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As pessoas jurídicas de direito público e a imunidade quanto às contribuições sociais prevista no § 7° do art. 195 da Constituição Federal

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28/10/2010 às 08:38
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O conceito jurídico-constitucional de entidade beneficente de assistência social abrange unicamente as pessoas jurídicas de direito privado.

Introdução

No âmbito do Tribunal Regional Federal da 4ª Região têm sido proferidas decisões que estendem a imunidade prevista no § 7° do art. 195 da Constituição Federal, que beneficia somente as entidades beneficentes de assistência social, também às pessoas jurídicas de direito público, notadamente os hospitais municipais constituídos sob a forma de autarquia ou fundação pública [01].

Para exemplificar, citamos o seguinte precedente:

TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE. ART. 195, § 7º, DA CONSTITUIÇÃO. - Em se tratando de hospital municipal criado por determinação legal para a prestação de assistência médida e hospitalar da população, decorre da própria lei municipal e da sua natureza de autarquia o caráter beneficente e a utilidade pública, a ausência de fins lucrativos, a manutenção por recursos orçamentários, a aplicação dos recursos na atividade. - Consideram-se satisfeitos os requisitos do art. 14 do CTN e supridos os requisitos do art. 55 da Lei 8.212/91. (TRF4, AC 2000.71.00.002763-0, Segunda Turma, Relator Leandro Paulsen, DJ 25/01/2006) [02]

Em face de decisões deste jaez, os nosocômios públicos deixam de pagar as contribuições devidas para o custeio da seguridade social, entre as quais destacamos a cota patronal da contribuição previdenciária, devida quando o município instituidor da autarquia ou fundação pública não possui regime de previdência próprio para os servidores da administração direta e indireta.

Assim, nestes casos, as autarquias e fundações públicas não vertem contribuição previdenciária nem para o regime próprio de previdência (inexistente), nem para o regime geral (RGPS), ao qual estão vinculados os seus servidores.

O objetivo do presente estudo é demonstrar que as decisões do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que estendem às pessoas jurídicas de direito público o benefício previsto no § 7° do art. 195 da Constituição Federal estão equivocadas, pois o conceito jurídico-constitucional de entidade beneficente de assistência social abrange unicamente as pessoas jurídicas de direito privado.


Conceito jurídico-constitucional de entidade beneficente de assistência social

O dispositivo constitucional em análise tema a seguinte redação:

Art. 195. (...)

§ 7º - São isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei.

Embora o texto fale em isenção, é pacífico o entendimento de que se trata de imunidade, condicionada ao atendimento de requisitos estabelecidos em lei. Ou seja, o dispositivo não é auto-aplicável e constitui mera expectativa de direito. Neste sentido, confira-se o seguinte trecho do voto condutor do julgamento do MI nº 232-1/RJ perante o Supremo Tribunal Federal, de lavra do relator, Ministro Moreira Alves:

"(...) o parágrafo 7º do art. 195 não concedeu direito de imunidade às entidades beneficentes de assistência social, direito esse que apenas não pudesse ser exercido por falta de regulamentação, mas somente lhes outorga a expectativa de, se vierem a atender as exigências a ser estabelecidas em lei, verão nascer, para si, o direito em causa. O que implica dizer que esse direito não nasce apenas do preenchimento da hipótese de incidência contida na norma constitucional, mas, depende, ainda, das exigências fixadas em lei ordinária, como resulta claramente do disposto no referido parágrafo 7º...".

No mesmo precedente restou firmado o entendimento de que a regulamentação válida da imunidade em questão poderia se dar por lei ordinária, poisquando o Constituinte quis deixar determinada matéria para regulamentação por lei complementar, o fez expressamente. O mesmo raciocínio jurídico foi reafirmado pela Corte Suprema no julgamento da Medida Cautelar na ADI nº 2.028-5 [03].

Não se ignora que o inciso II do art. 146 da CF exige lei complementar para regular as limitações constitucionais ao poder de tributar. Esta realmente é a regra geral. Acontece que o § 7º do art. 195 se constitui em exceção, e exceção criada por dispositivo de status igualmente constitucional. Deste modo, não resta dúvida de que lei mencionada na parte final do § 7º é a lei ordinária.

Feitas estas considerações iniciais, assevere-se que a imunidade em questão pode beneficiar somente as entidades beneficentes de assistência social, de modo que conferi-la a entes que não se enquadram nesta categoria é atentar frontalmente contra a Carta Política.

Nesta esteira, surge a necessidade de se fixar o conceito jurídico-constitucional de entidade beneficente de assistência social, o qual, embora não esteja expressamente previsto na Magna Carta, acredita-se tenha sido explicitado pelo Pretório Excelso no julgamento da já mencionada Medida Cautelar na ADI nº 2.028-5. Destaca-se o seguinte trecho da liminar proferida pelo Ministro Marco Aurélio [04], referendada à unanimidade pelo Plenário, verbis:

(...)

No preceito, cuida-se de entidades beneficentes de assistência social, não estando restrito, portanto, às instituições filantrópicas. Indispensável, é certo, que se tenha o desenvolvimento da atividade voltada aos hipossuficientes, àqueles que, sem prejuízo do próprio sustento e o da família, não possam dirigir-se aos particulares que atuam no ramo buscando lucro, dificultada que está, pela insuficiência de estrutura, a prestação do serviço pelo Estado.

(...)

Percebe-se, assim, que é da natureza da atuação das entidades beneficentes de assistência o substituir-se ao Estado deficiente, prestando, do modo gratuito e a quem necessitar, um serviço que deveria ser atendido pelo próprio Poder Público, mas que não o é por insuficiência de estrutura (serviço de saúde, verbi gratia) [05].

Logo, se tais entidades de substituem e colaboram com o Estado, sendo, por isso, premiadas com a imunidade referente às contribuições para a seguridade social, é óbvio que elas não são o Estado. Ao contrário, constituem-se, por natureza, em pessoas jurídicas de direito privado, criadas na forma de associações ou fundações.

Assim, ficam excluídas do conceito jurídico-constitucional de entidades beneficentes de assistência social as pessoas jurídicas de direito público, porque elas são o próprio Estado. Neste compasso, autarquias e fundações públicas municipais criadas para a prestação de serviços de saúde (hospitais), em que pese exercerem uma atividade de alta relevância, não se incluem no espectro da imunidade hipoteticamente prevista no § 7º do art. 195 da Constituição Federal.

Idêntica conclusão já foi adotada pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, como se lê no aresto abaixo:

CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO - CUSTEIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM FACE DA DECISÃO QUE INDEFERIU LIMINAR PARA SUSPENDER A EXIGIBILIDADE DA CONTRIBUIÇÃO PATRONAL PREVISTA NO ARTIGO 22, INCISO I, DA LEI Nº 8.212/91 - IMUNIDADE PREVISTA NO ARTIGO 195, § 7º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL QUE NÃO ALCANÇA PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PÚBLICO - RECOLHIMENTO DA "QUOTA PATRONAL" PELA MUNICIPALIDADE DECORRE DE RELAÇÃO DE EMPREGO - AGRAVO IMPROVIDO NA PARTE CONHECIDA. 1. Não se conhece do agravo de instrumento em relação ao "pedido subsidiário" de recolhimento em juízo dos valores devidos, porque essa matéria não foi objeto da decisão interlocutória recorrida, de modo que infletir sobre o tema representaria supressão de instância. 2. A imunidade tributária prevista no art. 195, § 7º, do Constituição Federal não alcança as pessoas jurídicas de direito público, como entende a agravante, mas tão somente "as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei", no caso o art. 55, § 1º, da Lei nº 8.212/91; tal imunidade tributária visa justamente incentivar a sociedade civil a atuar em colaboração com o Estado em áreas onde este é deficitário, de modo que apenas aquelas entidades beneficentes que prestam serviços de assistência social é que devem ser contempladas com o benefício fiscal, desde que atendidos os requisitos legais. 3. Assim, foge ao bom-senso conferir ao Município a imunidade tributária em relação à "cota patronal" das contribuições previdenciárias incidentes sobre a folha de salários de seus funcionários; ainda, tal contribuição tem previsão constitucional (art. 40, 'caput', da Constituição Federal). 4. A contribuição do Município para a Seguridade Social através da aplicação de repasse de verbas em atividades eminentemente "assistencialistas" não se faz mediante tributação, e o recolhimento da "cota patronal" pelo agravante decorre de relação de emprego, situação absolutamente distinta da primeira, pelo que não se verifica a alegada bitributação. 5. Agravo de instrumento improvido na parte conhecida. (AG 200703000489455, JUIZ JOHONSOM DI SALVO, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, 29/05/2008) Grifamos.

Embora desnecessário, pois, como demonstrado nas linhas acima, decorrente do próprio Texto Fundamental, esta exclusão das pessoas jurídicas de direito público do espectro da regra de imunidade encontra-se hoje expressamente prevista no art. 1º da Lei nº 12.101, de 27 de novembro de 2009, novo regulamento do § 7° do art. 195 da Constituição Federal. Veja-se:

Art. 1º  A certificação das entidades beneficentes de assistência social e a isenção de contribuições para a seguridade social serão concedidas às pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, reconhecidas como entidades beneficentes de assistência social com a finalidade de prestação de serviços nas áreas de assistência social, saúde ou educação, e que atendam ao disposto nesta Lei.

Parágrafo único.  (VETADO)

Trata-se de lei ordinária, motivo pelo qual se poderia objetar ofensa à reserva de lei complementar, como prevista no art. 146, inciso II, da Carta Política. Porém, já foram declinados acima os motivos pelo quais é dispensável a edição de lei complementar na espécie.

Entretanto, por honestidade científica, traz-se à baila o mais recente posicionamento jurisprudencial do Pretório Excelso, firmado pelo Pleno no julgamento de Medida Cautelar na ADI nº 1.802, precedente que prevê um regime híbrido de regulamentação para o § 7° do art. 195 da CF, parte por lei complementar, parte por lei ordinária.

Por oportuno, transcreve-se:

I. Ação direta de inconstitucionalidade: Confederação Nacional de Saúde: qualificação reconhecida, uma vez adaptados os seus estatutos ao molde legal das confederações sindicais; pertinência temática concorrente no caso, uma vez que a categoria econômica representada pela autora abrange entidades de fins não lucrativos, pois sua característica não é a ausência de atividade econômica, mas o fato de não destinarem os seus resultados positivos à distribuição de lucros. II. Imunidade tributária (CF, art. 150, VI, c, e 146, II): "instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei": delimitação dos âmbitos da matéria reservada, no ponto, à intermediação da lei complementar e da lei ordinária: análise, a partir daí, dos preceitos impugnados (L. 9.532/97, arts. 12 a 14): cautelar parcialmente deferida. 1. Conforme precedente no STF (RE 93.770, Muñoz, RTJ 102/304) e na linha da melhor doutrina, o que a Constituição remete à lei ordinária, no tocante à imunidade tributária considerada, é a fixação de normas sobre a constituição e o funcionamento da entidade educacional ou assistencial imune; não, o que diga respeito aos lindes da imunidade, que, quando susceptíveis de disciplina infraconstitucional, ficou reservado à lei complementar. 2. À luz desse critério distintivo, parece ficarem incólumes à eiva da inconstitucionalidade formal argüida os arts. 12 e §§ 2º (salvo a alínea f) e 3º, assim como o parág. único do art. 13; ao contrário, é densa a plausibilidade da alegação de invalidez dos arts. 12, § 2º, f; 13, caput, e 14 e, finalmente, se afigura chapada a inconstitucionalidade não só formal mas também material do § 1º do art. 12, da lei questionada. 3. Reserva à decisão definitiva de controvérsias acerca do conceito da entidade de assistência social, para o fim da declaração da imunidade discutida - como as rel ativas à exigência ou não da gratuidade dos serviços prestados ou à compreensão ou não das instituições beneficentes de clientelas restritas e das organizações de previdência privada: matérias que, embora não suscitadas pela requerente, dizem com a validade do art. 12, caput, da L. 9.532/97 e, por isso, devem ser consideradas na decisão definitiva, mas cuja delibação não é necessária à decisão cautelar da ação direta. (ADI 1802 MC, Relator(a):  Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 27/08/1998, DJ 13-02-2004 PP-00010 EMENT VOL-02139-01 PP-00064). Grifou-se.

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Como visto, modernamente o Supremo Tribunal Federal entende que a lei ordinária pode estabelecer validamente requisitos de constituição e funcionamento para as entidades beneficentes de assistência social. Quanto aos limites da imunidade, a sua fixação depende de lei complementar.

Voltando ao exemplo das autarquias ou fundações públicas municipais criadas para a prestação de serviços na área da saúde, temos que a escolha do tipo jurídico, se público ou privado, remonta à constituição da pessoa jurídica. Além disso, tal escolha será determinante para o seu funcionamento, pois definirá o regime legal aplicável.

Portanto, mesmo sob o ponto de vista da mais recente jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, é constitucional o art. 1° da Lei nº 12.101/09 quando explicita o disposto no § 7° do art. 195 da Constituição Federal, definindo que apenas as pessoas jurídicas constituídas sob a forma de direito privado podem ser qualificadas como entidades beneficentes de assistência social.

Entretanto, como já demonstrado nas linhas acima, independentemente do que consta da Lei nº 12.101/09, a exclusão das pessoas jurídicas de direito público do conceito de entidades beneficentes de assistência social, e, portanto, do benefício previsto no § 7° do art. 195 da Constituição Federal, é conclusão que deriva não da lei ordinária, e sim da melhor interpretação da própria Carta Política, sinalizada pelo seu guardião máximo (STF - MC na ADI nº 2.028-5).


Conseqüências da extensão da imunidade prevista no § 7° do art. 195 da Constituição Federal às pessoas jurídicas de direito público

Mesmo que se admitisse, apenas para argumentar, que as pessoas jurídicas de direito público poderiam se enquadrar no conceito de entidades beneficentes de assistência social, ainda assim elas não poderiam usufruir do benefício previsto no § 7° do art. 195 da Constituição Federal por falta de regulamentação.

Como já referido, o dispositivo constitucional em questão veicula norma que não é auto-aplicável, dependente de regulamentação por meio de lei ordinária (ou complementar, como entendem alguns). Como consta da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, trata-se de norma que traz mera expectativa de direito (MI nº 232-1/RJ).

Neste compasso, a aplicação da imunidade às pessoas jurídicas de direito público dependeria da edição de lei regulamentadora, para tanto não se prestando a Lei nº 12.101/09, que regulamenta o § 7° do art. 195 da Constituição Federal unicamente quanto às pessoas jurídicas de direito privado. Como tal legislação inexiste, tem-se que, também por este motivo, é impossível conceder imunidade quanto às contribuições para a seguridade social às pessoas jurídicas de direito público.

Decisões que pretendam aplicar a Lei n° 12.101/09 às pessoas jurídicas de direito público devem em primeiro ligar declarar a inconstitucionalidade do seu art. 1°, que limita a concessão do certificado de entidade beneficente de assistência social apenas às pessoas jurídicas de direito privado. Entretanto, pelo que foi exposto até aqui, não há razões jurídicas para isso.

Entretanto, como entendemos que a imunidade prevista no § 7° do art. 195 da Constituição Federal não abrange as pessoas jurídicas de direito público, toda vez que o Judiciário estende o benefício em questão às autarquias e fundações públicas, está se substituindo ao Legislador, e criando uma norma de isenção não prevista em nosso ordenamento jurídico.

Afora a afronta ao princípio constitucional da separação dos poderes [06], tal proceder investe também contra o princípio da legalidade tributária, tal como estampado no art. 97, inciso VI, do Código Tributário Nacional, in verbis:

Art. 97. Somente a lei pode estabelecer:

(...)

VI - as hipóteses de exclusão, suspensão e extinção de créditos tributários, ou de dispensa ou redução de penalidades.

(...)

Assevere-se também que na hipótese aventada não há espaço para a aplicação da analogia, pois inexiste relação de equivalência entre as realidades relativas às pessoas jurídicas de direito público, que integram o Estado, e as pessoas jurídicas de direito privado, que não fazem parte do Poder Público, embora possam eventualmente com ele colaborar.

De outra parte, o art. 108 do Código Tributário Nacional só faculta a utilização da analogia em matéria tributária no caso de ausência de disposição expressa, mas a legislação que regulamenta o § 7° do art. 195 da Constituição Federal (Lei nº 12.101/09) é clara ao excluir as pessoas jurídicas de direito público da desoneração fiscal em comento.

E esta proposital exclusão fica mais evidente ainda quando se analisa o conteúdo do parágrafo único do art. 1º da lei nº 12.101/09, que foi vetado pelo Presidente da República. Por meio de tal dispositivo, acrescido ao projeto de lei por emenda parlamentar, pretendeu-se conceder uma verdadeira isenção [07] às fundações públicas que tivessem como finalidade a prestação de serviços na área da saúde, favor não previsto na Constituição.

Veja-se o dispositivo e as razões do veto:

Ouvido, o Ministério da Fazenda manifestou-se pelo veto aos seguintes dispositivos:

Parágrafo único do art. 1º

"Parágrafo único.  Os benefícios de que trata o caput serão extensivos às fundações públicas que tenham como finalidade a prestação de serviços na área de saúde."

Razão do veto

"O dispositivo estende às fundações públicas de direito público isenção que a Constituição Federal concede exclusivamente às entidades beneficentes de assistência social."

Para além de tudo isso, o juízo de equidade também não pode ser aplicado, pois o Código Tributário Nacional veda seu emprego quando dele resultar a dispensa do pagamento de tributo (§ 2º do art. 108).

Avançando ainda mais, em que pese, acredita-se, não haja esforço hermenêutico capaz de enquadrar a requerente na Lei nº 12.101/09, tal empreitada, caso fosse possível, afrontaria o disposto no art. 111, inciso II, do CTN, o qual reza que se deve interpretar literalmente a legislação tributária que disponha sobre isenção.

Outrossim, as autarquias e fundações municipais de direito público compõe a administração indireta do respectivo ente político criador. Assim, seus servidores devem estar vinculados a regime jurídico único. É o que prevê o art. 39 da Constituição Federal:

Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas.

Como sabido, aos estatutários é assegurado regime de previdência próprio, distinto do regime geral, sustentado pelas contribuições dos servidores ativos, inativos e pensionistas, além da contribuição do respectivo ente público. É o que dispõe o caput do art. 40 da Carta Política:

Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo.

A extensão da imunidade prevista no § 7° do art. 195 da Constituição Federal às pessoas jurídicas de direito público cujos servidores estão vinculados ao Regime Geral de Previdência Social também provoca uma bárbara iniqüidade. É que os entes políticos (municípios) que cumpriram fielmente a Constituição, instituindo regimes próprios de previdência, estão contribuindo para a formação do patrimônio que garantirá o pagamento das aposentadorias e pensões dos servidores da administração indireta (autarquias e fundações).

Já os entes políticos que não instituíram regime próprio, e que foram reflexamente beneficiados por decisões judiciais que estenderam o benefício da imunidade às autarquias e fundações de direito publico por eles criadas, não estão contribuindo com nada, e o ônus financeiro daí decorrente está sendo indevidamente suportado por toda a sociedade brasileira.

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Sobre o autor
Fábio João Szinwelski

Procurador da Fazenda Nacional

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SZINWELSKI, Fábio João. As pessoas jurídicas de direito público e a imunidade quanto às contribuições sociais prevista no § 7° do art. 195 da Constituição Federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2675, 28 out. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17700. Acesso em: 29 mar. 2024.

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