Capa da publicação Eficácia plena e imediata da Lei da Ficha Limpa em face do empate no julgamento do STF
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Eficácia plena e imediata da Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135/2010) em face do empate no julgamento do Supremo Tribunal Federal

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29/09/2010 às 06:01
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2. Consequências jurídicas do empate no julgamento do Supremo Tribunal Federal: ausência da maioria qualificada necessária para afastar a aplicação imediata da lei complementar

De início, necessário esclarecer a impossibilidade da suspensão do julgamento, nos termos em que decidiu o STF. Não existe regra legal com tal permissivo.

O parágrafo único do artigo 173 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal dispõe que:

"Se não for alcançada a maioria necessária à declaração de inconstitucionalidade, estando licenciados ou ausentes Ministros em número que possa influir no julgamento, este será suspenso a fim de aguardar-se o comparecimento dos Ministros ausentes, até que se atinja o quorum".

No caso, há um cargo de Ministro vago, não se tratando, portanto, de Ministro em licença ou ausente. A norma citada não se aplica.

O Supremo Tribunal Federal não poderia ter determinado a suspensão do julgamento. Não há permissão legal para o non liquet do STF. Necessária, pois, a retomada e encerramento do julgamento do recurso, com a devida proclamação do seu resultado, medida que privilegiará a segurança e a previsibilidade jurídica.

Além disso, o voto médio, possível critério de solução nos casos de empate no julgamento de recursos, é inviável na espécie, porque o empate efetivo se deu na questão da constitucionalidade da aplicação imediata da norma, situação concreta na qual os votos são excludentes: ou a norma é aplicada ou não, sendo inviável falar-se em voto médio. Assim, incabível a utilização deste critério para desempatar o julgamento.

Considerando a formação do empate, a impossibilidade de utilização do voto médio e o não cabimento da suspensão, deve ser analisada a possível aplicação ao caso da norma regimental que concede o voto de qualidade ao Presidente do STF.

O artigo 13 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, atualizado pela Emenda Regimental nº 35, de 2009, dispõe caber ao Presidente do Tribunal proferir voto de qualidade nas decisões do Plenário para as quais o Regimento Interno não preveja solução diversa, quando o empate na votação decorra de ausência de Ministro em virtude de impedimento ou suspeição; vaga ou licença médica superior a 30 (trinta) dias, quando seja urgente a matéria e não se possa convocar o Ministro licenciado.

A norma regimental também não se aplica ao caso. Em primeiro lugar, porque o empate não decorre de ausência de Ministro em virtude de impedimento ou suspeição nem de vaga ou licença média, o que, por si só, afastaria a aplicação da regra.

Além disso, a citada norma só seria aplicada se o regimento não trouxesse solução diversa. No caso, o artigo 146 do RISTF determina o critério de desempate quando a matéria examinada dependa da formação da maioria absoluta dos votos, nestes termos:

"Havendo, por ausência ou falta de um Ministro, nos termos do art. 13, IX, empate na votação de matéria cuja solução dependa de maioria absoluta, considerar-se-á julgada a questão proclamando-se a solução contrária à pretendida ou à proposta."

Conforme será exposto adiante, o recurso extraordinário em discussão necessitaria, para ser provido, do voto da maioria absoluta dos Ministros. Por mais este motivo, restaria afastada a possibilidade de o Presidente, para desempatar a votação nominal, votar por uma segunda vez.

Por fim, pode-se questionar a constitucionalidade desta norma regimental, que concede ao Presidente a possibilidade, ao menos em tese, de votar duas vezes no mesmo processo. Tal norma quebra a tradição do chamado "Voto de Minerva" ou de qualidade, concedido ao Presidente nos casos de empate, desde que ele não tenha participado da votação.

Tradicionalmente, o Presidente seria incumbido de desempatar a questão porque, em um primeiro momento, não teria votado. A norma regimental distorce o instituto, concedendo ao Presidente, em caso de empate, a possibilidade teórica do voto duplo, violando, inclusive, a conhecida regra do "one man, one vote".

Em todo caso, ainda que se considere constitucional a norma regimental, não se aplicaria ao caso, porque ausentes os seus pressupostos de incidência: não está configurada a ausência de Ministro em virtude de impedimento ou suspeição nem de vaga ou licença média; e, ainda, existe norma regimental específica prevendo o critério de desempate para o caso (artigo 146 do RISTF).

Por outro lado, como o recurso extraordinário tem como objeto o afastamento de norma legal em razão de alegada ofensa à Constituição, tem aplicação a regra do artigo 97 da Constituição, conforme será analisado adiante.

O art. 97 da Constituição Federal dispõe que somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os Tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público. Sendo a ação de competência dos Tribunais, a lei só será declarada inconstitucional pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos integrantes do respectivo órgão especial. [4]

Assim,

"Em instância colegiada, deve ser obedecido o princípio constitucional da reserva de plenário ou full bench, em que a decisão que declarar a inconstitucionalidade apenas pode ser tomada pela maioria absoluta dos membros pertencentes ao plenário ou a órgão especial do tribunal." [5]

Ressalte-se que, para confirmar a constitucionalidade da regra legal, é desnecessária a maioria absoluta e mesmo o julgamento plenário. A manutenção da constitucionalidade corrobora a presunção que milita em favor das normas legais. Não há maiores formalidades para aplicar a norma legal, confirmando sua constitucionalidade. A cláusula de reserva de plenário incide apenas nos casos em que a norma é considerada inconstitucional, não incidindo se o Tribunal declara a sua constitucionalidade.

A cláusula de reserva de plenário "espelha o princípio da presunção de constitucionalidade das leis, que para ser infirmado exige um quorum qualificado do tribunal" [6].

Ao exigir o voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial para a declaração de inconstitucionalidade de uma lei pelo tribunal, o Constituinte procurou conceder maior estabilidade à decisão que resolve a questão constitucional [7].

"Esta verdadeira cláusula de reserva de plenário atua como condição de eficácia jurídica da própria declaração jurisdicional de inconstitucionalidade dos atos do Poder Público, aplicando-se para todos os tribunais, via difusa, e para o Supremo Tribunal Federal, também no controle concentrado.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem reiteradamente proclamado que a desconsideração do princípio em causa gera, como inevitável efeito conseqüencial, a nulidade absoluta da decisão judicial colegiada que, emanando de órgão meramente fracionário, haja declarado a inconstitucionalidade de determinado ato estatal". [8]

O artigo 481, parágrafo único, do Código de Processo Civil, excepciona a regra do artigo 97, pois estabelece que "Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a argüição de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão". Como não houve pronunciamento anterior do STF, tratando-se de matéria inédita na Corte, a cláusula de reserva de plenário incide inteiramente.

Considerando o empate formado no julgamento do recurso, e depois das ressalvas acima, a questão que surge e precisa ser respondida é a seguinte: para que o Supremo Tribunal Federal afaste a aplicação de normas de uma lei complementar válida e vigente, sob o fundamento de ofensa a normas constitucionais, é necessária a observância da cláusula de reserva de plenário, prevista no artigo 97 da Constituição, exigindo-se o voto da maioria absoluta dos seus membros?

Tentar-se-á, nos parágrafos seguintes, oferecer uma resposta a esta pergunta. Para tanto, necessário delimitar o alcance da norma do artigo 97 da Constituição Federal.

Como a citada regra constitucional exige a reserva de plenário apenas quando o Tribunal "declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo", tornou-se comum, nos Tribunais, o afastamento da aplicação de determinadas regras legais em casos concretos, com fundamento em normas constitucionais, sem a declaração formal de inconstitucionalidade da lei ou ato normativo. Deste modo, o Tribunal descumpria o artigo 97 da Constituição Federal, porque, na prática, entendia que a norma era inconstitucional, afastando-a, mas, como não declarava expressamente a sua inconstitucionalidade, ignorava a necessidade de maioria absoluta bem como o julgamento pelo plenário. A cláusula de reserva de plenário, na prática, era seguidamente desobedecida.

O Supremo Tribunal Federal, em diversos precedentes, coibiu este tipo de manobra hermenêutica, exigindo o cumprimento do artigo 97 sempre que determinada norma fosse afastada com fundamento em critérios constitucionais, mesmo que não houvesse a declaração formal de inconstitucionalidade da norma no acórdão:

"EMENTA: CONSTITUCIONAL. PROCESSO CIVIL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ACÓRDÃO QUE AFASTA A INCIDÊNCIA DE NORMA FEDERAL. CAUSA DECIDIDA SOB CRITÉRIOS DIVERSOS ALEGADAMENTE EXTRAÍDOS DA CONSTITUIÇÃO. RESERVA DE PLENÁRIO. ART. 97 DA CONSTITUIÇÃO. TRIBUTÁRIO. PRESCRIÇÃO. LEI COMPLEMENTAR 118/2005, ARTS. 3º E 4º. CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL (LEI 5.172/1966), ART. 106, I. RETROAÇÃO DE NORMA AUTO-INTITULADA INTERPRETATIVA.

‘Reputa-se declaratório de inconstitucionalidade o acórdão que - embora sem o explicitar - afasta a incidência da norma ordinária pertinente à lide para decidi-la sob critérios diversos alegadamente extraídos da Constituição’ (RE 240.096, rel. min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, DJ de 21.05.1999). Viola a reserva de Plenário (art. 97 da Constituição) acórdão prolatado por órgão fracionário em que há declaração parcial de inconstitucionalidade, sem amparo em anterior decisão proferida por Órgão Especial ou Plenário. Recurso extraordinário conhecido e provido, para devolver a matéria ao exame do Órgão Fracionário do Superior Tribunal de Justiça."

(RE 482090/SP, STF, 2008)

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Os seguidos precedentes no mesmo sentido do acórdão citado ensejaram o surgimento da Súmula Vinculante nº 10, do STF, nestes termos:

"Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte."

Aplicando-se a Súmula Vinculante nº 10, do próprio STF, à questão em discussão, a conclusão a que se chega é a de que a decisão que afaste a aplicação imediata da LC nº 135/2010, com fundamento em norma constitucional (artigo 16 da Constituição Federal), deve obedecer à cláusula de reserva de plenário.

Afastar a aplicação da jurisprudência sumulada do STF justamente nos processos em que se discute a constitucionalidade de uma regra legal com nítido caráter moralizador é de um injustificável casuísmo.

A questão é: pode o STF afastar a incidência de uma norma legal, com fundamento na Constituição, sem obedecer à cláusula de reserva de plenário e a sua própria Súmula Vinculante nº 10?

A única resposta para esta questão, salvo se entender-se que o Supremo está acima da própria Constituição, é negativa. O STF é guardião da Constituição Federal, mas em hipótese nenhuma pode descumprir suas disposições.

Conforme disposição do 9º, II, do RISTF, compete às Turmas, e não ao Plenário, o julgamento do recurso extraordinário.

No entanto, o artigo 22 do RISTF determina que: "O Relator submeterá o feito ao julgamento do Plenário, quando houver relevante argüição de inconstitucionalidade ainda não decidida". Foi exatamente o que aconteceu no presente caso. Seguindo as observações acima e a norma regimental, o Ministro relator do recurso extraordinário, compreendendo o alcance constitucional da causa, afetou o processo ao plenário, nos termos do artigo 22.

Deste modo, o relator cumpriu a cláusula de reserva de plenário, afetando ao órgão colegiado o julgamento de processo que tinha como objeto o afastamento de norma legal em razão de alegada ofensa a normas constitucionais.

Aliás, a regra geral, nos processos de competência do Plenário, é que o Presidente do Supremo Tribunal Federal não vote. Essa a interpretação que exsurge da leitura da norma do artigo 146 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal. O voto do Presidente, no plenário, é, pois, excepcional.

No caso, o Presidente do STF votou – foi o voto dele que ocasionou o empate. Qual a justificativa para o voto do Presidente? Ora, o Presidente votou porque se tratava de questão constitucional. Conforme lição do Ministro Gilmar Mendes, durante o julgamento da Extradição nº 1085 (2010), "A regra é muito clara, o Presidente do Plenário não proferirá voto, salvo em matéria constitucional". E a matéria constitucional discutida no processo, que autorizou o voto do Presidente, foi exatamente a possibilidade de afastamento da aplicação da lei complementar em razão de alegada ofensa a normas constitucionais.

Não fosse o caso, o voto do Presidente seria discutível. Deve-se ressaltar que, não tivesse votado o Presidente, não haveria o empate nominal na votação, mas, sim, maioria no sentido de negar provimento ao recurso. Só que o voto do Presidente restou justificado na hipótese, na medida em que a discussão central do processo centrou-se na constitucionalidade da lei complementar.

Deste modo, como se tratava de afastar a aplicação de uma regra legal com fundamento em norma extraída constitucional, a jurisprudência sumulada do STF impõe a necessidade de cumprimento do artigo 97 da Constituição Federal, que exige a formação de maioria absoluta para afastamento da norma legal. Deste modo, a norma legal só poderia ser afastada pelo voto da maioria absoluta dos membros do Supremo Tribunal Federal, ou seja, pelo voto de seis Ministros.

Como não houve a formação da maioria absoluta, já que apenas cinco Ministros, com base no artigo 16 da Constituição, afastaram a aplicação da norma, não houve quórum suficiente.

Assim, aplicando-se a norma do artigo 97 ao caso, como não houve a necessária maioria absoluta, mantém-se o conteúdo material, indeferimento do registro da candidatura, da decisão do Tribunal Superior Eleitoral, que também aplicara a norma à espécie, restando, por conseqüência, improvido o recurso extraordinário.

Chega-se a mesma conclusão, não provimento do recurso extraordinário, ao analisar-se a norma do artigo 146 do RISTF, anteriormente citada:

Art. 146. Havendo, por ausência ou falta de um Ministro, nos termos do art. 13, IX, empate na votação de matéria cuja solução dependa de maioria absoluta, considerar-se-á julgada a questão proclamando-se a solução contrária à pretendida ou à proposta.

E não se trata de manter a decisão de um Tribunal hierarquicamente inferior, o TSE, em face da decisão de Tribunal superior, STF, como comentou o Ministro Gilmar Mendes durante a sessão de julgamento.

Ora, a distribuição de competências entre o Tribunal Superior Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal não se resolve pela hierarquia. O STF, nada obstante sua importância, não possui o poder de revisão ordinário das decisões do TSE, fator essencial para configuração da hierarquia. Há, no caso, competência revisora material específica: o Supremo só é órgão revisor das decisões do TSE em matéria constitucional e no caso de denegação de remédios constitucionais específicos.

Conforme o artigo 120, § 3º, da Constituição Federal, "São irrecorríveis as decisões do Tribunal Superior Eleitoral, salvo as que contrariarem esta Constituição e as denegatórias de "habeas-corpus" ou mandado de segurança".

O poder revisor do STF, portanto, é restrito à matéria constitucional e à análise da decisão que denega certos remédios constitucionais. Tratando-se de outras matérias, não há qualquer outro Tribunal acima do TSE. Hierarquia propriamente dita não existe; há, apenas, distinções de competência em razão da matéria.

No caso, aliás, seria o STF o Tribunal a afastar a aplicação imediata da norma, com base em fundamentos constitucionais. O TSE, anteriormente, aplicara a norma em sua literalidade. Foi no Supremo Tribunal Federal, reitere-se, que se o afastamento da aplicação da norma legal convenceu metade dos Ministros.

Por fim, o conteúdo material da decisão do TSE deve permanecer não porque se trata de Tribunal superior – e não se trata, mas porque o empate no Supremo Tribunal Federal tem como consequência a plena constitucionalidade e aplicabilidade da lei.

Além disso, ao final, é a decisão do Supremo Tribunal Federal que subsiste, ainda que tenha conteúdo material idêntico à decisão do TSE. A decisão do STF, no recurso extraordinário, substitui a decisão do TSE. É o chamado efeito substitutivo dos recursos.

Conhecido o recurso, e não sendo o caso de error in procedendo (que ensejaria a anulação da decisão recorrida, não sua reforma), mas de error in judicando, a decisão que o julga substitui a decisão recorrida.

A substituição ocorre independentemente do reconhecimento do efetivo error in judicando, que pode existir ou não. Mantendo ou alterando a decisão recorrida em razão do error in judicando, a decisão que julga o recurso a substitui, já que é juridicamente impossível que subsistam "duas decisões com o mesmo objeto" [9].

Portanto, é a decisão do próprio Supremo que deverá ser aplicada ao caso. Como, para afastar a aplicação da norma, o STF teria que formar maioria absoluta, o que não aconteceu, a norma deve continuar sendo aplicada imediatamente.

Então, diferentemente do que afirmou o Ministro Gilmar Mendes, não é a decisão do TSE que permanece; mas, sim, a decisão do Supremo Tribunal Federal, ainda que tenha o mesmo conteúdo material da decisão do TSE – o que, aliás, é meramente circunstancial.

Por fim, data vênia, não tem razão o Presidente do STF ao afirmar que, no caso, afastara-se apenas uma interpretação inconstitucional do TSE, o que justificaria o afastamento da cláusula de reserva de plenário. Acrescentou o Presidente que, se fosse aplicado o artigo 97 a todas as questões constitucionais, o STF não poderia julgar recursos extraordinários por suas Turmas.

O artigo 102, III, da Constituição Federal dispõe que compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: contrariar dispositivo da Constituição; declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição; ou, por fim, julgar válida lei local contestada em face de lei federal.

É claro que, no caso concreto, é possível que o STF julgue recurso extraordinário, que envolva questão constitucional, no âmbito de suas turmas. Aliás, a competência ordinária para o julgamento de recursos extraordinários, no STF, é das Turmas (artigo 9º, II, do RISTF).

Contudo, conforme exposto, o artigo 22 do RISTF determina que: "O Relator submeterá o feito ao julgamento do Plenário, quando houver relevante argüição de inconstitucionalidade ainda não decidida". Assim, ainda que a competência ordinária para julgamento de recursos extraordinários seja das Turmas do STF, sempre que houver relevante arguição de inconstitucionalidade, o relator submeterá o julgamento do feito ao plenário. Em outras palavras, é condição necessária para a fixação da competência ordinária das turmas que o Supremo Tribunal Federal, na apreciação do processo, não afaste a aplicação de norma legal válida e vigente com base em critérios constitucionais.

Se for o caso de afastar a aplicação de uma norma legal válida e vigente em razão de ofensa à Constituição Federal, o STF, como os demais Tribunais, está sujeito à norma do artigo 97 da Constituição Federal. A competência do processo deve ser afetada ao pleno e o afastamento da norma dependerá da formação da maioria qualificada.

Reitere-se este ponto: o Supremo Tribunal Federal não está acima da Constituição. Pelo contrário, deve ser o seu "guardião precípuo", o que exige que fiscalize o seu cumprimento, mas também que a cumpra, sob pena de uma precípua guarda capenga.

Aliás, o Supremo Tribunal Federal tem tanto cuidado na obediência da cláusula de reserva de plenário que editou a citada Súmula Vinculante nº 10, para coibir manobras hermenêuticas objetivando o descumprimento material da norma do artigo 97.

Cabe citar, para demonstrar o cuidado do STF na exigência do cumprimento do artigo 97 da Constituição, o julgamento do AI 472897/PR (2007), da Relatoria do Ministro Celso de Mello, no qual o Supremo Tribunal Federal consignou:

"A estrita observância, pelos Tribunais em geral, do postulado da reserva de plenário, inscrito no art. 97 da Constituição, atua como pressuposto de validade e de eficácia jurídicas da própria declaração jurisdicional de inconstitucionalidade dos atos do Poder Público. Doutrina. Jurisprudência. - A inconstitucionalidade de leis ou de outros atos estatais somente pode ser declarada, quer em sede de fiscalização abstrata (método concentrado), quer em sede de controle incidental (método difuso), pelo voto da maioria absoluta dos membros integrantes do Tribunal, reunidos em sessão plenária ou, onde houver, no respectivo órgão especial. Precedentes. - Nenhum órgão fracionário de qualquer Tribunal, em conseqüência, dispõe de competência, no sistema jurídico brasileiro, para declarar a inconstitucionalidade de leis ou atos emanados do Poder Público. Essa magna prerrogativa jurisdicional foi atribuída, em grau de absoluta exclusividade, ao Plenário dos Tribunais ou, onde houver, ao respectivo Órgão Especial. Essa extraordinária competência dos Tribunais é regida pelo princípio da reserva de plenário inscrito no artigo 97 da Constituição da República."

Diante do exposto, a conseqüência jurídica do empate é a impossibilidade de afastamento da aplicação imediata da norma, porque não formada a maioria absoluta, e, por conseqüência, a plena aplicabilidade da lei complementar às eleições deste ano.

Esclareça-se que não se trata de proclamar o empate em si, já que a tutela, ou a negativa dela, há de ser dada em sua completude. O recorrente precisava do voto da maioria dos membros da Corte para que o seu recurso fosse provido. Como não obteve esta maioria, a conclusão a que se chega é a de que o recurso deve ser improvido.

O Tribunal, por maioria, deve negar provimento ao recurso, fazendo constar no resultado que o recorrente necessitava do voto da maioria absoluta dos membros do Tribunal para afastar a aplicação da norma, o que não obteve.

Conforme artigo 135 do RISTF:

Art. 135. Concluído o debate oral, o Presidente tomará os votos do Relator, do Revisor, se houver, e dos outros Ministros, na ordem inversa de antigüidade.

§ 1º Os Ministros poderão antecipar o voto se o Presidente autorizar.

§ 2º Encerrada a votação, o Presidente proclamará a decisão.

Neste ínterim, necessário destacar que resultado da votação em si, empate, não se confunde, no caso, com a proclamação final do resultado do julgamento.

É que, apesar do empate na votação nominal, a incidência da norma do artigo 97 da Constituição afasta a possibilidade de igual empate na proclamação do resultado. Em outras palavras, a votação efetiva terminou empatada, mas o resultado do julgamento, pela aplicação da norma do artigo 97 da Constituição, deve ser proclamado em desfavor do recorrente, que não conseguiu a maioria absoluta dos votos dos membros da Corte.

O Supremo Tribunal Federal, por maioria, manteve o acórdão do TSE, entendendo pela aplicabilidade imediata da Lei Complementar nº 135, de 4 de junho de 2010.

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Sobre o autor
João Aurino de Melo Filho

Procurador da Fazenda Nacional, Especialista em Direito Público e Mestre em Direito.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MELO FILHO, João Aurino. Eficácia plena e imediata da Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135/2010) em face do empate no julgamento do Supremo Tribunal Federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2646, 29 set. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17507. Acesso em: 22 nov. 2024.

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