6. Síntese conclusiva.
Preliminarmente podemos concluir que não estamos propriamente diante de um estado de natureza, mas de uma ordem estruturada a partir de fatores culturais que dissociam a esfera pública da privada, traduzida no célebre dilema brasileiro da igualdade, universalidade e legalidade no plano político institucional, e da desigualdade, hierarquização e regras truculentas de convivência no plano social. Esta disjunção não é da mesma natureza daquela existente em determinados bolsões em que a lógica familiar e privada é substituída por normas de convivência implementadas por grupos paraestatais em que, aí sim, vigora a lei do mais forte.
A autonomia das instituições legais e sua capacidade efetiva de afetar processos e comportamentos organizacionais e individuais tem peso historicamente significativo na garantia dos direitos de cidadania nas operações das agências públicas de controle social.
Um segundo determinante do controle da polícia é a força e a capacidade de ação efetiva de movimentos sociais de defesa dos direitos civis.
Certamente no cômputo dos custos de se acionar o estado está uma orientação motivacional que demarca nitidamente uma linha divisória entre o nível formal legal e o âmbito das relações pessoais, marcada por uma enorme bolha de indiferença em relação a um estado excessivamente legislador e regulatório.
Mecanismos de controle operam em vários níveis, nos quais a estrutura legal convive ao lado de regras organizacionais, das normas advindas de forças sociais, dos contratos controlados pelas partes interessadas e da dimensão ético-pessoal.
A indignação moral somada à perplexidade diante da brutalidade das facções criminosas e da solidariedade das populações a este tipo de ação, das incertezas da punição de predadores e da ineficiência agregada do sistema de justiça criminal não devem inibir a consideração realista do estado e suas organizações como instrumentalidade institucional de provisão de justiça e paz.
E, finalmente, não poderíamos deixar de alertar que a repressão, o combate ao crime organizado é salutar para a prevalência do Estado democrático de direito, e, por outro lado, a omissão, a conivência, tanto dos cidadãos quanto dos órgãos governamentais, relativamente às práticas criminosas, causa temor e compromete a estrutura do estado o que requer ações enérgicas das autoridades que muitas vezes preferem a omissão, que, nas palavras de Martin Luther King: "O que mais preocupa não é nem o grito dos violentos, dos corruptos, dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética. O que mais preocupa é o silêncio dos bons".
Referências Bibliografias
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Notas
- BOBBIO, Norberto. O Futuro da Democracia: uma defesa das regras do jogo. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1986.
- V. Ob. cit., p. 36-37
- Autor da conhecida obra intitulada "A luta pelo direito".
- V. ob. cit., p. 57.
- V. ob. cit., p. 103.
- LAFER, Celso. Reconstrução dos direitos humanos: um diálogo com o pensamento de Hanna Arendt. São Paulo, Cia. das Letras, 1988.
- V. ob. cit., p- 233.
- MARTINS, José de Souza. O Poder do Atraso. Ensaios de Sociologia da História Lenta. São Paulo, Editora Hucitec, 1994. p. 35.
- SCHILLING, Flávia. Corrupção, crime organizado e democracia. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v. 13/2, 2000.
- V. ob. cit. p. 80.
- BOBBIO, Norberto. O Futuro da Democracia: uma defesa das regras do jogo. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1986. p. 89
- V. ob. Cit., p. 103.
- V. ob. Cit., p. 86
- LAFER, Celso. Reconstrução dos direitos humanos: um diálogo com o pensamento de Hanna Arendt. São Paulo, Cia. das Letras, 1994, p. 233