ATIVIDADE ORDENADORA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA LIMITAÇÕES E SACRIFÍCIOS
Um dos objetivos e principal missão da Administração Pública é estabelecer a ordenação da conduta dos cidadãos. Para tal incumbência, o Estado toma por base os princípios dos interesses público e social. Essa atividade consagrada no Direito Administrativo brasileiro visa estabelecer a organização, direção, limitação, controle, fiscalização e orientação das relações entre privados, o chamado poder de polícia [14].
Com efeito, na tradicional definição de Caio Tácito, "o poder de polícia é, em suma, o conjunto de atribuições concedidas à administração para disciplinar e restringir em favor de interesse público adequado, direitos e liberdades individuais [15]"g.n..
A atividade administrativa de ordenação dos direitos individuais em decorrência do exercício do poder de polícia engloba toda intervenção do poder estatal na prática de atos desfavoráveis ou na imposição de gravames que incidam negativamente na posição das pessoas, limitando ou, até mesmo, extinguindo seus direitos por causa do interesse público [16].
Neste sentido, as intervenções administrativas, visando limitar direitos individuais, podem se dar:
1 - por meio de atos concretos e singulares no exercício do poder atribuído por lei à administração, tipo mais comum;
2 - diretamente de normas jurídicas, de leis ou de regulamentos, sem interposição de ato concreto pela Administração.
Em ambos os casos, deve-se observar o princípio da legalidade na versão mais estrita, na medida em que somente por atribuição legal, direta ou indireta — e, por vezes, constitucional — pode a Administração incidir negativamente sobre a esfera dos direitos individuais.
O administrativista espanhol J. Ramón Parada-Vazquez, relaciona as medidas de intervenção segundo o grau de intervenção:
1 - grau inferior - pode ser citada as obrigações de suportar, exemplo: inspeções ou os deveres de registro, que impõem pequenos ônus ou incômodos aos particulares;
2 – grau intermediário
2.1 - mais brando - estariam as exigências de autorização prévia para o exercício de um direito ou de uma atividade, exemplo: autorização para clinicar, autorização de funcionamento, dentre outras;
2.2 - mais grave - são as proibições formais de exercer atividade ou a imposição de condutas positivas e por fim;
3 - grau maior - sacrifício ou privação do direito em favor de um interesse público, mediante indenização [17].
Eduardo Garcia de Enterria sistematiza e identifica as "limitações administrativas de direitos" como mais ou menos gravosas:
1 - As menos gravosas: são as que atuam sobre as condições de exercício do direito, deixando intactos os seus elementos, as "delimitações administrativas do conteúdo normal de direitos" (que não incidem sobre o exercício do direito, mas, ao contrário, definem o seu próprio âmbito normal) e,
2 - As mais gravosas: como potestades ablativas reais (como, por exemplo, as desapropriações e as transferências coativas não expropriatórias) [18].
Com base nestes conceitos, alguns poderiam afirmar que o dispositivo, contido na norma do §1º do artigo 6º da lei 9.870/99, não se constitui uma limitação gravosa de maior de intensidade, haja vista a garantia realizada pelo legislador a empresa-escola de cobrar os créditos havidos neste período de prestação de serviço de forma forçada. Afirmação que não representa uma verdade factual; primeiro, em razão do processo, pois todos nós sabemos que apesar das últimas reformas introduzidas no Código de Processo Civil, os trâmites são ainda muito lentos, caros e, na maioria das vezes, ineficazes; em segundo lugar, o autor, depois de longa espera, quase sempre obtém o provimento jurisdicional favorável a sua pretensão, o que efetivamente não representa a satisfação do direito pelo réu, pois, além da morosidade, este pode realizar inúmeras manobras procrastinatórias - e o que é pior: com amparo legal, atrasa a entrega ou mesmo não entrega ao autor o bem tutelado pretendido. É o famoso "ganha, mas não leva".
Não bastassem as verdades factuais enumeradas junto ao judiciário, o legislador infraconstitucional, ao limitar as liberdades que dizem a respeito do gerir e decidir na manutenção dos contratos firmados por livre e espontânea vontade pelas partes, intervém de forma direta na empresa-privada. Esta intervenção traz de forma direta o endividamento com o fisco, pois o suposto crédito, além de ser difícil de ser recuperado, incorpora ainda a base de cálculos dos tributos. Não bastasse o endividamento com o fisco, a empresa-escola, em face de não poder enxugar seu quadro de funcionários, passa a se endividar com os trabalhadores
contratados, atrasando salários e proporcionando o mal-estar na coletividade que passa a viver com dificuldades.
Além da obrigação da empresa-escola em manter contratos por força de lei, tem agora a obrigação de financiar, mesmo sem condições, a atividade escolar. Isto lhe traz prejuízos seguidos e altera as características de sua atividade, pois o gestor escolar passa então a se preocupar com formas de obtenção de recursos financeiros para que não venha responder ações penais por crimes tributários.
Há ainda, e não se pode deixar de mencionar, a função social da empresa-escola que emprega funcionários e, enquanto saudável, contribui com o pagamento de tributos para o crescimento do país. Neste sentido, poder-se-ia verificar o interesse público presente na forma de atuar da escola, conformando com os ideais constitucionais.
E. García de Enterría descreve que o conteúdo das limitações administrativas de direitos é toda "incidência que não modifica o direito subjetivo afetado, nem tampouco a capacidade jurídica ou de atuar do titular, operando, exclusivamente, sobre as condições do exercício do direito, deixando inalterados todos os demais elementos desse (configuração, funcionalidade, limites e proteção)". g.n.. Tais limitações seriam impostas para tornar compatíveis os direitos dos particulares com os da comunidade [19].
A Administração, freqüentemente por ignorância ou má-fé, tem se valido de medidas ou formas que ordinariamente são tidas como meras limitações ou delimitações para impor gravames ao patrimônio, autênticos sacrifícios de direito.
Segundo Patrícia F. Baptista [20], nas últimas décadas a busca de um critério distintivo preciso entre as limitações e sacrifícios de direitos se tornou questão tormentosa no direito administrativo, sobretudo à vista de seus importantes reflexos práticos em reconhecer ou não o caráter indenizável dos sacrifícios e a não-indenizabilidade das limitações.
Carlos Ari Sundfeld [21], em artigo publicado, descreveu três critérios largamente utilizados pela doutrina para distinguir os sacrifícios das limitações, são eles:
1 - o critério da transferência patrimonial;
2 - do veículo da instituição do gravame e,
3 - o da generalidade ou singularidade da medida.
Depois de apontar os critérios, Carlos Ari Sundfeld, em crítica, afirma que nenhum dos três critérios apontados apresenta solução satisfatória para a distinção entre as limitações e os sacrifícios.
O autor afasta o critério da transferência patrimonial, afirmando que nem sempre o sacrifício atinge bem corpóreo. Neste caminho, poder-se-ia afirmar que os supostos créditos, créditos fictos, auferidos pela prestação de serviço forçada, não servem para as empresas educacionais quitarem seus débitos com o fisco e os envolvidos na prestação do serviço, o que importa afirmar que os bens corpóreos da sociedade empresarial ou dos sócios servirão aos pagamentos das dívidas contraídas face à intervenção do Estado na atividade econômica.
Quanto ao critério do meio instituidor, o professor descreve que o gravame não poderia ser medido somente por uma distinção meramente formal, devendo ser considerado o efeito sobre o direito, como bem relatam Parada, Enterrie, Patrícia e muitos outros doutrinadores e juristas.
Por fim, quanto ao critério da medida-geral e da medida-singular, embora seja o mais difundido na doutrina, não oferecem solução isolada e absoluta para a distinção entre sacrifícios e condicionamentos.
É preciso reconhecer que há casos em que gravames impostos singularmente não importam em sacrifícios do direito e que há outros em que gravames de incidência genérica podem gerar direito à indenização [22].
Neste sentido, faz necessário conjugar de acordo com J.A. Santamaría o critério da intensidade do gravame.
"(...) as limitações, evidentemente, não podem ser indenizáveis, quando possuam alcance geral ou quando, por sua intensidade, imponham às
pessoas privadas gravames que não excedam aos inconvenientes normais que impõe a vida em sociedade (p.ex. a obrigação de desvio em uma rodovia por razão de obras); Porém o dever indenizatório se faz presente nos casos opostos de limitações singularizadas a sujeitos determinados, que suponham uma ruptura do princípio da igualdade ante as cargas públicas e que excedam os parâmetros de incômodo antes citados" [23]. g.n.
O gravame com uma obrigação de prestação de serviço na forma como determinado pelo dispositivo atacado afeta garantias constitucionais, ainda que por força de ato de alcance geral, contém uma intensidade que suprime o conteúdo mínimo essencial do direito, o que configura um sacrifício e, portanto, deve ser indenizado pela Administração, em sendo diferente, fere o texto constitucional.
A imposição legal, como realizada pelo dispositivo, a nosso ver, poderia gerar à escola, que recebe este tipo de crédito, o direito de pagar ao fisco com os títulos havidos desta relação ou mesmo incluir no pólo passivo da ação de cobrança a União Federal visando a responsabilizá-la pelos valores que deixou de receber ante a impossibilidade de rescisão imediata do contrato com o inadimplente.
A doutrina brasileira, para aferir a intensidade da medida administrativa, tem levado em conta o grau de preservação do valor ou da utilidade econômica do direito em função do gravame imposto [24].
Nem sempre será necessário recorrer a critérios econômicos para aferir a efetiva existência de um sacrifício de direito e, por conseguinte, do dever de indenizar pelo Poder Público. O sacrifício poderá ser constatado pela mera inviabilidade do exercício de direito para os fins aos quais naturalmente se destinaria [25].
Parece-me certo concluir que a designação da regra atacada não é uma mera limitação, mas, sim, um sacrifício de direito, uma limitação de grau máximo, em função das características que assume, quando grava propriedade e transcende os meros limites da inconveniência.
A limitação, imposta pelo dispositivo da lei atacada, fere as regras e incisos dos artigos 5º e 170, da Constituição Federal como já destacado.
A LIVRE INICIATIVA - A ATIVIDADE DO ENSINO E A CONSTITUIÇÃO
A Constituição da República Federativa do Brasil, ao instituir o Estado Democrático de Direito, o fez ante uma união indissolúvel dos membros que o compõem, declarando e assegurando ao povo brasileiro direitos individuais, políticos, sociais e difusos.
Os direitos individuais, políticos e sociais reconhecidos como fundamentais derivam das liberdades, verdadeiras garantias realizadas no texto constitucional que devem ser perseguidos por todos.
Dentre outras garantias sociais perseguidas pelo Estado, está o trabalho e a livre iniciativa [26], pois somente com o trabalho o homem garante a sua subsistência digna, além de proporcionar o crescimento do país com justiça. A valorização do trabalho, através da livre iniciativa, estabelece a dignidade da pessoa humana e liberdades [27].
A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Ellen Gracie, julgando Recurso Extraordinário, afirmou que o princípio da livre iniciativa não deve ser utilizado na tentativa de se afastar das regras de regulação do mercado ou de defesa do consumidor [28], e que o exercício de qualquer atividade econômica pressupõe o atendimento
aos requisitos legais e às limitações impostas pela Administração no regular exercício de seu poder de polícia, premissa que se faz verdadeira, se observada pelo lado do equilíbrio necessário do mercado, evitando monopólio, oligopólios, cartéis ou outras práticas que possam subjugar o povo à vontade de uma ou mais empresas com um único fim.
Por outro lado, torna-se questionável, quando se verifica que tais limitações transcendem os limites da defesa do interesse difuso, do consumidor e intervém de modo a suspender ou mesmo restringir direitos garantidos à livre iniciativa, ou seja, de gerir o seu negócio, de manter uma vida digna a todos os envolvidos no trabalho, professores e auxiliares.
Neste sentido, a ingerência se faz presente quando o governo, visando garantir a educação em face de sua inoperância no ensino público gratuito, se intromete na intimidade da empresa-escola para obrigá-la a manter um serviço, mesmo que por um determinado tempo, sem nada receber, somente com uma suposta garantia legal de que poderá receber os créditos havidos neste período de obrigação forçada por lei, o que não se conforma com uma realidade factual, pois, quando a empresa-escola chega a ponto de se indispor com o cliente, é porque há muito à relação de consumo ou de comércio está desgastada, a confiança quebrada em razão do cliente não estar cumprindo com sua parte: o pagamento. Assim, garantir créditos onde já não se recebia é impor, é ingerir, é suprimir direito de liberdades, é impor sacrifícios à livre iniciativa.
Tal assertiva encontra seus próprios limites no artigo 174 da Constituição Federal, em que está descrito que o agente normativo e regulador da atividade econômica - Estado deve exercer suas funções de Administração na forma da lei. Portanto, com observação à Constituição Federal.
O STF, em outra decisão, assim se posicionou quanto ao tema:
"A possibilidade de intervenção do Estado no domínio econômico não exonera o Poder Público do dever jurídico de respeitar os postulados que emergem do ordenamento constitucional brasileiro. Razões de Estado – que, muitas vezes, configuram fundamentos políticos destinados a justificar, pragmaticamente, ex parte principis, a inaceitável adoção de medidas de caráter normativo - não podem ser invocadas para viabilizar o descumprimento da própria Constituição. As normas de ordem pública – que também se sujeitam à cláusula inscrita no art. 5º, XXXVI, da Carta Política (RTJ 143/724) - não podem frustrar a plena eficácia da ordem constitucional, comprometendo-a em sua integridade e desrespeitando-a em sua autoridade." (STF - RE 205.193 - Rel. Min. Celso de Mello - DJU 06.06.1997)" g.n
É mister, portanto, a compreensão de que a intervenção do Estado na economia deve respeitar os postulados que emergem do ordenamento como verdadeiros princípios que estabelecem direitos fundamentais, descritos nos incisos XXII, XXIV, do artigo 5º, parágrafo único, incisos II e IV do artigo 170 [29] da CF/88.
Os Desembargadores Nelson Schiesari e Brenno Marcondes, em julgado, reconheceram que o ensino é livre à iniciativa privada, atendidos os cumprimentos das normas gerais da educação e a avaliação pelo poder público, não podendo as escolas privadas serem equiparadas às escolas públicas [30], afirmação está que só vem confirmar que não poderá o legislador infraconstitucional criar limites a direitos fundamentais que a Constituição Federal não criou.
A obrigação excessiva, trazida pela limitação do dispositivo atacado, torna a escola obrigada a financiar os estudos de inadimplentes, ou seja, torna a escola refém do Poder Público, que não cumpre com suas obrigações de garantir educação. Ressalte-se que tal limite confronta com própria regra do Fies, Lei n.º 11.552/07, que obriga o interessado a apresentar em alguns casos até 5 fiadores solidários para obter o financiamento dos estudos pelo Estado.
A excessiva obrigação do caput do artigo 6º da Lei 9.870/99 induz certamente a uma outra falsa premissa de que a escola poderá cobrar seus créditos e recebê-los mediante ação própria.
O suposto crédito, havido por imposição de lei, não encontra garantias reais que possam suportá-lo. Assim, a escola, também obrigada ao parcelamento da anuidade pela mesma lei, não tem outra opção a não ser contratar um advogado para ingressar na justiça na tentativa de localizar bens para receber créditos, trazendo à escola um outro ônus, o da justiça.
Este excesso via intervenção na gestão da empresa-escola retira liberdades do gestor e estabelece o desequilíbrio nas contas das escolas (receita X despesas), gerando o endividamento com o Estado, contratados e fornecedores muitas das vezes impagáveis.
Na realidade, a limitação, como realizada, mesmo que transvertida na forma de lei, mostra-se um verdadeiro sacrifício às escolas, pois além daqueles ônus já descritos (risco dos patrimônios da empresa e particular do gestor com o endividamento da empresa) o gestor tem,
a partir do endividamento com o fisco, sua liberdade ameaçada em face dos chamados crimes tributários, além de comprometer o bem-estar social (garantia de emprego), isto em face da ingerência estatal em proibir a suspensão ou rescisão dos contratos de prestação de serviços com os inadimplentes.
Nunca é demais ressaltar que a atividade econômica assume uma função social, quando torna possível o emprego, proporcionando o respeito e a dignidade a todos os envolvidos na atividade.
A atividade educacional - prestação de serviço - regulada na Lei 9.870/99, encontra como base para soluções de conflitos o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil Brasileiro, mais especificamente a parte especial dos direitos e obrigações, contratos, conforme caput do artigo 6º.
O legislador infraconstitucional, ao dispor sobre os dois códigos no caput do artigo, quis garantir, inicialmente, ao contratante a proteção ao consumo, ou seja, garantia do recebimento da carga horária educacional contratada, sem, contudo, desobrigá-lo do dever de cumprir com a obrigação contratual contida no artigo 1092, do C.C. de 1916 (no código atual artigos 476 e 477). Nota-se que o dispositivo é taxativo e específico. Com esta disposição, o legislador preservou não só a liberdade de contratar, artigo 421 C.C., como também o princípio da livre iniciativa. Tal assertiva nos permite afirmar que os efeitos produzidos pelos contratos estabelecidos incorporaram o patrimônio e possibilitam, através do equilíbrio econômico e financeiro da empresa, a manutenção de empregos, conseqüentemente o bem-estar social e o interesse público com o pagamento de tributos que contribuem ao crescimento do país.
Notadamente, os direitos fundamentais conformados em gerações trazem aos entes o dever de ofertar a educação gratuita, função social garantida pelo direito positivado no texto constitucional essencial ao desenvolvimento do indivíduo. Na impossibilidade desta prestação de serviços pelo poder público, o Estado deve buscar políticas públicas alternativas que visem à efetiva realização do seu dever, sem impor aos particulares, que prestam este tipo de serviços, sacrifícios de forma indireta. Implementar ações através de programas tais como o PROUNI, para atendimento à educação em todos os níveis [31], pode ser uma saída ao problema
de inadimplência vivido na grande maioria das escolas, ou ainda, pagar os impostos que vencem mês a mês com os créditos auferidos pela força da regra atacada.
Em decisão em M.S. que versou sobre a intervenção da União na gestão da saúde no Município do Rio de Janeiro, o STF concedeu segurança ao Município face não ser possível a União requisitar bens e serviços públicos sem a necessidade de estado de defesa.
A decisão afirma não ser possível a União intervir na gestão do Município e se apossar dos bens públicos por falta de previsão legal [32]. Tal decisão importa na afirmação de que o governo quando edita uma lei e impõe ao particular o dever de manter um contrato com quem não cumpre sua obrigação, na realidade, está se apossando dos bens particulares, pois a lei intervém, ferindo direitos de liberdades.
A referida decisão garantiu ao município do Rio de Janeiro a autonomia de sua gestão e trouxe ainda à baila a impossibilidade de requisições de bens de públicos, ressaltando ser possível a requisição de bens ante as necessidades coletivas, urgentes e transitórias decorrentes de situações de perigo iminente, de calamidade pública ou de irrupção de epidemias, asseguradas as indenizações devidas, conformando a decisão com o texto constitucional.
É fato que a educação, considerada necessária à coletividade, pode ser requerida de forma transitória mediante os requisitos enumerados. Entretanto, o dispositivo atacado que obriga o particular a prestar a educação promove uma requisição indireta. A forma, como realizada a requisição, sem meios que assegurem uma justa indenização, subjuga a livre iniciativa em face da subjetividade do crédito que não serve a nada, sequer para cobrar.
O Estado, com bens reconhecidamente necessários a sobrevivência digna do homem, como no caso da água, energia, gás e outros, adota uma conduta diferente, permitindo que as concessionárias suspendam o serviço por tempo determinado, até que seja saldado o débito com a empresa. Neste sentido, a empresa-educacional que cumpre um papel social relevante, deve também ter preservado seu equilíbrio econômico-financeiro, a fim de que o serviço educacional seja suspenso até o efetivo pagamento.
Assim, as limitações gravosas, impostas à livre iniciativa, devem ser precedidas de motivos que autorizem o Estado a impor limites aos direitos e garantias constitucionais mediante indenização.
As requisições de bens pelo Estado devem ser exercidas nos limites da lei específica. A inobservância destes limites traz vícios e fere a Constituição Federal. O dispositivo, que retira dos empresários os direitos e garantias fundamentais tais como a liberdade de decidir e a gerência dos negócios, agrava o patrimônio da empresa e o do gestor, colocando em risco a
liberdade dos gestores envolvidos e, por fim, comprometendo o bem-estar social (garantia de emprego), trazendo o endividamento da empresa privada.