Nos termos do Código de Processo Civil, o cumprimento de sentença que determina o pagamento de soma será realizado conforme os artigos 475 – I ao 475 – R do CPC, artigos estes que foram incluídos pela Lei n. 11.232/2005.
Segundo a conceituação legal, a execução será provisória quando se tratar de sentença impugnada mediante recurso ao qual não foi atribuído efeito suspensivo (§ 1º do artigo 475-I, CPC).
Importante, nesta toada, destacar a consideração doutrinária sobre o instituto, já nos termos do procedimento adotado pela Lei 11.232/2005: O critério, agora, é a estabilidade do título executivo em que se funda a execução: se se tratar de decisão acobertada pela coisa julgada material, a execução é definitiva; se se tratar de decisão judicial ainda passível de alteração (reforma ou invalidação), em razão da pendência de recurso contra ela interposto, a que não tenha sido atribuído efeito suspensivo, a execução é provisória. [01]
Assim, uma vez prolatada sentença que contempla a obrigação de pagamento por quantia certa, impugnada mediante recurso desprovido de efeito suspensivo, poderá o credor, ainda que não tenha ocorrido o seu trânsito em julgado, lançar mão da mencionada execução provisória da sentença, realizando, inclusive, todos os atos executivos para a satisfação completa da obrigação, desde que cumpridas as exigências legais.
A grande discussão vivenciada atualmente no Direito Processual Civil Brasileiro repousa exatamente sobre a aplicação do artigo 475 – J do CPC às execuções provisórias, em especial a multa de 10% (dez por cento) inserta no aludido comando legal, havendo entendimentos doutrinários conflitantes, os quais merecem serem expostos a fim de possibilitar uma conclusão mais farta e compreensível.
Inicialmente, cumpre expor uma primeira corrente doutrinária, na qual entre os doutrinadores, o ilustre processualista Humberto Theodoro Júnior [02], defende que a multa de 10% (dez por cento) do artigo 475 – J do CPC não é devida na execução provisória. Vejamos:
. Durante o recurso sem efeito suspensivo, é possível a execução provisória, como faculdade do credor, mas inexiste, ainda, a obrigação de cumprir espontaneamente a condenação para o devedor. Por isso não se pode penalizá-lo com a multa pelo atraso naquele cumprimento.A multa em questão é própria da execução definitiva, pelo que pressupõe sentença transitada em julgado
Convém lembrar que o direito de recorrer integra a garantia do devido processo legal (CF, art. 5º, inciso LV), pelo que o litigante não poderá ser multado por se utilizar, adequadamente e sem abuso, desse remédio processual legítimo. [...]Dessa maneira, há na própria sistemática do direito processual uma inviabilidade de punir-se o devedor por não cumprir a sentença contra o qual interpôs regular recurso.
[...]a multa do art. 475-J não tem caráter repressivo de litigância de má-fé. Sua função é de mera remuneração moratória. Se o recurso for manifestamente protelatório, o executado não ficará impune; ficará, isso sim, sujeito a uma punição mais grave, cabível por atentado à dignidade da justiça. [...].
(g.n.)Em linha de pensamento distinta, há outra corrente doutrinária, a qual entende ser perfeitamente possível a aplicação do art. 475 – J do CPC no procedimento de execução provisória, bem como a multa de 10% prevista no mencionado artigo. Vejamos:
. Até porque, vale a pena o destaque, a execução ''não provisória'' de pagamento de soma em dinheiro também é uma ''faculdade'' do credor, já que o caput do art. 475-J reclama, nestes casos, que ela seja requerida ao juiz, vedada a atuação judicial de ofício para tanto. [03](g.n.)Assim, a idéia de facultatividade da execução provisória não deve causar qualquer estranheza quanto à circunstância de seu cumprimento observar o modelo executivo do art. 475-J, inclusive no que diz respeito à incidência da multa de 10% a que se refere o caput do art. 475-J
O Ministro Athos Gusmão Carneiro ensina que na execução provisória o credor - tendo aguardado o transcurso dos 15 dias - acrescentará à planilha de cálculo também a multa de 10%. [04]
O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo já se pronunciou sobre o tema, afirmando que a execução provisória implica as mesmas regras da definitiva - Obrigação do devedor de depositar o valor, no prazo legal, se não quiser arcar com a multa de 10%. [05] (g.n.)
Sobre a partir de qual momento é que se conta o prazo para pagamento na execução provisória, o referido Tribunal já decidiu que tratando-se de execução de sentença ainda não transitada em julgado, deve a devedora ser informada de que terá início o curso do prazo para pagamento da dívida sem multa, através de intimação de seu advogado constituído, pela imprensa. [06]
O Superior Tribunal de Justiça, órgão do Poder Judiciário que poderá, na condição de responsável pela interpretação das Leis Federais, solucionar definitivamente a questão interpretativa ora exposta, já se pronunciou sobre o tema em inúmeras decisões monocráticas [07], entretanto, conforme já se tem notícia [08], no Resp 1.059.478-RS, o STJ, reconhecendo a relevância do assunto e sua abrangência, remeteu a questão à Corte Especial para que a mesma decida a respeito do cabimento da multa do artigo 475 – J em execução provisória.
Enquanto a Corte Especial do STJ não se pronuncie, podemos concluir que, nos termos dos demais entendimentos supra expostos, a doutrina e a jurisprudência sem inclinam no sentido de, praticamente de forma pacífica, admitir a aplicação do art. 475 – J do CPC à execução provisória, inclusive no que concerne a multa de 10% estampada em seu caput, eis que sequer há ressalva legislativa que distinga e execução provisória da execução definitiva com relação a multa. Entretanto, ao que se percebe, a exemplo do que ocorre com a execução definitiva, o ponto nada pacífico é definir a partir de qual momento processual deve ser iniciada a contagem do prazo para pagamento: se a partir da sentença condenatória, se a partir da intimação na pessoa do advogado, ou, ainda, se a partir da intimação pessoal do executado.
Com o devido respeito a todos os preciosos ensinamentos expostos, entendemos que a execução provisória deve, por sua própria natureza, ter tratamento diferenciado da execução definitiva, ou seja, se nesta entendemos que o prazo para pagamento deve ser contado a partir do trânsito em julgado, naquela podemos afirmar que o prazo deve se iniciar a partir da intimação do executado, na pessoa do seu advogado, eis que, por se tratar de mera faculdade, o início da execução provisória pode sequer ser pretendido pelo credor, que, analisando a possibilidade do recurso da parte adversa lograr êxito, prefira aguardar o julgamento definitivo da lide, ocasião em que se livrará de qualquer risco de posteriormente se ver obrigado a indenizar eventuais perdas e danos a favor do executado (475 – O, inciso I, CPC).
Por derradeiro, somente para reforçar ainda mais a idéia da possibilidade de aplicação do artigo 475 – J do CPC à execução provisória, cumpre mencionar que o próprio artigo 475 – O do CPC dispõe que deve ser aplicado à execução provisória, no que couber, os dispositivos da execução definitiva, reservando o aludido artigo tão-somente alguns regramentos específicos (precauções) para a execução provisória, sem, contudo, fazer qualquer ressalta/precaução com relação a multa de 10%, com o acertado e louvável propósito de conciliar os interesses de efetividade do credor e, por outro lado, de segurança jurídica do devedor.
Notas
- DIDIER JÚNIOR, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. 2. ed. Editora JusPodivm, 2008. p. 499.
- THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Processo Civil. Processo de execução e cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 53.
- BUENO, Cássio Scarpinella.Variações sobre a multa do caput do art 475-J do CPC In Aspectos Polêmicos da Nova Execução de títulos judiciais, Lei 11.232/2005. Coordenação Teresa Arruda Alvim Wambier – São Paulo. Revista dos Tribunais, 2006, p 151.
- Centro de Estudos do TJRS. Reformas do CPC – Questionamentos. Disponível em: www.tj.rs.gov.br/institu/c_estudos/Ref_processuais_ques_controvertidas.doc
- Agravo de Instrumento n. 7.117.343-0. 15ª Câmara de Direito Privado. Relator: Antônio Ribeiro. Data do Julgamento: 06.03.07 – v.u.
- Agravo de Instrumento n. 1.225.318-0/2. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Relatora: Silvia Rocha Gouvêa - julgamento: 27/01/2009
- Ag 1030987 (03.02.2009); REsp 1075719 (07.10/.008); Ag 1001494 (13.06.2008); MC 014169 (06.05.2008); Ag 993387 (09.03.2008); MC 013395 (16.10.2007); REsp 956197 (11.06.2008).
- http://www.stj.gov.br/SCON/infojur/doc.jsp?livre=@cod=0373