Ministro Marco Aurélio e os Ministros Carlos Britto, Gilmar Mendes, Cezar Peluso, Eros Grau e Sepúlveda Pertence (já aposentado). Contra, os Ministros Carlos Velloso, Nelson Jobim, Ellen Gracie, Joaquim Barbosa e Celso Mello.

Alerta Comim [275] que:

O resultado apertado da votação (6x5 a favor da progressão), devido à aposentadoria do Ministro Carlos Velloso e coma saída do Ministro Nelson Jobim, tende a aumentar em favor da tese referendada no pleno, sobretudo levando-se em conta que já há precedentes da lavra do Ministro Ricardo Lewandowski, recém ingresso na Corte Suprema, adotando a orientação do órgão plenário.

Em casos tais, pela teoria clássica, a decisão teria efeito inter partes. Somente após a suspensão da execução da norma pelo Senado alcançar-se-ia maior amplitude – efeito erga omnes. Todavia, não é o que preconiza a teoria moderna, consoante assevera Gomes [276]:

apesar da inexistência de norma explícita, o julgamento de inconstitucionalidade de um texto legal, pelo STF, na prática, mesmo quando se dá num caso concreto, no que diz respeito à sua "validade", acaba produzindo efeitos "contra todos" e possui eficácia vinculante (sobretudo frente ao Poder Judiciário).

Dessa maneira, no instante em que o Pleno do STF reconhecesse a inconstitucionalidade da lei, retirar-lhe-ia a validade. A norma continuaria vigorando até que a Casa Legiferante editasse o ato suspensivo. Porém, muito embora a lei permanecesse no ordenamento, não teria validade alguma. Por conseguinte, nenhum órgão do Poder Judiciário poderia dar-lhe aplicabilidade.

Resta saber se o STF conferiu, diretamente, eficácia erga omnes a essa decisão concreta.

Quando trouxermos a Reclamação nº 4.335-5/AC detalharemos o impasse.

No julgamento em questão, a Corte, novamente, a exemplo do caso de Mira Estrela, utilizou a técnica da modulação (ou limitação) dos efeitos temporais [277] para conferir efeito ex nunc à declaração de inconstitucionalidade.

Prescindimos de maiores comentários sobre a origem e meandros do instituto. Importa, isso sim, repisar que a Corte Maior, ao se valer, sem previsão legal, de instituto próprio do controle abstrato, consignaria a tese modernista, no sentido de abstrativizar o controle concreto de constitucionalidade.

Oportuno relatar, outrossim, que a Superior Corte de Justiça, paulatinamente, parece engrenar nos estudos da teoria em comento [278].

Para encerrar essa caminhada, compete-nos expor que a abstrativização do controle concreto, ou melhor, a admissibilidade de o STF conferir imediatamente efeitos erga omnes e vinculante aos seus excertos, independentemente da suspensão da execução da norma pelo Senado Federal, está sendo decidida na Reclamação nº 4.335/AC [279].

Essa ação constitucional, da relatoria do Ministro Gilmar Mendes, foi ajuizada pela Defensoria Pública da União contra decisões do Juiz de Direito da Vara de Execuções Penais de Rio Branco-AC, por meio das quais indeferira pedidos de progressão de regime feitos por condenados a pena de reclusão em regime integralmente fechado em decorrência da prática de crimes hediondos. Alega-se que as decisões a quo estariam ofendendo a autoridade da decisão da Corte no HC 82959/SP supra-referido. A Defensoria Pública reivindica proteção ao efeito erga omnes emanado, segundo ela, pela decisão máxima.

Em 15 de agosto de 2006, a Procuradoria-Geral da República apresentou parecer pelo não-conhecimento da reclamação analisanda.

O voto do relator foi pela procedência da ação, para cassar as decisões monocráticas, assentando que caberá ao juízo reclamado proferir novo decisium para avaliar se, no caso concreto, os interessados atendem, ou não, os requisitos para gozar do referido benefício.

Pedimos vênia para transcrever o resumo do voto do Relator, Ministro Gilmar Ferreira Mendes, uma vez que se mostra expoente no sentido do acolhimento da tese construtivista:

Preliminarmente, quanto ao cabimento da reclamação, o relator afastou a alegação de inexistência de decisão do STF cuja autoridade deva ser preservada. No ponto, afirmou, inicialmente, que a jurisprudência do STF evoluiu relativamente à utilização da reclamação em sede de controle concentrado de normas, tendo concluído pelo cabimento da reclamação para todos os que comprovarem prejuízo resultante de decisões contrárias às suas teses, em reconhecimento à eficácia vinculante erga omnes das decisões de mérito proferidas em sede de controle concentrado. Em seguida, entendeu ser necessário, para análise do tema, verificar se o instrumento da reclamação fora usado de acordo com sua destinação constitucional: garantir a autoridade das decisões do STF; e, depois, superada essa questão, examinar o argumento do juízo reclamado no sentido de que a eficácia erga omnes da decisão no HC 82959/SP dependeria da expedição da resolução do Senado suspendendo a execução da lei (CF, art. 52, X). Para apreciar a dimensão constitucional do tema, discorreu sobre o papel do Senado Federal no controle de constitucionalidade.

Aduziu que, de acordo com a doutrina tradicional, a suspensão da execução pelo Senado do ato declarado inconstitucional pelo STF seria ato político que empresta eficácia erga omnes às decisões definitivas sobre inconstitucionalidade proferidas em caso concreto. Asseverou, no entanto, que a amplitude conferida ao controle abstrato de normas e a possibilidade de se suspender, liminarmente, a eficácia de leis ou atos normativos, com eficácia geral, no contexto da CF/88, concorreram para infirmar a crença na própria justificativa do instituto da suspensão da execução do ato pelo Senado, inspirado numa concepção de separação de poderes que hoje estaria ultrapassada. Ressaltou, ademais, que ao alargar, de forma significativa, o rol de entes e órgãos legitimados a provocar o STF, no processo de controle abstrato de normas, o constituinte restringiu a amplitude do controle difuso de constitucionalidade.

Considerou o relator que, em razão disso, bem como da multiplicação de decisões dotadas de eficácia geral e do advento da Lei 9.882/99, alterou-se de forma radical a concepção que dominava sobre a divisão de poderes, tornando comum no sistema a decisão com eficácia geral, que era excepcional sob a EC 16/65 e a CF 67/69. Salientou serem inevitáveis, portanto, as reinterpretações dos institutos vinculados ao controle incidental de inconstitucionalidade, notadamente o da exigência da maioria absoluta para declaração de inconstitucionalidade e o da suspensão de execução da lei pelo Senado Federal. Reputou ser legítimo entender que, atualmente, a fórmula relativa à suspensão de execução da lei pelo Senado há de ter simples efeito de publicidade, ou seja, se o STF, em sede de controle incidental, declarar, definitivamente, que a lei é inconstitucional, essa decisão terá efeitos gerais, fazendo-se a comunicação àquela Casa legislativa para que publique a decisão no Diário do Congresso. Concluiu, assim, que as decisões proferidas pelo juízo reclamado desrespeitaram a eficácia erga omnes que deve ser atribuída à decisão do STF no HC 82959/SP [280].

O Ministro Eros Grau, acompanhando o relator, julgou procedente a reclamação em comento. Reconheceu, no art. 52, X, da CF, verdadeiro exemplo de mutação constitucional, e, por isso, conferir-lhe-ia nova interpretação para atribuir ao Senado Federal a competência para publicar as decisões definitivas do Supremo Tribunal Federal. Assentou que a decisão concreta da Corte tem força normativa bastante para suspender a execução da lei.

Contrariamente à tese, o já aposentado Ministro Sepúlveda Pertence julgou improcedente a reclamação, muito embora tenha concedido habeas corpus de ofício para que o juiz de primeira instância examinasse os demais requisitos para deferimento da progressão de regime. Vejam-se as razões por ele expendidas:

Reportando-se aos fundamentos de seu voto no RE 191896/PR (DJU de 29.8.97), em que se declarou dispensável a reserva de plenário nos outros tribunais quando já houvesse declaração de inconstitucionalidade de determinada norma legal pelo Supremo, ainda que na via do controle incidente, asseverou que não se poderia, a partir daí, reduzir-se o papel do Senado, que quase todos os textos constitucionais subseqüentes a 1934 mantiveram. Ressaltou ser evidente que a convivência paralela, desde a EC 16/65, dos dois sistemas de controle tem levado a uma prevalência do controle concentrado, e que o mecanismo, no controle difuso, de outorga ao Senado da competência para a suspensão da execução da lei tem se tornado cada vez mais obsoleto, mas afirmou que combatê-lo, por meio do que chamou de "projeto de decreto de mutação constitucional", já não seria mais necessário. Aduziu, no ponto, que a EC 45/2004 dotou o Supremo de um poder que, praticamente, sem reduzir o Senado a um órgão de publicidade de suas decisões, dispensaria essa intervenção, qual seja, o instituto da súmula vinculante (CF, art. 103-A) [281].

Resumindo, o ex-Ministro posicionou-se contra a implementação da mutação constitucional destinada a transformar o Senado Federal em órgão publicador das decisões supremas, conquanto tenha reconhecido que a regra do art. 52, X, da CF esteja sofrendo do mal da obsolescência. Outrossim, evidenciou a prevalência do modelo concentrado em face do difuso. Por fim, consignou a desimportância de se atacar o papel do Senado no cotejo das leis, simplesmente porque o STF deteria o poder de aprovar enunciado de súmula vinculante, que, no final das contas, supriria a atividade daquele.

O Ministro Joaquim Barbosa manifestou-se pelo não-conhecimento da reclamação, mas, também, deferiu o habeas corpus. Considerou que,

apesar das razões expostas pelo relator, a suspensão da execução da lei pelo Senado não representaria obstáculo à ampla efetividade das decisões do Supremo, mas complemento. Aduziu, de início, que as próprias circunstâncias do caso seriam esclarecedoras, pois o que suscitaria o interesse da reclamante não seria a omissão do Senado em dar ampla eficácia à decisão do STF, mas a insistência de um juiz em divergir da orientação da Corte enquanto não suspenso o ato pelo Senado. Em razão disso, afirmou que resolveria a questão o habeas corpus concedido liminarmente pelo relator. Afirmou, também, na linha do que exposto pelo Min. Sepúlveda Pertence, a possibilidade de edição de súmula vinculante. Dessa forma, haveria de ser mantida a leitura tradicional do art. 52, X, da CF, que trata de uma autorização ao Senado de determinar a suspensão de execução do dispositivo tido por inconstitucional e não de uma faculdade de cercear a autoridade do STF. Afastou, ainda, a ocorrência da alegada mutação constitucional. Asseverou que, com a proposta do relator, ocorreria, pela via interpretativa, tão-somente a mudança no sentido da norma constitucional em questão, e, que, ainda que se aceitasse a tese da mutação, seriam necessários dois fatores adicionais não presentes: o decurso de um espaço de tempo maior para verificação da mutação e o conseqüente e definitivo desuso do dispositivo. Por fim, enfatizou que essa proposta, além de estar impedida pela literalidade do art. 52, X, da CF, iria na contramão das conhecidas regras de auto-restrição [282].

Extrai-se do voto que o Ministro, na linha de raciocínio de Sepúlveda Pertence, prefere o enunciado de súmula vinculante ao invés de anuir com a mutação do art. 52, X, da Lei Magna.

Aliás, esse é o entendimento de Moraes [283]:

Não mais será necessária a aplicação do art. 52, X, da Constituição Federal – cuja efetividade, até hoje, sempre foi reduzidíssima –, pois, declarando incidentalmente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, o próprio Supremo Tribunal Federal poderá editar Súmula sobre a validade, a interpretação e a eficácia dessas normas, evitando que a questão controvertida continue a acarretar insegurança jurídica e multiplicidade de processos sobre questão idêntica.

O julgamento não está encerrado. Até a finalização deste trabalho monográfico, os autos da reclamação encontravam-se no gabinete do Ministro Ricardo Lewandowski, devido a pedido de vista.

Solvendo indagação deixada no item 2.4, in fine, tendo em vista que a reclamação, costumeiramente, sempre protegeu a autoridade das decisões abstratas do STF e levando em conta que a súmula vinculante é o resultado de inúmeros julgados concretos, pela corrente moderna, franqueando-se a utilização de reclamação para dar autoridade a enunciado de súmula com efeito vinculativo, haveria, sim, a diminuição do afastamento entre os modelos adotados pelo Brasil.

Para finalizar a apresentação dessa tendência, oportuno trazer à tona que, aos 26 dias do mês de março do ano em curso, foi apresentado no Senado Federal, pelo Senado Arthur Virgílio, a proposta de Emenda à Constituição nº 11 (PEC), a qual intenta revogar o inciso X do art. 52 da Constituição Federal, cujo texto nos permitimos colacionar:

Parte superior do formulário

PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO Nº 11, DE 2008

Revoga o inciso X do art. 52 da Constituição Federal.

As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do § 3º do art. 60 da Constituição, promulgam a seguinte Emenda Constitucional:

Art. 1º É revogado o inciso X do art. 52 da Constituição.

Art. 2º Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

O controle de constitucionalidade no Direito brasileiro vem, progressivamente, dando maior destaque para a via concentrada e em abstrato.

Isso porque as decisões diretas do Supremo Tribunal Federal, tomadas relativamente às próprias leis, repercutem de imediato em favor de toda a sociedade.

Com isso, ganha-se em agilidade e em segurança jurídica, superando-se os recursos e as dúvidas inerentes às várias instâncias judiciais do processo comum.

A Emenda Constitucional nº 45, de 2004, que é a mais recente "Reforma do Poder Judiciário", caminhou neste sentido. Isso porque reforçou – e aperfeiçoou – o controle concentrado e em abstrato de normas.

Em atenção a uma sugestão do Excelentíssimo Senhor Ministro do Supremo Tribunal Federal, Professor Doutor Gilmar Ferreira Mendes, Presidente eleito da mais Alta Corte brasileira, apresento proposta de emenda constitucional que dá mais um passo em favor da celeridade judicial, direito fundamental constante da Constituição (art. 5º, LXXVIII).

A proposta é cirúrgica: ela pretende revogar o inciso X do art. 52 da Constituição, norma de competência que remonta à Constituição de 1934, tempo em que não existiam os modernos mecanismos de controle concentrado e em abstrato de normas.

Por meio dela, compete ao Senado Federal suspender a execução de lei declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal no controle difuso e em concreto de normas. Assim, as decisões tomadas pelo Supremo com eficácia apenas inter partes passam a ser erga omnes.

Essa norma perdeu a sua razão, uma vez que não se aplica às ações diretas – hoje bastante freqüentes – e em função da súmula vinculante, criada que foi pela Emenda nº 45, e que surte, desde logo, efeitos erga omnes. Ademais, parece correto cogitar de eficácia maior à generalidade das ações do controle difuso e em concreto de normas, conforme eventualmente venha a construir o Supremo Tribunal Federal.

Em função de todo o exposto, rogo o apoio dos Nobres Pares para apresentar e aprovar a presente proposta de emenda constitucional.

Sala das Sessões, 26 de março de 2008. – Senador Arthur Virgílio. [284]

A PEC nº 11 encontra-se, desde o dia 27 de março deste ano, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal.

A partir da leitura do texto supra, depreende-se que foi alçada, igualmente, no âmbito legislativo, a bandeira da tese da abstrativização do controle concreto de constitucionalidade, tão defendida pelos doutrinadores construtivistas.

Feita a explanação da inclinação pela abstrativização do controle concreto, não podemos nos furtar de apresentar as maledicências desse fenômeno. Por conseguinte, aglutinaremos as críticas doutrinárias à tese.

3.4 CRÍTICAS À TEORIA MODERNA

A doutrina brasileira, predominantemente, debate-se contra a tese modernista, a qual busca dotar o Supremo Tribunal Federal de autonomia bastante para que suas decisões concretas passem a produzir, de instantâneo, eficácia erga omnes e vinculante, sem arrimo do Senado Federal.

Os renitentes apresentam um conjunto argumentativo através do qual esperam frear a escalada dessa teoria.

O mais tenaz dos fundamentos, pelo menos reputamos assim, seria a ausência de previsão legislativa a confortar as aspirações da tese.

Nesse sentido, anotem-se as colocações de Lenza [285]:

muito embora a tese da transcendência decorrente do controle difuso pareça bastante sedutora, relevante e eficaz, inclusive em termos de economia processual, de efetividade do processo, de celeridade processual (art. 5º, LXXVIII – Reforma do Judiciário) e de implementação do princípio da força normativa da Constituição (Konrad Hesse), parecem faltar, ao menos em sede de controle difuso, dispositivos e regras, sejam processuais, sejam constitucionais, para a sua implementação.

Reaviva o mestre constitucionalista [286] que os efeitos geral e vinculante foram emprestados às decisões abstratas do STF e à súmula vinculativa. Para que o cotejo concreto alcançasse tais consectários, não prescindiria da resolução do Senado para suspender a execução da lei inconstitucional. Não logrando esse resultado, a lei continuaria válida e eficaz, aferível caso a caso.

A tese somente superaria o obstáculo narrado por meio de reforma constitucional, modificando ou abolindo a regra do art. 52, X, da CF.

Há quem sustente que o STF estaria usurpando competência da Casa Legislativa, uma vez que a norma seria fruto do poder constituinte originário [287]. Enfim, estar-se-ia afrontando a tripartição dos Poderes.

Reforça Martins [288]:

A transformação tem sido feita pela via do Regimento Interno do STF, significando uma verdadeira afronta ao princípio democrático e da separação das funções estatais. Tem-se um tribunal avocando competências e, em última instância, legislando em causa própria.

Além do mais, os oposicionistas defendem a permanência do sistema misto de controle, tal como está. A contribuição do Senado no controle difuso não seria uma atividade vã, mas teria um motivo nobre de ser: a participação democrática, embora indireta, no controle difuso de constitucionalidade [289].

Dessarte, rechaçam a exclusão da competência da Casa Legislativa, bem como a tentativa de erigi-la a órgão publicador das decisões concretas do STF. Tal investida, conforme salientam Streck, Oliveira e Lima [290]:

significa reduzir as atribuições do Senado Federal à de uma secretaria de divulgação infra-legislativa (sic) das decisões do Supremo Tribunal Federal; significa, por fim, retirar do processo de controle difuso qualquer possibilidade de chancela dos representantes do povo deste referido processo, o que não parece ser sequer sugerido pela Constituição da República de 1988.

De outra banda, possibilitando-se à Corte Maior a conferência de efeitos erga omnes e vinculante às sentenças incidentais, estar-se-ia lesando direitos fundamentais. Estariam sendo maculados os princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, pois restariam atingidos todos aqueles que não participaram da lide.

Coloca-se, ainda, que a função do STF no recurso extraordinário não seria analisar teses sobre a constitucionalidade ou inconstitucionalidade, mas julgar a aplicação dada à Constituição em situações concretas. Nessa seara, o STF não atuaria como verdadeira Corte Constitucional, mas como Corte de Apelação [291]. Seria a instância maior nos quadros do Poder Judiciário.

No que concerne aos efeitos temporais da decisão concreta, sustentam os oposicionistas que seria da tradição sistêmica o efeito ex tunc, o qual teria aptidão para vincular apenas as partes confrontantes. Em contrapartida, a suspensão da execução da lei pelo Senado Federal emanaria efeito ex nunc.

A razão de ser desse costume seria evidente. A resolução senatoria equivaleria à revogação da lei, a qual se situa no plano da vigência da lei. Ao passo que as decisões objetivas da Suprema Corte funcionariam como uma derrogação da lei, alocada no plano da eficácia das normas. No controle concentrado, o órgão judiciário estaria agindo como legislador negativo.

Esclarecem Streck, Oliveira e Lima [292]:

Se até o momento em que o Supremo Tribunal declarou a inconstitucionalidade da lei no controle difuso, a lei era vigente e válida, a decisão no caso concreto não pode ser equiparada à decisão tomada em sede de controle concentrado. [...] temos que a razão está com aqueles que sustentam os efeitos ex nunc da decisão suspensiva do Senado.

Encontrar-se-ia na tese moderna até mesmo um foco de inconstitucionalidade, segundo concepção mais positivista:

Decidir – como que, a partir de sofisticado raciocínio, o Min. Gilmar Mendes – que qualquer decisão do Supremo Tribunal em controle difuso gera os mesmos efeitos que uma proferida em controle concentrado (abstrato) é, além de tudo, tomar uma decisão que contraria a própria Constituição. [293]

No entender dos oposicionistas, caso o Supremo Tribunal pretenda conferir efeitos erga omnes e vinculante às decisões concretas, terá dois caminhos: editar súmula com efeito vinculativo ou seguir os passos do sistema, remetendo a decisão ao Senado Federal.

Consoante advertem, ou isso "ou as súmulas perderam sua razão de ser, porque valerão tanto ou menos que uma decisão por seis votos a cinco" [294].

Veja-se a problemática da tese moderna:

uma súmula do Supremo Tribunal Federal, elaborada com oito votos (que é o quorum mínimo), pode alterar a Constituição. [...] Ao mesmo tempo, uma decisão em sede de controle de constitucionalidade difuso, proferida por seis votos, pode proceder a alterações na estrutura jurídica do país, ultrapassando-se a discussão acerca da tensão vigência e eficácia de uma lei. [295]

Com efeito, no que tange à mutação constitucional do art. 52, X, da CF, defendida pelos Ministros Gilmar Mendes e Eros Grau, estar-se-ia extrapolando as fronteiras do conceito desse fenômeno, entabulado por Canotilho [296].

A proposta dos construtivistas visaria retirar da alçada do Senado a competência para suspender a lei declarada inconstitucional pelo STF e, concomitantemente, transformá-lo em mero publicador das decisões máximas. Tal proposta operaria irrefutável alteração do texto constitucional, vedado pela natureza do instituto.

Ressalta Nogueira, "que o Min. Gilmar Mendes está a fazer é mudando o próprio texto do art. 52, X, de maneira que está agindo na verdade como um legislador positivo, o que é constitucionalmente vedado ao STF" [297].

Demais, ressaltam que na própria Corte Constitucional a matéria seria bem dividida. Tome-se como exemplo a Reclamação nº 4.263/MT, julgada em 06 de abril de 2006, na qual o Ministro Carlos Britto entendeu incabível esta ação para garantir a autoridade da decisão proferida no HC nº 82.959-7/SP, vejamos:

sabe-se que as reclamatórias podem ser manejadas ante o descumprimento de decisórios proferidos, com efeito vinculante, nas ações destinadas ao controle abstrato de constitucionalidade, tanto quanto em processos de índole subjetiva (desde que, neste último caso, o eventual reclamante deles haja participado). 4. Com os olhos postos no caso concreto, observo que a decisão tomada no processo apontado pelo reclamante não possui efeito vinculante e eficácia erga omnes, razão pela qual o pronunciamento jurisdicional exarado nesse feito apenas tem a finalidade de atar as partes neles envolvidas. [298]

De se realçar que o Ministro Carlos Britto fez parte do quorum vencedor, o qual declarou a inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90, nos autos do HC nº 82.959-7/SP.

Em face disso, posto que o julgamento da Reclamação nº 4.335/AC esteja empatado – dois votos a favor da tese e dois contra –, o entendimento do Ministro Carlos Britto revela que o julgamento promete fortes emoções.

Acerca do destino da tese modernista, palpita Tesheiner [299]:

é improvável que o Supremo Tribunal Federal venha a adotar essa orientação, tendo recentemente decidido que não cabe reclamação para garantir a autoridade de suas decisões, por violação a Súmula ou a decisões proferidas em processos subjetivos dos quais o reclamante não foi parte.

Conjugados os motivos supra-analisados, a oposição renega a tese da abstrativização do controle concreto de constitucionalidade, propugnando pela mantença do sistema misto de controle das leis.

Por outro lado, aponta soluções para o problema dos efeitos erga omnes e vinculante das decisões difusas do STF. Uma, seria aprovar súmula com efeito vinculante, encurtando o caminho para o alargamento dos pronunciamentos da Corte. Outra, seria oficiar ao Senado Federal, conforme manda o art. 52, X, da CF, para que suspenda a execução da lei declarada inconstitucional. Em terceiro, em caso de renitência da Casa Legiferante, haveria a possibilidade de oficiar o Procurador-Geral da República para que ingressasse com ADI, se entendesse por bem [300].

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Sobre o autor
Deivid Sarmento Vaz

Assistente de Promotoria de Justiça do Ministério Público do Rio Grande do sul. Pós-Graduação em Direito Público

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VAZ, Deivid Sarmento. A abstrativização do controle concreto de constitucionalidade e o papel do Senado Federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2051, 11 fev. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12318. Acesso em: 29 mar. 2024.

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