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As parcerias público-privadas no sistema penitenciário brasileiro

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17/09/2009 às 00:00

Resumo:


  • As experiências de gestão compartilhada em presídios no Brasil, embora ainda incipientes, mostram resultados positivos, como a redução da reincidência criminal e a melhoria das condições de cumprimento de pena.

  • As parcerias público-privadas (PPPs) surgem como alternativa para enfrentar a crise do sistema prisional, permitindo investimentos em infraestrutura e gestão sem comprometer imediatamente os recursos públicos.

  • Opiniões de especialistas se dividem entre os que veem na privatização uma forma de melhorar a eficiência e qualidade dos serviços penitenciários e os que criticam a mercantilização do sistema prisional e possíveis violações aos direitos dos detentos.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Resumo: Este trabalho trata da adoção de parcerias entre o Estado e a iniciativa privada, no que se refere à administração de sistemas prisionais. Dentre as necessidades mais importantes da atualidade temos a questão do sistema prisional brasileiro, que, com raras exceções, encontra-se falido e quase sem perspectivas de melhorias. Daí a urgência em se adotar inovações na gestão desse campo tão importante. Historicamente e em outros países, temos a comprovação de que a adoção do sistema de Parcerias Público-Privadas na gestão prisional apresenta resultados positivos. No Brasil não temos, ainda, nenhuma experiência desse tipo, entretanto já possuímos, desde o final da década de 90, experimentos em alguns Estados acerca da terceirização de determinados serviços em penitenciárias estaduais. O resultado destes experimentos se mostrou positivo. Evoluímos, com a normatização e conseqüente implantação, ainda na sua fase inicial, mas totalmente prevista e regulamentada, do sistema de parcerias público-privadas para a construção, manutenção e operação de complexos penitenciários em alguns Estados. A experiência recente de terceirização de determinados serviços em presídios, nos serve para comprovar que deve ser proporcionado ao presidiário um cumprimento de pena em condições minimamente dignas, e com isso proporcionar-lhe a tão almejada ressocialização.

Palavras-chave: Parceria Público-Privado; PPP; Gestão Compartilhada; Presídio; Presidiário;Ressocialização.

Sumário: Introdução. 1. Breve histórico da experiência internacional. 1.1. A gestão compartilhada nos presídios brasileiros. 2.1. Fundamentação jurídica. 2.2. Experiências brasileiras. 2.2.1. Paraná. 2.2.2. Ceará. 2.2.3. Bahia. 2.2.4. Espírito Santo. 2.2.5. Amazonas. 3. As parcerias público-privadas brasileiras. 3.1. A implantação de PPPs para penitenciárias em Pernambuco. 3.2. A implantação de PPPs para penitenciárias em Minas Gerais. 4. Opiniões de especialistas. 5. Conclusão. 6. Referências bibliográficas.


INTRODUÇÃO

A situação atual do Brasil, referente à política de administração penitenciária, é bastante preocupante. Exceto raras exceções, o sistema prisional brasileiro apresenta bem mais problemas do que soluções. A superlotação, tanto em presídios, cadeias públicas e delegacias, trazem outros em sua esteira, como a falta de atendimento à saúde, péssima alimentação, corrupção do sistema entre outros, sendo que, dessa forma, o objetivo maior, que é a ressocialização do apenado para que ele possa retornar ao convívio em sociedade apto a este relacionamento, muito raramente é alcançado.

Este trabalho visa analisar as experiências obtidas com o sistema de gestão compartilhada na administração de presídios, para, então, se chegar à consideração de que a política de utilização de parcerias público-privadas na gestão prisional terá maior ou menor possibilidade de obter sucesso.

Inicialmente, foram analisadas as experiências em outros países no tocante à gestão compartilhada e privatizações na administração em presídios.

Posteriormente, verificamos algumas das experiências brasileiras realizadas nesse mesmo sistema de co-gestão de penitenciárias (que se trata da terceirização de determinados serviços em algumas penitenciárias), nos estados do Paraná, Ceará, Amazonas, Bahia e Espírito Santo, bem como as fases atuais de implementação do sistema de parcerias público-privadas nos estados de Pernambuco e Minas Gerais.

Discorremos, ainda, sobre a opinião de diversos especialistas no tema, acerca das vantagens e desvantagens da adoção desse tipo de parceria (PPPs) no sistema prisional brasileiro e, por fim, concluímos analisando criticamente a importância desse tipo de gestão, em mais um processo de evolução da sociedade brasileira.


1. BREVE HISTÓRICO DA EXPERIÊNCIA INTERNACIONAL

As parcerias público-privadas nascem da necessidade de o Estado buscar parceiros no desenvolvimento de infra-estrutura e serviços públicos para o atendimento das demandas da sociedade. Essa associação se dá por vários fatores e em diferentes modos, mas tem início no final do século passado, se desenvolvendo no Reino Unido, na França, nos Estados Unidos, Portugal, Itália, Holanda e alguns países da América Latina, entre outros.

O conceito formal de parceria público-privada depende de cada país em que está inserida, podendo significar private finance initiative (iniciativa financeira privada) na Inglaterra, purchase-of-services contracts (contratos de aquisição de serviços) nos Estados Unidos, ou contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada ou administrativa, no Brasil.

As PPPs estão relacionadas às diferentes formas de articulação entre o setor público, empresas e organizações não governamentais. Essa articulação tem por objetivo viabilizar projetos de interesse para a sociedade ao mesmo tempo em que supõem o exercício de atividade empresarial pelo setor privado. Nas PPPs existe a previsão de retorno positivo para todos os envolvidos. No setor público, esse retorno positivo está relacionado aos objetivos sociais, econômicos e políticos. Já no lado do parceiro privado, o retorno, normalmente, diz respeito ao capital financeiro, todavia, há casos de parcerias em que ambos os envolvidos não visam o retorno financeiro, que são os casos em que o Estado faz parceria com fundações/instituições sem fins lucrativos.

Com relação ao sistema carcerário, existem cerca de 200 presídios privados no mundo, sendo a metade deles nos Estados Unidos. O início da experiência americana com a privatização de presídios se deu na década de 1980. Hoje, esse modelo penitenciário atende 7% dos condenados. Já na Inglaterra, 10% da população carcerária está em penitenciárias com administração terceirizada. Na Austrália, que é a recordista mundial, esse percentual sobe para 17%. África do Sul, Canadá, Bélgica e Chile também aderiram à privatização. Um levantamento do governo australiano mostra que um preso em regime privatizado pode custar menos que na cadeia pública - lá, o custo cai de US$ 55 mil para US$ 34 mil. Para os donos dos presídios, os números da privatização nos Estados Unidos sugerem que o negócio não é ruim. O valor de mercado da Correction Corporation of America, a maior empresa do ramo, saltou de US$ 200 milhões para US$ 1 bilhão em cinco anos.1

Mas nem todos os exemplos são tão bem-sucedidos. Na Nova Zelândia, o Estado retomou o controle do único presídio que estava sob administração empresarial.

1.1. A EXPERIÊNCIA DA INGLATERRA

No Reino Unido, a concepção de parceria público-privada, até 1989, baseava-se em um conjunto de regras e diretrizes que determinava que projetos – como a construção de estradas, presídios e hospitais – deveriam estar sob a responsabilidade do setor público e, se acaso houvesse participação privada, a cobertura dos investimentos se daria pelo Estado. Essas regras se destinavam a regular o modo como o investimento privado se daria nas empresas nacionalizadas daquele país.2

Em maio de 1989 o governo britânico extinguiu esse conjunto de regras, alegando ter perdido a utilidade, surgindo então, em 1992, a versão inglesa das PPPs (Private Finance Initiative – PFI). Ela nasceu durante o governo do conservador John Major e tinha por objetivo estimular empreendimentos conjuntos envolvendo os setores público e privado em um contexto de implementação da agenda liberal de Margareth Thatcher. A PFI foi definida como o conjunto de ações para aumentar a participação do capital privado na prestação de serviços públicos.3

Os setores da Inglaterra que mais se utilizaram das parcerias público-privadas foram os de transporte, educação, saúde, presídios, defesa, lazer, meio ambiente, habitação, desenvolvimento de tecnologia e obras públicas em geral. Até o ano de 2003 totalizavam mais de 600 projetos de PFIs e um capital envolvido de mais de 50 bilhões de Euros. O projeto individual de maior envergadura na Inglaterra foi a construção, em 1996, da linha de trem – em parte submersa – que cruza o Canal da Mancha, com um custo de mais de 4 bilhões de Euros.

No final da década de 80 o sistema carcerário da Inglaterra atingiu um quadro de superpopulação que, somado ao alto custo de manutenção, levou esse país a adotar um modelo de sistema prisional privado. A escassez do número de vagas nos presídios foi um dos vários problemas enfrentados pela Inglaterra e País de Gales e resolvido com a privatização. O governo inglês assinou contratos com consórcios de empresas privadas para a construção de nove penitenciárias. Atualmente, dos 138 presídios existentes na Inglaterra, 9 são estabelecimentos privados.

As empresas que assinaram contratos com o governo Inglês construíram as penitenciárias, e tiveram como contra-partida financeira o recebimento de valores do governo por um prazo de 25 anos. Os presídios privatizados estão sendo construídos desde 1992, e as empresas são responsáveis por todos os setores do presídio exceto o transporte de presos para audiência ou julgamentos, que é executada por uma empresa privada de segurança, que não é a mesma que gerencia o estabelecimento prisional. Não há guaritas nem cercas elétricas, os guardas trabalham desarmados. Em 1999 e 2000, não houve fugas ou resgate no sistema de regime fechado. Os presídios são monitorados por câmeras de TV móveis nas partes interna e externa. Nas penitenciárias, entre o alambrado e a muralha existe no chão um sistema de alarme com fibras ópticas que impede o preso de cavar túneis. Cada cela abriga, na maioria dos presídios, dois detentos. Os primários jamais ficam na mesma cela que o reincidente. Mais de 15 mil condenados de uma população carcerária de 65 mil cumprem penas alternativas que são fiscalizadas, orientadas e supervisionadas por comissões. Além de aparelhos de segurança como os detectores de metais, a revista pessoal é feita em todas as autoridades inclusive nos advogados, sendo que, no Reino Unido apenas a Família Real está isenta da revista ao entrar num presídio.4

A adoção britânica da privatização de penitenciária diferiu-se do modelo norte–americano por centralizar o poder nas mãos do Estado e ainda por ser financiada com dinheiro arrecadado através de impostos ou de empréstimos ao mercado, contrariamente ao que ocorre nos Estados Unidos, onde as receitas para construção de prisões são financiadas com títulos públicos que necessitam de aprovação legislativa para serem emitidos e ainda são limitados a um determinado valor.

1.2. A EXPERIÊNCIA DOS ESTADOS UNIDOS

A experiência norte-americana em parcerias do Estado com o particular remonta de uma época mais longínqua que a inglesa e não está atrelada a um projeto, mas sim se origina de uma ocorrência natural, onde a Administração Pública buscou, em diferentes níveis, com empresas privadas e o setor não lucrativo, parcerias na prestação, principalmente em nível local, de serviços sociais. Na prestação de serviços sociais, o Governo americano é muito dependente da sua sociedade, pois esses serviços são, na sua maioria, ofertados por terceiros que estão em situação de cooperação com o setor público. Nos campos da educação e da saúde, a participação de organizações não-governamentais é bastante significativa, chegando a responder, até o ano de 2005, por metade dos hospitais, escolas e universidades do país e cerca de 60% das agências de serviços sociais, além da maior parte das organizações cívicas e organizações não governamentais.5

A idéia de privatização de prisões surgiu nos anos 80, no governo do presidente Ronald Reagan. Pretendia livrar o setor público das despesas da construção de penitenciárias e imprimir ao setor carcerário técnicas de gestão empresarial que, por sua vez, garantissem a eficiência que o setor público era incapaz de dar. De quebra, proporcionaria bons lucros para as empresas que tocassem o negócio. Nos Estados Unidos, há cerca de 150 prisões de administração privatizada em 28 Estados. A súmula 1981 da Suprema Corte dos Estados Unidos determina que "não há obstáculo constitucional para impedir a implantação de prisões privadas, cabendo a cada Estado avaliar as vantagens advindas dessas experiências, em termos de qualidade e segurança, nos domínios da execução penal" 6.

Nos Estados Unidos, há mais de dois milhões de pessoas cumprindo pena em presídios e mais de 400 mil trabalham neles. 7

De acordo com o Departamento de Justiça americano, a economia para o governo com um presídio privado é de apenas 1% em relação a um presídio mantido pelo Estado. Opositores da privatização também afirmam que os administradores das cadeias fazem lobby por leis mais duras e encarceramentos mais longos. Entretanto, o principal ponto positivo do exemplo americano é de que, quando a gestão é privada, a implantação de novas unidades custa menos e é mais rápida. Uma unidade privada de 350 vagas é entregue em cinco meses a um custo de US$ 14 mil por vaga. Pela mesma obra, o governo gasta quase o dobro, US$ 26 mil, e o prazo de entrega é de dois anos. Trata-se de uma preciosa lição para países com déficit de vagas.8

Antes de efetivada a privatização nos Estados Unidos, o marketing das prisões privadas foi feito, por mais de 15 anos, com base nas premissas de que os estabelecimentos prisionais privados poderiam fornecer serviços de alta qualidade e a preços mais baixos.

Por sua vez, esse processo de privatização de quase 10% das cadeias americanas é suspeito de engordar os lucros de empresários, pois há suspeitas de que tenha se transformado em uma indústria de criar presos. Hoje, por causa do lobby dessas empresas junto ao Congresso norte-americano para alongar penas e tornar mais rígidas as punições aos delinqüentes, o número de presidiários supera os dois milhões, sendo que cerca de 80% desses presidiários são pobres, negros ou latinos. Nos Estados Unidos, de cada quatro habitantes negros, um já foi preso.

Pelo trabalho que realizam, os presos recebem apenas US$ 0,28 por hora, enquanto o salário-mínimo no país é superior a US$ 5 por hora. Boa parte dessa diferença vai para o caixa das companhias. Dois estados, Texas e Califórnia, concentram quase 40% das 160 cadeias privadas e já gastam, com a manutenção das prisões — incluindo as que administram diretamente — mais do que aplicam em educação. No Texas, em 1980, cada preso custava US$ 13 por dia. Hoje, esse gasto chega a US$ 45. Na Califórnia, foram desembolsados US$ 5,3 bilhões na última década para a construção e renovação de celas. No total, os Estados Unidos dispendem aproximadamente US$ 40 bilhões por ano para manter todos seus presídios, orçamento que tende a crescer por causa do endurecimento das leis anti-drogas9.

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A privatização dos presídios também criou distorções nesse mercado. Apesar de 12 empresas estarem operando nos Estados Unidos, duas delas — a Corrections Corporations of America (CCA) e a Wackenhut Corrections Corporations — controlam dois terços das cadeias privadas do país. Juntas, faturam quase US$ 900 milhões por ano e, com 110 presídios, têm sob seu controle 103 mil presos. Nos últimos anos, com a imagem de eficiência vendida pelo governo americano, a CCA conseguiu contratos para administrar prisões em Porto Rico, Grã-Bretanha e Austrália. Por conta dessa expansão, o valor de mercado dessa empresa passou, nos últimos cinco anos, de US$ 200 milhões para mais de US$ 1 bilhão na Bolsa de Valores de Nova York. A Wackenhut, um pouco menor que a CCA, porém mais lucrativa, atua na Grã-Bretanha, África do Sul, Nova Zelândia, Curaçao e Canadá 10.

1.3. A EXPERIÊNCIA DA FRANÇA

O modelo francês de privatização do sistema prisional, apesar de ter sido inspirado no americano, foi implantado com várias diferenciações. Em 2004, o ministro da Justiça francês, Dominique Perben, lançou uma série de licitações voltadas para empresas privadas, com vistas à construção de 30 estabelecimentos até 2007, criando, assim, 13.200 novas vagas. O projeto foi orçado em 1,4 bilhão de euros, sendo que fazem parte desse sistema os grupos privados como Eiffage (ex-Fougerolles) e Bouygues. O setor designado como "hotelaria" (restaurante, lavanderia, etc.) será igualmente privatizado.

Houve a implantação de um sistema de co-gestão, onde o Estado e o grupo privado realizam um gerenciamento e a administração conjuntos do estabelecimento prisional. Nesse modelo o Estado indica o Diretor-Geral do estabelecimento, a quem compete o relacionamento com o juízo da execução penal e a responsabilidade pela segurança interna e externa da prisão. A empresa privada encarrega-se de promover, no estabelecimento prisional, o trabalho, a educação, o transporte, a alimentação, o lazer, bem como a assistência social, jurídica, espiritual e a saúde física e mental do preso, vindo a receber do Estado uma quantia por preso/dia para a execução desses serviços. 11

As prisões constituem um mercado extremamente atraente para os grupos privados, visto que a população carcerária não pára de crescer. Nos Estados Unidos, ela bate todos os recordes, com uma taxa de encarceramento de 686 para 100.000 habitantes em 2003. Na Grã-Bretanha, existem 135 detentos para 100.000 habitantes, assim como em Portugal; na Espanha, são 125 presidiários para 100.000; na Itália, 100 para 100.000; na Holanda, 93 para 100.000; na Bélgica, 85 para 100.000. Embora, na França, esta proporção esteja entre as mais baixas (99 para 100.000 habitantes em 2003), o número de presos aumentou em 32 % desde 1990. Em 1° de julho de 2003, ele totalizava 63.652, ou seja, 2.689 a mais que um ano antes, sem que tenha havido alteração no número de vagas (48.600). Nunca a taxa média de ocupação foi tão alta: 128,3 %. 12 Na França, 6% da população carcerária está cumprindo pena em presídios terceirizados 13.


2. SISTEMA DE GESTÃO COMPARTILHADA NOS PRESÍDIOS BRASILEIROS

A Gestão Compartilhada é um modelo pelo qual cada parceiro mantém sua identidade institucional e programática dirigindo pessoas, esforços e recursos para fins comuns e integrados. No tocante à utilização desse tipo de sistema na gestão prisional, o Estado terceiriza alguns serviços ao parceiro privado, tais como: fornecimento de refeições; aquisição de uniformes; serviços de lavanderia, entre outros. As experiências nacionais estão em algumas penitenciárias de seis estados brasileiros. São eles Amazonas, Ceará, Bahia, Espírito Santo e Santa Catarina (o Paraná, que foi o pioneiro, retomou totalmente a administração de seus presídios). São 16 penitenciárias, com 7.346 detentos. O Estado entrega, por um período de um a cinco anos, uma prisão já construída para uma empresa cuidar de toda a administração interna, da cozinha aos agentes penitenciários. O primeiro presídio gerido dessa forma foi o de Guarapuava, no Paraná, em 1999.

2.1. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA

O art. 24. da Constituição Federal prevê as regras de competência concorrente entre a União, Estados e Distrito Federal, estabelecendo quais as matérias que deverão ser regulamentadas de forma geral por aquela e específica por estes. Dentre as matérias, estabelece o inciso I do art. 24. da Carta Magna, a competência concorrente para legislar sobre direito penitenciário. Nesse diapasão está também o princípio da eficiência da Administração Pública o qual, agregado à legalidade, vem insculpido no art. 37. da Carta Maior. Desta forma, as Assembléias Legislativas de diversos Estados brasileiros editaram normas referentes às parcerias público-privadas como, por exemplo, a lei nº 12.234/2005 do Rio Grande do Sul, a lei nº 9.290/2004 da Bahia, a lei nº 14.868/2003 de Minas Gerais (nesta vem explicitado em seu § 1º, art. 5º, a autorização para contratos de PPPs na área do sistema penitenciário), entre outras.

Nos direitos fundamentais, a Constituição assegurou aos presos que a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado (art 5º, XLVIII), garantindo o respeito à integridade física e moral (art. 5º, XLIX). Como bem salienta José Roberto Pimenta Oliveira, "é irrefutável que, na prisão, tão-somente o direito à liberdade do preso encontra-se sob intervenção direta do Estado" 14 .

A atividade administrativa que orienta o sistema penitenciário deve ser delimitada no sentido de se fixar, com exatidão, o conjunto de atividades estatais vinculadas à execução da pena, considerando que esta atividade é resultado do exercício da função jurisdicional criminal, a qual, sem sombra de dúvida, cabe exclusivamente ao Estado. A partir dessa delimitação, a contratação administrativa pressupõe uma nítida separação entre os atos de jurisdição e os atos de administração, sendo que, inseridos nestes atos de administração verificam-se aqueles inerentes à função administrativa prisional que afetem o direito de liberdade do preso, nos quais a Administração Pública atua com coerção na produção de atos jurídicos e materiais, não podendo, portanto, serem objeto de delegação à iniciativa privada. De outra feita, aqueles atos afetos à atividade administrativa de gestão prisional, tais como a assistência material (fornecimento de alimentação, instalações higiênicas, assistência à saúde, jurídica, assistência social – visando o reingresso do preso - vestuário, entre outras) podem ser objeto de contratação administrativa.

Por derradeiro, nos finaliza José Roberto Pimenta Oliveira:

"como apenas as atividades materiais de gestão não se concretizam via atos jurídicos e atos materiais coercitivos relativamente à esfera jurídica titularizada pelos presos, somente elas podem ser legitimamente objeto de contratação de prestação de serviços por entes privados, além da construção da obra do próprio estabelecimento penal. 15

2.2. EXPERIÊNCIAS BRASILEIRAS

2.2.1. PARANÁ

O estado do Paraná é o pioneiro em matéria de gestão compartilhada em estabelecimentos prisonais. A Primeira Penitenciária Industrial do País, destinada a presos condenados do sexo masculino, em regime fechado, foi inaugurada em 12 de novembro de 1999, está localizada no Município de Guarapuava, distante 265 km de Curitiba e tem capacidade para abrigar até 240 presos. A Penitenciária Industrial de Guarapuava foi construída com recursos dos Governos Federal e Estadual. O custo total incluindo projeto, obra e circuito de TV foi no valor de R$5.323.360,00, sendo 80% provenientes de Convênio com o Ministério da Justiça e 20% do Estado do Paraná.

A unidade foi concebida e projetada objetivando o cumprimento das metas de ressocialização do interno e a interiorização das unidades penais (preso próximo da família e local de origem), política esta adotada pelo governo do estado do Paraná, que busca oferecer novas alternativas para os apenados, proporcionando-lhes trabalho e profissionalização, viabilizando, além de melhores condições para sua reintegração à sociedade, o benefício da redução da pena. Seu projeto arquitetônico privilegia uma área para indústria de mais de 1.800m2. No barracão da fábrica trabalham 70% dos internos da unidade, em 3 turnos de 6 horas, recebendo como renumeração de 75% do salário-mínimo; os outros 25% são repassados ao Fundo Penitenciário do Paraná, como taxa de administração, revertendo esses recursos para melhoria das condições de vida do encarcerado. Essa penitenciária dispõe de um sistema de monitoramento dos setores, através de circuito fechado de TV, que permite a observação da movimentação dos presos no interior da unidade e externamente, no acesso de veículos e pessoas. Possui, ainda, portões automatizados, quadrantes suspensos, sistema detector de metais fixo e móvel de rádios.

Os custodiados que não estão implantados no canteiro da fábrica trabalham em outros canteiros, tais como: faxina, cozinha, lavanderia e embalagens de produtos. Todos recebem remuneração (75% do salário-mínimo) e o benefício da remição de pena (1 dia remido a cada 3 dias trabalhados). Os canteiros de trabalho funcionam em 3 turnos de 6 horas, possibilitando que todo o tratamento penal (atendimento jurídico, psicológico, médico, serviço social, odontológico, escola, atividade recreativa) seja executado no horário em que o interno não está trabalhando. 16 Essa gestão compartilhada, que não é sinônimo de parceria público-privada, teve origem em 1999, quando foi concedida à empresa Humanitas Administração Prisional S/C. A empresa ficou responsável pela alimentação, necessidades de rotina, assistência médica, psicológica e jurídica dos presidiários, ficando o governo do estado do Paraná responsável pela nomeação do diretor, do vice-diretor e do diretor de disciplina, que supervisionavam a qualidade de trabalho da empresa contratada e faziam valer o cumprimento da Lei de Execuções Penais. O estado do Paraná, quando, em 2005, ainda vigia o contrato com a empresa Humanitas, pagava o equivalente a cerca de R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais) por preso.

A grande parte dos criminosos que estão em Guarapuava praticou delitos de maior potencial ofensivo, como homicídio (35% do total), tráfico de entorpecentes (21% do total), latrocínio (20% do total) e estupro (15% do total). Para os demais crimes, restam apenas 9%. Dos ingressos no estabelecimento criminal, 181 (cento e oitenta e um) são primários, e 58 (cinqüenta e oito) reincidentes. A média de idade concentra-se entre 21 e 35 anos, abarcando 145 (cento e quarenta e cinco) detentos (60% do total) 17.

Antes de o governo paranaense finalizar os contratos de co-gestão dos serviços nos presídios, esse sistema havia se estendido para a Casa de Custódia de Curitiba, a Casa de Custódia de Londrina, a prisão de Piraquara e a prisão de Foz do Iguaçu.

Quanto à reincidência criminal, destaca-se que com os egressos do presídio de Guarapuava - em 2005 - era de 6%. Em Maringá, no mesmo Estado, tal índice alcançava 30%. A média nacional é de 70% de reincidência criminal 18.

2.2.2. CEARÁ

A implantação da gestão compartilhada em presídios no Ceará tem início em 17 de novembro de 2000, com a adoção desse sistema na Penitenciária Industrial Regional do Cariri, no município de Juazeiro do Norte. Destinada aos presos do regime fechado, a PIRC tem capacidade para 549 presidiários 19.

Com uma área de 15.000 m2, tem 66 celas coletivas para cinco presos cada uma e 117 para dois presos cada. Possui ainda 12 "quartos de convivência familiar", 850 metros de cercas eletrificadas, (com ouriços e sensores de movimento) sobre muralhas de 7m de altura; 17 guaritas; cozinha industrial; sistema de som; sala de controle por 64 câmaras de circuito interno; auditório com salão de artes e eventos; cabines telefônicas, play ground, campo de futebol, cinco quadras poliesportivas; painéis, orações e mensagens bíblicas abertos em paredes; fábricas de velas, calçados e bijuteiras e uma padaria, 4 salas de aula, biblioteca e administração, lanchonete, consultórios médico-odontológicos, enfermaria, farmácia, 5 refeitórios para detentos e mais 4 para a administração, lavanderia.

Em 30.05.01, foi inaugurado o Núcleo de Ressocialização, com a finalidade de preparar o encarcerado para ele enfrentar a discriminação ou as reservas da população com ex-presidiários. Para tanto, além do trabalho, dos exercícios físicos e da recreação, o preso recebe aulas, ouve palestras de psicólogos 20.

Essa co-gestão foi implementada com a Humanitas Administração Prisional S/C (posteriormente passando a se denominar Companhia Nacional de Administração Prisional – CONAP) e dentre as responsabilidades dessa empresa privada cita-se selecionar e contratar sob sua inteira responsabilidade, observadas as regras de seleção da Superintendência do Sistema Penal SUSIPE, preferencialmente da Região do Cariri, os recursos humanos necessários para o pleno desenvolvimento da Penitenciária Industrial do Cariri, assumindo os encargos administrativos dos mesmos, e cumprindo com todas as obrigações trabalhistas, fiscais, previdenciárias e outras, em decorrência de sua condição de empregadora/contratante.

A execução penal permanece nas mãos do estado, conforme afirmou o juiz da execução penal da Comarca de Juazeiro do Norte, no Estado do Ceará, José Josival da Silva: "[...] nossa penitenciária é terceirizada. Então, essa questão de limpeza, alimentação e outros serviços que englobam a chamada atividade-meio, é uma empresa que cuida. A parte referente à administração da pena, à execução mesma da pena, é da nossa competência. 21

De acordo com Marcos Prado, diretor de recursos humanos da CONAP, a execução da pena na Penitenciaria do Cariri:

"[...] você não pode comparar o que estamos fazendo aqui com uma simples detenção, uma simples cadeia. Aqui existe toda uma infra-estrutura visando ao atendimento da lei de execução penal, e obviamente, à ressocialização do preso. O nosso maior desafio é provar tanto para o governo quanto para a sociedade, que essa experiência dá certo 22 ".

No presídio existe toda uma infra-estrutura no sentido de dar efetividade ao princípio da ressocialização do preso. A maior ênfase ocorre no aspecto do trabalho executado na própria prisão. Isto existe graças a uma parceria efetuada entre a CONAP e algumas empresas da região. Através do trabalho, os internos ganham dignidade e obtém o benefício da remição, ou seja, para cada três dias trabalhados diminui-se um dia no tempo do cumprimento da pena. Nas palavras do próprio juiz José Josival: "[...] a importância central aqui é recuperar o homem pelo trabalho 23 ".

Nessa penitenciária, através de parceria com a empresa Criativa Jóias, 150 presidiários fabricam folheados, com uma produção de 250 mil peças/mês. Cada preso recebe cerca de 75% do salário mínimo por mês e redução da pena. 24

No tocante à individualização da pena, os serviços de assistência psicológica, de orientação social e sexual, tanto ao interno quanto ao egresso, são efetuados por um quadro de funcionários próprio da CONAP. Já a assistência jurídica é prestada na PIRC por um quadro composto por 04 (quatro) advogados contratados e auxiliados por estagiários que prestam a referidas assistência aos internos que não possuem defensores. A assistência religiosa, concebida como o direito de acesso à religião, é efetivada através de diferentes cultos religiosos. No que se refere à saúde dos presos, o atendimento é prestado por uma equipe composta de um médico, um psiquiatra, dois psicólogos, um dentista, dois enfermeiros e três assistentes sociais. A infra-estrutura física é dotada de um núcleo de saúde, em que são prestados atendimentos ambulatoriais, uma enfermaria e um centro cirúrgico no qual são feitos procedimentos cirúrgicos de baixa e média complexidade. A assistência educacional do preso se dá através de uma escola de ensino fundamental e médio na qual os internos recebem a instrução escolar. No tocante a superlotação penitenciaria, ressalta-se que a PIRC não possui esse grave problema, sendo que a lotação máxima alcançada foi de 520 internos (dados de 2005). Ainda com relação à assistência ao egresso, uma equipe de assistentes sociais dos quadros da própria CONAP realiza esse trabalho 25.

No ano de 2002, com apoio do Ministério da Justiça, o governo do Ceará levou adiante a política de terceirização dos estabelecimentos penais, inaugurando a Penitenciária Industrial Regional de Sobral – PIRS e o Instituto Presídio Professor Olavo Oliveira II.

A ampliação dessa política prisional deu-se, novamente, sob dispensa de licitação, custando para o Estado o valor R$ 3.220.076,80 (em relação à PIRS) e R$ 9.918.476,42 do IPPOO II. O IPPOO II tem 15 mil metros quadrados e capacidade para 492 detentos em 60 celas individuais e 72 celas para seis pessoas. Seu moderno sistema eletrônico de segurança possui serviços de áudio para comunicação interna, além de 34 câmeras de monitoramento, 12 sensores infravermelhos e três portais eletrônicos. O setor de saúde do Módulo de Tratamento Penal possui duas enfermarias, sala de fisioterapia, farmácia, dois consultórios médicos e um consultório dentário, além de posto assistencial de primeiros socorros. Já o setor jurídico dispõe de parlatório que permite até 12 atendimentos simultâneos, bem como sala para advogados e assistentes sociais. No Módulo de Instrução e Trabalho, os detentos têm seis salas de aula, uma biblioteca e cinco oficinas profissionalizantes. Uma moderna cozinha industrial, com câmara frigorífica e padaria compõe o Módulo de Serviço, que conta também com uma lavanderia. No Módulo de Convivência, os detentos e seus visitantes tem dois salões polivalentes para a realização de encontros e palestras e uma quadra de esporte. É também neste espaço que se localizam os 10 vestuários para encontros íntimos.

À administradora (Companhia Nacional de Administração Prisional - CONAP) cabe prover a alimentação, a manutenção e limpeza, vestuário e material de higiene para os presos. É ainda responsável pelo pessoal da área de segurança nas atividades de monitoramento das áreas de vivência, bem como o atendimento médico, odontológico, psicológico, social e jurídico. A supervisão das rotinas internas das oficinas de trabalho e as atividades de educação física dos detentos são igualmente atribuições da empresa administradora 26.

O Ministério Público Federal (em 2007) contestou a privatização dos presídios no Ceará - Penitenciária Industrial Regional do Cariri (PIRC), Penitenciária Industrial Regional de Sobral (PIRS) e Instituto Presídio Professor Olavo Oliveira II (IPPOO II). Para o MPF, o sistema de privatização das penitenciárias no Ceará tem ocorrido com dispensas de licitação sucessivas e elevadíssimos custos para o erário, de contratos de terceirização ou co-gestão prisional, sem qualquer respaldo legal. No Ceará, a população carcerária é de 11,5 mil presos. Dos 3 milhões de reais mensais da SEJUS, 1,6 milhão de reais são destinados aos presídios não terceirizados, enquanto 1,4 milhão de reais são repassados à Companhia Nacional de Administração Prisional (CONAP), empresa privada, responsável pelos presídios mais novos do Ceará, construídos entre 2000 e 2002. O custo médio por preso administrado pela CONAP é de R$ 920,00, sendo que nos outros dez presídios esse valor fica em R$ 650,00. 27

2.2.3. BAHIA

A população carcerária na Bahia está sob a responsabilidade de dois órgãos da administração centralizada, a Secretaria Estadual de Segurança Pública/Polícia Civil e a Secretaria da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos/Superintendência de Assuntos Penais. As estatísticas condensadas pelo Estado informam que o sistema prisional, em dezembro de 2007, possuía aproximadamente 13.919 custodiados (5.659 presos na polícia e 8.260 na Superintendência de Assuntos Penais) 28.

Desses estabelecimentos penitenciários 05 (cinco) são administrados a forma de gestão compartilhada. São eles, por ordem de implantação: Conjunto Penal de Valença (01/2003), Conjunto Penal de Juazeiro 08/2005, Conjunto Penal de Serrinha (08/2006), Conjunto Penal de Itabuna (11/2006) e Conjunto Penal de Lauro de Freitas (11/2006), totalizando 1.717 internos 29. Nas unidades em co-gestão baianas, o Estado indica o diretor-geral, o diretor-adjunto e o chefe de segurança. A empresa que vence a licitação administra todo o restante, desde o supervisor administrativo, médicos, dentistas, psicólogos, advogados, assistentes sociais, nutricionistas e professores até o agente penitenciário, chamado de agente de disciplina. A guarda de muralha é realizada pela Polícia Militar 30.

A Pastoral Carcerária na Bahia emitiu relatório, em 30 de março de 2008, a respeito da situação das unidades de aprisionamento. De acordo com esse relatório, os presos mantidos em delegacias "estão em celas subumanas, imundas, fétidas e superlotadas, sem nenhum tipo de assistência médica e com policiais civis custodiando presos. 31

Nas unidades penais de Valença, Itabuna, Serrinha, Juazeiro e Lauro de Freitas, que são administradas pelo modelo de co-gestão, o governo do Estado paga, por preso, o equivalente a algo em torno de R$ 1.400,00 (um mil e quatrocentos reais) por mês. Todavia, ainda conforme o relatório elaborado pela Pastoral Carcerária, a realidade nessas unidades é de que, "a preocupação apenas é manter o cidadão preso, sem que se possa dar qualquer destaque a projetos que, efetivamente, trabalhem a questão da ressocialização do apenado. A unidade penal da Secretaria da Justiça que tem mais detentos em atividade laborativa é o Conjunto Penal de Jequié, que não é terceirizado" 32 .

De outra feita, a Secretaria da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos divulgou, em dezembro de 2007, que as unidades prisionais da Bahia aumentaram oferta de emprego. Segundo a agência de comunicações do órgão:

"As unidades do interior que mais se destacam no número de cartas de emprego são o Conjunto Penal de Juazeiro, com 21 internos beneficiados, e o Conjunto Penal de Teixeira de Freitas, com 20. Na capital, a Colônia Lafayete Coutinho apresentou o maior acréscimo no número de cartas de emprego: 127%. O artesanato também apresentou crescimento nas unidades. No Conjunto Penal de Valença, essa atividade cresceu 238%, entre janeiro e outubro. A Lemos Brito é a unidade prisional onde mais se fabricam peças artesanais, registrando um aumento de 13% no mesmo período. 33

Em experiência inédita no país, a Pastoral Carcerária, por meio da Arquidiocese de Salvador, firmou convênio de gestão compartilhada com o governo Bahiano, em 2007, para administrar a unidade penal de Simões Filho, na região metropolitana de Salvador. O presídio abriga 324 internos em regime semi-aberto. A Pastoral Carcerária doou para a Colônia Penal de Simões Filho cerca de sete mil livros didáticos da 4ª a 8ª série, que ficarão, inicialmente, na biblioteca da unidade à disposição dos internos. Essa representa uma primeira iniciativa para a implantação de um sistema de ensino na unidade. Com 58 celas, além de quatro para visitas íntimas, a Colônia tem capacidade para cerca de 250 pessoas, dispõe de cozinha, lavanderia, oficina de trabalho e sistema eletrônico para fechamento de portas.

A pena em regime semi-aberto destina-se ao interno que apresenta bom comportamento e boa vivência carcerária (que estuda ou trabalha), o que dá a ele o direito de sair do cárcere para trabalhar e visitar a família. 34

2.2.4. ESPÍRITO SANTO

No estado do Espírito Santo, o modelo de co-gestão implantado com o governo estadual está presente em duas penitenciarias, a Penitenciária de Segurança Média de Colatina, em Colatina, e a Penitenciária de Segurança Máxima (PSMA) localizada no município de Viana.

Em julho de 2005 foi inaugurada a penitenciaria de Colatina, com capacidade para 300 vagas, sendo 24 delas destinadas à ala feminina. O governo estadual firmou parceria com o Instituto Nacional de Administração Prisional Ltda (INAP). O parceiro privado, além de arcar com os custos para aquisição, instalação e manutenção de equipamentos de segurança, uniformes (agentes, internos e funcionários), fornecimento de colchões, roupas de cama, kits de higiene, alimentação e serviços de apoio à cozinha, instalação de uma estrutura para atendimento médico, odontológico e enfermaria, também oferece trabalho e educação para os internos do presídio.

Com o modelo de co-gestão, a empresa contratada pelo governo do Estado, oferece aos internos serviços ocupacionais, mantendo um setor de seleção e ocupação, sob supervisão da direção, com as atribuições de selecionar os internos para as atividades nos canteiros de trabalho, elaboração de relatório de freqüência dos internos ao trabalho, para efeito de remuneração e emissão de atestado de trabalho para efeito de remissão da pena. O presídio dispõe de mais 6 salas específicas para o desenvolvimento de atividades voltadas para o trabalho dos internos. Além do trabalho, a empresa mantém salas específicas para estudos. Nestes locais os internos freqüentam aulas do ensino básico e fundamental. E todas as alas do presídio são monitoradas por um sistema de câmaras, inclusive na portaria 35.

No ano de 2006 a penitenciária de Colatina registrou um foco de rebelião em uma de suas alas (cerca de 53 internos), devido à reivindicação dos presos contra a proibição da entrada de malotes na penitenciária. O presídio não estava superlotado (possuía cerca de 300 presos), e possuía todas as assistências necessárias garantidas, incluindo quatro alimentações diárias e atendimentos médicos. A reivindicação dos presos não foi atendida e, após 11 horas de protesto, a penitenciária voltou à normalidade.

A Penitenciária de Segurança Máxima, localizada no município de Viana, também adotou, em 2007, o sistema de Gestão compartilhada com o Instituto Nacional de Administração Prisional Ltda (INAP); tem capacidade para 500 vagas e foi totalmente reformada com recursos próprios do Estado, com gastos no valor de R$ 6,7 milhões, no início do ano passado. A PSMA conta com circuito interno de TV com 64 câmeras, espaços e salas para a administração, alojamento para agentes, ambulatório com consultório médico, psicológico e atendimento odontológico, pessoal técnico da unidade e área de segurança, quatro salas para fins pedagógicos e educacionais, uma sala de múltiplo uso e uma biblioteca, salas para assistência social e jurídica, defensoria pública e assistência psicológica, além de áreas de visitas para familiares e seis quartos para encontros íntimos cada ala. 36

2.2.5. AMAZONAS

No estado do Amazonas, o governo estadual firmou parceria com a empresa Companhia Nacional de Administração Penitenciária (CONAP), com a finalidade de terceirizar serviços na área de três penitenciárias. São elas, o Complexo Penitenciário Unidade Prisional do Puraquequara, com capacidade para 614 internos, destinado aos presos provisórios; o Instituto Penal Antonio Trindade, presídio de segurança máxima com capacidade para 496 presos do regime provisório; e o Complexo Penitenciário Anísio Jobim, presídio com capacidade para 450 presos do regime fechado e 138 vagas no regime semi-aberto (estas não terceirizadas, sendo administradas pela Secretaria de Justiça do Estado).

Em outubro de 2007, durante um inspeção-surpresa, 25 dias após uma rebelião, no Instituto Penal Antônio Trindade, o Corregedor de Justiça, o representante da OAB e o Ministério Público constataram que houve falha da CONAP, empresa que administra o presídio.

Durante a rebelião, ambulatórios e gabinetes odontológicos foram destruídos, ar-condicionados queimados, departamento jurídico também destruído, bebedouro quebrado e restos de colchões incendiados. Na avaliação da comissão que inspecionou o IPAT, a culpa pela rebelião, que durou mais de 14 horas, foi da Companhia Nacional de Administração Prisional (CONAP). "constatamos que a atuação da CONAP nessa cadeia é péssima. Não há treinamento adequado, falta assistência médica e de higiene. Ouvimos vários detentos e o que ouvimos e vimos nos leva a constatar que a rebelião foi culpa da falta de preparo de agentes da CONAP" 37 disse João Simões - corregedor-geral de justiça - ao deixar o presídio.

Tudo o que foi levantado durante a inspeção surpresa no IPAT – falhas, omissões, desmandos e maus tratos de presos -, foi transformado em relatório e enviado ao governo do Estado, ao Ministério Público e à OAB para que as providências fossem tomadas. "verificamos de forma comprovada que a rebelião foi culpa da falta de preparo dos agentes da CONAP. E juntamente com o Ministério Público e a Ordem dos Advogados iremos iniciar um movimento para que toda essa situação seja sanada" disse Simões. O desembargador afirmou também que não é admissível que uma empresa contratada pelo Estado, que recebe um valor para cumprir com suas obrigações contratuais, não o faça. "isso é dinheiro público. Os presos que estão aguardando julgamento perderam sua liberdade, mas não perderam o direito de ser tratados como seres humanos". 38

O relatório do sistema prisional brasileiro de 2006, elaborado pelo Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva, no tocante à fiscalização por parte da administração Pública em penitenciárias administradas pelo modelo de co-gestão, é incisivo:

"A Secretaria de Segurança e Direitos Humanos do Estado não exerce efetivo controle sobre a atuação da empresa que administra uma penitenciária e uma cadeia pública em Manaus. E quando a sociedade civil, o Centro dos Direitos Humanos da Arquidiocese de Manaus, requerem informações sobre o contrato celebrado entre o Estado e a empresa, são tratados como intrusos. Em suma, eles não aceitam ser avaliados, dentro dos padrões da cidadania e da fiscalização pública, até para melhorarem seu desempenho". 39

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Sobre o autor
Jorge Amaral dos Santos

Policial Rodoviário Federal. Especialista em Direito Público. Especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal. Mestre em Direito, políticas públicas de inclusão social pela Universidade de Santa Cruz do Sul - UNISC.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Jorge Amaral. As parcerias público-privadas no sistema penitenciário brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2269, 17 set. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13521. Acesso em: 19 dez. 2024.

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