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Tutela da omissão legislativa inconstitucional.

Mandado de injunção e ação direta de inconstitucionalidade por omissão

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30/11/2010 às 10:55
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O Judiciário, quando acionado, poderia atuar subsidiaria e incidentalmente, regulamentando o exercício do direito no caso em espécie por meio de uma decisão com efeitos "inter partes".

I-INTRODUÇÃO

A ineficácia dos direitos consagrados nas Constituições brasileiras é um problema grave, além de extremamente antigo. Com efeito, os textos constitucionais, sobretudo após o advento do Estado Social, sempre apresentaram abundante rol de direitos cuja eficácia plena dependia, em sua maioria, da posterior elaboração de normas infraconstitucionais e, por isso, revelava-se fundamental a ulterior participação do legislador.

Na prática, contudo, as normas regulamentadoras dificilmente eram editadas e os direitos não se concretizavam. É relevante ressaltar, ainda, que, por vivermos numa democracia, não há possibilidade de obrigar-se juridicamente o Poder Legislativo a elaborar leis. Destarte, conquanto os direitos estivessem enunciados na Constituição, os cidadãos não tinham condições de exercê-los. Verificava-se, consequentemente, enorme descompasso entre a previsão do texto constitucional e a prática jurídica.

Embora o valor, a autoridade e a eficácia das normas presentes nas Constituições não devam ser afastados pela inatividade voluntária do Poder Público, na prática, ordinariamente, verifica-se o descumprimento do dever previsto no texto constitucional de elaborar normas viabilizadoras do exercício de direitos e garantias constitucionais.

A Carta Magna atual, sem fugir à regra, apresentou grande tendência de deixar para o legislador ordinário a integração e a complementação de suas normas, o que enfraqueceu, por conseguinte, a aplicabilidade imediata dessas normas.

O constituinte de 1988, a fim de compor essa questão da ineficácia dos direitos constitucionais em decorrência da inação do legislador, criou mecanismos de tutela da omissão inconstitucional do legislador: o mandado de injunção e a ação direta de inconstitucionalidade por omissão.

O primeiro instrumento processual seria teoricamente capaz de sanar concretamente a omissão legislativa. A pretensão do constituinte era, essencialmente, possibilitar, através da atuação substitutiva do Poder Judiciário, em casos concretos, o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania, sempre que a falta de norma regulamentadora tornasse inviável a fruição dos mesmos.

Assim, o Poder Judiciário, quando acionado, poderia atuar subsidiaria e incidentalmente, regulamentando o exercício do direito no caso em espécie por meio de uma decisão com efeitos inter partes. Logo, em razão dessa garantia constitucional, em tese, a ausência de lei integrativa não deveria impedir o exercício do direito assegurado por norma constitucional.

O constituinte de 1988, conquanto se tratasse de novel instituto, não deixou claro, nos dispositivos constitucionais que dispuseram acerca do mandado de injunção, quais seriam os seus efeitos, a sua finalidade e o seu alcance.

Com efeito, não há, na Constituição Federal, preceito expresso quanto à legitimidade passiva do mandado de injunção, a sua natureza, nem em relação aos efeitos da providência juriscicional. Coube, portanto, ao Colendo Supremo Tribunal Federal, principal guardião e intérprete da Carta Magna, estabelecer os contornos da garantia constitucional em tela.

A Suprema Corte brasileira, entretanto, durante muito tempo, desvirtuou a finalidade do mandado de injunção ao igualar seus efeitos aos da ação direta de inconstitucionalidade por omissão, atribuindo-lhe, por consequência, o escopo específico de ensejar o reconhecimento formal da inércia inconstitucional do Poder Público.

Com efeito, durante vários anos, o Supremo Tribunal Federal posicionou-se, majoritariamente, no sentido de que, ao se verificar a omissão do Poder competente em elaborar a norma regulamentadora, no caso concreto, incumbiria ao órgão jurisdicional apenas a declaração da inconstitucionalidade dessa omissão e comunicação ao referido Poder para a adoção das providências devidas. Assim, o Supremo Tribunal Federal sepultou um instrumento destinado a evitar o desprestígio da Lei Fundamental que poderia ter um futuro promissor.

Nas duas primeiras décadas da Carta Magna, foi pequena a evolução do entendimento da Suprema Corte sobre a aplicação desse remedium júris, nos últimos anos, contudo, nota-se relevante modificação no âmbito desse Tribunal.

A Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADI por omissão) também foi uma inovação da Constituição Federal de 1988. Nesse caso, diversamente do que ocorre no mandado de injunção, há um controle abstrato da omissão, com o escopo de defender a ordem fundamental contra omissões incompatíveis com o comando constitucional.

No presente artigo, após esclarecimentos iniciais sobre a eficácia e a aplicabilidade das normas constitucionais e as omissões legislativas, serão analisados os dois instrumentos processuais em tela criados pela Constituição Federal de 1988.


II-ESCLARECIMENTOS PRELIMINARES SOBRE VALIDADE, VIGÊNCIA, EFICÁCIA E APLICABILIDADE

2.1.Validade e vigência normativas

TÉRCIO SAMPAIO FERRAZ JUNIOR [01], ao abordar a questão da validade e vigência das normas, afirma que, numa visão dogmática, para o reconhecimento da validade de uma norma, é necessário que esta esteja integrada ao ordenamento jurídico, exigindo-se, pois, o cumprimento do processo de formação ou produção normativa, das normas de competência. É necessário, portanto, que a sua elaboração esteja em conformidade com os requisitos estabelecidos no próprio ordenamento jurídico. Observados esses requisitos, estar-se-á diante de uma norma juridicamente válida.

Importa mencionar, no entanto, que a validade normativa não se confunde com a vigência. Uma norma poderá ser perfeitamente válida, mas não vigente; o contrário, porém, jamais se verificará.

Com efeito, ainda segundo TÉRCIO SAMPAIO FERRAZ JUNIOR [02], a vigência é a qualidade da norma que se relaciona com o tempo de validade, período que se inicia com a entrada em vigor da norma e finda com a sua revogação.

Esse mesmo jurista entende que a autoridade de uma norma vigente pode ser considerada "imunizada", sendo, dessa forma, exigíveis os comportamentos previstos pela mesma. Vigência exprime, pois, a exigibilidade de um comportamento.

2.2.Sobre o significado da palavra eficácia

O tema da eficácia das normas constitucionais ocupa lugar de destaque na doutrina brasileira. É essencial, inicialmente, para o presente estudo, fixar o sentido em que será utilizada a palavra eficácia, pois que, para a mesma, a doutrina pátria atribui significados diversos, o que poderia gerar equívocos de ordem semântica.

Para tanto, é imperioso mencionar que eficácia de uma norma não se confunde com vigência ou validade. Uma norma vigente e validade não será, necessariamente, eficaz, no entanto, para ser eficaz, deverá ter vigência e validade quando se verificarem os fatos que serão por ela regulados.

Ao abordar essa questão, JOSÉ AFONSO DA SILVA [03] assevera que a eficácia das normas pode ser tomada em dois sentidos diferentes: eficácia social e eficácia jurídica.

Segundo o supramencionado doutrinador, o primeiro sentido designa a conduta humana em conformidade com a previsão da norma, referindo-se, desse modo, ao fato de que a norma é concretamente obedecida e aplicada pela sociedade. A eficácia social é, portanto, a medida da extensão do alcance dos objetivos normativos. Nessa acepção, é tecnicamente chamada de efetividade.

Já o segundo sentido de eficácia, o jurídico, diz respeito à qualidade de produzir, em maior ou menor grau, efeitos jurídicos, ou seja, refere-se à possibilidade técnico-jurídica de aplicação de uma norma, sua aptidão para produzir efeitos jurídicos.

No presente estudo, partindo-se da distinção elaborada por JOSÉ AFONSO DA SILVA, empregar-se-á a palavra eficácia apenas em seu sentido jurídico, valendo-se do termo efetividade para aludir a sua acepção social [04].

2.3.Aplicabilidade

Sobre a questão da aplicabilidade das normas, JOSÉ AFONSO DA SILVA [05] doutrina:

"Aplicabilidade significa qualidade do que é aplicável. No sentido jurídico, diz-se da norma que tem possibilidade de ser aplicada, isto é, da norma que tem capacidade de produzir efeitos jurídicos. Não se cogita de saber se ela produz efetivamente esses efeitos. Isso já seria uma perspectiva sociológica, e diz respeito à sua eficácia social."

Para JOSÉ AFONSO DA SILVA, a eficácia e a aplicabilidade das normas constitucionais são fenômenos conexos, aspectos de uma mesma realidade encarada sob prismas diversos, a eficácia como potencialidade e a aplicabilidade como praticidade. [06]

Consideramos, no entanto, que a aplicabilidade está intimamente relacionada com a aptidão para produzir efeitos jurídicos, identificando-se, por conseguinte, com a eficácia jurídica. Portanto, entendemos que o conceito de aplicabilidade se confunde com o de eficácia jurídica [07]. Em face do exposto, nesta obra, utilizar-se-ão indistintamente os termos aplicabilidade e eficácia.


III-EFICÁCIA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

3.1.Teorias acerca da eficácia das normas constitucionais

Apresentada uma definição sobre validade, vigência, eficácia e aplicabilidade, é indispensável enfrentar a questão da classificação das normas constitucionais quanto à eficácia por meio da análise dos diversos posicionamentos encontrados na doutrina.

3.2.Concepção clássica norte-americana: normas self-enforcing provisions e not self-executing ou not self-enforcing provisions

A doutrina e a jurisprudência norte-americanas elaboraram a primeira classificação das normas constitucionais no tocante à aplicabilidade. Distinguiram-nas em self-executing provisions e not self-executing provisions.

Essa classificação, capitaneada por THOMAS M. COOLEY [08], partiu da concepção de que as constituições continham normas, princípios e regras de caráter geral que, para serem aplicadas, precisavam ser desenvolvidas pelo legislador ordinário em face da ausência de elementos fundamentais, não sendo, destarte, imediatamente exequíveis.

Segundo essa concepção, as normas constitucionais self-executing eram aquelas revestidas de plena eficácia jurídica, sendo, por consequência, aplicáveis de imediato.

As normas not self-executing, por outro lado, dependiam de leis ordinárias que as integrassem para serem executáveis, não possuindo, dessa forma, plena eficácia.

3.3.Aplicação da doutrina norte-americana no Brasil

Até os anos sessenta do século passado, a classificação de RUI BARBOSA, fundada na classificação norte-americana, dominou a doutrina brasileira no tocante à eficácia das normas constitucionais. Pela influencia que suas idéias exerceram no pensamento jurídico brasileiro, bem como pela importância de seu entendimento, é interessante apontar os aspectos fundamentais de sua concepção.

RUI BARBOSA [09] adotou a clássica distinção entre normas auto-aplicáveis (auto-executáveis) e não auto-aplicáveis (não auto-executáveis). Esse Ilustre jurista prelecionava serem as normas auto-executáveis:

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"as determinações para executar as quaes, não se haja mister de constituir ou designar uma autoridade, nem criar ou indicar um processo especial, e aquellas onde o direito instituído se cahe armado, por si mesmo, pela sua própria natureza, dos meios de execução e preservação."

Asseverava, portanto, que as normas constitucionais auto-aplicáveis eram executáveis por si, ou seja, não dependiam de produção legislativa posterior para produzirem seus efeitos porque já apresentavam os seus conteúdos determinados.

No tocante às normas não auto-aplicáveis, RUI BARBOSA [10] afirmava serem aquelas que não possuíam os meios de ação necessários ao exercício dos direitos por elas assegurados ou os encargos impostos, devendo aguardar, consequentemente, a atuação do legislador que conferisse aplicabilidade segundo seu critério. Para o aludido jurista, eram normas não auto-aplicáveis aquelas que estabeleciam competência, atribuições e poderes.

A presente classificação, no entanto, não correspondia à realidade e às exigências da ciência jurídica, nem às necessidades práticas de aplicação das Constituições, porquanto admitia a existência de normas constitucionais ineficazes e destituídas de imperatividade.

Modernamente, a doutrina majoritária sustenta que toda e qualquer norma constitucional é jurídica e, portanto, executável, podendo variar apenas em relação ao grau de aplicabilidade e ao destinatário principal. [11]

Importa ressaltar que o próprio RUI BARBOSA reconheceu não ser possível admitir a existência de dispositivos constitucionais aos quais se conferisse apenas valor moral de conselhos ou lições, uma vez que todos teriam força imperativa de regras ditadas pela soberania popular.

JOSÉ AFONSO DA SILVA [12], discorrendo sobre a teoria clássica, afirma que esta não revela uma visão ordenada e científica dos efeitos jurídicos das normas programáticas, abundantemente presentes nas Constituições contemporâneas, bem como das normas de princípios que consagram novos valores e carecem de concretização. Para esse doutrinador, a teoria clássica não atribuiu a essas espécies normativas a importância devida.

Tendo em vista os novos conteúdos das Constituições, mais voltados para a efetivação de valores sociais, e partindo da premissa de que não há norma constitucional desprovida de eficácia, JOSÉ AFONSO DA SILVA sustentou a necessidade da elaboração de outra classificação das normas constitucionais a fim de harmonizá-la com a realidade constitucional moderna.

3.4 Classificação de J.H.Meirelles Teixeira

J.H.Meirelles Teixeira [13] foi o primeiro a formular, no Direito brasileiro, uma classificação que, partindo da concepção de inexistirem normas constitucionais desprovidas de eficácia, diferenciava o grau de eficácia maior ou menor dessas normas. Propôs, assim, a reformulação da doutrina clássica norte-americana, sugerindo a divisão das normas em duas categorias diversas: normas de eficácia plena e normas de eficácia limitada ou reduzida.

As normas de eficácia plena, segundo esse Doutrinador, são as que produzem, desde a entrada em vigor, todos os efeitos fundamentais, incidindo, por conseguinte, direta e imediatamente sobre os seus objetos. Apresentam, portanto, condições de alcançar todos os objetivos almejados pelo constituinte, pois que este lhe atribuiu normatividade suficiente.

As normas de eficácia limitada ou reduzida, por outro lado, são aquelas que não produzem seus efeitos essenciais ao entrarem no mundo jurídico, porque o constituinte não lhes atribuiu a normatividade necessária, cabendo, pois, ao legislador ordinário, o dever de regulamentá-las total ou parcialmente.

J.H.Meirelles Teixeira elaborou, ainda, para essa última categoria de normas, uma subclassificação levando em consideração os conteúdos e os objetivos normativos, a saber:

- Normas programáticas: tratam de matéria eminentemente ético-social, constituindo programas de ação social dirigidos ao legislador ordinário;

- Normas de legislação: não possuem conteúdo ético-social, tratam da matéria de organização ou de liberdade e não produzem desde logo seus efeitos por razão de natureza técnica ou instrumental.

3.5.Classificação tricotômica da eficácia de José Afonso da Silva [14]

Dentre as classificações apresentadas pela doutrina brasileira, a proposta por JOSÉ AFONSO DA SILVA é a mais tradicional e conhecida.

Com base nas críticas à teoria clássica anteriormente mencionadas e partindo da premissa de que todas as normas constitucionais são dotadas de eficácia e existem para serem aplicadas, JOSÉ AFONSO DA SILVA, ao sistematizar a questão da eficácia das normas constitucionais, formulou uma teoria tricotômica da eficácia, classificando as normas constitucionais em:

- Normas de eficácia plena e aplicabilidade direta, imediata e integral: são normas constitucionais dotadas de todos os meios e elementos necessários a sua execução, sendo, portanto, auto-aplicáveis;

- Normas de eficácia contida e aplicabilidade direta e imediata, mas possivelmente não integral: são normas que, conquanto o constituinte tenha regulado suficientemente os interesses relativos à determinada matéria, há espaço para o legislador ordinário atuar de forma restritiva;

- Normas de eficácia limitada ou reduzida: são normas que apresentam aplicabilidade indireta, mediata ou reduzida e necessitam, consequentemente, de ulterior regulamentação do legislador ordinário que lhes conferirá aplicabilidade, podendo, então, incidir sobre os interesses por elas tutelados.

Segundo JOSÉ AFONSO DA SILVA, as normas de eficácia plena e aplicabilidade direta, imediata e integral estabelecem condutas jurídicas positivas ou negativas, veiculam comandos certos e definidos que, desde a entrada em vigor da Constituição Federal, produzem todos os seus efeitos essenciais no tocante às situações, interesses e comportamentos regulados diretamente pelo constituinte.

As normas da segunda espécie, por sua vez, são imperativas, positivas ou negativas, limitadoras do Poder Público e consagradoras, em regra, de direitos subjetivos. A aplicabilidade dessa espécie de norma é imediata e direta, ou seja, sua eficácia não está condicionada a atividade subsequente do legislador ordinário, mas tão somente seus limites poderão ser restringidos por meio de lei.

Por fim, ainda de acordo com as lições de JOSÉ AFONSO DA SILVA, as normas de eficácia limitada se subdividem em dois grupos: normas definidoras de princípio institutivo ou organizativo e normas declaratórias de princípio programático.

As normas definidoras de princípio institutivo ou organizativo propõem-se a criar organismos ou entidades, contem esquemas gerais da estrutura e das atribuições de instituições, órgãos ou de institutos, devendo o legislador ordinário estruturá-los em definitivo. Já as normas declaratórias de princípio programático traçam os princípios que visam à realização dos fins sociais do Estado que devem ser cumpridos pelos órgãos estatais (legislativos, administrativos e jurisdicionais).

3.6 Classificação de Celso Ribeiro Bastos e Carlos Ayres Brito

CELSO RIBEIRO BASTOS E CARLOS AYRES BRITO [15], ao tratarem do tema, lecionam que todas as normas constitucionais se predispõem à produção de efeitos, mas nem todas as normas são suscetíveis de serem aplicáveis da mesma forma e, por conseguinte, não produzem de maneira uniforme e integral seus efeitos. Com base nesse entendimento, propõem a classificação das normas constitucionais em normas de aplicação e normas de integração.

Para esses Doutrinadores, as normas de aplicação são aquelas que incidem diretamente sobre os fatos e, consequentemente, são plenas e se subclassificam em normas:

- Irregulamentáveis: incidem diretamente sobre os fatos regulados e rejeitam regramentos infraconstitucionais, sendo sua matéria tratada exclusivamente pelo texto constitucional;

- Regulamentáveis: embora plenas e consistentes, aceitam regulamentação infraconstitucional, sendo vedada, contudo, a alteração do seu conteúdo, sentido e alcance.

As normas de integração, por outro lado, são as que necessitam da atividade integradora do legislador ordinário para apresentarem aplicabilidade, pois necessitam de complementação. Asseveram CELSO RIBEIRO BASTOS E CARLOS AYRES BRITO que as normas de integração:

"padecem de visceral imprecisão, ou deficiência instrumental, e se tornam, por si mesmas, inexeqüíveis em toda a sua potencialidade. Daí porque se coloca entre elas e a sua real aplicação, outra norma integradora de sentido, de modo a surgir uma unidade de conteúdo entre as duas espécies normativas." [16]

Portanto, verifica-se que, nessa espécie normativa, há um vazio que precisa ser preenchido para possibilitar a aplicação da norma constitucional.

Por fim, esses Doutrinadores lecionam que as normas de integração podem ser completáveis, quando exigirem efetivamente regulamentação infraconstitucional para serem eficazes, ou restringíveis, no caso da possibilidade de limitação do seu campo de incidência pela lei.

3.7.Classificação de Celso Antônio Bandeira de Mello

Celso Antônio Bandeira de Mello [17], com base na consistência e amplitude dos direitos imediatamente resultantes da norma constitucional para os administrados, classificou as normas constitucionais em:

- Normas concessivas de poderes jurídicos; conferem aos administrados, independentemente de qualquer atuação alheia – ato ou concurso de vontades – o poder de fruir imediatamente o bem deferido pelo constituinte, criando uma posição jurídica imediata de plena consistência para o administrado.

- Normas concessivas de direitos: concedem o direito de fruir, imediatamente, benefícios jurídicos concretos, cujo gozo se faz por meio de prestação alheia que, se negada, será exigível juridicamente;

- Normas meramente indicadoras de uma finalidade a ser atingida: são menos consistentes que as duas primeiras espécies tratadas, pois apenas apontam escopos a serem atingidos pelo Poder Público sem, contudo, especificar a conduta que a satisfaz.

Por fim, cumpre destacar que, para Celso Antônio Bandeira de Mello, as normas concessivas de poderes jurídicos se subdividem em normas que conferem direitos ou poderes insuscetíveis de restrição e naquelas que poderão ser restringidas por lei.

3.8 Classificação de Luís Roberto Barroso

É interessante, ademais, trazer à colação a classificação apresentada por Luís Roberto Barroso que também tratou do tema levando em consideração a situação jurídica dos indivíduos frente às normas constitucionais.

LUÍS ROBERTO BARROSO [18] elaborou a sua proposta classificatória com o objetivo de reduzir a discricionariedade dos Poderes Públicos no tocante à aplicação da Constituição e com a finalidade de propiciar a adoção de um critério mais científico à interpretação constitucional pelo Poder Judiciário, especialmente quanto às omissões dos Poderes Executivo e Legislativo. Segundo ele, as normas constitucionais se subdividem em: normas de organização; normas definidoras de direitos e normas programáticas.

As normas constitucionais de organização tem por objeto organizar o exercício do poder, refletindo as opções políticas básicas e definindo as competências, as estruturas do Estado e os procedimentos a serem observados, apresentando eficácia plena e aplicabilidade imediata.

As normas constitucionais definidoras de direitos fixam direitos fundamentais do homem (individuais, coletivos, políticos e sociais). As normas constitucionais programáticas traçam os objetivos que devem ser alcançados pelo Estado.

3.9 Reflexões acerca da eficácia das normas constitucionais

A Constituição brasileira, bem como a grande maioria das Constituições contemporâneas, contem normas de diferentes espécies e naturezas que, conquanto coordenadas e relacionadas entre si, dirigem-se a atender finalidades distintas e a exercer funções diversas no sistema normativo. [19]

Analisando as diferentes classificações existentes na doutrina, abordadas nos tópicos anteriores, é possível afirmar que, atualmente, é pacífico o entendimento de que qualquer norma constitucional possui eficácia jurídica, podendo apresentar apenas variações quanto ao grau de aplicabilidade.

Além disso, cabe ressaltar que as classificações doutrinárias colacionadas não chegam a ser incompatíveis, pois grande parte, embora apresente subdivisões peculiares, indica, em essência, haver normas de maior ou menor eficácia conforme dispensem ou não a ulterior atuação integradora ou complementadora do legislador.

Com efeito, as classificações apresentadas por JOSÉ AFONSO DA SILVA, CELSO RIBEIRO BASTOS E CARLOS AYRES BRITO são praticamente coincidentes, diferindo, basicamente, no tocante à nomenclatura. Ademais, não fosse a ausência de categoria de normas que possibilitem a restrição do seu âmbito de atuação, também se assemelharia a essas classificações a elaborada por MEIRELLES TEIXEIRA.

Neste livro, adotar-se-á a tradicional classificação das normas constitucionais JOSÉ AFONSO DA SILVA em razão da sua ampla aceitação na doutrina brasileira e, também, por ser a classificação adotada pelo Colendo Supremo Tribunal Federal. [20]

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Sobre a autora
Marina dos Anjos Pontual

Procuradora federal. Pós graduada em Direito Processual. Bacharel em Direito pela UFPE. Pós graduanda em Direito do Trabalho

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PONTUAL, Marina Anjos. Tutela da omissão legislativa inconstitucional.: Mandado de injunção e ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2708, 30 nov. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17971. Acesso em: 19 abr. 2024.

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