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Parcelamento tributário das empresas em recuperação judicial

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Resumo: Objetivando facilitar a recuperação das empresas que estão em dificuldades financeiras, foi editada a Lei Complementar 118/ 2005, que incluiu dois parágrafos ao art. 155-A do CTN, quais sejam o § 3º e § 4º, criando assim um parcelamento especial para as empresas envolvidas em recuperação judicial, de forma que todos os entes federados ofereçam a elas condições especiais, diferentes das estabelecidas para os demais devedores da Fazenda Pública. Contudo, nenhuma unidade da federação promulgou lei específica sobre esse tema. Diante disso, o presente trabalho analisa os projetos de lei existentes e a necessidade de edições de leis específicas acerca do tema proposto.

Palavras-chave: Parcelamento tributário, recuperação judicial, lei específica.


1.INTRODUÇÃO

Quando uma empresa encontra-se em dificuldade financeira, começa a não pagar seus tributos e fica inadimplente com o fisco. Considerando essa situação, promoveu o legislador modificações no Código Tributário Nacional (CTN) objetivando, principalmente, o cumprimento da função social da empresa e procurando evitar seu encerramento, por meio de uma equalização da satisfação do crédito da Fazenda Pública, de qualquer esfera, com proteção da unidade produtiva. A criação de legislações específicas acerca do parcelamento tributário, consoante disposição do art. 155-A, § 3º e § 4º, do CTN, permitiu auxiliar a empresa devedora de tributos a superar sua crise econômico-financeira, sem causar prejuízo à Fazenda Pública, que será claramente beneficiada com a maior arrecadação tributária, fruto de um maior cumprimento dos parcelamentos assumidos pelas empresas. A competência atribuída às Fazendas Públicas de elaboração de normas específicas de parcelamento e o fato de as regras existentes não permitirem às empresas o cumprimento ou até a escolha pelo parcelamento nos fazem entender que, caso não haja uma ação legislativa de criação de leis acerca de parcelamentos especiais, nunca serão atingidos os objetivos e benefícios da Lei 11.101/05, quais sejam a conservação da unidade produtiva gerando a conservação de postos de trabalho e a manutenção da arrecadação de tributos.


2. METODOLOGIA

A presente pesquisa analisa o ôntico e o deôntico do parcelamento tributário, trazendo propostas de soluções deônticas para a omissão legislativa de parcelamentos especiais às empresas em recuperação judicial.

Carvalho [01] preleciona que "a não identificação do elo que prende o enunciado científico ao sistema de que faz parte aparecerá como sério transtorno no desenvolvimento do discurso, truncando o fluxo do pensamento." Por esse motivo, esse estudo tem como referência o sistema jurídico como um todo, analisando a completa legislação vigente sobre o tema.

A pesquisa é instrumental jurídica, realizada através de um procedimento de dogmática jurídica e tendo por fontes a legislação vigente, a doutrina e os projetos de lei sobre o tema que tramitam no Congresso Nacional.


3. CONSIDERAÇÕES

O CTN, em seu art. 155-A, §3º e §4º, criou um direito próprio de parcelamento para as empresas envolvidas em recuperação judicial, de tal maneira que todos os entes federados ofereçam a elas condições especiais, diferentes das estabelecidas para os demais devedores da Fazenda Pública. Quanto a essa questão, de acordo com Ivo [02]: "A autoridade é competente para produzir determinado instrumento introdutor de normas porque essa competência está prevista em uma norma do sistema jurídico. Competência não se presume".

Sendo assim, na ausência de lei estadual, distrital ou municipal, específica para a recuperação judicial, deve ser aplicada a própria lei geral municipal, distrital ou estadual sobre parcelamento, porém obedecido o prazo determinado pela lei federal específica. Nesse caso, o prazo de parcelamento não poderá ser inferior ao concedido por lei federal específica. Senão vejamos o que dispõe o citado artigo:

Art. 155-A

. O parcelamento será concedido na forma e condição estabelecidas em lei específica.

§ 1º

Salvo disposição de lei em contrário, o parcelamento do crédito tributário não exclui a incidência de juros e multas.

§ 2º

Aplicam-se, subsidiariamente, ao parcelamento as disposições desta Lei, relativas à moratória.

§ 3º

Lei específica disporá sobre as condições de parcelamento dos créditos tributários do devedor em recuperação judicial

§ 4º

A inexistência da lei específica a que se refere o § 3º deste artigo importa na aplicação das leis gerais de parcelamento do ente da Federação ao devedor em recuperação judicial, não podendo, neste caso, ser o prazo de parcelamento inferior ao concedido pela lei federal específica.

A lei federal específica, mencionada ao final do §4º, é a Lei 10.522/02, com redação outorgada pela Lei 10.637/02, que preceitua em seu art. 10 que o prazo mínimo de parcelamento será de sessenta meses, sendo corrigidas as parcelas pela SELIC.

O não exercício da competência conferida às Fazendas Públicas de elaboração de normas específicas de parcelamento não traz segurança aos devedores em recuperação judicial de que terão margem de negociação de seus débitos com a Fazenda Pública como ocorre com os outros credores elencados na Lei 11.101/05. As regras existentes não permitem às empresas cumprirem, ou até optarem, pelo parcelamento, o que nos faz crer que, caso não haja uma ação legislativa de edição de leis sobre parcelamento especial, no sentido de atender aos objetivos e benefícios da Lei 11.101/05, todos os esforços de proteção das unidades produtivas no Brasil poderão ser ineficazes, visto que uma parcela considerável dos casos de recuperação judicial possui como base para a crise financeira problemas com débitos tributários.

Não se pode olvidar dos objetivos do instituto da recuperação judicial, como alerta Campinho [03]: "O instituto da recuperação vem desenhado justamente com o objetivo de promover a viabilização da superação desse estado de crise, motivado por um interesse na preservação da empresa desenvolvida pelo devedor."

O sentido axiológico da Lei 11.101/05 é de auxílio à recuperação da empresa, trazendo, assim, competência com verdadeiro limite objetivo para os entes federados, visando consubstanciar o princípio da segurança jurídica, no sentido de as empresas em recuperação judicial poderem prever quais normas serão aplicadas em um possível pedido de parcelamento.

A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso de prescrição e de todas as ações de execuções em face do devedor, contudo, o § 7º do art. 6º esclarece que "as execuções de natureza fiscal não são suspensas pelo deferimento da recuperação judicial, ressalvada a concessão de parcelamento nos termos do Código Tributário Nacional (...)".

Portanto, a empresa devedora em recuperação judicial, para a suspensão das execuções fiscais, deverá obter o parcelamento dos créditos tributários. Isso difere do que ocorre no caso de extinção das obrigações do falido, pois aí se exige a prova de quitação de todos os tributos, consoante o art. 191-A do CTN.

Havendo produção de normas específicas de parcelamento para empresas em recuperação, pode-se vislumbra que as empresas poderão cumprir os prazos e as condições para obterem o parcelamento do débito tributário e conseqüentemente a certidão positiva com efeitos de negativa, levando ao término o processo de sua recuperação judicial.

Entendemos, portanto, que regras especiais de parcelamento para as empresas que demonstrem interesse e reúnam os requisitos para se recuperarem judicialmente são indispensáveis para dar efetividade à Lei 11.101/05. Assim, transforma-se o ôntico da atividade empresarial em deôntico.

É necessário dar aos § 3º e § 4º do CTN eficácia técnica, tendo em vista a impossibilidade de desencadeamento de seus efeitos, pela falta de regras específicas editadas pelos entes da federação.

Vale ressaltar que as regras acima citadas devem objetivar pela celeridade na análise do pedido do parcelamento, tendo em vista que é necessário tempo hábil para o requerimento e deferimento do parcelamento e a conseqüente expedição da respectiva certidão positiva com efeitos de negativa, para o cumprimento da exigência prevista no art. 57, da Lei 11.101/05.

Projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional dispõem sobre o parcelamento de débitos tributários de devedores em recuperação judicial, administrados pela Secretaria da Receita Federal, Procuradoria da Fazenda Nacional e INSS. Os principais Projetos de Lei são:

a)PL 6.447/05: de autoria do deputado Jorge Boeira do PT/SC, foi apresentado no Plenário da Câmara dos Deputados em 15-12-05. Permite o parcelamento em 180 prestações corrigidas pela taxa de juros em longo prazo (TJLP). Entre os projetos apresentados, dispõe na forma mais adequada do tratamento aos devedores que buscam a recuperação judicial, trazendo previsões que viabilizam melhor as idéias da Lei 11.101/05.

b)PL 5.250/05: de autoria do Senador Fernando Bezerra, do PTB/RN, foi apresentado em 17-5-05. Tem objeto maior que os demais projetos, pois trata de outros débitos de natureza não tributária, podendo estes ser divididos em até 72 parcelas, a depender do atendimento de condições específicas, sendo aquelas corrigidas pela SELIC. Parte do projeto trata de dispositivos em desacordo com a autorização legislativa prevista no art. 68 da Lei 11.101/05.

c)PL 246/2003: de autoria do deputado Paes Landin, do PTB/PI, foi apresentado em 27-2-03. Permite o parcelamento em 240 prestações, a serem corrigidas pelo INPC. O presente projeto, em caso de intenção de sua aprovação, deverá ter alguns pontos revistos e alterados para melhor precisão técnica e jurídica.

Alguns Estados, como São Paulo, Rio de Janeiro, Ceará e Mato Grosso, também criaram projetos de lei objetivando o parcelamento especial, porém nenhum foi aprovado. O principal argumento usado pelo fisco para impedir o parcelamento especial é que aquele daria ensejo à criação da "indústria da recuperação de empresas", isto é, empresas saudáveis pediriam recuperação apenas para obter parcelamento especial. Contudo, tal argumento não merece prosperar, visto que requisitos legais poderiam facilmente impedir essa prática, tais como estender a quarentena entre uma recuperação e outra, ou exigir prova contábil de crise econômico-financeira.

Observa-se também que a edição de tais regras gerará ao fisco uma arrecadação maior, com execução fiscal mais eficiente. Esta será apresentada de forma objetiva e coerente com as demais regras do ordenamento jurídico, visando facilitar o pagamento dos débitos tributários às empresas em recuperação judicial, o que facilitará o parcelamento destes.

Mesmo entendendo que o direito tributário não pode ser interpretado sob o ponto de vista do direito econômico, é evidente que o legislador não deve esquecer a situação econômico-financeira das empresas brasileiras, as quais enfrentam uma exorbitante carga tributária e um momento de crise financeira mundial. Pesquisa divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), intitulada "Estatísticas do Cadastro Central de Empresas", apresenta dados alarmantes: aproximadamente 70% das empresas criadas no país fecham as portas nos cinco primeiros anos de existência.

Nesse sentido, o crédito tributário não deve ser exigido a qualquer custo e sim da maneira mais adequada e menos gravosa, resguardando as unidades produtivas e os direitos sociais das pessoas participantes do processo produtivo daquelas. A segurança desses direitos é papel de grande importância do Estado; assim, cabe a este exercer sua função regulatória na preservação daqueles.

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Mesmo com a ausência de leis que regulem o parcelamento especial, alguns magistrados têm deferido prestações em mais de sessenta parcelas, entre outros benefícios, às empresas em recuperação judicial, através de acordos judiciais. Exemplo louvável pela atuação do Judiciário diante da omissão do Legislativo ocorreu em processo de recuperação judicial da Recrusul, empresa de Sapucaia do Sul, no Rio Grande do Sul, que conseguiu encerrar o processo de recuperação, por cumprir todos os pressupostos legais necessários, em dezembro de 2008. Isso só ocorreu porque foi homologado acordo no Judiciário, parcelando em 120 meses parte do débito tributário da empresa, nos moldes do Refis, mesmo com a ausência de lei específica e em número de parcelas superior à da lei federal.


4. CONCLUSÃO

As alterações promovidas pelo legislador do CTN objetivam o cumprimento da função social da empresa e a necessidade de evitar que aquela pereça, buscando, assim, um equilíbrio entre a satisfação do crédito e a recuperação da empresa. A normatização de legislações específicas acerca do parcelamento tributário, consoante disposição do art. 155-A do CTN, § 3º e § 4º, permite além de verdadeiro auxílio à empresa devedora a superação da crise econômico-financeira, sem causar prejuízo à Fazenda Pública, que será claramente beneficiada pelo saneamento da empresa.

A análise conjunta dos projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional denota a necessidade de adequações técnicas e jurídicas antes de suas aprovações.

Tudo isso é de relevo para que os fins estabelecidos na Lei 11.111/05 sejam alcançados. Entretanto, a grande questão é que as Fazendas Públicas entendem que regras sobre parcelamento especial poderiam criar a "indústria da recuperação de empresa", argumento que não merece prosperar diante do exposto.

Cabe relembrar que alguns magistrados estão deferindo formas especiais de parcelamento em processo de recuperação judicial, através de acordos homologados judicialmente. Daí se conclui ser de suma importância a edição de leis para o saneamento das empresas e para um aumento da arrecadação tributária, fruto de um maior cumprimento dos parcelamentos assumidos pelas empresas.


5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed., São Paulo: Malheiros, 2005.

CAMPINHO, Sergio. Falência e recuperação de empresa. 4. ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2009.

CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Fundamentos jurídicos da incidência. 6. ed., São Paulo: Saraiva, 2008.

CARRAZA, Roque. Curso de Direito Constitucional Tributário. 23. ed., São Paulo: Malheiros, 2007.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 17. ed., São Paulo: Saraiva, 2005.

IVO, Gabriel. Norma jurídica, produção e controle. 1. ed., São Paulo: Noeses, 2006.

Sites:

www.camara.gov.br, acessado em 3-9-09.

www.ibge.gov.br, acessado em 3-9-09.

www.senado.gov.br, acessado em 5-9-09.

Notas

  1. CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Fundamentos jurídicos da incidência. 6. Ed., São Paulo: Saraiva, 2008.
  2. IVO, Gabriel. Norma jurídica, produção e controle. 1. Ed., São Paulo: Noeses, 2006, p. 15.
  3. CAMPINHO, Sergio. Falência e recuperação de empresa. 4. Ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2009, p. 122.
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Sobre a autora
Caroline Laurentino de Almeida Balbino

Advogada tributarista e empresarial, pós graduada em direito tributário pelo IBET.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BALBINO, Caroline Laurentino Almeida. Parcelamento tributário das empresas em recuperação judicial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2293, 11 out. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13653. Acesso em: 23 dez. 2024.

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