III - Do grau de mudança pragmática com a edição do art. 114, § 3º, da Constituição Federal. Casos excepcionais que recomendam a oitiva do INSS nos feitos executivos incoados de ofício pela Justiça Laboral.
Como restou fastidiosamente demonstrado, a Previdência Social, no trâmite da execução de ofício das contribuições sociais, nos moldes do riscado pela Carta Política, em seu art. 114, § 3º, não deve ser compelida a mover uma folha sequer, nem sequer se houver interposição de embargos, sejam os de devedor ou de terceiros.
Porém, como medida de se evitar eventuais erros de cálculo ou mesmo de "equivocado" enquadramento das verbas, com vistas à perpetração de senegação, nos acordos firmados na Justiça do Trabalho, hodiernamente, os arts. 832, § 4º e 879, § 3º, ambos da CLT, com o manto da Lei nº 10.035/2000, faculta-se ouvir o setor administrativo-arrecador da Previdência Social. Fato esse, porém, que não a leva a vestir a condição de parte no feito executório lavrado de ofício pela justiça laboral.
Contudo, ao findar-se a execução das contribuições previdenciárias pela Justiça do Trabalho, a mesma haverá de repassar ao INSS o resultado obtido, seja o pagamento feito pelo devedor (remição da execução) ou, daqueles que se interessaram em remir o bem constritado, ou, ainda, a entrega do numerário conseguido com o hasteamento dos bens eventualmente constritados através do ato da penhora, ou, de revés, provindos do arresto nela convertido.
Confira-se, nesta pegada, o que restou aventado pela Lei nº 10.035/2000:
"Art. 889-A. Os recolhimentos das importâncias devidas, referentes às contribuições sociais, serão efetuados nas agências locais da Caixa Econômica Federal ou do Banco do Brasil S.A., por intermédio de documento de arrecadação da Previdência Social, dele se fazendo constar o número do processo."
(...)
§ 2º. As varas do trabalho encaminharão ao órgão competente do INSS, mensalmente, cópias das guias pertinentes aos recolhimentos efetivados nos autos, salvo se outro prazo for estabelecido em regulamento".
A esse tempo, aí sim, haverá a Justiça do Trabalho de remeter para a Previdência Social a guia solvida, apondo, também, o valor originário do débito e os parâmetros que levaram àquela apuração numérica na faina obreira, para que, com isso, o ente Público, mais uma vez, possa aquilatar da exatidão ou não do que fora amealhado pela Justiça Laboral.
Caso ainda posicione a Previdência Social na trilha de que o valor aportado fora a menor, dará início ao levantamento do que julgar remanescer, via fiscalização e, posteriormente, com a incoação do procedimento administrativo de lançamento buscará o recebimento extrajudicial de seu crédito, culminando-se na execução fiscal se restar infrutífero o solvimento naquela via extraprocessual.
De conseguinte, e em realidade, aquela notificação que se fazia ao INSS, para que, frente à decisão trabalhista, ficasse o órgão previdenciário cientificado dela e dos consectários que daí poderiam advir, expediente esse que dava-se assim que prolatada a sentença ou homologado o acordo, agora, mutatis mutandis, passa a ser levada a cabo ao final do processo executivo ou no instante em que restar solvida a contribuição previdenciária decorrente do provimento laboral.
O que se fez, em realidade, com a edição do art. 114, § 3º, da Lei Mater, foi:
a) municiar o juiz de todas as armas para excutir o crédito previdenciário, executando-o de ofício diante da recalcitrância do devedor em não tê-lo quitado precedentemente;
b) mudar o momento de comunicação à autarquia previdenciária, que, doravante, far-se-á, em termos finais, quando do solvimento ou, de outro lado, ante à frustração do executivo, pela ausência de bens penhoráveis ou, identicamente, pela ausência de licitante para arrematar o que fora constritado;
c) lembrando-se que, para as situações díspares do pagamento (parte final do escandido na alínea ´b´), aí sim, a cientificação haverá de ser endereçada pela Justiça do Trabalho diretamente à Procuradoria da autarquia.
Em regra, pois, a notificação da Justiça Obreira haverá de ser dirigida à Seção de Arrecadação e Fiscalização do INSS (48), ou seja, à sua repartição administrativa, nada tendo, desde logo, a ser encaminhado ao órgão da Procuradoria, salvante as situações por nós já balizadas neste escrito. Porque é aquele primeiro segmento da Administração Previdenciária que detém poderes para proceder eventual fiscalização, acaso entenda que o cálculo judicia, ou o acordo entabulado não definiu de modo legal as verbas, ou, ainda, o valor vertido não estão afetos aos parâmetros da legislação de regência.
Contudo, a par do elencado pela Lei nº 10.035/2000, existem, todavia, três supostos fáticos que compelem o Judiciário do Trabalho, ante à norma constitucional em testilha, proceder, agora, com a notificação ao INSS na sua esfera jurídica (aqui, sim, no imo das Procuradorias), quais sejam:
1ª) Quando não houver bens penhoráveis, que, sabidamente, levará a que o órgão previdenciário envide buscas exaustivas na senda de se encontrar objetos constritáveis, não devendo, em primeira mão, contentar-se, apenas, com a certidão do meirinho, mesmo porque, com o agitamento de pesquisa fora da Comarca, se for o caso, poder-se-á chegar à existência de coisas passíveis de viabilizar a segurança do juízo;
2ª) Quando restar frustrada a alienação judicial do que fora constritado, já que, em caso tal, nada obstará a que a própria Previdência Social tenha eventual interesse em manejar o instituto da adjudicação; (49)
3ª) Quando, antes de iniciar uma execução de ofício, houver notícia de parcelamento do débito que a daria gênese, e, findo o prazo estipulado na citada avença, não existir qualquer comunicação do INSS na senda da sorte futura da composição, ou seja, se fora cumprida ou desonrada, haverá de ser instada a Previdência Social para manifestar-se sobre tal ponto. E, de igual sorte, se instaurado executivo laboral das contribuições, também houver parcelamento, suspendendo-se o feito neste particular, e, posteriormente, não se tiver notícias de cumprimento ou não da amortização.
IV Das aparentes celeumas materiais e processuais engendradas pela novel redação do art. 114, § 3º, da Carta Política.
Se se focar o hodierno art. 114, § 3º, da Lei Mater, com uma ótica puramente processualística e não com a hermenêutica mais globalizada (aqui entendida como uma visão jurídico-político-social), que viemos preconizando por todo este escrito, chegar-se-á, por certo, a alguns tópicos que se poderiam mostrar como embaraçosos à perfeita aplicação da norma constitucional em tela.
Com o objetivo de, mais uma vez, fortificar a nova plataforma axiológica que deve timbrar o operador jurídico nesse tanto, passamos a expor os virtuais pontos de estrangulamento que seriam apreendidos.
a) Quanto ao instituto da prescrição e o eventual retardo da execução ´ex officio´.
O Professor José Augusto Rodrigues Pinto, sobre a temática em debate, entende que "o único fato em condições de impedir o efeito prescricional será o que resulte da aliança do dever de impulso oficial com o monopólio judicial da legitimação para instaurar a ação. E como tal aliança está ausente do caso sob estudo, pois a legitimação conferida ao juiz é concorrente com a legitimação natural das partes, estas não se acham dispensadas do dever de exercer seu direito de ação se o órgão jurisdicional se omitir no cumprimento de dever de instauração da instância ex officio, sujeitando-se, portanto, aos efeitos da prescrição consumada por sua inércia". (50)
Soa-nos, pois, equivocado o entendimento supra, dado que:
1º) Nem o reclamante e, muito menos o reclamado, teriam legitimação para incoar a execução laboral, no que tange ao prisma das contribuições previdenciárias, logo, eventual prescrição, em vista de possível inércia, somente poderia ser produzida pelo INSS. Assim sendo, quando o lente suso mencionado refere-se a uma lentidão das partes, já se engana palmarmente ao colocar esse substantivo próprio no plural;
2º) A Previdência Social, como alinhado dantes, não é parte na relação jurídica inicial e, muito menos, na executiva e, assim sendo, como poderia ser alcançada por eventual prescrição, se, dela para com ela mesma, no caso em apreço não poderia agir, dado que o executivo haveria de ser inicializado, de ofício, pelo magistrado obreiro;
3º) Somente quem tem, com exclusividade, a iniciativa de instaurar a instância, no que atina ao aspecto das contribuições sociais decorrentes da sentença, é o juiz laboral, dado que é ela movimentada ex officio, daí não se poder penalizar outrem por uma inação de terceiro.
Mas, poder-se-ia objetar: e se o juiz trabalhista ficar silente? Ainda assim, não se há falar em prescrição para o INSS, porque, também como vazado nesse escrito, nada obsta que a Previdência Social, ao tomar conhecimento da existência de um fato que materializa a factibilidade de engendrar uma exação, a apure no âmago administrativo e, com a posterior inscrição em dívida ativa, venha a manejar a executividade imediata, aí sim, na órbita da Justiça Comum, porque entendemos que, inerte a Justiça Especializada, a competência transferiu-se àquela outra esfera jurisdicional, até por força da instauração prévia de um procedimento administrativo de verificação tributária.
Nosso ponto-de-vista, inclusive, parece mais fortalecido, atualmente, uma vez que o dispositivo que impunha a pena de responsabilidade funcional do magistrado, qual seja, o art. 44, da Lei nº 8.212/91, com a redação conferida pela Lei nº 8.620/93, fora revogado pelo novo texto constitucional decorrente da Emenda Constitucional nº 20/98, como por nós alhures evidenciado.
Poder-se-ia, de conseguinte, pensar: se assim o é, o magistrado do trabalho poderá preferir optar por uma conduta reticente e, ainda com isso, nada se lhe acontecerá? Não. E, no plano puramente normativo, essa asserção é verdadeira, porque, segundo o princípio da reserva legal, inexiste delito (aqui incluída a infração disciplinar) sem prévia lei que o capitule. Já, no aspecto político-social, que também está contido nas regras jurídicas, outra será a conseqüência, qual seja, haverá um descrédito popular-institucional quanto à competência conferida ao Poder Judiciário do Trabalho e, com certeza, isso retornaria em caudais de situações politicamente negativas, principalmente, porque, em realidade, descumprido restara o almejado pela nova regra constitucional, sacada no art. 114, § 3º, que, não se cansa de repetir, colocou nas mãos do Juiz Laboral a ferramenta, possivelmente mais adequada em todos os tempos, na senda de colaboração com o maior óbice possível à sonegação.
Foi, exatamente com os olhos na grandeza da norma constitucional, que o Tribunal Superior do Trabalho passou a exigir dos Sodalícios Regionais que, juntamente com a estatística dos trabalhos perpetrados mensalmente, fosse encaminhado, também, o volume das contribuições previdenciárias arrecadadas, para que, com isso, possa perstar contas à Nação da valia socila da regra constitucional em comento.
Voltando-se ao tema, se a execução, no que atina às contribuições previdenciárias, não forem abertas pelo juiz do trabalho e, com isso, transcorrer prazos prescricionais, estes, como é curial, não afetarão a autarquia em apreço. Tal entendimento, como é perceptível, além de mais sistêmico, protege o bem jurídico tutelado nas situações vertentes, qual seja, o interesse público, exatamente aquele alvitrado pela Constituição Federal em seu art. 114, § 3º.
É de ver-se que nada há de celeumática no que tange à prescritividade e a novel regra do ordenamento jurídico Maior.
b) No plano da legislação aplicável à execução previdenciária levada a cabo pelo magistrado laboral.
Nesse tópico, o insigne magistrado, José Augusto Rodrigues Pinto, embora entenda que, até intuitivamente, o regramento a ser encartável seria o trabalhista, porém, tal não se daria por força do contido no art. 1º, da Lei das Execuções Fiscais, que, a seu turno, aponta que o diploma, subsidiariamente incidente, é o Código de Processo Civil.
Frente a esse quadro, o prefalado julgador laboral enfatiza que "está sendo dada ao juiz do trabalho a incumbência de promover a execução na Justiça do Trabalho sem usar a sua lei processual, nem mesmo subsidiariamente. Além disso, vai aplicar-se na execução da sentença um lei processual que exclui de sua disciplina precisamente a execução da sentença". (51)
E, assim sendo, o renomado escritor (52), em bem elaborada síntese, aponta as atecnias decorrentes da não utilização da lei trabalhista, mas, de revés, o uso da lei dos executivos fiscais. Valendo, destarte, a pena elencar algumas de tais distonias.
Quadro comparativo entre os diplomas legislativos aplicáveis |
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- Lei Trabalhista - |
- Lei das Execuções Fiscais - |
A citação do devedor é feita por mandado e, sucessivamente, por edital (CLT, art. 880 e o seu § 3º) |
A citação é implementada pela via postal, ou, se frustrada, primeiramente por mandado e, somente por último, via edital (Lei nº 6.830/80, art. 8º) |
Prazo para cumprimento voluntário da sentença, antes de ato constritivo, é de 48 (quarenta e oito) horas (CLT, art. 880) |
Na execução Fiscal, o prazo para pagamento é de 5 (cinco) dias (Lei nº 6830/80, art. 8º) e, na lei previdenciária (Lei nº 8.212/91, art. 53), o prazo para pagamento é de 2 (dois) dias, podendo haver citação e penhora concomitantes (53) |
A penhora ex officio poderá recair sobre quaisquer bens do devedor, sem obedecer nenhuma ordem (art. 883 da CLT) |
A penhora está jungida à gradação estabelecida no art. 11, da Lei nº 6.830/80 |
Não há, a meu ver, nenhuma incompatibilidade quer formal ou material quanto à utilização da lei trabalhista na execução ex officio, ventilada pelo art. 114, § 3º, da Carta Política.
Isso porque, ao se romper com o princípio dispositivo, pretendeu a Constituição, no que atina à faina laboral e com a norma em comento, dotar essa justiça especializada de um instrumento a serviço da obstaculização à sonegação, obviamente valendo, para tanto, do próprio arcabouço de regência, que, como se sabe, é mais expedito que os outros diplomas legislativos, qual seja, a Consolidação das Leis do Trabalho - CLT.
De conseguinte, a execução em tela haverá de caminhar dentro dos contornos traçados pela Consolidação das Leis do Trabalho, já que, indiscutivelmente, quis o legislador constitucional que, com tais normas, a serviço de uma arrecadação otimizada, fossem debelados problemas crônicos anteriormente existentes. E, demais disso, não seria crível dotar a Justiça Trabalhista dessa competência e, mesmo assim, afastá-la do complexo normativo que melhor a colocaria ao lado de tal mister, dotando-lhe de regras que, em tudo, refoge à sua peculiar sistemática e ao trato de seu dia-a-dia.
Se, inobstante isso, o juiz obreiro quiser aplicar a Lei nº 6.830/80 nas execuções previdenciárias preconizadas pelo art. 114, § 3º, da Carta Republicana, como compatibilizar tal conduta com os requisitos contidos no art. 6º daquele diploma legal? Qual a certidão de dívida ativa - CDA - que o magistrado aporia na dita petição inicial?
Esses questionamentos, mais uma vez, entremostram que, dentro do tema em discussão competência atribuída pelo novel § 3º, do art. 114, da Lei Mater a interpretação haverá de ser, sempre, na senda de prestigiar o almejado pela Lex Legum e não, pois, dentro de uma ótica romano-germênica, tão a gosto dos processualistas mais conservadores.
Sem contar que, após apurado os cálculos do crédito da Previdência Social, serão eles homologados na linha do preconizado pela CLT, já que a Lei das Execuções Fiscais nada dispõe a respeito. (54) E, assim sendo, não seria crível que, por um lado, aceitasse a regra de regência da Justiça do Trabalho e, por outro, entendesse viável a Lei dos Executivos Fiscais. E, por fim, se esta última fosse a aplicável, aí sim, poder-se-ia pensar até em substituição do bem penhorado a pedido do INSS (art. 15, inciso II), cancelamento da certidão de dívida ativa (!?) pela Previdência (art. 26), imposição de verba honorária quando do solvimento do crédito securitário (art. 2º, § 2º, parte final), o que, a toda evidência, deformaria toda a configuração da executividade trabalhista. Seria um hibridismo indesejável sem qualquer base jurídico-constitucional.
Para dar sentido ao texto superior, nada mais há de ser feito do que a aplicação da Consolidação das Leis do Trabalho tangentemente à execução das contribuições previdenciárias.
Visto sob este prisma, repita-se, nada há de controvertido no campo da aplicação das normas do processo trabalhista no trato da questão ora enfocada.
E, para por uma pá de cal sobre o assunto, ao meu sentir, no instante em que a Lei nº 10.035, de 25/10/2000, veio à lume com o intento de alterar "a Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943, para estabelecer os procedimentos, no âmbito da Justiça do Trabalho, de execução das contribuições devidas à Previdência Social", teve-se uma indiscutível preferência pela CLT como norma de regência na temática aqui enfocada.
a) Existência de execução fiscal e demanda trabalhista com créditos alusivos à novel competência estatuída pela Emenda Constitucional nº 20/98. Prevenção ou incompetência de um dos juízos, eis a questão.
Os magistrados, Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, trazem um suposto fático que abrangeria a temática aqui enfocada, ao asseverarem assim: "em uma ação de Execução Fiscal movida pelo INSS em que haja créditos, por exemplo, decorrentes da ação fiscalizatória sobre certa empresa que tinha empregados sem registro logo, sem efetuar contribuições e uma ação de um ou mais destes mesmos empregados, contra a empresa, perante a Justiça do Trabalho, em que, procedente a ação, com o reconhecimento do vínculo de emprego, passam a ser exigidas as contribuições no curso da execução. A empresa, ao embargar as execuções, alegará a incompetência absoluta de um dos Juízos para a cobrança dos valores em comum". (55)
Realmente, como fazer em caso que tal? A meu ver, dentro das situações contempladas pela hodierna regra do art. 114, § 3º, da Constituição Federal, a Justiça do Trabalho detém competência absoluta sobre a matéria. Assim sendo, e no caso supradito, faleceria ao Juízo Federal, em princípio, e no que tange à questão da contribuitividade do empregado, competência para analisar e julgar esse ponto.
Teria, porém, tal competência se o INSS, após excutida essa questão na Justiça Laboral, via a execução trabalhista de ofício, entender que existiria remanescente, onde, para cobrá-lo, em primeira mão, faria uso do lançamento fiscal e, empós, se não solvida a exação, aí sim voltar-se-ia no plano executivo fiscal no pálio da Justiça Comum.
De conseguinte, se, na execução fiscal, proposta na Justiça Comum, houver mais de um fundamento e, apenas alguns deles forem de competência da Justiça Especializada, deverá o Juiz de Direito (Estadual, por delegação ou próprio magistado federal), a seu turno, deixar de apreciar apenas aqueles temas que refogem à sua competência, prosseguindo, naturalmente, nos demais.
Entrementes, se o for incompetente para todo o thema decidendum, nos moldes do art. 113, § 2º, do Código de Processo Civil, deverá remeter os autos para a Justiça do Trabalho, sob pena de nulidade de seus eventuais atos decisórios.
Lembrando-se, assisadamente, que as questões aqui levantadas somente terão interesse prático após a publicação da Emenda Constitucional nº 20/98, que, sabidamente, conferiu novo raio competencial à Justiça do Trabalho.
E, demais disso, a afirmação da competência da justiça laboral, nos casos previstos no art. 114, § 3º, da Carta Magna, como sendo absoluta, evidentemente não impede de, no porvir, o INSS voltar a questionar resíduos que entenda ainda devidos, o que será, desta feita, procedido na Justiça Comum, como já enfocado, por nós, em linhas anteriores.
Isso porque, sabidamente, a competência da justiça obreira encerra-se com a execução de ofício por ela levada a efeito, a qual nasceu da própria sentença que fora por ela prolatada. Assim sendo, novo título da Previdência Social, ainda que fundado sobre os mesmos fatos, dependerá de apuração via lançamento fiscal e posterior inscrição no livro próprio (Dívida Ativa) e, por conta disso, a causa de tal exação, primariamente, não mais será o provimento jurisdicional trabalhista, extrapolando-se, por conseguinte, a competência conferida pelo art. 114, § 3", da Lei Mater e, por conseqüência, voltando-se para o espectro de aplicação do art. 109, inciso I, da Lex Legum, donde carrear, agora sim, a competência para a Justiça Federal, ou, dependendo da situação, para a Justiça Estadual (art. 15, inciso I, da Lei nº 5.010/66). (56)
Para dilucidar a ocorrência de duplicidade de exigência em juízos diversos, os escritores Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari aventam que "instalado o conflito de competência, não havendo a exclusão da competência da Justiça Federal ou Estadual (art. 109 e seu § 3º), impõe-se resolver a questão pela prevenção do Juízo, ou seja, o primeiro Juiz que conhecer da causa é o competente para a solução da lide". (57)
Mas, com todo o respeito, não podemos comungar acerca da aplicabilidade da prevenção como sendo o meio técnico-jurídico para deslindar esta quaestio. Tudo isso porque, em primeiro lugar, como já entremostrado por nós, a casuística desafia a competência absoluta da Justiça do Trabalho e, em segundo passo, a prevenção somente se verifica no pálio da competência relativa, como pode, com tranqüilidade, inferir-se do contido nos arts. 106 e 219, ambos do Código de Processo Civil, já que, como se sabe, em se tratando de incompetência absoluta, os autos haverão de ser remetidos ao que detiver a prefalada competência (ex vi legis: art. 113, § 2º, do diploma processual civil).
Disso deflui, com meridiana clareza, que se competente para a demanda for a Justiça do Trabalho e, de igual sorte, a mesma exação estiver sendo exigida na Justiça Comum, esta última haverá de remeter o feito àquela, sob pena de que, neste processo, os atos decisórios sejam tido na conta de nulos por falecer a esse juízo competência para tratar sobre o assunto.
De igual sorte, como se vê, foi o posicionamento do colendo Superior Tribunal de Justiça, assim vazado: "Em decorrência disto e a teor dos arts.112 e 113, § 2º., do CPC, os atos praticados pelos demais juízos, aos quais foram distribuídas outras ações idênticas, são nulos, por se tratar de incompetência absoluta, conforme orientação firmada em outros julgados deste STJ". (58)
Parece-me, isso sim, que a solução caminha na senda de que, em havendo duplicidade de exigência exacional, a competência é da Justiça do Trabalho, dentro dos limites estabelecidos pelo art. 114, § 3º, da Carta Magna, ou seja, o Juízo Comum, neste tanto, haverá de remeter os autos àquela especializada, sob pena de total nulificação dos atos decisórios, se a questão pertencer, na totalidade, à temática afeta à justiça obreira.
De efeito, se permanecer a execução na Justiça Comum, no tanto da competência da Laboral, e, na primeira, vier a ser prolatada sentença em grau de embargos do devedor, como é sabido, poderá o interessado valer-se até da ação rescisória, estribada, aqui, no art. 485, inciso II, segunda parte, do Código de Proceso Civil.
b) A execução de ofício, a seu turno, acena por ser feita nos mesmos autos que engendrou a sentença geratriz da contributividade previdenciária.
Não vislumbro, data maxima respecta, como ter-se a execução preconizada pelo art. 114, § 3º, da Lei Maior, em autos apartados. Nenhuma razão de conveniência, celerização ou, quiçá de outra vertente, aponta as vantagens disso.
De efeito, quer me sinalizar que o melhor caminho seria, isso sim, após extinta a relação laboral, com o trânsito em julgado do comando dessa especializada, que iniciasse, de ofício, a execução das contribuições previdenciárias nos mesmos autos, logicamente se restassem tais contributos insolvidos.
Outro empeço, acerca da exeqüibilidade em separado, surge quanto à questão do patamar das contribuições previdenciárias, ou seja, digamos que ela seja cifrada em montante bem diminuto, ainda assim, justificaria todas as diligências que disso decorrerriam, tais como, extração de cópias pela Vara do Trabalho, ordenação de mandado de penhora etc, que, naturalmente, oneram os custos da máquina judiciária? É racional, nos tempos hodiernos, gastar-se mais do que se pretende ver amealhado? O dinheiro público, ainda nesses casos, pode ser dispendido nessa esteira? Ou, de revés, até seria um comportamento malversador do erário estatal pautar-se nessa linha de conduta?
Estamos, cada vez mais, diante do princípio da significância, isto é, somente atos que gerem uma resposta social positiva demanda a instauração de um processo judicial. A noção de custo/benefício está cada vez mais presente em nossas vidas e, de igual sorte, no mundo jurídico, que, sabidamente, nada mais é do que a regulação das condutas humanas.
Não fosse isso suficiente, de outro lado, merece ser escandido que, na sistemática processual civil, que por evidente resta aplicável, também, à hipótese da executividade das contribuições sociais, incompossível cogitar-se de penhora de bens quando, em realidade, os custos da execução sobrepujam ao valor do bem constritado (art. 659, § 2º).
Discorrendo sobre este ponto, e de forma magistral, tem-se a ensinança de Humberto Theodoro Júnior, ao registrar que "a execução deve ser útil ao credor, e, por isso, não se permite sua transformação em instrumento de simples castigo ou sacrifício do devedor (...) é intolerável o uso do processo executivo apenas para causar prejuízo ao devedor, sem qualquer vantagem para o credor. Por isso, "não se levará a efeito a penhora, quando evidente que o produto da execução das execução dos bens encontrados será totalmente absorvido pelo pagamento das custas da execução" (art. 659, § 2º). (59)
Isso tudo, a meu sentir, informa que, até por imperativo dos novéis ideários normativos, não se torna de bom alvitre lançar mão de processo executivo em separado para as contribuições previdenciárias.
Em igual direção, indiscutivelmente, está a letra da Lei nº 10.035/2000, ao inserir normas recentes na Consolidação das Leis do Trabalho, apondo:
"Art. 880. O juiz ou presidente do tribunal (...) mandará expedir mandado de citação ao executado, a fim de que cumpra a decisão ou o acordo no prazo, pelo modo e sob as cominações estabelecidas, ou, em se tratando de pagamento em dinheiro, incluídas as contribuições sociais devidas ao INSS, para que pague em quarenta e oito horas, ou garanta a execução, sob pena de penhora" (sem destaques e reticências na fonte).
"Art. 884.
(...)
§ 4º. Julgar-se-ão na mesma sentença os embargos e asimpugnações à liquidação apresentadas pelos credores trabalhista e previdenciário" (sem as letras em itálico e os parêntesis e reticências no original).
Outro, no entanto, será o nosso entendimento, se tais autos apartados vierem no rumo de ua maior economicidade (art. 573 do Código de Processo Civil).
Exemplifiquemos: se houver como se cumular vários títulos contra um mesmo devedor, aí sim, o caminho da reunião disso em um só feito executório é indesmentível, tal como se dará quando se tiver, em face da mesma empresa, várias reclamatórias trabalhistas que, inexoravelmente, redundarão em vários débitos previdenciários, onde, por curial, recomendável torna-se o amalgamento deles em autos único.
Aforante o que acabamos de expor, que, as outras hipóteses, como se vislumbra, acabam por recomendar, em regra, a execução das contribuições previdenciárias nos mesmos autos que culminou o ato sentencial.
Mas, e em sede de embargos do devedor, por seu turno, serão eles processados nos mesmos autos, ou, de revés, devem ser autuados em apenso e com suspensão do feito executivo?
Colaciona-se, neste particular, lição preciosa de Francisco Meton Marques de Lima, ao prelecionar que: "Na execução trabalhista, os embargos estão disciplinados nos arts. 884 a 886 da CLT, de forma bem simples, sem complicações com limites claros sobre o cabimento etc (...) Os embargos à execução e à penhora processam-se nos autos da execução (...) Na prática, os embargos vêm sendo recebidos com suspensão da execução". (60)
Seja como for, o que nos interessa, aqui, são os embargos tirados acerca das contribuições previdenciárias. E, também, admitamos, sem maiores delongas, que no processo trabalhista os ditos embargos suspendam o curso da execução.
Esta suspensão do processo de execução apanhará, tão-somente, a matéria embargada e não será empeço à executividade das verbas do reclamante. Se, porventura, os embargos, a seu turno, incidirem sobre a relação trabalhista e também a ótica previdenciária, aí sim, ter-se-á a suspensão do feito executivo como um todo.
É isso, aliás, que reza o § 4º, do art. 884, da CLT, com a redação conferida pela Lei nº 10.035/2000, e, também, o § 8º, do art. 897, onde se lê:
"Quando o agravo de petição versar apenas sobre as contribuições sociais, o juiz da execução determinará a extração de cópias das peças necessárias, que serão autuadas em apartado, conforme dispõe o § 3º, parte final, e remetidas à instância superior para apreciação, após contraminuta".
E, com isso, nada há falar-se em suspensividade do curso da execução trabalhista a nível do reclamante.
Sendo, deste giro, inverídica a afirmativa de que: "para protelar a execução trabalhista bastaria, apenas, embargar a execução previdenciária, se nos mesmos autos". Isto porque, se tal lide incidental versar sobre a questão puramente exacional, em nada haverá de alterar o campo da relação executivo-obreira. Ter-se-á, sim, um lídimo tumulto processual se se incluir o INSS na lide, porque, se este sucumbir, sobrevirá o duplo grau - obrigatório - de jurisdição, como já alinhamos precedentemente.
Por derradeiro, deve-se, então, no campo dos embargos do devedor, se os mesmos abrangerem unicamente o tópico da seguridade social, recebê-los com suspensividade restrita a esse ponto focal, valendo-se o juiz, por analogia, do que está estampado no art. 1.052, do Código de Processo Civil, de todo aplicável à espécie em debate.
c) As multas previdenciárias, assim como os juros moratórios, serão excutidos, de ofício, pela Justiça do Trabalho.
De primeira mão, soa-me de bom alvitre evocar à mente a literalidade do art. 114, § 3º, da Carta Magna, assim vazado: "Compete ainda à Justiça do Trabalho executar, de ofício, as contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir" (destacou-se).
Ora, a nível de linguagem forense a palavra acréscimo significa aumento, acessão (61). Portanto, o termo acréscimos legais, contido no preceito constitucional acima transcrito, significa um aumento em decorrência da lei, e isso, em termos tributários, está a significar as penalidades decorrentes da mora no cumprimento da exação fiscal.
De efeito, até por uma mera interpretação gramatical, que, a meu ver, deve ser a primeira via que o exegeta haverá de lançar mão, chega-se à conclusão de que a execução de ofício, levada a cabo pela justiça obreira no campo previdenciário, abarca, igualmente, os juros moratórios e a multa decorrentes do atraso no solvimento do contributo de regência.
Em segundo passo, deve ser escandido que, no concernente às contribuições sociais, sua exigência, através da execução de ofício, está no pálio de uma inescondível obrigação tributária principal e, portanto, fica encartada no art. 113, § 1º, da Lei nº 5.172/66.
Assim sendo, não seria crível que, em tendo a obrigação principal por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária, contentasse a Justiça do Trabalho, apenas, com o desembolso da exação previdenciária desacompanhada das sanções decorrentes do descumprimento, voluntário, da norma peculiar, qual seja, a Lei nº 8.212/91, por parte do sujeito devedor.
Quem não quita um débito previdenciário, a tempo e modo, está subsumido às penalidades decorrentes deste seu ato omissivo e, por conta disso, haverá de solver o principal somado aos acréscimos legais, como, aliás, bem deflui do estatuído pelo art. 114, § 3º, da Lei Mater. Portanto, a competência da Justiça do Trabalho abrange, sem qualquer margem de dúvida, a execução do principal e dos respectivos acréscimos legais, como bem divisado pela Lex Legum.
Calha à fiveleta esta ensinança de José Cretella Júnior, assim averbada: "O contribuinte tem obrigação de pagar o tributo devido ou sofrer a sanção pecuniária, como sujeito passivo da obrigação principal". (62)
Não seria compreensível, desse modo, que a Justiça do Trabalho, no cometimento constitucional ínsito no novel art. 114, § 3º, viesse excutir apenas o principal, olvidando-se da sanção decorrente do não-pagamento da contribuição previdenciária na época própria. Tal comportamento da justiça obreira seria, com todo o respeito, uma afronta direta e literal à regra constitucional, além de um malferimento também cristalino à norma epigrafada no art. 113, § 1º, do Código Tributário Nacional.
Foi exatamente por isso, a meu ver, que a Lei nº 10.035/2000, veio de introduzir o § 4º ao art. 879 da Consolidação das Leis do Trabalho CLT, grafando que: "A atualização do crédito devido à Previdência Social observará os critérios estabelecidos na legislação previdenciária".