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As organizações criminosas e seus reflexos na democracia

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19/09/2010 às 11:39
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6. Síntese conclusiva.

Preliminarmente podemos concluir que não estamos propriamente diante de um estado de natureza, mas de uma ordem estruturada a partir de fatores culturais que dissociam a esfera pública da privada, traduzida no célebre dilema brasileiro da igualdade, universalidade e legalidade no plano político institucional, e da desigualdade, hierarquização e regras truculentas de convivência no plano social. Esta disjunção não é da mesma natureza daquela existente em determinados bolsões em que a lógica familiar e privada é substituída por normas de convivência implementadas por grupos paraestatais em que, aí sim, vigora a lei do mais forte.

A autonomia das instituições legais e sua capacidade efetiva de afetar processos e comportamentos organizacionais e individuais tem peso historicamente significativo na garantia dos direitos de cidadania nas operações das agências públicas de controle social.

Um segundo determinante do controle da polícia é a força e a capacidade de ação efetiva de movimentos sociais de defesa dos direitos civis.

Certamente no cômputo dos custos de se acionar o estado está uma orientação motivacional que demarca nitidamente uma linha divisória entre o nível formal legal e o âmbito das relações pessoais, marcada por uma enorme bolha de indiferença em relação a um estado excessivamente legislador e regulatório.

Mecanismos de controle operam em vários níveis, nos quais a estrutura legal convive ao lado de regras organizacionais, das normas advindas de forças sociais, dos contratos controlados pelas partes interessadas e da dimensão ético-pessoal.

A indignação moral somada à perplexidade diante da brutalidade das facções criminosas e da solidariedade das populações a este tipo de ação, das incertezas da punição de predadores e da ineficiência agregada do sistema de justiça criminal não devem inibir a consideração realista do estado e suas organizações como instrumentalidade institucional de provisão de justiça e paz.

E, finalmente, não poderíamos deixar de alertar que a repressão, o combate ao crime organizado é salutar para a prevalência do Estado democrático de direito, e, por outro lado, a omissão, a conivência, tanto dos cidadãos quanto dos órgãos governamentais, relativamente às práticas criminosas, causa temor e compromete a estrutura do estado o que requer ações enérgicas das autoridades que muitas vezes preferem a omissão, que, nas palavras de Martin Luther King: "O que mais preocupa não é nem o grito dos violentos, dos corruptos, dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética. O que mais preocupa é o silêncio dos bons".


Referências Bibliografias

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LAFER, Celso. Reconstrução dos direitos humanos: um diálogo com o pensamento de Hanna Arendt. São Paulo, Cia. das Letras, 1988.

MARTINS, José de Souza. O Poder do Atraso. Ensaios de Sociologia da História Lenta. São Paulo, Editora Hucitec, 1994.

ONU. Nono Congresso das Nações Unidas sobre prevenção do crime e tratamento de delinqüentes. Cairo, 28abr-8mai 1995. Rio de Janeiro, Centro de Informações dasNações Unidas, 1995.

PAIXÃO, Antonio Luiz. Crime, controle Social e Consolidação da Cidadania. Dados: Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, 1988: v.25, p.63-85.

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ZALUAR, A., 1984. A Máquina e a Revolta. São Paulo. Brasiliense.

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Revista Jurídica Consulex, Ano XII, nº 279, 31.08.2008

Revista Jurídica Consulex, Ano XII, nº 280, 15.09.2008


Notas

  1. BOBBIO, Norberto. O Futuro da Democracia: uma defesa das regras do jogo. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1986.
  2. V. Ob. cit., p. 36-37
  3. Autor da conhecida obra intitulada "A luta pelo direito".
  4. V. ob. cit., p. 57.
  5. V. ob. cit., p. 103.
  6. LAFER, Celso. Reconstrução dos direitos humanos: um diálogo com o pensamento de Hanna Arendt. São Paulo, Cia. das Letras, 1988.
  7. V. ob. cit., p- 233.
  8. MARTINS, José de Souza. O Poder do Atraso. Ensaios de Sociologia da História Lenta. São Paulo, Editora Hucitec, 1994. p. 35.
  9. SCHILLING, Flávia. Corrupção, crime organizado e democracia. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v. 13/2, 2000.
  10. V. ob. cit. p. 80.
  11. BOBBIO, Norberto. O Futuro da Democracia: uma defesa das regras do jogo. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1986. p. 89
  12. V. ob. Cit., p. 103.
  13. V. ob. Cit., p. 86
  14. LAFER, Celso. Reconstrução dos direitos humanos: um diálogo com o pensamento de Hanna Arendt. São Paulo, Cia. das Letras, 1994, p. 233
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Sobre o autor
José James Gomes Pereira

Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Piauí. Curso de Formação de Oficiais pela APMPE em Paudalho, Pernambuco. Especialista em Direito Processual Penal pela Universidade Federal do Ceará. Desembargador no e. Tribunal de Justiça do Estado do Piauí. Especialista em História Política do Piauí pela Universidade Estadual do mesmo estado. Professor Universitário. Mestre pela Universidade Católica de Brasília – UCB. Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universida del la Museo Argentino - UMSA e Pós-Doutorando em Direito Constitucional. Università deglí Studí Messína. Itália.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEREIRA, José James Gomes. As organizações criminosas e seus reflexos na democracia. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2636, 19 set. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17431. Acesso em: 28 mar. 2024.

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