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A possibilidade de gestão direta do manejo florestal sustentável pelo Serviço Florestal Brasileiro (SFB) em Florestas Nacionais (FLONA)

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10/02/2011 às 11:31

Resumo:


  • A Lei de Gestão de Florestas Públicas (lei federal 11.284/2006) regula a produção sustentável de produtos florestais no Brasil.

  • A lei estabelece três formas de gestão de florestas públicas: gestão direta, destinação às comunidades locais e concessão florestal.

  • O Serviço Florestal Brasileiro (SFB) tem competências como exercer a função de órgão gestor, apoiar programas de treinamento e apoiar atividades florestais sustentáveis.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Sumário: 1. Introdução; 2. a interpretação jurídica da lei de gestão de florestas públicas (lei federal 11.284/06) e A sua estrutura interna; 3. A importância e significado do "TÍtulo I" da lei 11.284/2006: "DISPOSIÇÕES PRELIMINARES"; 4. O Título II ("DA GESTÃO DE FLORESTAS PÚBLICAS PARA PRODUÇÃO SUSTENTÁVEL") e as atribuições do Serviço Florestal brasileiro; 5. As atribuições do SFB em análise sistemática com a lei do SNUC (lei 9.985/2000) e a lei de criação do ICMbio (LEI 11.516/2007); 5.1. A Gestão administrativa das unidades de conservação; 5.2. A Especialidade da lei de gestão DE FLORESTAs PÚBLICAS e as atribuições do SFB; 6. Conclusão; 7. Bibliografia


1. Introdução

O Brasil possui a segunda [01] maior área ocupada por florestas no mundo, com 554 milhões de hectares [02], sendo a maior área de floresta tropical do planeta.

As florestas brasileiras ocupam 14% da área mundial e ocupam 64,3% do território nacional. Cerca de metade das nossas florestas se encontram em áreas públicas. No caso da Amazônia Legal, por exemplo, 75% das florestas estão em áreas públicas. Um terço deste percentual é representado por Unidades de Conservação [03] e Terras Indígenas, ou seja, áreas afetadas e protegidas.

A Lei de Gestão de Florestas Públicas (lei federal 11.284/2006), que regula a produção sustentável de produtos florestais, surgiu como um anseio da sociedade brasileira, do setor madeireiro respeitador da lei e dos ambientalistas, em efetivar o combate à exploração ilegal de madeira nas florestas brasileiras. Essa lei pretende realizar uma guinada de princípios na área florestal, efetivando a ocupação real das florestas brasileiras (bens públicos) pela entidade pública e pela comunidade. Pretende construir um novo processo de desenvolvimento econômico-social, principalmente na região da Amazônia brasileira, área sabidamente e continuamente explorada sem critérios e fiscalização eficaz contínua.

A Lei de Gestão possui, ao mesmo tempo, a finalidade de combater a famigerada e violenta ocupação ilegal de terras públicas [04] e o desmatamento ilegal, utilizando o manejo florestal sustentável como método de exploração cuidadosa da floresta, com danos reduzidos e preservação contínua.

Nas últimas duas décadas, a contribuição da Amazônia na produção de toda a madeira utilizada no Brasil aumentou de 14% para 85%. A região forneceu quase 29 milhões de m3 de toras em 1997. De acordo com dados oficiais, 80% dessa exploração é feita de forma ilegal. Segundo o Greenpeace, mesmo a extração considerada legal é altamente destrutiva e o uso de tecnologia obsoleta resulta em enorme perda de matéria-prima durante o processo produtivo. Até hoje, aproximadamente dois terços da Amazônia permanecem como floresta virgem e ainda podem ser preservados [05].

É fato notório que, atualmente, o comércio madeireiro no País é alimentado com extrações ilegais de toras. A ratio legis da Lei de Gestão é justamente tentar combater esse panorama, da seguinte forma: 1) protegendo e estimulando as empresas que operam na legalidade através das concessões florestais onerosas [06]; 2) difundindo e apoiando o manejo sustentável pelas comunidades tradicionais locais; 3) e possibitando à União Federal, através do órgão "Serviço Florestal Brasileiro" (SFB), realizar a gestão direta em Florestas Nacionais - FLONAS, de modo a oferecer madeira legalizada e continuamente sustentável. São estas as três fomas de gestão de florestas públicas enumeradas pela Lei de Gestão de Florestas Públicas.

É necessário, para manter as florestas em pé, diminuir o espaço para o mercado negro e para as empresas madeireiras que trabalham de forma predatória e criminosa, cometendo ilícitos penais e destruindo o patrimônio florestal brasileiro, que é direito das presentes e futuras gerações.

Enfim, a Lei de Gestão é mais um instrumento para tentar manter as florestas vivas por meio da reunião entre a exploração econômica sustentável e a conservação permanente, com limitação de retirada de madeira.

Adriano Ramos Remor [07] elenca algumas vantagens da concessão florestal onerosa, que também podem ser estendidas, com as devidas adaptações, à gestão comunitária e para a gestão direta: estabilidade econômica e geográfica das empresas florestais madeireiras através de contratos administrativos de longo prazo com o governo, dando garantia do abastecimento de madeira legal ao setor produtivo; auxílio na determinação de políticas fundiárias de ordenamento fundiário e desenvolvimento rural; redução dos conflitos pela posse e uso dos recursos florestais; redução do desmatamento com maior controle das áreas; ampliação das áreas certificadas na Amazônia; desenvolvimento técnico e científico do manejo florestal; segurança jurídica e fundiária para uma produção florestal ordenada e profissionalizada; apoio ao manejo florestal comunitário.

Considerando que as três formas de gestão de florestas públicas correspondem a descentralizações de produção sustentável, no sentido de serem realizadas por ou com a colaboração de entes alheios ao Estado, é de se concordar plenamente com Amália Maria Goldberg Godoy [08], professora de Economia da UEM, quando afirma que "a descentralização dos recursos florestais leva a uma maior participação das comunidades florestais nas políticas de decisão e maior accountability dos políticos para com as pessoas cujo sustento depende das florestas". A autora aponta também vantagens nesse processo, vantagens essas já vislumbradas por Ferguson e Ribot. São elas: fomenta a democracia porque permite melhores oportunidades aos residentes locais para participar das decisões; possibilita o desenvolvimento social e econômico que depende do conhecimento local; aumenta a transparência, a responsabilidade e a capacidade de resposta das instituições governamentais; permite representação política dos diversos grupos políticos, étnicos, religiosos e culturais na tomada de decisões; aumenta a estabilidade política e a unidade nacional e possibilita aos cidadãos controlar os programas públicos no plano local; atua como terreno fértil para novas idéias políticas; conduz a programas mais criativos e inovadores; prioriza as necessidades locais; promove a participação da comunidade local no combate à corrupção.

A Lei de Gestão estabelece em seu art. 2º, os princípios pelos quais se orienta o manejo florestal sustentável na sua aplicação obrigatória como método de gestão:

Constituem princípios da gestão de florestas públicas:

I - a proteção dos ecossistemas, do solo, da água, da biodiversidade e valores culturais associados, bem como do patrimônio público;

II - o estabelecimento de atividades que promovam o uso eficiente e racional das florestas e que contribuam para o cumprimento das metas do desenvolvimento sustentável local, regional e de todo o País;

III - o respeito ao direito da população, em especial das comunidades locais, de acesso às florestas públicas e aos benefícios decorrentes de seu uso e conservação;

IV - a promoção do processamento local e o incentivo ao incremento da agregação de valor aos produtos e serviços da floresta, bem como à diversificação industrial, ao desenvolvimento tecnológico, à utilização e à capacitação de empreendedores locais e da mão-de-obra regional;

V - o acesso livre de qualquer indivíduo às informações referentes à gestão de florestas públicas, nos termos da lei 10.650, de 16 de abril de 2003.

VI - a promoção e difusão da pesquisa florestal, faunística e edáfica, relacionada à conservação, à recuperação e ao uso sustentável das florestas;

VII - o fomento ao conhecimento e a promoção da conscientização da população sobre a importância da conservação, da recuperação e do manejo sustentável dos recursos florestais;

VIII - a garantia de condições estáveis e seguras que estimulem investimentos de longo prazo no manejo, na conservação e na recuperação das florestas.

A Lei de Gestão exige que a gestão das florestas públicas para extração sustentável de produtos florestais seja realizada através do manejo florestal sustentável. Esta forma sustentável de manejar os recursos naturais se constitui em administração da floresta para obtenção de benefícios econômicos e sociais, respeitando-se os mecanismos de sustentabilidade do ecossistema. O manejo florestal deve ser economicamente viável, ecologicamente sustentável e socialmente justo.

A exploração florestal permitida pela Lei de Gestão inclui a produção de madeira (toras e resíduos) e de outros produtos florestais como resinas, raízes, cascas e cipós, e possui como fonte de matéria-prima somente as florestas exploradas sob regime sustentável, através de Planos de Manejo Florestal Sustentável aprovados pelo órgão ambiental competente.

O manejo florestal sustentável é o método que deve ser necessariamente utilizado na gestão de florestas públicas, estabelecendo a Lei de Gestão em seu art. 3º, VI, o seu conceito:

manejo florestal sustentável: administração da floresta para a obtenção de benefícios econômicos, sociais e ambientais, respeitando-se os mecanismos de sustentação do ecossistema objeto do manejo e considerando-se, cumulativa ou alternativamente, a utilização de múltiplas espécies madeireiras, de múltiplos produtos e subprodutos não madeireiros, bem como a utilização de outros bens e serviços de natureza florestal.


2. A interpretação jurídica da lei de gestão de florestas públicas (lei federal 11.284/06) e A sua estrutura interna

A Lei de Gestão de Florestas Públicas (lei federal 11.284, de 02 de março de 2006) possui uma divisão interna em 5 "Títulos", os quais devem ter sua topografia, estrutura e terminologia seguidos obrigatoriamente para uma correta interpretação sistemática da lei. Os "Títulos", como é cediço na tradição do Direito, são divididos internamente em "Capítulos", e estes em "Seções", podendo existir subseções em leis extensas para melhor sistematizar os institutos jurídicos, tornando mais visível e claro os ideais da lei.

A interpretação sistemática evita conflitos entre os dispositivos legais, de modo a tornar harmonioso certo diploma legal. A segurança jurídica (art. 5º, caput, CF/88), direito inerente ao Estado Social Democrático de Direito, só pode ser alcançada se a ordem jurídica tiver a forma de um sistema jurídico livre de contradições, onde a interpretação sistemática desempenha papel essencial à clareza legislativa e a busca da justiça material [09].

Como afirma Alexandre Pasqualini, professor da Escola da Magistratura do Rio Grande do Sul, "a Interpretação Sistemática do Direito oferece contribuições cuja importância e repercussão para a Teoria Geral do Direito e os trabalhos futuros - independentemente da filiação filosófica - já não poderão mais desconhecer" [10].

Em decorrência da interpretação sistemática, os "Capítulos" e "Seções" que a lei 11.284/2006 traz devem ser interpretados sistematicamente dentro de seus "Títulos", sob pena de se fazer uma interpretação equívoca, desvirtuando o significado dos institutos e alcançando conclusões não jurídicas e antidemocráticas.

Ainda mais, a interpretação das normas tem como ponto de partida a premissa de que a lei não contém palavras inúteis, devendo-se extrair do sistema toda sua amplitude, com base nas definições e conceitos postos pelo legislador, sem ignorar os dispositivos legais que possuam significado. A idéia tem nascedouro no Direito romano, no aforismo de que "não se presumem na lei palavras inúteis"(verba cum effectu, sunt accipienda).

Os comentários que abaixo seguem utilizam uma interpretação sistemática e teleológica da lei.

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A estrutura da lei 11.284/2006 é composta pelos seguintes "Títulos":

  • TÍTULO I - DISPOSIÇÕES PRELIMINARES

  • TÍTULO II - DA GESTÃO DE FLORESTAS PÚBLICAS PARA PRODUÇÃO SUSTENTÁVEL

  • TÍTULO III - DOS ÓRGÃOS RESPONSÁVEIS PELA GESTÃO E FISCALIZAÇÃO

  • TÍTULO IV - DO SERVIÇO FLORESTAL BRASILEIRO

  • TÍTULO V - DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS E FINAIS

O Título II, que enumera as formas de gestão de florestas públicas, traz diversos "Capítulos", que são as 3 formas de gestão: CAPÍTULO II - DA GESTÃO DIRETA; CAPÍTULO III - DA DESTINAÇÃO ÀS COMUNIDADES LOCAIS; CAPÍTULO IV - das concessões florestais.


3. A importância e significado do "TÍtulo I" da lei 11.284/2006: "DISPOSIÇÕES PRELIMINARES"

O Título I da lei 11.284/06 é conceitual e autenticamente interpretativo, trazendo princípios e definições que necessariamente devem ser seguidos na hermenêutica dos demais dispositivos da lei.

Autêntica é a interpretação feita pelo próprio legislador, que cria dispositivos legais (na mesma lei ou em outra posterior) para definir certo instituto jurídico [11].

A interpretação autênticaé obrigatória para todos os destinatários da lei interpretada, pois como já ensinava Francesco Ferrara, a interpretação autêntica declara formal e obrigatoriamente o sentido de institutos ou expressões [12].

Como dito, tais princípios e definições da lei 11.284/2006 orientam a interpretação dos demais dispositivos restantes da lei dentro da sistemática de seus "Títulos".

Algumas definições são relevantes para o decorrer dos comentários, como as constantes nos incisos VIII e XIII do art. 3º da lei 11.284/2006:

VIII - unidade de manejo: perímetro definido a partir de critérios técnicos, socioculturais, econômicos e ambientais, localizado em florestas públicas, objeto de um Plano de Manejo Florestal Sustentável - PMFS, podendo conter áreas degradadas para fins de recuperação por meio de plantios florestais;

XIII - órgão gestor: órgão ou entidade do poder concedente com a competência de disciplinar e conduzir o processo de outorga da concessão florestal;

A definição de "unidade de manejo" [13], como é visto na leitura acima, é conceito amplo, ou seja, não restrito à concessão florestal onerosa, podendo ser utilizado nas demais formas de gestão.

Já o conceito de "órgão gestor" não abrange as três formas de gestão. Para a presente lei, o termo "órgão gestor" quando aparece em suas disposições, diz apenas respeito ao "órgão condutor da concessão florestal onerosa", interpretação única que pode ser dada ao termo "órgão gestor", que em âmbito federal é o SFB. Desta maneira, a lei limita a utilização da expressão "órgão gestor" somente para a concessão florestal onerosa, apesar de as formas de gestão serem de três tipos. A expressão "órgão gestor" não possui técnica jurídica, já que conceitos básicos de Direito Administrativo impedem que se confundam conceitos básicos de "órgão" e "entidade" com personalidade jurídica. O termo "órgão gestor" é apenas um emblema para se referir ao órgão ou entidade do poder concedente que gere a concessão florestal onerosa com a finalidade de alertar o concessionário de que sua atuação está sendo monitorada pelo órgão/entidade governamental.


4. O Título II (DA GESTÃO DE FLORESTAS PÚBLICAS PARA PRODUÇÃO SUSTENTÁVEL) e as atribuições do Serviço Florestal brasileiro

No Título II da lei 11.284/2006 são definidos os 3 modos ou formas de gestão de florestas públicas para produção sustentável de recursos florestais:

TÍTULO II - DA GESTÃO DE FLORESTAS PÚBLICAS PARA PRODUÇÃO SUSTENTÁVEL

CAPÍTULO I - DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 4° A gestão de florestas públicas para produção sustentável compreende:

I - a criação de florestas nacionais, estaduais e municipais, nos termos do art. 17 da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000, e sua gestão direta;

II - a destinação de florestas públicas às comunidades locais, nos termos do art. 6º desta Lei;

III - a concessão florestal, incluindo florestas naturais ou plantadas e as unidades de manejo das áreas protegidas referidas no inciso I do caput deste artigo.

CAPÍTULO II - DA GESTÃO DIRETA

CAPÍTULO III - DA DESTINAÇÃO ÀS COMUNIDADES LOCAIS

CAPÍTULO IV - DAS CONCESSÕES FLORESTAIS

A Lei de Gestão estabelece as três formas de gestão de florestas públicas para produção sustentável: a) a criação de unidades de conservação do Tipo Floresta Nacional (FLONA) e sua gestão direta em unidades de manejo localizadas em seu interior; b) destinação comunitária (concessão gratuita); c) concessão florestal onerosa em unidades de manejo localizadas em FLONA ou localizadas em florestas que não sejam Unidades de Conservação.

O art. 55 estabelece que o SFB (órgão da União Federal-MMA) atua exclusivamente na gestão de florestas públicas, enumerando este artigo algumas competências do SFB que não são exaustivas, pois a gestão de florestas públicas enumerada no Título II é mais abrangente que as atribuições catalogadas.

Art. 55. O SFB atua exclusivamente na gestão das florestas públicas e tem por competência:

I - exercer a função de órgão gestor prevista no art. 53 desta Lei, no âmbito federal, bem como de órgão gestor do FNDF;

II - apoiar a criação e gestão de programas de treinamento, capacitação, pesquisa e assistência técnica para a implementação de atividades florestais, incluindo manejo florestal, processamento de produtos florestais e exploração de serviços florestais;

III - estimular e fomentar a prática de atividades florestais sustentáveis madeireira, não madeireira e de serviços;

IV - promover estudos de mercado para produtos e serviços gerados pelas florestas;

V - propor planos de produção florestal sustentável de forma compatível com as demandas da sociedade;

VI - criar e manter o Sistema Nacional de Informações Florestais integrado ao Sistema Nacional de Informações sobre o Meio Ambiente;

VII - gerenciar o Cadastro Nacional de Florestas Públicas, exercendo as seguintes funções:

a) organizar e manter atualizado o Cadastro-Geral de Florestas Públicas da União;

b) adotar as providências necessárias para interligar os cadastros estaduais e municipais ao Cadastro Nacional;

VIII - apoiar e atuar em parceria com os seus congêneres estaduais e municipais.

Desta maneira, o SFB, conforme dicção da lei, poderá atuar nas três espécies de gestão mencionadas. A Administração Pública só faz aquilo que a lei permite. A lei claramente permite que o SFB atue na criação de FLONAS e na gestão direta em UMFs dentro das mesmas. Fica patente que o SFB tem atribuição de criação e gestão direta somente em FLONAS, ficando excluídas todas as demais unidades de conservação.

Vejamos outros argumentos que permitem ao SFB (União Federal - MMA) realizar a criação de FLONAS e a gestão direta de UMFs em FLONAS.


5. As atribuições do SFB em análise sistemática com as leis do SNUC (Lei 9.985/2000) e a lei de criação do ICMbio (Lei 11.516/2007)

5.1. A Gestão administrativa das unidades de conservação

As leis ambientais brasileiras são muitas. A interpretação sistemática e a análise temporal das leis é essencial para a hermenêutica de todo esse arcabouço jurídico. Os conceitos trazidos pela Lei de Introdução ao Código Civil [14] sobre a caracterização da natureza das leis como lei geral e lei especial são comumente utilizados nessa área.

A lei de natureza geral regula determinado universo temático e é aplicada tão-somente quando uma norma de caráter mais específico (especial) sobre determinada matéria não se verificar no ordenamento jurídico. Em outras palavras, a lei de índole específica sempre será aplicada em prejuízo daquela que foi editada para reger temas de ordem geral: é a aplicação do brocardo jurídico lex specialis derrogat generali.

A Lei que regula o Sistema Nacional de Unidades de Conservação - SNUC - (lei 9.985, de 18 de julho de 2000) é lei geral sobre Unidades de Conservação, estabelecendo a natureza, estrutura e administração das Unidades de Conservação. Esta lei atribuiu originariamente ao IBAMA (autarquia federal vinculada ao MMA) a gestão da referidas Unidades. Tal gestão, por meio de lei posterior, ficou a cargo do ICMBio (lei 11.516/2007). Esta lei, que cria o ICMBio, por este motivo de transferir de modo geral a administração das Unidades de Conservação ao ICMBio, é encarada como lei geral, pois transfere a essa nova autarquia as atribuições gerais do SNUC. A lei 11.516/2007 é lei que complementa as disposições do SNUC, formando um sistema geral sobre administração de Unidades de Conservação.

Observe o art. 6º da lei do SNUC sendo alterado pela lei 11.516/2007:

A lei 9.985, de 18 de julho de 2000, que regulamenta o art. 225, § 1º, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras providências.

Art. 6ºO SNUC será gerido pelos seguintes órgãos, com as respectivas atribuições:

I – Órgão consultivo e deliberativo: o Conselho Nacional do Meio Ambiente - Conama, com as atribuições de acompanhar a implementação do Sistema;

II - Órgão central: o Ministério do Meio Ambiente, com a finalidade de coordenar o Sistema; e

III - Órgãos executores: o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - Ibama, os órgãos estaduais e municipais, com a função de implementar o SNUC, subsidiar as propostas de criação e administrar as unidades de conservação federais, estaduais e municipais, nas respectivas esferas de atuação.

III - órgãos executores: o Instituto Chico Mendes e o Ibama, em caráter supletivo, os órgãos estaduais e municipais, com a função de implementar o SNUC, subsidiar as propostas de criação e administrar as unidades de conservação federais, estaduais e municipais, nas respectivas esferas de atuação. (Redação dada pela Lei nº 11.516, 2007)

Como dito, originariamente, a gestão das Unidades de Conservação era da atribuição do IBAMA. Na data de 28 de agosto de 2007 foi publicada a lei 11.516 criando o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), a qual transferiu para essa nova Autarquia a gestão administrativa das Unidades de Conservação (art. 1º, I da lei 11.516/2007). Percebe-se que a atribuição de gerir Unidades de Conservação de modo geral sempre foi de apenas uma entidade, no caso, Autarquia.

Estabelece a lei de criação do ICMBio:

LEI Nº 11.516, DE 28 DE AGOSTO DE 2007

Dispõe sobre a criação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - Instituto Chico Mendes; altera as Leis nos 7.735, de 22 de fevereiro de 1989, 11.284, de 2 de março de 2006, 9.985, de 18 de julho de 2000, 10.410, de 11 de janeiro de 2002, 11.156, de 29 de julho de 2005, 11.357, de 19 de outubro de 2006, e 7.957, de 20 de dezembro de 1989; revoga dispositivos da Lei n. 8.028, de 12 de abril de 1990, e da Medida Provisória n. 2.216-37, de 31 de agosto de 2001; e dá outras providências

OPRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º Fica criado o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - Instituto Chico Mendes, autarquia federal dotada de personalidade jurídica de direito público, autonomia administrativa e financeira, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, com a finalidade de:

I - executar ações da política nacional de unidades de conservação da natureza, referentes às atribuições federais relativas à proposição, implantação, gestão, proteção, fiscalização e monitoramento das unidades de conservação instituídas pela União;

II - executar as políticas relativas ao uso sustentável dos recursos naturais renováveis e ao apoio ao extrativismo e às populações tradicionais nas unidades de conservação de uso sustentável instituídas pela União;

III - fomentar e executar programas de pesquisa, proteção, preservação e conservação da biodiversidade e de educação ambiental;

IV - exercer o poder de polícia ambiental para a proteção das unidades de conservação instituídas pela União; e

V - promover e executar, em articulação com os demais órgãos e entidades envolvidos, programas recreacionais, de uso público e de ecoturismo nas unidades de conservação, onde estas atividades sejam permitidas.

Parágrafo único. O disposto no inciso IV do caput deste artigo não exclui o exercício supletivo do poder de polícia ambiental pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA.

[...]

Art. 6º A alínea a do inciso II do § 1º do art. 39 da Lei n. 11.284, de 2 de março de 2006, passa a vigorar com a seguinte redação:

"a) Instituto Chico Mendes: 40% (quarenta por cento), para utilização restrita na gestão das unidades de conservação de uso sustentável;"

5.2. A Especialidade da lei de gestão de florestas públicas e as atribuições do SFB

A Lei de Gestão de Florestas Públicas é uma lei especial(princípio da especialidade) que cuida da gestão das florestas públicas para produção sustentável através do manejo florestal com o tríplice fundamento: ambiental, econômico e social, em áreas florestais específicas e determinadas. A Lei de Gestão não se aplica às Unidades de Conservação de Proteção Integral, o que torna clara sua limitação temática, caracterizando sua especialidade em relação às leis do SNUC e de criação do ICMBio. Sendo lei especial, ela afasta a aplicação das leis gerais naquilo em que for incompatível.

A lei especial (Lei de Gestão - lei 11.284/2006) concedeu ao ente da Administração Direta a prerrogativa específica de realizar o manejo sustentável por meio também da gestão direta em Unidades de Conservação da categoria FLONA. Nas demais categorias, o ICMBio poderá fazer a gestão direta, seguindo as disposições específicas dos Planos de Manejo de cada Unidade de Conservação e obedecendo à lei do SNUC.

A Lei de Gestão de Florestas Públicas é "lei especial e posterior" ao SNUC (lei 9985/2000) e não faz nenhuma menção em atribuir ao órgão gestor de Unidades de Conservação em geral a gestão direta mencionada em seu art. 4º, I.

A Lei de Criação do ICMBio (11.516/2007), posterior à Lei de Gestão, altera o SNUC transferindo a atribuição geral de administração de UCs ao ICMBio, e em qualquer uma de suas disposições não altera as atribuições do SFB previstas na Lei de Gestão (lei 11.284/2006). A lei de criação do ICMBio (lei 11.516/2007) faz somente uma alteração na Lei de Gestão de Florestas Públicas:

"Art. 6º. A alínea a do inciso II do § 1º do art. 39 da Lei no 11.284, de 2 de março de 2006, passa a vigorar com a seguinte redação: "Art. 39º, § 1º, II, a) Instituto Chico Mendes: 40% (quarenta por cento), para utilização restrita na gestão das unidades de conservação de uso sustentável".

Isto torna evidente a manutenção das atribuições do SFB em fazer a gestão das três formas aludidas. A Lei de Gestão de Florestas Públicas atribui à UNIÃO-MMA-SFB a possibilidade de realizar a gestão das florestas públicas pelos modos definidos no art. 4º.

Em suma, a lei de criação do ICMBio promoveu, como visto, a alteração geral na Lei do SNUC e apenas modificou a lei de gestão de modo pontual, não alterando os artigos que concedem ao SFB a gestão direta de UMFs em FLONAS.

Não é juridicamente possível a interpretação na qual se afirma que a lei 11.284/2006 estabeleceu ao ICMBio uma atribuição específica de realizar a gestão direta de UMFs em FLONA.

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Sobre o autor
Vanderson Roberto Vieira

Mestre em Direito pela Unesp. Professor de Direito no UNICEUB-DF e no Instituto Processus - DF. Analista do Ministério do Meio Ambiente.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIEIRA, Vanderson Roberto. A possibilidade de gestão direta do manejo florestal sustentável pelo Serviço Florestal Brasileiro (SFB) em Florestas Nacionais (FLONA). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2780, 10 fev. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18463. Acesso em: 30 dez. 2024.

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