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Aspectos legais da Emenda Constitucional nº 20/98 e o Município

01/05/1999 às 00:00
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Em 15 de dezembro de 1998, foi editada a Emenda Constitucional nº 20, que modificou o sistema de previdência social e estabeleceu normas de transição com relação às mudanças nele ocorridas. O art. 1º da referida Emenda, ao alterar o conteúdo do art. 40 da Constituição da República, acrescentou o § 13, que passou a ter a seguinte redação § 13 - Ao servidor ocupante, exclusivamente, de cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração bem como de outro cargo temporário ou de emprego público, aplica-se o regime geral de previdência social .

Com isto, o Município de João Pessoa, preocupado com as implicações advindas do disposto neste dispositivo e ciente de que poderia ser constituído em mora pelo não pagamento ao INSS da contribuição acima prevista, e com a qual não concorda, por sua flagrante inconstitucionalidade, requereu a suspensão da exigibilidade do suposto crédito tributário, pleiteando um mandado de segurança perante o Juízo da 1ª. Vara Federal com base, entre outros argumentos jurídicos, na violação do princípio federativo, vez que a Constituição de 1988 manteve a forma federal do Estado brasileiro, inovando ao nela incluir os Municípios, ao declarar que "a República Federal do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito"(art. 1º).

O federalismo baseia-se no união de coletividades políticas autônomas envolvendo técnica de descentralização, revela dois princípios que o distinguem de outras formas de Estado: o princípio da autonomia e o princípio da participação. O princípio da autonomia quer significar que as coletividades territoriais distintas do poder central têm sua própria estrutura governamental e competências próprias; o princípio da participação diz respeito à participação dos Estados federados na formação da vontade ou das leis nacionais (representatividade do Senado). Nos termos da Constituição, o Município é entidade estatal integrante da federação, como entidade político - administrativa, dotada de autonomia política, administrativa e financeira. A autonomia municipal é assegurada pelos artigos 18 e 29, e garantida contra os Estados no art. 34, VII, "c". Autonomia significa capacidade ou poder de gerir os próprios negócios, dentro de limites estabelecidos por entidade superior. A Constituição, bem como governo próprio e competências exclusivas.

A Magna Carta diz, ainda, expressamente, em seu art. 60, § 4º, que não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir a forma federativa do estado; o voto secreto, universal e periódico, a separação dos poderes e os direitos e garantias individuais. A vulneração desse núcleo temático, ainda que potencial, pode legitimar, desde logo, o controle jurisdicional, que constituirá, neste contexto, um instrumento de preservação e de restauração da vontade emanada do órgão detentor das funções constituintes primárias.

No que tange à organização da Administração Pública, incumbe privativamente a cada pessoa política - União, Estados (ou Distrito Federal) e Municípios - editar para si leis dispondo sobre - a estruturação de sua Administração Pública, com sua divisão em órgãos ou pessoas jurídicas, definindo os cargos que compõem cada qual e as respectivas competências; a organização de seus serviços públicos; os procedimentos a serem adotados no exercícios de suas atividades administrativas; o regime jurídico de seus servidores. Essa competência administrativa está ínsita no art. 18 da Constituição, consagrando a autonomia administrativa de cada uma das pessoas constitucionais cuja existência supõe o poder de ordenação da estrutura e do modo de atuar da Administração Pública. Assim, cada entre político, por sua auto - administração, imposta pelo art. 18 da constituição Federal, possui competência privativa para legislar sobre o regime jurídico de seus servidores, como também sobre sua previdência.

O art. 149, parágrafo único, da Constituição Federal, o qual confere em termos amplos às entidades federativas a faculdade de adoção de regime próprio de previdência, uma vez que lhe compete organizar e estruturar seus serviços, para custeio, em benefício destes, de sistemas de previdência e assistência social. O Município só poderá instituir contribuição cobrada de seus servidores para custeio, em benefícios destes, de sistema de previdência e assistência social, se tiver o seu próprio sistema de previdência, o qual é conseqüência da autonomia administrativa prevista no art. 30, I, da constituição Federal, O Princípio Federativo, norma imutável da Constituição Federal (art. 60, § 4º, I), é princípio fundamental da ordem jurídica brasileira dirigido à organização e estruturação política do Estado e baseia-se, sobretudo, na autonomia dos entes políticos que compõem a Federação.

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A equiparação do Município a empregador despreza os institutos jurídicos consolidados no direito positivo pátrio, bem como contradiz a decisão da Corte Suprema no caso da contribuição anterior. A diversidade existente os empregadores e os entes públicos são manifestas, sendo inconcebíveis qualquer tentativa de aproximação. Não pode, portanto, uma emenda à Constituição impor obrigações aos Municípios, a empregadores (contribuintes), já que a própria Constituição Federal assim não dispôs, originariamente, em seu art. 195, cujo caput não foi modificado.

A modificação introduzida pelo §13 do art. 40 caracteriza, sem dúvida, uma flagrante ofensa ao Princípio Federativo. Sendo assim, diante da disposição contida no art. 40, § 13 se o Município não fizesse o recolhimento das contribuições relativas a seus servidores aposentados e ocupantes de cargos comissionados, até a data correta, seria constituído em mora pelo INSS (e repita-se, de um débito totalmente inconstitucional), o que, consequentemente, traria sérios problemas à Municipalidade, como a retenção do Fundo de Participação dos Municípios, autorizada devido ao parcelamento celebrado entre o autor e o INSS, bem como imposição de elevadas multas pelo atraso no pagamento do suposto débito junto à autarquia federal. Foi assim concedida a medida liminar (*) propugnada, estando suspensas as exigências dispostas na emenda vergastada.


NOTAS

(*) À guisa de ilustração, já agora, no último dia 15 de abril de 1999, o eminente Ministro do STF Carlos Velloso concedeu idêntica liminar nos autos do Mandado de Segurança n. 23.411-3 em face de dois aposentados do Egrégio Supremo Tribunal Federal, tema ora esposado.

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Sobre o autor
Carlos Pessoa de Aquino

advogado, procurador-geral do Município de João Pessoa (PB), professor da UFPB, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AQUINO, Carlos Pessoa. Aspectos legais da Emenda Constitucional nº 20/98 e o Município. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 31, 1 mai. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1470. Acesso em: 18 abr. 2024.

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