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Acumulação remunerada de cargos e empregos públicos na jurisprudência brasileira

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12/12/2009 às 00:00
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19. ACUMULAÇÃO DE PROVENTOS DE APOSENTADORIA COM CARGOS ELETIVOS E CARGOS EM COMISSÃO DECLARADOS EM LEI DE LIVRE NOMEAÇÃO OU EXONERAÇÃO

Por fim, a Constituição Federal, art. 37, § 10º, ressalva a possibilidade de cumulação de proventos de aposentadoria decorrentes de cargos, emprego ou função, com os cargos eletivos e cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação ou exoneração, não despertando maiores dúvidas.

Servidores ou empregados públicos aposentados que forem eleitos para cargos eletivos (Prefeito, Deputado etc.), ou nomeados para cargos em comissão de livre nomeação e exoneração poderão acumular seus proventos de aposentadoria com os vencimentos do novo cargo.


20. TETO REMUNERATÓRIO CONSTITUCIONAL

Mesmo nos casos de acumulação lícita de cargos remunerados, ou mesmo vencimento de aposentadoria, ainda assim o servidor estará sujeito ao teto constitucional, segundo consta do inciso XVI, do art. 37, da Constituição Federal. As regras do teto constitucional já sofreram duas alterações por Emendas Constitucionais, a nº 19 e nº 41, que deu a seguinte redação ao dispositivo:

XI - a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos;

Para cumprimento do comando constitucional, em caso de acumulação de cargos ou empregos, bem como proventos de aposentadoria, é necessário somar ambos os valores recebidos, e o valor obtido da soma está limitado ao teto constitucional. Essa conclusão é tirada da expressão "percebidos cumulativamente ou não" constante do inciso XI, acima transcrito.

Sobre o tema, José dos Santos faz importante observação:

Desse modo parece-nos que, à luz do novo texto constitucional, será possível a acumulação se em um dos cargos ou empregos, ou até em ambos, o servidor tiver redução remuneratória de forma a ser observado o teto estipendial fixado em lei [36].

Entretanto, esta norma não se aplica a Magistrados. As resoluções nº 13 e 14 do Conselho Nacional de Justiça excluem, de forma inconstitucional, os subsídios dos Magistrados da regra do teto, quando em acumulação com o exercício de magistério. Dispõe a Resolução nº 13, que trata da aplicação do teto remuneratório constitucional e do subsídio mensal dos membros da Magistratura [37]:

Art. 8º Ficam excluídas da incidência do teto remuneratório constitucional as seguintes verbas:

(...)

II – de caráter permanente:

a) remuneração ou provento decorrente do exercício do magistério, nos termos do art.

95, parágrafo único, inciso I, da Constituição Federal; e

Entretanto, apesar da grande crítica sofrida pela regra, o Supremo Tribunal Federal proferiu decisão favorável à tese. O fundamento é que a regra de acumulação dos Magistrados não é o art. 37, XVI, e sim o art. 95, parágrafo único, ambos da Constituição. Logo, a verificação do teto constitucional deve ser feita de forma isolada, um teto para a função de Magistrado e outro para a função de Magistério.

Essa interpretação é injusta e de fundamentação frágil, gerando benefício indevido aos Magistrados, em evidente afronta ao texto constitucional que não pretendeu criar diferença em situações juridicamente iguais.

Entendendo que a regra fere a isonomia, disserta Lucas Rocha Furtado:

Assim, se um advogado público, por exemplo acumula seus vencimentos (ou subsídio) com o cargo de professor de uma universidade Pública, devem ser somados os valores e aplicado o teto. Sem em vez de advogado público se tratar de um juiz, sob tão frágil e casuístico argumento, não se aplica o teto ao somatório dos valores percebidos pelo magistrado, mas este será aplicado a cada uma das fontes sem que se faça somatório [38].

Por fim conclui:

Todavia, não foi essa a solução adotada pela Constituição Federal, de modo que não caberia ao CNJ, ou ao STF, criar tratamento diferenciado e privilegiado em favor dos magistrados. Se o critério adotado pela EC nº 41/03 é injusto, ou inconstitucional quando aplicado a cumulações lícita, que se construa solução para que não seja aplicado a nenhuma categoria, e não apenas aos magistrados [39].

Adotando os fundamentos da decisão do Supremo Tribunal Federal, os Membros do Ministério Público, por igualmente possuírem regra distinta, art. 128, estariam, assim como os Magistrados, sujeitos a tetos distintos, uma para sua função Ministerial e outro para a função de Magistério. Essa tese foi adotada pelo Conselho Nacional do Ministério Público nas Resoluções nº 09 [40] e 10 [41], que dispõem sobre a aplicação do teto remuneratório no âmbito do Ministério Público, da União e dos Estados, que adotam e não adotam o subsídio, respectivamente.

Por fim, ressalta-se a questão do subteto remuneratório da Magistratura Estadual. Com fundamento no disposto no inciso XVI do art. 37 da Constituição, o Conselho Nacional de Justiça editou as Resoluções nº 13 e 14, que apenas repetia o texto constitucional, limitando o valor salarial no Judiciário dos Estados a 90,25% (noventa vírgula vinte e cinco por cento) do subsídio dos Ministros do Supremo Tribunal Federal.

Quando da edição das Resoluções, a maioria dos Tribunais de Justiça dos Estados resistiram à aplicação das Resoluções. A Associação dos Magistrados do Brasil ingressou com a ADI 3854, questionando a constitucionalidade das Resoluções, bem como da Emenda Constitucional 41, referente à criação do subteto. Por maioria, foi deferida a liminar, suspendendo as norma citadas. O fundamento foi a isonomia, tendo em vista a impossibilidade de criação de tetos distintos entre o Judiciário da União e dos Estados.

Ressalta-se que a mesma Emenda criou normas semelhantes no Poder Legislativo, onde os Deputados Estaduais devem receber remuneração máxima equivalente a 75% (setenta e cinco por cento) da remuneração dos Deputados Federais. Mas nunca houve manifestação do Supremo Tribunal Federal sobre este ponto.

Dessa forma, desde o deferimento da liminar, os Magistrados Estaduais estão sujeitos ao teto remuneratório correspondente aos valores pagos aos Ministros do Supremo Tribunal Federal.


21. CONSEQUÊNCIAS

Havendo acumulação em hipótese não abrangida pela Constituição, a legalidade deverá ser recomposta. No caso dos servidores federais, regulados pela Lei 8.112, de 11 de dezembro de 1990, a solução será encontrada em seu art. 133, com a seguinte redação:

Art. 133. Detectada a qualquer tempo a acumulação ilegal de cargos, empregos ou funções públicas, a autoridade a que se refere o art. 143 notificará o servidor, por intermédio de sua chefia imediata, para apresentar opção no prazo improrrogável de dez dias, contados da data da ciência e, na hipótese de omissão, adotará procedimento sumário para a sua apuração e regularização imediata, cujo processo administrativo disciplinar se desenvolverá nas seguintes fases.

Em caso de acumulação inconstitucional, estando o servidor de boa-fé, este deverá escolher em qual dos cargos permanecerá, nos termos do citado artigo. O servidor poderá fazer a opção até o último dia do prazo para apresentar defesa.

Para isso, a Autoridade Administrativa notificará o servidor para apresentar opção no prazo improrrogável de dez dias, contados da data da ciência e, na hipótese de omissão, adotará procedimento sumário para a sua apuração e regularização imediata. Não fazendo a opção, caracterizará a má-fé e por consequência o servidor perderá ambos os cargos, devendo, ainda, devolver o que recebera ilegalmente. Nesse sentido Supremo Tribunal Federal:

EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ACÓRDÃO PROFERIDO PELA TERCEIRA SEÇÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, QUE DENEGOU MANDADO DE SEGURANÇA IMPETRADO CONTRA ATO DO MINISTRO DE ESTADO DA PREVIDÊNCIA E ASSISTÊNCIA SOCIAL. DEMISSÃO DO CARGO DE MÉDICO DO QUADRO DE PESSOAL DO INSS. ACUMULAÇÃO ILEGAL DE EMPREGO PÚBLICO EM TRÊS CARGOS. PRESUNÇÃO DE MÁ-FÉ, APÓS REGULAR NOTIFICAÇÃO. RECURSO IMPROVIDO I. O acórdão recorrido entendeu que o servidor público que exerce três cargos ou empregos públicos de médico - um no INSS, outro na Secretaria Estadual de Saúde e Meio Ambiente e outro junto a hospital controlado pela União, incorre em acumulação ilegal de cargos. II. O Supremo Tribunal Federal tem reconhecido a presunção de má-fe do servidor que, embora notificado, não faz a opção que lhe compete. III. Demissão do recorrente que se assentou em processo administrativo regular, verificada a ocorrência dos requisitos do art. 133, § 6º, da Lei 8.112/90. IV. Precedentes desta Corte em situações semelhantes: RMS 24.249/DF, Rel. Min. Eros Grau e MS 25.538/DF, Rel. Min. Cezar Peluso. V. Recurso improvido. (RMS 23917, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 02/09/2008, DJe-177 DIVULG 18-09-2008 PUBLIC 19-09-2008 EMENT VOL-02333-01 PP-00139).

Já na hipótese da ilegalidade ser detectada pelo Ministério Público, duas possibilidades se apresentam. A primeira consiste na comunicação pelo Ministério Público à Autoridade Administrativa para que tome as providências cabíveis, no caso de servidor federal aplicação do art. 133, da Lei 8.112/93. Caso a Autoridade Administrativa não tome as providências, deverá ser responsabilizada, inclusive criminalmente, pois lhe compete praticar o ato de ofício.

A segunda possibilidade que se apresenta ao Membro do Ministério Público é propor ação civil visando por fim a acumulação indevida de cargos. Nessa hipótese, deve ser dado ao servidor a possibilidade de opção, devendo ser notificado para que exerça seu direito de opção no prazo de 10 (dez) dias [42]. Não sendo feita a opção, deverá o servidor ser citado para apresentar defesa, prosseguindo o processo até sentença final e perda de ambos os cargos, podendo ainda incidir nas penalidades da Lei de Improbidade Administrativa.

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O Tribunal Regional Federal da 1ª Região reconhece a improbidade administrativa na acumulação irregular de cargos públicos remunerados [43]:

ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MÉDICO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS. INCOMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS.

I - A acumulação lícita de cargos exige que se atenda ao requisito da compatibilidade de horários, a teor do art. 119 da Lei 8.112/90.

II - As sanções do art. 12, da Lei 8.429/92 não são necessariamente cumulativas, cabendo ao magistrado a sua dosimetria.

III - Não é devida a devolução dos valores percebidos a título de salários quando verificado que o trabalho foi efetivamente prestado, ainda que as nomeações tenham sido irregulares, visto que seria o mesmo que admitir enriquecimento sem causa da União.

IV - Apelação provida em parte. Sentença reformada.

(AC 2003.41.00.005421-8/RO, Rel. Desembargador Federal Cândido Ribeiro, Terceira Turma,DJ p.30 de 21/09/2007)


22. ACUMULAÇÃO COM ATIVIDADE PRIVADA

Apesar de não se tratar de acumulação de cargos remunerados, a acumulação da atividade pública com a particular gera grandes problemas para a administração. Ao contrário do que se pensa, em regra é possível o desempenho de atividade pública e privada. A restrição se dará se a atividade pública requerer dedicação exclusiva. Neste caso, o servidor estará impedido de exercer qualquer outra atividade privada remunerada.

Isso não quer dizer necessariamente que a atividade privada não remunerada está consequentemente autorizada. Quando não houver dedicação exclusiva, ou para desempenho de atividade não remunerada, será necessário averiguar se o desempenho da atividade privada não compromete o exercício adequado da atividade pública remunerada, ou gerar qualquer tipo de conflito de interesse. Referente ao último ponto, Marçal Justen Filho afirma que:

Essa última alternativa ocorre quando a atividade estranha ao cargo for apta a produzir interesses incompatíveis com o desempenho imparcial e satisfatório da atividade inerente ao cargo. O conflito de interesses conduziria à frustração do princípio da impessoalidade, dando oportunidade ao exercício indevido das atribuições inerentes ao cargo [44].

Ressalta-se que muitas legislações vedam o desempenho de atividade privada por parte de servidores. É o caso dos servidores da União regidos pela Lei 8.112/90, que veda diversas atividades privadas. Havendo vedação legal, impossibilitado estará o servidor do desempenho, sob pena das sanções legais.


CONCLUSÃO

Ao contrário do que parece num primeiro momento, a simplicidade do texto constitucional traz muita dificuldade prática para delimitação da abrangência das exceções à inacumulabilidade remunerada de cargos e empregos públicos. Passados mais de vinte anos da promulgação da Constituição Federal e mais de dez da Emenda Constitucional nº 20/98, a questão ainda atormenta administradores públicos e aplicadores do direito.

Apesar de ainda hoje não existir um consenso com relações a determinados pontos, muitas questões foram sendo solucionadas pela jurisprudência pátria, possibilitando uma atuação adequada e respaldada.

Os casos aqui tratados foram abordados sob um ponto de vista doutrinário, mas em especial jurisprudencial, como forma de servir de orientações àqueles que atuam no Direito Administrativo.

Tais decisões, apesar de não possuírem efeitos vinculantes, devem ser seguidas, ou ao menos servir de parâmetro para casos semelhantes, em especial pelos agentes públicos, pois podem ser responsabilizados por autorizarem acumulações não abrangidas pela Constituição.

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Sobre o autor
Celso Costa Lima Verde Leal

Procurador da República. Ex-Procurador da Fazenda Nacional. Especialista em Direito Público pela UNB

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LEAL, Celso Costa Lima Verde. Acumulação remunerada de cargos e empregos públicos na jurisprudência brasileira. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2355, 12 dez. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13966. Acesso em: 22 nov. 2024.

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