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Da não incidência da contribuição previdenciária sobre planos de saúde oferecidos pelas empresas a seus empregados

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I - Delimitação do Tema

Trata-se de saber se incide a contribuição previdenciária, por parte do Empregador, sobre o valor dos planos de saúde oferecidos a empregados.

Segundo a Receita Previdenciária, o termo remuneração previsto no inciso I, do art. 28, da Lei nº 8.212/91 compreenderia os Planos de Saúde oferecidos pela Empresa aos seus Empregados, tendo em vista, tanto a literalidade do disposto na Lei nº 8.212/91, quanto o disposto no art. 458, da CLT. Assim, os valores devidos ou pagos a funcionários, ainda que in natura, ou em forma de utilidades, incorporar-se-iam à remuneração para todos os efeitos legais, e constituiriam base de incidência das contribuições previdenciárias.

No nosso entender, esta interpretação estaria equivocada, por imparcial ante a redação do art. 458, §2º, da CLT pela Lei 10.243/01.

Advertimos que o objeto foi feito levando-se em consideração ao máximo a ótica tributária, do ponto de vista da relação Receita do Brasil – Empresa. A análise trabalhista, que leva em consideração a relação Empresa-Colaborador não é objeto de nossa análise, pois possui outros desdobramentos que fogem ao tema aqui proposto.


II. – Plano de Saúde não integra a remuneração: Interpretação literal, teleológica e jurisprudencial

No nosso entender, os planos de saúde, seja em decorrência de interpretação integrada dos preceitos legais e constitucionais, seja por uma questão de filosofia moral prática e justiça social, não integram o salário-de-contribuição. Portanto, não podem ser objeto de incidência da contribuição previdenciária.

A matéria sob exame recebe tratamento na Constituição Federal, em seu art. 201, § 11 (com redação dada pela EC nº 20/98) [01]. A questão, então, está em definir corretamente o conceito de salário ou de remuneração para fins de incidência da contribuição previdenciária. Ou seja, deve-se saber o que integra o assim denominado salário-de-contribuição.

A Lei nº 8.212/91, definiu o que seria salário-de-contribuição em seu art. 28. Em referido dispositivo, indica que, para o segurado empregado, o salário-de-contribuição englobaria a remuneração mais os seus ganhos habituais sob a forma de utilidades. Todavia, é importante observar que o conceito de remuneração previsto na norma não é tão extensivo. Aliás, observemos que o artigo em tela foi alterado pela Medida Provisória n° 1.596-14, posteriormente convertida na Lei nº 9.528/97, que emprestou a referido dispositivo a redação atual [02].

Ou seja, pode-se inferir que a confusão estabelecida para saber se Plano de Saúde integra ou não o salário-de-contribuição, foi instaurada após a modificação levada a efeito pela MP 1.596-14/97. Vejamos por que.

Para o que importa, deve-se observar a justificativa da Edição da mencionada Medida Provisória, abaixo transcrita:

"15. Para a implantação do novo sistema torna-se necessário unificar as bases contributivas da Previdência Social e do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço-FGTS, a partir de um conceito comum e mais abrangente de remuneração, com a devida adequação da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1.991, que ora se faz, e, em breve, da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990.

16. Tal proposta facilitará o acompanhamento comparativo das arrecadações previdenciária e trabalhista, propiciando maior integração entre as duas fiscalizações, seja por intermédio de ações conjuntas ou de intercâmbio de subsídios fiscais, propiciando o aparelhamento do Estado quanto às informações necessárias ao atendimento de direitos do trabalhador. Além disso, as empresas ver-se-ão desobrigadas do preenchimento obrigatório de documentos legais, que captam informações significativamente similares, possibilitando-lhes reduzir as suas atividades administrativas com repercussões sobre os custos de sua atividade econômica.

17. No âmbito do Estado, além da redução dos custos envolvidos da administração e processamento dos instrumentos hoje existentes, estimada em centenas de milhões de reais, a unificação permitirá a conjugação de esforços integrados em torno do novo documento de coleta, evitando paralelismo da ação governamental no controle de bases de dados pulverizadas, dando condições para um melhor desempenho operacional dos órgãos governamentais.

18. Nesse sentido, faz-se necessária alteração em vários dispositivos da Lei nº 8.212, de 1991, e Consolidação das Leis do Trabalho-CLT.

19. A alteração do art. 28 da Lei nº 8.212, de 1991, faz-se necessária para melhor caracterizar o salário-de-contribuição, identificando, detalhadamente, as parcelas que o integram e as que não sofrem contribuições previdenciárias, possibilitando maior segurança ao contribuinte nessa obrigação que ora se lhe pretende imputar, além de reunir num só ato legal diversas disposições esparsas em várias leis. Por outro lado, é antecipada, no âmbito da Precidência Social, a alteração do conceito de remuneração, para fins de incidência de contribuição previdenciária, visando à unificação com o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, que, em breve, dar-se-á na área trabalhista." (grifamos)

O Sistema a que a justificativa faz menção é o CNIS, que deveria ser aperfeiçoado por intermédio de uma nova guia que unificasse as informações que devem ser prestadas pelo Empregador. Ou seja, que unificasse os conceitos relativos à base de incidência das diversas exações previstas em lei.

Portanto, ao que tudo indica, o Plano de Saúde integraria o salário-de-contribuição para facilitar as fiscalizações previdenciárias, trabalhistas e do sistema do FGTS, desde que as normas necessárias fossem harmonizadas entre si.

No entanto, referida consolidação não ocorreu, como previsto na justificativa acima transcrita. Realmente, o art. 15, da Lei nº 8.036/90 (Lei do FGTS), permaneceu com a sua redação original, in verbis:

"Art. 15. Para os fins previstos nesta Lei, todos os empregadores ficam obrigados a depositar, até o dia 7 (sete) de cada mês, em conta bancária vinculada, a importância correspondente a 8% (oito por cento) da remuneração para ou devida, no mês anterior, a cada trabalhador, incluídas na remuneração as parcelas de que tratam os artigos 457 e 458, da CLT, e a gratificação de Natal a que se refere a Lei nº 4.090, de 13 de julho de 1962, com as modificações da Lei nº 4.749, de 12 de agosto de 1965." (grifamos)

Importante observar que a Lei do FGTS, ao invés de fazer remissão ao conceito de remuneração previsto no art. 28, da Lei nº 8.212/91, faz remissão ao conceito de remuneração previsto nos arts. 457 e 458, da CLT.

Ocorre que os arts. 457 e 458, da CLT não foram modificados para adequar-se ao espírito do art. 28, da Lei nº 8.212/91. Ao contrário observe-se que que houve revogação tácita do art. 28, § 9º, "q", da Lei nº 8.212/91, pela Lei nº 10.243/2001, que acrescentou o § 2º, ao art. 458 da CLT.

Com efeito, apesar do art. 28, da Lei nº 8.212/91 tratar do conceito de remuneração, de uma forma abrangente, a CLT o faz de forma diferente. E para o que importa, expressamente exclui o pagamento de plano de saúde do conceito de salário e, por via de conseqüência, do conceito de remuneração, o que faz com que não se possa admitir a afirmativa segundo a qual, por previsão no art. 458, da CLT, o Plano de Saúde integra o salário para os fins de cálculo da contribuição previdenciária. Vejamos.

Diz o art. 457, da CLT, a respeito de remuneração:

Art. 457

. Compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber.

Ou seja, remuneração constitui-se de salário mais gorjetas. Mas tal definição é insuficiente. Necessita-se saber o que é salário. Sua definição legal encontra-se no art. 458, da CLT:

Art. 458

- Além do pagamento em dinheiro, compreende-se no salário, para todos os efeitos legais, a alimentação, habitação, vestuário ou outras prestações "in natura" que a empresa, por força do contrato ou do costume, fornecer habitualmente ao empregado. Em caso algum será permitido o pagamento com bebidas alcoólicas ou drogas nocivas.

§ 2º Para os efeitos previstos neste artigo, não serão consideradas como salário as seguintes utilidades concedidas pelo empregador:

IV – assistência médica, hospitalar e odontológica, prestada diretamente ou mediante seguro-saúde. (com redação dada pela Lei nº 10.243, de 10.06.2001) (grifamos)

Ora, se as parcelas referidas no § 2º, do art. 458, da CLT, não são nem salário, nem gorjeta, não podem ser consideradas como remuneração. E se não são remuneração, não constituem base de cálculo para o salário-de-contribuição. Resulta, pois, demonstrado, tecnicamente, que Plano de Saúde não integra a base de cálculo para fins de incidência da contribuição previdenciária. Mas não é só.

Interessante é notar que a razão pela qual se optou por excluir as parcelas referidas do conceito de salário, é de cunho estritamente social e benéfico para o trabalhador.

A Mensagem nº 1.115/00 do Poder Executivo que encaminha o Projeto de Lei que se converteu na Lei nº 10.243/2001 (DCD de 1º de setembro de 2000, p. 44.935), assim justifica o acréscimo do § 2º ao art. 458, da CLT:

"4. A proposta modifica, ainda, o § 2º do art. 458, da CLT, que dispõe sobre o salário in natura, para determinar que os benefícios, concedidos pelo empregador, relativos a educação, transporte, assistência médica, hospitalar, e odontológica, seguros de vida e de acidentes pessoais e previdência privada, não integram o salário. A carência de serviços e benefícios sociais indica a conveniência de estimular as empresas a concederem benefícios que proporcionem aos trabalhadores maior segurança e satisfação, sem ônus subseqüente de outra natureza. A proposta atende a essas expectativas desvinculando tais benefícios do salário."

Referida idéia foi acolhida pelo Relator na Casa de Origem, Deputado Pedro Côrrea, que assim se posicionou a respeito:

"Outra modificação proposta pelo Projeto de Lei nº 3.253, de 2000, tem a ver com as parcelas que, expressamente, deixarão de ser consideradas salário. Tratam-se de benefícios que, muitas vezes, não são concedidas pelo empregador, porque integram a remuneração do trabalhador, sobre eles incidindo contribuições sociais como Previdência Social, Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, Sistema "S", Salário Educação, entre outras contribuições, que somam aproximadamente 35% além de servir de base de cálculos para o 13e, férias e verbas rescisórias (40% sobre o FGTS). Com isso, trabalhadores deixam de receber benefícios como educação, transporte destinado ao deslocamento para o trabalho (alteração proposta no presente projeto), assistência médica, seguros de vida e de acidentes pessoais, previdência privada entre outros."

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O Professor Wladimir Martinez [03] também parece não discordar:

"Aliás, em vários momentos a lei prestigiou os benefícios trabalhistas e estimulou ou incentivou a empresa a propiciar, diretamente, os meios de consecução da seguridade social, como assistência social e à saúde, fundos de pensão, cooperativas de consumo, planos de saúde, clubes patronais, bolsas de estudos, empréstimos subsidiados e muitíssimas outras modalidades de salário indireto.

Dividiu com o particular obrigações ínsitas ao Estado.

Salário-de-contribuição, ente pecuniário matemático-financeiro, base de aferição da cotização do trabalhador (e fulcro do cálculo dos benefícios) e da empresa, é palavra tomada em sentido genérico, abarcando a medida e o fato gerador dos contribuintes. Quer dizer, pelo menos, duas entidades, a) como composto (conteúdo); e b) importância do valor (nível).

No bojo das fontes de custeio, por seu papel de expressão monetária da incidência da contribuição, sobressai a definição do salário-de-contribuição. Não obstante este aspecto, historicamente os textos legais conheceram redação singela e, de certa forma, ainda a têm, em visível conflito coma a extraordinária importância da matéria tratada.

A linearidade assinala-se por dois motivos mínimos: a) ao referir-se, pura e simplesmente, à remuneração, não conceituada em particular; b) tendo optado por esta solução, remeter imediatamente ao instituto jurídico não previdenciário ainda não consolidado.

Do art. 28 do PCCS deflui a concepção íntima do conceito. Os elementos integrantes da definição, presentes no texto legal, presumidos ou nele historicamente impregnados, são: a) remuneração, como núcleo fundamental; b) destinação da contribuição; c) contraprestatividade, isto é, a idéia de ser pelo trabalho ou para o trabalho; d) totalidade da importância; e) nada significar o título; f) consumação do pagamento; g) integração no patrimônio do trabalhador; e, finalmente, h) origem da retribuição.

Desses itens, convêm destacar alguns (letras a, b e c). A finalística do aporte é ressaltada; a contribuição custeia os benefícios socialmente postos à disposição do segurado e dependente. Não tem sentido, se o pagamento assumido pela empresa é a própria prestação previdenciária.

Como salientado, a remuneração é o núcleo do conceito de salário-de-contribuição. Presente desde os primórdios da previdência social, foi escolhida para ser a principal, senão a única referência da cotização.

Só interessam os bens incorporáveis ao patrimônio da pessoa, sejam materiais ou intelectuais, a serem substituídos pela prestação previdenciária.

Não é só o órgão gestor da Previdência Social juridicamente quem paga benefícios. Muitas vezes, a lei delega essa atribuição à empresa, e disso é exemplo clássico os "primeiros quinze dias" do auxilio-doença, prestação securitária atribuída ao empregador, ex vi do art. 60, § 3º , do PBPS. Consentânea com essa linha de raciocínio, diz a Formulação CJ/MPAS n. 016/81, in Proc. MPAS n. 014.869/80 e IAPAS n. 1.025.951/80.

Circunvizinha do tema, à mesma conclusão chegou Maria Wilma de A. S. Rezende, da Consultoria-Geral do MPS, quando decidiu pela não incidência de contribuição sobre o atendimento à saúde, oferecido pela empresa (Parecer CJ/MPS n. 141/91). Não ignorava trata-se de ganho habitual, mas considerou o fato de se cuidar de prestação securitária antecipada pelo particular.

A empresa sub-roga-se no dever do Estado de ministrar a seguridade social. E, por via de conseqüência, não se justifica tal oferecimento se constituir em hipótese de incidência de exação previdenciária. Faz parte integrante da natureza da contribuição a sua finalística. Atendido diretamente o objetivo da previdência social, em condições ideais, dada a proximidade gerada pelo contrato de trabalho, entre quem enseja a proteção e o protegido, não tem cabimento subtrair-se do próprio montante parcela a ser utilizada na sua consecução. Não respeita a lógica sedimentadora da construção do ordenamento científico da seguridade social; portanto, tal raciocinio deve ser estendido (e estimulado) a todas as prestações laborais com cunho previdenciário, principalmente quando o acréscimo operado fica fazendo parte indissociável da pessoa humana, podendo esta todo o tempo com ele contar." (grifamos)

Sendo o Plano de Saúde um benefício relevante prestado pelo Empregador, devemos apreciar um outro argumento relativo a saber se a contribuição previdenciária incide na hipótese de o Empregador não oferecer o Plano de Saúde a todos os seus colaboradores, conforme previsão na Lei de Custeio.

Há um primeiro aspecto que deve ser observado. Não haveria problema à Empresa oferecer o Plano de Saúde a parte de seus colaboradores. Primeiro, porque não sendo salário, não enfrenta o problema da isonomia prevista no art. 461, da CLT que determina que a um mesmo trabalho deve ser paga uma mesma remuneração.

Mas o segundo motivo, mais relevante, é que o art. 444, da CLT, autoriza a flexibilidade das relações laborais, podendo as partes negociarem seus benefícios e suas obrigações livremente, desde que não contravenham às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos, e às decisões das autoridades competentes.

Ora, se o Empregador é livre para estipular os benefícios que deseja oferecer, e a quem deseja oferecer, não há prejuízo nenhum em referida atividade, já que, como visto, não sendo o Plano de Saúde remuneração, não incide no caso o princípio da isonomia.

Ainda, por amor ao debate, questionar-se-ia, sobre a possibilidade de haver um conceito de remuneração para o direito previdenciário e outro para o direito trabalhista. A idéia é cientificamente errônea e já foi rechaçada pelo Supremo Tribunal Federal.

No "Leading Case" RE 166.772/RS [04], o Supremo Tribunal Federal entendeu que as definições técnicas inseridas no art. 195, I, da Constituição Federal devem ser interpretadas em conformidade com a dimensão que lhes empresta o Direito do Trabalho. Essa a conclusão a que chegaram os Ministros Marco Aurélio, Celso de Mello, Sepúlveda Pertence, Sydney Sanches, Néri da Silveira, Moreira Alves e Octavio Galloti. Eis a Ementa:

O Min. Celso de Mello afirmou em seu voto que: "a locução constitucional "folha de salários", inscrita no art. 195,I, da Carta Política, há de ser definida em função de critérios estritamente técnicos, a serem considerados na exata e usual dimensão que lhes confere o Direito do Trabalho."

No mesmo sentido é o seguinte excerto do voto do Min. Moreira Alves: "(...) realmente já foi demonstrado, desde o voto do eminente Ministro –Relator e em alguns dos votos que o seguiram, que a expressão "salário" é usada univocamente na Constituição no sentido de salário trabalhista. Mesmo para fins previdenciários – como se vê do art. 201 -, "salário" está empregado no sentido de remuneração em decorrência de vínculo empregatício."

O argumento de autoridade dos votos acima transcritos já seriam, por si só, suficientes para balizar qualquer interpretação a respeito, dada à conhecida proeminência dos Mins. Celso de Mello e Moreira Alves no Cenário Jurídico nacional. Mas ainda que assim não fosse, a força da lógica nos conduz a concordar com os argumentos expostos: O conceito de salário e remuneração utilizado na Constituição é unívoco. Eles aparecem tanto no art. 195, quanto nos arts. 201 e 7º. O conceito de remuneração em referidos artigos deve expressar a mesma idéia, a mesma conotação e denotação. Do contrário, não faria sentido falar-se em técnica ou ciência do Direito e estaríamos ao arbítrio do intérprete, o que não se admite em matéria de vinculação tributária, como no caso de cobrança de contribuição previdenciária. E esta idéia deve ser a expressa em Direito do Trabalho.

A razão é simples: Primeiro, porque o art. 7º está todo direcionado para a interpretação e aplicação do Direito do Trabalho. Sendo o art. 7º Cláusula Pétrea da Constituição – que não pode ser alterado a não ser por meio de uma nova Constituição -, o disposto no art. 201 deve ser interpretado em harmonia com as suas diretrizes, voltadas ao direito laboral.

Segundo, porque o art. 110 do Código Tributário Nacional – que é norma interpretativa do sistema tributário, inclusive na aplicação de cobrança previdenciária, dispõe que "a lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias."

Ora, se a Constituição deve ser técnica, então o conceito de remuneração deve ser o mesmo, seja para fins trabalhistas, seja para fins previdenciários. Prevalecendo o conceito de remuneração do Direito do Trabalho, este deve ser buscado no art. 458, da CLT. Referido conceito não pode ser alterado por outra legislação, por expressa vedação do Código Tributário Nacional (art. 110).

Também a jurisprudência do Col.TST aponta para o mesmo caminho no sentido de unificação do conceito de remuneração com prevalência da definição prevista na CLT. Assim, o RR 772.413/2001 (DJ de 14/11/2002, 2ª Turma, Rel. Juiz Convocado Altino Pedrozo dos Santos); e o RR 782.805/2001, (DJ de 05/04/2002, 4ª Turma, Rel. Min. Ives Gandra Martins Filho). Além destes arestos, podemos citar o processo AC 20037100062211-9/RS, do Tribunal Regional Federal da Quarta Região, e o RO 00324-2005-002-24-00-2, do Tribunal Regional do Trabalho da Vigésima Quarta Região.


III.- Conclusão

Vê-se, portanto, que não é possível a cobrança de contribuição previdenciária sobre plano de saúde, pois colide com a literalidade do art. 458, § 2º, da CLT, e pode ser rechaçada com base em autorizada doutrina e jurisprudência, tanto do Supremo Tribunal Federal, quanto do Tribunal Superior do Trabalho.


Notas

  1. Art. 201
  2. (...)

    § 11º Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e conseqüente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei.

  3. Art. 28. Entende-se por salário-de-contribuição:
  4. I - para o empregado e trabalhador avulso: a remuneração auferida em uma ou mais empresas, assim entendida a totalidade dos rendimentos pagos, devidos ou creditados a qualquer título, durante o mês, destinados a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador de serviços nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa; (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 10.12.97)

    § 9º Não integram o salário-de-contribuição para os fins desta Lei, exclusivamente: (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 10.12.97)

    q) o valor relativo à assistência prestada por serviço médico ou odontológico, próprio da empresa ou por ela conveniado, inclusive o reembolso de despesas com medicamentos, óculos, aparelhos ortopédicos, despesas médico-hospitalares e outras similares, desde que a cobertura abranja a totalidade dos empregados e dirigentes da empresa; (Incluído pela Lei nº 9.528, de 10.12.97)

  5. MARTINEZ, Wladimir Novaes. Comentários à lei básica da previdência social: tomo I, plano de custeio: Lei n. 8.212/91. 6ª.ed. São Paulo: LTr, 2008. Fls. 347-348
  6. RE 166772/RS; Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO; Tribunal Pleno; DJ 16-12-1994 PP-34896 EMENT VOL-01771-04 PP-00703
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Sobre o autor
Sergio Lindoso Baumann Pietroluongo

Advogado. Especialista em Direito Público na UniDF

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PIETROLUONGO, Sergio Lindoso Baumann. Da não incidência da contribuição previdenciária sobre planos de saúde oferecidos pelas empresas a seus empregados. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2226, 5 ago. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13278. Acesso em: 19 abr. 2024.

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