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Propriedade intelectual: a influência do copyright nos direitos autorais e seu controle pela mídia

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13/04/2010 às 00:00
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"Propriedade"

Para aumentarem o controle e os lucros de suas obras, passaram também a considerar que a propriedade teria natureza perpétua, o que é uma inverdade [22]. Esse pensamento ganhou muita força em 1998. Naquele ano, o Congresso americano decretou o Ato Sonny Bono de Extensão de Contrato de Copyright, que prolongou a vigência do prazo copyright por mais 20 (vinte) anos além do convencionado para pessoas jurídicas, em memória do congressista e músico Sonny Bono. Conforme sua viúva Mary Bono declarou, o seu falecido marido acreditava no que Jack Valenti, presidente da Associação dos Estúdios Cinematográficos Estadunidenses (MPAA), mais almeja:

Sonny queria que a proteção dos direitos autorais durasse para sempre. Fui informada pela equipe que isso seria inconstitucional. Eu peço aos senhores que trabalhem comigo para endurecer nossas leis de copyright de todas as maneiras possíveis. Como os senhores sabem, existe também a proposta de Jack Valenti por um período que dure a eternidade menos um dia. Talvez o Comitê possa analisá-la no próximo Congresso. [23]

Há de salientar-se que houve repercussão deste fato no Brasil, o que foi imediatamente contido. O contorno do direito real de propriedade foi moldado em um período recheado pela reafirmação de liberdades individuais, que culminou com positivação dos direitos fundamentais de primeira geração [24], dentre eles a proteção da propriedade privada, e que, coincidindo com a gênese do desenvolvimento da sociedade industrial, aparentemente oferecia uma solução coerente à ciência jurídica, na medida em que permitia o estudo unitário dos fenômenos sob uma roupagem una e dotada da força tão necessária ao direito [25].

Neste contexto, surge a idéia de que necessário é um direito privado e não um direito dos particulares, sendo que a intervenção estatal justifica-se ao se conceber que a autonomia privada deve ser limitada para que não infeste "territórios socialmente sensíveis" [26].

Fato é que, observado o direito como instrumento de manipulação das massas pela classe dominante [27], a indústria do entretenimento, com um pouco de ousadia, defende a idéia de que seria bem mais razoável que os direitos autorais sejam um direito de propriedade, o que é falso. Como nos ensina o doutrinador português José de Oliveira Ascensão, em seus comentários sobre as inovações trazidas pela Lei nº 5.988/73, sobre o Código Civil de 1916:

O Código Civil não reconhecia o Direito de Autor como um ramo autônomo do Direito. A "Propriedade Literária, Científica e Artística", estava regulada nos arts. 649 a 673, como uma propriedade entre outras. Mas esse obstáculo foi afastado com a vigente lei dos direitos autorais, que suprimiu a referência à propriedade. Nenhuma razão há hoje para integrar o Direito Autoral no Direito das Coisas. [28]

Portanto, não há o que se falar em tratar o direito autoral moderno como um direito de propriedade. Nessa linha de raciocínio assiste o pensamento do ilustre professor Antonio Chaves:

Direito Autoral é um conjunto de prerrogativas de ordem não patrimonial e de ordem pecuniária que a lei reconhece a todo criador de obras literárias, artísticas e científicas de alguma originalidade, no que diz respeito à sua paternidade e ao seu ulterior aproveitamento, por qualquer meio durante toda a sua vida e aos seus sucessores, ou pelo prazo que ela fixar. [29]

Tal consideração não merece crédito, já que a adoção dessa medida como provável solução seria inviável, trazendo um enorme prejuízo à cultura em nome de uma proteção abusiva de interesses meramente mercadológicos.

2.1. Fundadores, gravadores, transformadores e colecionadores

A informatização e o processo que a Internet desencadeia no planeta trazem consigo alguns aspectos positivos, como aponta Lawrence Lessig:

A tecnologia digital poderia habilitar um extraordinário número de pessoas comuns para se tornar parte do processo criativo. Para sair da vida de um ''consumidor'' (...) de música – e não apenas música, mas filme, e arte, e comércio – para uma vida onde alguém pode individualmente e coletivamente participar em fazer algo novo. [30]

Como exemplo, a rede está contribuindo para que escritores de todo o planeta ingressem no mercado editorial sem percorrer a via crucis da edição do papel, algo totalmente sujeito a cupidez financeira das obras por parte das editoras. Por meio de e-books, uma alternativa barata e bastante usada aqui e no exterior, que já deram origem à editoras virtuais e caíram nas graças do rei dos romances de horror, Stephen King.

Depois de publicar Riding The Bullet somente na Internet em parceria com uma editora, houve um imprevisto que mudou o rumo de seu trabalho. Um leitor, constrangido por ter lido sem pagar pelo livro de King, enviou um cheque no valor de US$ 2,50 (dois dólares e cinqüenta centavos) ao autor. Ele percebeu que poderia descartar a editora do processo e tratar diretamente com os leitores. Sua próxima obra, The Plant, foi disponibilizada para os leitores na rede mediante o pagamento de US$ 1,00 (um dólar) por capítulo.

Stephen King rompeu com uma tradição secular de edição e decretou a plena autonomia do autor. Sem os custos do papel, da distribuição e sem editora, a tendência é a liberação e democratização da literatura, hoje tratada como artigo político de luxo.

Em alguns anos, as pessoas certamente esquecerão como a Internet é atualmente. Pensando nisso, surgiu o WayBack Machine [31]. Este site especializado, gerido por uma organização sem fins lucrativos, a Internet Archive, funciona como um arquivo virtual da própria Internet: ele contém mais de 10 bilhões de cópias de páginas, arquivado desde 1996.

Como se denota, também não há uma espécie de arquivo de programas de TV. A programação do dia anterior, a menos que seja gravado em fita cassete, não estaria mais disponível ao público. Não estava. Em 2005 entrou em cena o YouTube [32], um site que comporta vídeos enviados pelos usuários contendo qualquer tipo de conteúdo, tais como clipes musicais, programas de TV ou vídeos caseiros, para serem assistidos no horário e local que se desejar, funcionando como uma verdadeira biblioteca audiovisual.


 Causa e efeito

Sun Tsu Wu foi um estrategista militar chinês que viveu por volta do ano 500 A.C. Sua obra A arte da guerra é estudada em todas as academias militares e seus princípios são freqüentemente adaptados para outras áreas, como economia, administração ou marketing. Em uma de suas passagens, nos ensina o sábio chinês: "Se conheceres o inimigo e a ti mesmo, não precisarás temer o resultado de uma centena de batalhas. Se conheceres a ti mesmo, mas não ao inimigo, para cada vitória conquistada sofrerás uma derrota. Se não conheceres nem a ti próprio nem ao inimigo, irás sucumbir em todas as batalhas". Felizmente a obra é de domínio público; se fosse escrita hoje, provavelmente daqui a 100 (cem) anos ainda seria devida remuneração ao autor ou a algum herdeiro.

Há quem lute em favor da democratização do conteúdo. Seus argumentos são tão bons quanto os da indústria cultural. São verdadeiros combatentes que buscam o sucesso tendo como lema a difusão de idéias e do conhecimento livremente.

Essa guerra que está sendo travada no momento por ambos os lados traz consigo sérias consequências: está sendo restringido com o endurecimento das leis o processo criativo, protegendo-se cada vez mais o conteúdo velho em detrimento da criação de conteúdo novo em nome de interesses patrimoniais, esquecendo-se totalmente das condições em que o conteúdo velho foi criado livremente, como veremos a seguir.

3.1. Danos: limitando criadores, inovadores e corrompendo cidadãos.

Em 1998, os Estados Unidos adotaram a Lei de Copyright do Milênio Digital (DMCA), modificando profundamente o regime de proteção à propriedade intelectual. Tal norma, ditatorial e abusiva, criminalizou qualquer iniciativa que possa vir a violar mecanismos técnicos à proteção de direitos à propriedade intelectual e estende a terceiros a responsabilidade pela violação de direitos autorais. Provedores de acesso e de serviços na Internet são considerados co-responsáveis, caso seus usuários infrinjam direitos autorais por meio dos serviços por eles prestados. Uma conseqüência foi à retirada maciça de conteúdo protegido da Internet que pudesse ser alvo de processos judiciais. Em alguns casos, é permitido que em menos de 24 horas os usuários sejam julgados e condenados, sem mesmo saber o que está acontecendo.

A DMCA é fruto de um acordo feito entre vários países, imposto pela Organização Mundial de Propriedade Intelectual (WIPO). Em discussões sobre a ALCA e na Organização Mundial do Comércio, fortes pressões são exercidas para a adoção, em escala global, de normas equivalentes ao DMCA.

Quanto mais a busca pela liberdade de criação cresce, maiores são as tentativas de evitar o desenvolvimento dessa ideologia. Dessa forma, o Congresso americano prepara um dos maiores ataques que já se viu. Depois de aprovarem a DMCA, não ficaram contentes.

Era preciso ir á fonte do problema, então foi apresentado no congresso americano Projeto de Lei denominado Lei de Certificação e Padrões de Sistemas de Segurança (SSSCA), em fase de discussão há mais de quatro anos, que obrigaria todo dispositivo digital interativo, hardware ou software, a apresentar meios de impedir cópia de conteúdo protegido.

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Segundo esta proposta, o software livre, por exemplo, poderia ser considerado como produto ilegal, já que se tem o acesso ao código fonte e qualquer pessoa poderia alterar livremente os seus mecanismos de proteção. Devemos vigiar e impedir que projetos e leis assim apareçam no Brasil, ou que nos sejam impostos por acordos internacionais.

Na França, o país berço do pensamento iluminista, já aconteceu o pior. Este tipo de lei já existe a mais de um ano e é conhecida como DADVSI (droid d''auteur et droids dans la société de l''infomation), que foi aprovada sob muitos protestos populares.

Em um país como o nosso em que o magistrado arbitra o valor de US$ 100.000,00 (cem mil dólares) por uma pequena infração de direito autoral, como pelo uso indevido de fotografia, exigindo um alto custo para o réu empreender sua defesa numa ação desse tipo, e que nunca retornaria esse valor ao réu acusado injustamente por defender seu direito de expressão, não há o que se falar em promoção da cultura com as normas autorais vigentes.

Quando há violação de direito patrimonial do autor, em certos casos, a lei prevê um critério de indenização, como por exemplo, de quem edita a obra sem autorização do autor. Nesta hipótese, a legislação prevê que o contrafator deverá pagar o valor obtido com a venda dos exemplares ou "não se conhecendo o número de exemplares que constituem a edição fraudulenta, pagará o transgressor o valor de três mil exemplares, além dos apreendidos", conforme dispõe o artigo 103 e parágrafo único, da Lei nº 9.610/98.

Para as outras hipóteses a não há previsão legal, devendo o juiz analisar o entendimento doutrinário e jurisprudencial existentes: "O ressarcimento devido ao autor haverá de superar o que seria normalmente cobrado pela publicação consentida. A ser de modo diverso, sua aquiescência seria, na prática, dispensável. Cumpre, ao contrário, desestimular o comportamento reprovável de quem se apropria indevidamente da obra alheia" [33].

Em caso de violação de direito moral, não há nenhum critério para o fixar o valor da indenização por violação existente no mesmo diploma legal. O arbitramento desse valor pelo juiz é mensurado pela agressão primária à tutela da intimidade moral, ferindo direito de personalidade do autor, como é o entendimento jurisprudencial:

Dano moral. Mensuração. Para a reparação do dano moral não se exige a ocorrência de ofensa à reputação do indivíduo. O que acontece é que, de regra, a publicação da fotografia de alguém, com intuito comercial ou não, causa desconforto, aborrecimento ou constrangimento, não importando o tamanho desse desconforto, desse aborrecimento ou desse constrangimento. Desde que ele exista, há o dano moral, que deve ser reparado, manda a CF (5.º X). [34]

Existe certa tendência, em algumas Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em tabelar o dano moral, fixando-se o valor correspondente a 100 (cem) salários mínimos.

Ressalta-se que em caso de violação de direito autoral onde não há necessidade de produção de prova pericial, pode ser aplicada a Lei nº 9.099/95, limitando o valor da indenização pretendida em até 40 (quarenta) salários mínimos.

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Sobre o autor
Michael Vinícius de Oliveira

Bacharel em Direito

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Michael Vinícius. Propriedade intelectual: a influência do copyright nos direitos autorais e seu controle pela mídia. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2477, 13 abr. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14677. Acesso em: 22 dez. 2024.

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