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Exceção de pré-executividade: sua extinção após a Lei nº 11.382/06

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25/12/2010 às 09:31
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6. Conclusões:

1ª. Com a alteração no caput do art. 736 do CPC, promovida pela Lei 11.382/06, permitindo o ingresso dos embargos independentemente de garantia do juízo (penhora, depósito ou caução), desapareceu a utilidade da exceção de pré-executividade, que, por isso, deve considerar-se extinta do sistema processual brasileiro. Sabendo-se que seu objetivo era propiciar ao executado a possibilidade de se defender de uma execução notadamente indevida, sem ter de enfrentar o constrangimento decorrente da constrição de seus bens, não há mais sentido a sua utilização quando a penhora do patrimônio do devedor não é mais exigida como condição para o exercício de sua defesa processual.

2ª. Além de o devedor não mais ter que comprometer seu patrimônio (através da penhora de bens) para se defender, através dos embargos pode alegar qualquer tipo de matéria, não havendo, dessa forma, mais sentido na utilização e aceitação em juízo da exceção de pré-executividade. Com a Reforma do processo de execução promovida pela Lei 11.382/06, os embargos do devedor (sob a rubrica de "embargos à execução") passaram a ser tratados de forma genérica no art. 745, que deu a maior amplidão possível ao conteúdo dessa peça de defesa. Agora, nos embargos, o executado pode alegar toda e qualquer questão de direito ou de fato, inclusive "qualquer matéria que lhe seria lícito deduzir como defesa em processo de conhecimento".

3ª. Também não se justifica a preservação do instituto da exceção de pré-executividade sob o argumento de que deve ser mantida para facultar ao executado a possibilidade de suspender a execução. A suspensividade que se concebia em relação a ela só era possível porque os embargos, como regra, também suspendiam a execução. Havia, portanto, uma simetria de tratamento entre os dois institutos, quanto aos efeitos que produziam no andamento processual. Todavia, na sistemática atual (introduzida pela Lei 11.382/06), os embargos perderam o efeito suspensivo, sendo a regra o regular processamento da ação executória. Ora, se os próprios embargos perderam o efeito ordinário da suspensividade da execução, seria um contra-senso pretender preservar a exceção de pré-executividade com efeito suspensivo. Além do mais, na sistemática atual, a suspensão da execução não mais evita os atos executórios do tipo da penhora (§ 6º. do art. 739-A do CPC). Não sendo possível evitar a penhora, não se justifica a permanência do instituto da exceção de pré-executividade.

4ª. Não há necessidade, por outro lado, da manutenção da exceção de pré-executividade para suscitar questões de ordem pública quando já escoado o prazo para embargos. Uma simples petição é suficiente para alertar ao Juiz que aprecie as matérias que ele deve conhecer de ofício (as matérias de ordem pública não precluem e podem ser apreciadas a qualquer tempo, art. 267, § 3º.), sem necessidade de denominá-la tecnicamente de exceção de pré-executividade.

5ª. Não é plausível a interpretação de que a impugnação prevista no par. 1º. do art. 475-J pressupõe a penhora de bens, o que justificaria a permanência da exceção de pré-executividade na fase de cumprimento de sentença. Tal interpretação geraria o paradoxo de deixar que permanecesse nessa fase, ficando entretanto extinta no processo autônomo de execução (próprio para os títulos extra-judiciais). A prevalecer a orientação de que a penhora continua como uma exigência para a impugnação, criaríamos o paradoxo de tornar mais complexo e demorado o procedimento executivo para os títulos judiciais, quando deveria ser mais enxuto. Na verdade, o citado dispositivo não exige a penhora como requisito para ingresso da impugnação, mas sim indica o momento a partir do qual o executado tem que oferecê-la, sob pena de precluir seu direito de apresentar defesa na fase de cumprimento de sentença. Nada impede que o executado se antecipe, protocolizando sua impugnação antes mesmo de ser realizado qualquer ato de penhora nos autos. Ao cumprimento de sentença aplicam-se subsidiariamente as regras do processo de execução (art. 475-R do CPC), logo a mesma concepção deve se aplicar a um e a outro. Se não cabe exceção de pré-executividade no processo autônomo de execução (previsto para os títulos extrajudiciais), com mais razão também não é viável na fase de cumprimento de sentença.


7. Referências bibliográficas:

ALVIM, Eduardo Arruda. A Recente Reforma do Código De Processo Civil operada pela Lei 11.382/06 e a Objeção de Pré-Executividade em matéria fiscal, Revista Panóptica, Ed. 14 (2008).

ASSIS, Araken de. Manual da Execução, 11ª edição, RT.

CARVALHO, Thiago Luiz Pacheco de. O instituto da exceção de pré-executividade no ordenamento jurídico brasileiro . Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 2291, 9 out. 2009. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/13649>. Acesso em: 31 maio 2010.

DIDIER JR., Fred. Curso de Direito Processual Civil, Edições Jus Podivm.

DINAMARCO, Candido Range. Instituições de direito processual civil, Ed, Malheiros, 2004.

FUX, Luiz. O Novo Processo de Execução – O Cumprimento da Sentença e a Execução Extrajudicial, Forense, 1ª. edição, 2008.

NERY, Nelson. Código de Processo Civil Comentado, Editora RT.

SALES, Fernando Augusto de Vita Borges de. A exceção de pré-executividade em face da nova sistemática dos embargos à execução . Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1356, 19 mar. 2007. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/9616>. Acesso em: 31 maio 2010.

THEODORO, Humberto Junior. A reforma da Execução do Título extrajudicial, Forense 2007, pág. 209.

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WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Tereza Arruda Alvim; e MEDINA José Miguel Garcia. Breves Comentários à Nova Sistemática Processual civil 3. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 194.


Notas

"Art. 745.  Nos embargos, poderá o executado alegar:

I - nulidade da execução, por não ser executivo o título apresentado;

II - penhora incorreta ou avaliação errônea;

III - excesso de execução ou cumulação indevida de execuções;

IV - retenção por benfeitorias necessárias ou úteis, nos casos de título para entrega de coisa certa (art. 621);

V - qualquer matéria que lhe seria lícito deduzir como defesa em processo de conhecimento."

§ 1º  O juiz poderá, a requerimento do embargante, atribuir efeito suspensivo aos embargos quando, sendo relevantes seus fundamentos, o prosseguimento da execução manifestamente possa causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação, e desde que a execução já esteja garantida por penhora, depósito ou caução suficientes.

(...)

§ 6º  A concessão de efeito suspensivo não impedirá a efetivação dos atos de penhora e de avaliação dos bens.

  1. Instituições de direito processual civil, Ed, Malheiros, 2004, p. 715-716.
  2. A esse respeito, veja-se o seguinte trecho de voto do Ministro Castro Meira no REsp 872.300/RJ: "por construção doutrinária e jurisprudencial, a exceção de pré-executividade foi admitida como instrumento para provocar-se, através de prova documental préconstituída, a manifestação do juízo sobre matérias que deveria conhecer de ofício e que não demandem dilação probatória. Em um primeiro momento, o critério definidor das matéria que poderiam ser alegadas por meio desta excepcional modalidade de defesa do executado residia na possibilidade ou não de o Juiz conhecê-las de ofício. Em momento posterior, temperou-se o entendimento inicialmente consagrado pela doutrina e jurisprudência, segundo o qual a exceção de pré-executividade somente poderia ser admitida na defesa de questões de ordem pública, que pudessem ser conhecidas de ofício pelo Juiz. Adotou-se como critério definidor das matérias que podem ser alegadas em objeção de pré-executividade o fato de ser desnecessária a dilação probatória, afastando-se, pois, o critério fincado, exclusivamente, na possibilidade de conhecimento de ofício pelo Juiz. Assim, passou-se a admitir essa forma excepcional de defesa para acolher exceções materiais, extintivas ou modificativas do direito do exeqüente, desde que comprovadas de plano e desnecessária a produção de outras provas além daquelas constantes dos autos ou trazidas com a própria exceção" (STJ, Segunda Turma, j. 19.10.2006, DJ 31.10.2006).
  3. Nesse sentido, acórdão da 3ª. Turma do STJ no REsp 733.533, onde está acentuado que "é cabível a chamada exceção de pré-executividade para discutir excesso de execução, desde que esse seja perceptível de imediato, sem dilação probatória e, para tanto, baste examinar a origem do título que embasa a execução (rel. Min. Nancy Andrighi, j. 4.4.06, DJU 22.5.06). No mesmo sentido: STJ-1a. T., REsp 841.967, rel. Min. Luiz Fux, j. 12.2.08, DJ 2.4.08.
  4. Admitindo, em tese, a invocação de compensação em exceção de pré-executividade, quando for possível a sua constatação de plano: STJ-3ª. T., REsp 716.841, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 2.10.07, DJU 15.10.07.
  5. A exceção, antes um instrumento de defesa para arguição de questões processuais, transformou-se em meio de defesa de direito essencialmente material, já que se permitiu a invocação de temas relacionados com o pagamento ou qualquer outra forma de extinção da obrigação, desde que prontamente comprováveis, sem necessidade de produção de outras provas (a não ser aquelas pré-constituídas).
  6. Em "O Novo Processo de Execução – O Cumprimento da Sentença e a Execução Extrajudicial", Forense, 1ª. edição, 2008, p. 409.
  7. Breves Comentários à Nova Sistemática Processual civil 3. São Paulo– RT, 2007, pág. 193/194.
  8. Manual da Execução, 11ª edição, RT pág. 1069.
  9. A reforma da Execução do Título extrajudicial, Forense 2007, pág. 209.
  10. A Recente Reforma do Código De Processo Civil operada pela Lei 11.382/06 e a Objeção de Pré-Executividade em matéria fiscal, Revista Panóptica, Ed. 14 (2008).
  11. Ob. cit.
  12. Estamos nos referindo ao art. 741 do CPC (Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973) com a redação dada pela Lei nº 8.953, de 13 de dezembro de 1994.
  13. O citado dispositivo tem a seguinte redação atual:
  14. O art. 739-A do CPC estabelece que "os embargos do executado não terão efeito suspensivo". A suspensão da execução, no entanto, pode ser deferida pelo Juiz se o embargante demonstrar a relevância dos fundamentos dos embargos e a possibilidade de sofrer grave dano de difícil ou incerta reparação, e desde que a execução já esteja garantida por penhora, depósito ou caução suficientes (§ 1º.).
  15. Como já observamos em nota anterior, a suspensão da execução só pode ser deferida pelo Juiz se o embargante demonstrar a relevância dos fundamentos dos embargos e a possibilidade de sofrer grave dano de difícil ou incerta reparação, e desde que a execução já esteja garantida por penhora, depósito ou caução suficientes (art. 739-A, § 1º.).
  16. CARVALHO, Thiago Luiz Pacheco de. O instituto da exceção de pré-executividade no ordenamento jurídico brasileiro . Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 2291, 9 out. 2009. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/13649>. Acesso em: 31 maio 2010.
  17. Art. 739-A.  Os embargos do executado não terão efeito suspensivo.
  18. SALES, Fernando Augusto de Vita Borges de. A exceção de pré-executividade em face da nova sistemática dos embargos à execução . Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1356, 19 mar. 2007. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/9616>. Acesso em: 31 maio 2010.
  19. WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Tereza Arruda Alvim; e MEDINA José Miguel Garcia. Breves Comentários à Nova Sistemática Processual civil 3. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 194.
  20. O caput do art. 746 do CPC tem a seguinte redação: "É lícito ao executado, no prazo de cinco (5) dias, contados da adjudicação, alienação ou arrematação, oferecer embargos fundados em nulidade da execução, ou em causa extintiva da obrigação, desde que superveniente à penhora, aplicando-se, no que couber, o disposto neste Capítulo".
  21. Excetuando-se a execução de alimentos e a contra a Fazenda Pública, que continuam a exigir um processo de execução propriamente dito (art. 730 e 732 do CPC).
  22. Ver relação completa dos títulos judiciais no art. 475-N do CPC.
  23. Ver, a esse respeito, Araken de Assis, Manual da Execução, Editora RT, 10ª. ed., n. 538, p. 1.184; Nelson Nery, Código de Processo Civil Comentado, Editora RT, p. 736.
  24. Ob. cit.
  25. Manual de Direito Processual Civil. Editora Método, p. 905.
  26. Fred Didier Jr., Curso de Direito Processual Civil, Edições Jus Podivm, p. 541-542.
  27. Ob. cit., p. 905.
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Sobre o autor
Demócrito Reinaldo Filho

Juiz de Direito. Doutor em Direito. Ex-Presidente do IBDI - Instituto Brasileiro de Direito da Informática.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

REINALDO FILHO, Demócrito. Exceção de pré-executividade: sua extinção após a Lei nº 11.382/06. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2733, 25 dez. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18103. Acesso em: 28 mar. 2024.

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