RESUMO: A extinção do direito à constituição do crédito tributário referente ao Imposto Causa Mortis, pelo lançamento, é questão ainda tormentosa em doutrina e jurisprudência, mercê de orientações que, apesar de há muito sedimentadas especialmente junto aos Tribunais de Justiça, desafiam a lógica do Sistema Tributário Nacional. A morte do autor da herança, constituindo o fato gerador do Imposto Causa Mortis, faz surgir a correlata obrigação de pagar o imposto, e, bem por isso, deflagra a contagem do prazo decadencial de cinco anos. Destarte, tanto a abertura do processo de inventário quanto eventual homologação do cálculo do imposto pelo juiz do processo revelam indiferentes jurídicos, absolutamente desinfluntes na contagem do prazo decadencial para lançamento do imposto causa mortis.
PALAVRAS – CHAVES: Imposto Causa Mortis; morte; autor da herança; hipótese de incidência; princípio da saisine; decadência; extinção do crédito tributário.
SUMÁRIO: Introdução; 1. Hipótese de incidência do imposto Causa Mortis e elementos da respectiva obrigação tributária; 2. Crédito Tributário e lançamento do imposto Causa Mortis; 3. Decadência e imposto causa mortis à luz das regras positivadas no CTN; 4. Conclusões.
Introdução
Segundo regramento expresso no Sistema Tributário Nacional, a tributação nas transmissões gratuitas de propriedade, por ato inter vivos ou causa mortis, é da competência dos Estados e do Distrito Federal – ITCMD --; ao passo que a competência tributária nas transmissões onerosas de propriedade foi atribuída aos Municípios – ITBI.
Assim é que, ao lado da competência para instituição dos referidos impostos, privativa dos Estados e Distrito Federal quanto ao ITCMD e dos Municípios em relação ao ITBI, subsiste a competência legislativa concorrente entre União, Estados e Municípios; donde se extrai competir à União a edição de normas gerais, ao passo que aos demais entes políticos da Federação remanesce a competência suplementar para edição de normas de tributação.
Especificamente no que tange ao ITCMD, objeto deste breve estudo, importa observar que ao lado das normas gerais de tributação, vertidas especialmente no Código Tributário Nacional, recepcionado pela Carta Fundamental como lei complementar, cada Estado tem editado legislação específica dispondo sobre os elementos da obrigação tributária principal do ITCMD, assim como sobre deveres instrumentais acessórios e formalidades correlatas à sistemática de arrecadação do tributo, adequando-se assim, à realidade de cada unidade política da Federação, as correlatas medidas de política fiscal e de praticabilidade tributária.
Nesse cenário de competências legislativas concorrentes, onde os Estados editam regras particulares quanto à sistemática de incidência e arrecadação do imposto causa mortis, algumas questões têm causado particular embaraço na condução de processos judiciais de inventário, isso porque, primeiro, as regras gerais em matéria de tributação, a despeito da competência tributária dos Estados, continuam sob a égide da União; e, segundo, também para legislar sobre o rito do procedimento judicial de inventário, no bojo do qual se processa a apuração do imposto causa mortis, permanece íntegra a competência da União.
Portanto, regras estaduais versando sobre o imposto causa mortis, mormente quanto a critérios de incidência, apuração, pagamento e imposição de penalidades devem ser sopesadas sob a ótica da legislação federal vigente, pena de configurar-se, na espécie, flagrante subversão das regras e princípios positivados no Sistema Tributário Nacional.
Nesse cenário, importa trazer à sirga relevante debate acerca do regramento aplicável ao imposto causa mortis quanto à ocorrência da decadência, enquanto forma de extinção do crédito tributário.
1. Hipótese de incidência do imposto Causa Mortis e elementos da respectiva obrigação principal do tributo
A competência [01] para instituição do imposto causa mortis e doação de quaisquer bens ou direitos foi, pelo legislador constituinte, atribuída privativamente aos Estados e ao Distrito Federal, na intelecção da norma inserida no art. 155, I , da Carta Fundamental [02]. Não se pode descurar, contudo, que ao lado dessa competência tributária privativa para instituição do referido tributo, subsiste a competência normativa concorrente entre União, Estados e Municípios para legislar sobre Direito Tributário, na intelecção do art. 24, I, §§ 1º a 4º da CF [03].
Cumpre não se perca de perspectiva, sobremais, que o Código Tributário Nacional, recepcionado pela Constituição Federal como Lei Complementar, tem normatividade específica a tratar da incidência tributária sobre a transferência gratuita da propriedade; valendo destacar que a regra esculpida no art. 35 do CTN [04] faz alusão apenas e tão -somente à transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos, restringindo assim a hipótese de incidência do ITCMD, já que a norma constitucional elegeu como hipótese de incidência da exação "a transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos". Como se vê, a hipótese de incidência constitucional é mais abrangente do que aquela delineada pelo CTN, motivo pelo qual há quem sustente faltar lei complementar editada pela União para possibilitar aos Estados a tributação sobre e bens e direitos não imobiliários [a discussão acerca da questão, embora fecunda, escapa ao objeto desse trabalho, razão pela qual será deliberadamente negligenciada].
Pois bem. A perfunctória leitura da norma inserida no inciso I, do art. 155 da Carta Política revela que o núcleo da norma de tributação, o prescritivo constitucional do tributo em comento, coincide com transmissão, mercê do evento morte, de quaisquer bens ou direitos. Eis ai, portanto, aspecto material da hipótese de incidência do imposto causa mortis.
Importa reafirmar, por necessário, que "no caso de transmissão causa mortis, o fato gerador do imposto ocorre na abertura da sucessão, que se dá com a morte de determinada pessoa, à qual pertenciam os bens" [05]. Portanto, a hipótese de incidência do imposto causa mortis coincide com o evento morte do titular dos bens e direitos que são transmitidos, por sucessão, aos herdeiros legítimos ou testamentários, na forma da legislação civil vigente. De ver-se, pois, que o art. 1.784 do Código Civil prescreve taxativamente que "aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários". Tal dispositivo legal, como cediço, adota o chamado princípio saisine, segundo o qual com a morte opera-se o imediatismo na transmissão dos bens aos herdeiros respectivos. Ainda que ilíquida a herança no momento da transmissão, ou seja, da morte do autor da herança, os herdeiros já se colocam como titulares de direitos sobre o acervo hereditário, cabendo apenas a liquidação e individualização dos quinhões, mediante procedimento de inventário.
Ainda na análise do aspecto material do imposto causa mortis, imperativo anotar que a norma constitucional prescreve a incidência do gravame sobre a transmissão de quaisquer "bens e direitos". Necessária, pois, nova incursão no Direito Civil fim de se fixar a adequada compreensão das expressões empregadas pelo legislador constituinte. Segundo WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO [06] "juridicamente falando, bens são valores materiais ou imateriais, que podem ser objeto de uma relação de direito. O vocábulo, que é amplo no seu significado, abrange coisas corpóreas e incorpóreas, coisas materiais ou imponderáveis, fatos e abstenções humanas". Conquanto a expressão "bens" comporte diversas classificações, para efeito de verificação da norma de incidência do imposto causa mortis, cremos ser suficiente e adequado o conceito fornecido acima. Igualmente polissêmica, a propósito, é a expressão "direitos"; também empregada pela norma constitucional que delimita a regra matriz de incidência do imposto causa mortis. A expressão cunhada no texto constitucional, – direitos --, contudo, deve ser entendida de forma restritiva, de modo a abranger apenas e tão-somente aqueles direitos passíveis de transmissão, acrescidos de valoração econômica. Discorrendo sobre o elemento material da hipótese de incidência do imposto causa mortis, mais especificamente sobre a intelecção e alcance das expressões analisadas – bens e direitos --, REGINA CELI PEDROTTI VESPERO FERNANDES [07] observa, com bastante propriedade, que:
Como sabemos o vocábulo direito é de extenso alcance, inclusive filosófico. Assim, a sua interpretação deve ser limitada, pois, a teor da constituição Federal, devemos entendê-lo como aqueles direitos passiveis de transmissão, acrescidos de valoração econômica, como o são os bens, o que o restringe consideravelmente.
Daí por que Caio Mario da Silva Pereira assegura que os direitos integram o patrimônio, sendo este o conjunto das relações jurídicas de uma pessoa, apreciáveis economicamente. Assim, somente aquelas relações jurídicas que tenham expressão pecuniária, ou seja, aquelas que possam ser convertidas em credito financeiro para alguém é que são compreendidas no patrimônio. Excluídos estão, portanto, os que não possuem valor econômico, embora referidos direitos possam, quando violados, converter-se em um valor pecuniário, o qual entra em seu patrimônio. Todavia, não se podem considerar no patrimônio do individuo as meras expectativas, ainda que tragam a probabilidade de se converterem em direitos.
Como os direitos são economicamente apreciáveis, entram na categoria de bens. Não se confundem, entretanto, com o próprio objeto, seja uma coisa material, seja uma prestação; é o próprio direito que se objetiva.
Para a completa analise do aspecto material da hipótese de incidência do imposto é necessário ainda estabelecer a distinção entre bens, direitos e patrimônios, pois há entendimento de na sucessão causa mortis a transmissão ser deste e não daqueles.
Caio Mario da Silva Pereira conceitua o patrimônio como " o conjunto das relações jurídicas de uma pessoa, apreciáveis economicamente".
Arnoldo Wald o conceitua como "o conjunto de relações jurídicas imputáveis a uma pessoa e passiveis de apreciação pecuniária". E afirma fazer parte dele tanto os direitos como os deveres, tanto o ativo como o passivo.
A maior divergência na doutrina é saber se o patrimônio alcança o conjunto de valores ativos e passivos ou somente os ativos.
Atualmente, entende-se que abrange os valores ativos e passivos, pois, quando uma pessoa entra em comércio com outra realiza um negócio, gera-se um fenômeno econômico ou de natureza patrimonial, mesmo que não se saiba de antemão se o resultado será positivo ou negativo. Mas, de uma forma ou de outra, esse resultado afetará o patrimônio da pessoa. Daí dizer que patrimônio não é apenas o conjunto de bens. Se assim fosse, o resultado negativo daquela operação estaria fora do patrimônio e não o atingiria, o que não é verdade. Para que se compreenda a verdadeira extensão da idéia de patrimônio, é indispensável que observemos a incidência dos resultados positivo e negativo sobre o complexo econômico da pessoa, e, aceitando que ele os receba, conclui-se que, num dado momento, tanto os direitos quanto os compromissos o integram. Noutros termos, o patrimônio se compõe de um lado positivo e de outro lado negativo.
O patrimônio pode ser também líquido e bruto. Líquido é o conjunto de bens e créditos deduzidos os débitos. Bruto, o complexo de relações jurídicas sem essa dedução.
Conclui-se, pois, que o patrimônio é constituído por todo o ativo e por todo o passivo de um individuo. Dessa forma pode-se encontrar patrimônio negativo, como é o caso do insolvente.
No que tange ao aspecto temporal da hipótese de incidência do imposto causa mortis; desnecessárias maiores delongas à escorreita compreensão do tema, já que, como vimos de ver acima, o evento morte configura o fato gerador da exação [intelecção da norma inserida no art. 1784, do CC/2002]. Portanto, o marco temporal para incidência do imposto coincide com a morte do autor da herança que se transmite por sucessão.
De igual sorte, o elemento espacial da obrigação tributária em deslinde vem expressamente definido no texto constitucional. Nos termos do inciso I, do § 1º do art. 155 da CF, em se tratando de bens imóveis e respectivos direitos, ao Estado-membro onde estiver situado o bem pertencerá o imposto. Em se cuidando de transmissão de bens móveis e direitos de igual natureza, o imposto caberá ao Estado-membro onde se processar o inventário, na dicção da norma inserida no inciso II, do § 1º do art. 155 da CF. Anote-se que o inventário deve ser processado no foro da situação dos bens, se o autor da herança não possuía domicílio certo ou do lugar em que ocorreu o óbito se, não tendo domicílio certo, possuía o autor da herança bens em lugares diferentes, conforme art. 96 do CPC [08].
Quanto ao aspecto pessoal do imposto causa mortis, urge considerar que a Carta Fundamental prescreve a respectiva competência tributária aos Estados-membros e ao Distrito Federal (art. 155, I, CF), ao passo que silencia a respeito da sujeição passiva da exação. Contudo, "basta uma análise ordinária para observar que a pessoa que está em conexão direta com o fato tributário, de forma a ter sua riqueza por ele revelada, é o herdeiro ou legatário (ou herdeiros/legatários) do falecido, sendo estes, pois, os destinatários da carga tributária, ou seja, as pessoas cuja capacidade contributiva restou comprovada. Ao corroborar essa assertiva, dispõe o parágrafo único do art. 35 do CTN, que nas transmissões causa mortis ocorrem tantos fatos geradores distintos quantos sejam os herdeiros ou legatários. [09]"
Finalmente, no que concerne ao aspecto quantitativo da hipótese de incidência do imposto causa mortis – alíquota e base de cálculo --, cumpre observar que a alíquota foi fixada pelo Senado Federal, na intelecção da norma contida no art. 155, § 1º, V, da CF, mediante edição da Resolução n.º 9, de 05.05.1992, no porcentual máximo de 8% sobre os bens e direitos transmitidos. Delimitada a alíquota máxima pela União, cabe aos Estados-Membros, no exercício de sua competência concorrente, estabelecer as respectivas alíquotas do imposto causa mortis, podendo observar, no âmbito de sua conveniência legislativa e à vista dos interesses de arrecadação, a progressividade de alíquotas.
Quanto à base de cálculo do imposto, curial observar que em relação aos bens imóveis o art. 38 CTN [10], Lei Complementar que prescreve as normas gerais de competência concorrente, define como sendo o valor venal dos bens ou direitos transmitidos. Relativamente aos bens móveis e direitos afins, não havendo Lei Complementar específica, cada Estado-membro disciplina a questão, segundo sua competência, observando-se que nesses casos usualmente prevalece a declaração de valor apresentada pelo inventariante no processo de inventário. Um critério objetivo que pode nortear a avaliação dos bens móveis e direitos correlatos e que é quase que por unanimidade aceito pelas legislações estaduais implica em atribuir-se a tais bens o mesmo valor declarado ao Fisco Federal pelo falecido (declaração de IR). De qualquer forma, esse valor venal deve ser apresentado nas declarações iniciais do processo de inventário, podendo, eventualmente, haver necessidade de avaliação dos bens transmitidos, no caso de controvérsia estabelecida no curso do processo (conferir artigos 993, 1.002, 1.007 e 1036 do CPC [11]).
2. Crédito Tributário e lançamento do imposto Causa Mortis
Como cediço, o crédito tributário não se confunde com a obrigação tributária, de vez que essa pode existir, não sendo, porém, exigível, sem que antes se tenha por ocorrido o procedimento de lançamento fiscal, que atesta a existência e legitima a exigibilidade do crédito tributário. Assim é que do fato econômico, ou seja, do fato jurídico-tributário, surge a obrigação, traduzida em uma relação jurídica que une o sujeito ativo ao passivo, estabelecendo um crédito do lado ativo e o correspondente débito passivo. Conquanto exista o crédito desde então, ele somente será exigível após a edição de norma individual, arrimada em norma geral e abstrata, que o formaliza, qual seja, o lançamento. A propósito, veja-se a elucidativa lição de HUGO DE BRITO MACHADO [12] :
"É sabido que obrigação e crédito, no Direito privado, são dois aspectos da mesma relação. Não é assim, porém, no Direito Tributário brasileiro. O CTN distinguiu a obrigação (Art. 113) do crédito (art. 139). A obrigação é um primeiro momento da relação tributária. Seu conteúdo ainda não é determinado e o seu sujeito passivo ainda não está formalmente identificado. Por isto mesmo a prestação respectiva ainda não é exigível. Já o crédito tributário é um segundo momento da relação de tributação. No dizer do CTN, ele decorre da obrigação principal e tem a mesma natureza desta (art. 139). Surge com o lançamento, que confere à relação tributária liquidez e certeza.
Para fins didáticos, podemos dizer que a obrigação tributária corresponde a uma obrigação ilíquida do Direito Civil, enquanto que o crédito tributário corresponde a essa mesma obrigação depois de liquidada. O lançamento corresponde ao procedimento de liquidação".
Como se vê, imprescindível a existência de prévio lançamento fiscal a legitimar a exigência de prestação, em desfavor do sujeito passivo da obrigação. Sem o lançamento, a obrigação do sujeito passivo pode existir, mas não será exigível.
Por outro lado, de rigor observar que a expressão lançamento é plurissignificativa, na medida em que é empregada no ordenamento jurídico, em especial no Código Tributário Nacional, com diferentes significados. O fato é que, passando ao largo das férteis discussões doutrinárias a propósito do conceito e natureza do lançamento, o legislador cuidou de cunhar uma definição normativa de lançamento, que na dicção de HUGO DE BRITO MACHADO [13] "é o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, identificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, identificar o seu sujeito passivo, determinar a matéria tributável e calcular ou por outra forma definir o montante do crédito tributário, aplicando, se for o caso, a penalidade cabível"; conforme definição cunhada no artigo 142, do CTN, verbis:
Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo o caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
Não revela excrescência advertir, aliás, que em matéria de lançamento fiscal nenhuma discricionariedade é conferida à autoridade fiscal, certo que a constituição do crédito tributário opera-se por procedimento em tudo e por tudo vinculado ao primado da legalidade, mercê da regramento esculpido no art. 142 do CTN, acima transcrito. A propósito, em percuciente análise ao dispositivo legal em comento, o festejado tributarista JAMES MARINS [14] acentua, com a propriedade de sempre, o caráter vinculado do lançamento tributário, enquanto modalidade de constituição do crédito tributário. Vejamos, pois, ipsis litteris, sua preleção:
" O lançamento tributário no Brasil rege-se pelas disposições do Código Tributário Nacional, especialmente pelos arts.142 e ss., que cuidam, na expressão utilizada pelo Código, da "constituição do crédito tributário" e disciplinam o lançamento e suas modalidades. A competência do CTN (que tem status de lei complementar ratione materiae) obedece à previsão expressa do art. 146, inc. III, alínea "b" da Constituição. Isto significa que regime jurídico básico do lançamento é o do Código Tributário Nacional que não pode ser validamente modificado nesse campo por lei ordinária, decretos ou quaisquer outra espécie de norma infracomplementar ou infralegal.
Embora revestido de finalidade estritamente tributária, o lançamento é ato administrativo. Este ato, como visto, será muitas vezes precedido de procedimento preparatório, que é denominado de procedimento de lançamento. Este ato administrativo tributário reveste-se de vários atributos, como o de estancar a fluência do prazo decadencial, e tem a virtude de ensejar a exigibilidade administrativa e, subseqüente uma vez inscrita a obrigação lançada em dívida ativa, propiciar a exequibilidade (que é necessariamente judicial) da obrigação tributária.
(...)
Entre nós, consagrou-se o seguinte conceito, cunhado por Paulo de Barros Carvalho: "Lançamento é o ato jurídico administrativo, da categoria dos simples, modificados ou assecuratórios e vinculados, mediante o qual se declara o acontecimento do fato jurídico tributário, se identifica o sujeito passivo da obrigação correspondente, se determina a base de cálculo e a alíquota aplicável, formalizado o crédito e estipulando os termos de sua exigibilidade".
Eurico de Santi qualifica o lançamento como ato – norma administrativa com estrutura hipotético-condicional que opera de modo a associar evento concreto de relevância tributária ao resultado jurídico esperado.
Nos termos do CTN o lançamento, enquanto principal ato administrativo tributário, corresponde a função vinculada e obrigatória, competindo à autoridade administrativa verificar a ocorrência do evento imponível, procedendo a descrição do conceito do fato e enquadrando-o no conceito da norma jurídica tributária de modo a extrair suas conseqüências jurídicas que conduzam à determinação do montante da obrigação tributária e da individualização dos sujeitos ativo e passivo da relação jurídica.
Nessa tarefa o agente administrativo deve colher, em obediência ao princípio do dever de fiscalização, a ocorrência do evento no mundo fenomênico prevista no fato imponível, que representa o evento selecionado pelo legislador como apto a gerar obrigação tributária, e descrevê-lo formalmente para fins de verificar seu encaixe na descrição hipotética contida na norma jurídica tributária - denominada de hipótese de incidência – e daí extrair as conseqüências obrigacionais previstas na norma jurídica tributária".
Pois bem. Como vimos de ver acima, o regime jurídico básico do lançamento fiscal é aquele definido pelo Código Tributário Nacional, o que implica dizer que mesmo sendo titulares da competência para instituição do imposto causa mortis (art. 155, I, da CF), os Estados-membros e o Distrito Federal, no exercício de sua competência normativa concorrente (art. 24, I, da CF), jamais poderão alterar a sistemática de lançamento do referido imposto, o mesmo ocorrendo em relação às hipóteses de extinção do crédito tributário pela prescrição ou decadência (art. 156, V, CTN [15]), na dicção da regra esculpida no art. art. 146, III, "b" da Carta Política [16].