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Cumprimento de sentença e multa do artigo 475-J do Código de Processo Civil

12/05/2011 às 16:31
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INTRODUÇÃO

O Cumprimento de Sentença instituído pela Lei nº 11.232 de 22 de dezembro de 2005 veio prestigiar o que é hoje conhecido como processo sincrético, o que constitui uma grande mudança no processo civil brasileiro. Esse sincretismo é caracterizado por se reunirem no mesmo processo a fase cognitiva e executiva, ou seja, o que eram dois processos distintos, agora é considerado um só processo, dividido em fases.

Atualmente, a execução de sentença passou a ser identificada apenas como uma distinta e posterior fase do que anteriormente era denominado processo de conhecimento, sendo agora o cumprimento de sentença o instituto que busca a compelir o devedor a quitar seu débito, líquido e certo através da sentença.

Além disso, importante instrumento trazido pela reforma processual ocorrida pela Lei nº 11.232/2005 é a multa prevista no art. 475-J do Código de Processo Civil, que é aplicada no caso do não adimplemento voluntário pelo devedor do que foi estabelecido no ato

jurisdicional de constituição do título judicial, o que trouxe inúmeras adequações do processo para a realidade social vigente.

O método de pesquisa utilizado para a elaboração desde artigo foi o estudo e análise da legislação aplicável, jurisprudência e doutrina.

Vários são as questões a serem enfrentadas neste trabalho, pois serão examinadas, dentre outras, as vantagens mais relevantes trazidas com o cumprimento da sentença; o atual conceito de sentença do processo civil brasileiro; a natureza jurídica na multa prevista no art. 475-J do Código de Processo Civil, e a partir de qual termo e em quais situações essa multa é devida; se são devidos honorários advocatícios de sucumbência incidentes sobre o cumprimento da sentença; bem como se o cumprimento de sentença foi criado levando em consideração os interesses do credor ou do devedor.

O presente trabalho não tem como objetivo fazer um comparativo entre o processo de execução anterior e o cumprimento de sentença atual, embora algumas considerações a respeito sejam imprescindíveis para o perfeito entendimento do novo procedimento. O objeto de estudo em destaque será traçar os aspectos gerais do cumprimento da sentença condenatória em quantia certa em face de devedor solvente e a o termo inicial do prazo para imposição da multa prevista no art. 475-J do CPC, bem como sobre a necessidade ou não da intimação do devedor e de que forma deverá ser efetivada, se necessária


1 CUMPRIMENTO DE SENTENÇA

A sentença, no processo civil, em regra, pode ser de três espécies: declaratória, constitutiva e condenatória. Nos dois primeiros casos, as sentenças se cumprem automaticamente, sem necessidade de atuação do réu. Já no caso de sentença condenatória, dependerá a satisfação do direito do credor de atuação do réu. Trata-se do cumprimento da sentença, que é a fase de execução da sentença, posterior à fase de cognição, por isso o processo agora é denominado sincrético, pois é um mesmo processo com fases distintas, de cognição e execução.

Os procedimentos de cumprimento das sentenças proferidas em ações consideradas mandamentais são previstos nos arts. 461, 461-A do Código de Processo Civil. Tais artigos tratam do cumprimento de sentenças condenatórias em ações que tenham como objeto obrigações de fazer, não fazer, e dar coisa certa ou incerta. Estas ações são denominadas ações mandamentais pois não necessitam de execução propriamente dita a ser promovida pelo autor da lide no caso de procedência de seus pedidos; a própria sentença já é bastante para a determinação de cumprimento da obrigação pelo devedor, pois expede uma ordem ao mesmo.

No cumprimento destas sentenças, não é necessária nova citação do réu, sendo que o juiz determinará o cumprimento da obrigação, fixando um prazo para tal, e não sendo esta cumprida no prazo estipulado, proceder-se-á conforme previsto nos parágrafos do art. 461, no caso de obrigação de fazer ou não fazer, e conforme parágrafos do art. 461-A, no caso de obrigação de entrega de coisa, podendo algumas providências serem tomadas de ofício pelo juiz e outras a requerimento da parte vencedora na ação, sendo que, não ocorrendo de nenhuma forma o cumprimento, ou tornando-se impossível este, converter-se-á a obrigação em perdas e danos.

No caso de condenação em obrigação de pagar quantia certa, também denominada execução por quantia certa contra devedor solvente, tema no qual delimita-se o presente trabalho, aplica-se as disposições previstas nos arts. 475-I e seguintes do Código de Processo Civil - CPC, aplicando-se subsidiariamente, no que couber, as normas atinentes ao processo de execução de título extrajudicial, conforme previsão do art. 475-R do CPC.

Continuam existindo as execuções provisória e definitiva, com procedimentos um pouco distintos. A execução provisória terá lugar nos casos de sentença pendente de recurso interposto, desde que não tenha sido atribuído a este efeito suspensivo, e será promovida em autos apartados, providência necessária, haja vista que os autos principais deverão ser remetidos ao Juízo ad quem.

A sentença, com a reforma processual decorrente da Lei 11.232/2005, teve seu conceito alterado. O art. 162, §1º do CPC, antes da mencionada reforma, estabelecia que a sentença era o ato pelo qual o juiz põe termo ao processo, decidindo ou não o mérito da causa. A redação do artigo foi alterada, passando a estabelecer que a sentença é o ato do juiz que implica algumas das situações previstas nos arts. 267 e 269 do CPC.

Diante da nova sistemática adotada pelo Código de Processo Civil, sentença agora, é o ato que possui aptidão para por fim ao processo (no caso, sem resolução de mérito) ou por fim à fase na qual foi proferida. Desse modo, em um único processo, poderá ser proferida mais de uma sentença, só que em fases distintas.

1.1 CUMPRIMENTO DE SENTENÇA CONDENATÓRIA EM OBRIGAÇÃO DE PAGAR QUANTIA CERTA

Havendo condenação de qualquer das partes no pagamento de quantia certa, com o trânsito em julgado, torna-se necessária, para a execução da sentença, a observância das normas previstas nos arts. 475-I e seguintes do código de Processo Civil.

Caso a sentença não determinar o valor devido, deverá haver o procedimento da liquidação de sentença, previsto no art. 475-A ao art. 475-H do Código de Processo Civil, para tornar a sentença líquida. Todavia, há casos em que a determinação do valor da condenação necessita apenas de cálculo aritmético, devendo o exeqüente instruir o requerimento de cumprimento de sentença com a memória discriminada e atualizada do cálculo.

De acordo com o art. 475-J, caput, do Código de Processo Civil, o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, como exposto acima, não efetue o pagamento no prazo de quinze dias, o valor da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, II, também do CPC (vide art. 475-B do mesmo diploma legal), expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.

Cumprido o mandado de penhora, observado a ordem de preferência estabelecida no art. 655 do Código de Processo Civil, aplicável ao cumprimento de sentença, por expressa determinação legal (art. 475-R), deverá ser intimado do auto de penhora e avaliação o executado, na pessoa de seu advogado, ou, na falta deste, o seu representante legal, ou pessoalmente, por mandado ou pelo correio. O executado deverá ter a ciência inequívoca da penhora realizada, seja através de seu advogado, ou pessoalmente. Um aspecto relevante é que para a intimação do executado não é necessário requerimento do exeqüente, ou seja, é providência a ser tomada, de ofício, pela secretaria do Juízo, quando da efetivação da penhora. Nota-se que, havendo procurador constituído pelo executado, a intimação será realizada através daquele, medida que simplifica e agiliza o procedimento de satisfação do crédito, pois era freqüente, no sistema anterior, ou seja, antes da entrada em vigor da Lei 11.232/2005, situações em que o executado se furtava à intimação pessoal, que antes era imprescindível. Entretanto, não havendo procurador constituído nos autos, continua a necessidade de intimação do devedor pessoalmente, para que este tenha ciência inequívoca da penhora, ato condizente com o princípio processual do contraditório.

A partir da intimação da penhora, seja através do advogado, ou pessoalmente, observadas as regras processuais de contagem dos prazos, o executado poderá oferecer impugnação no prazo de quinze dias. Como é regra no processo civil, sempre será dada oportunidade à parte contrária a usar de algum tipo de defesa, seja em qual procedimento for. Mesmo sendo uma fase satisfativa, o devedor tem oportunidade de apresentar razões para o não acolhimento do pedido do credor. No art. 475-J, §2º do Código de Processo Civil, é prevista a Impugnação ao Cumprimento de Sentença, que poderá ser ofertada pelo devedor como meio de defesa. Não haverá mais, no cumprimento de sentença por quantia certa, os "Embargos do Devedor", meio de defesa substituído, neste caso, pela "Impugnação ao Cumprimento de Sentença". Mas como todo procedimento, a impugnação possui requisitos para ser aviada, sendo que o principal é a penhora prévia; não há que se falar em impugnação ao cumprimento de sentença sem prévia penhora. A impugnação ao cumprimento de sentença é um meio incidental de defesa do executado mais restrito, tendo em vista que já houve a fase de conhecimento, que se encontra prevista nos artigos 475-J, §1º, 475-L e 475-M do CPC. As matérias a serem versadas pela impugnação são as previstas no art. 475-L do CPC. São elas: a) falta ou nulidade de citação, se o processo correu à revelia; b) inexigibilidade do título; c) penhora incorreta ou avaliação errônea; d) ilegitimidade das partes; e) excesso de execução; f) qualquer causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que superveniente à sentença. O rol é taxativo, não comporta interpretação ampliativa, de modo que não é permitido serem inseridas situações não previstas no art. 475-L do CPC.

Como regra geral, a impugnação não terá efeito suspensivo, ou seja, a execução prosseguirá em todos seus termos. Todavia, desde que comprovados relevantes os fundamentos e o prosseguimento da execução seja manifestamente suscetível de causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação, o efeito suspensivo poderá ser atribuído à impugnação. Tal fato ensejará conseqüências de ordem prática: se atribuído efeito suspensivo, a impugnação será instruída e decidida nos próprios autos, pois não atrapalhará o curso regular da execução, que estará suspensa; não atribuído efeito suspensivo à impugnação, que é a regra, a mesma será instruída e decidida em autos apartados, para não prejudicar a tramitação da execução. Neste último caso, quando a lei menciona autos apartados, não quer dizer que seja outro processo, mas sim incidente da fase de execução, materializada em outros autos.

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Mesmo sendo atribuído efeito suspensivo à impugnação, poderá haver o prosseguimento da execução, desde que seja a requerimento do exeqüente e seja prestada caução suficiente e idônea, arbitrada pelo juiz e prestada nos próprios autos. Nesse caso, mesmo não tendo sido previsto pelo legislador, seria adequado que também fossem formados autos apartados, que é medida necessária para o prosseguimento da execução sem prejuízo da instrução da impugnação, de modo a não tumultuar o cumprimento da sentença.

Com a prestação da caução, os interesses do executado estarão resguardados, caso seja acolhida a impugnação, não havendo dano a quem quer que seja, pois, ao final, tendo sido expropriados bens do devedor, este poderá levantar a caução para reparação de seus danos, por isso a necessidade dela ser suficiente e idônea.

Havendo oferecimento de impugnação, será dada vista da mesma ao exeqüente, para manifestação, em obediência ao Princípio do Contraditório, apesar de a Lei não estabelecer tal procedimento. Tal entendimento é adotado pelo grande processualista Doutor Humberto Teodoro Júnior [01], quando ensina a respeito da impugnação ao cumprimento de sentença:

Não se trata de petição inicial de ação incidental, como é o caso dos embargos à execução de título extrajudicial. Por isso não há citação do credor e nem sempre se exige autuação apartada. Cumpre-se, naturalmente, o contraditório, ouvindo-se a parte contrária e permitindo-se provas necessárias à solução da impugnação.

Conforme entendimento esposado pelo presente trabalho, o prazo para manifestação do exeqüente sobre a impugnação é de cinco dias e não de quinze dias, tendo em vista que não houve previsão do prazo na Lei, então utiliza-se a regra geral esculpida no art. 185 do Código de Processo Civil. Na doutrina, embora com entendimento diverso do defendido por este trabalho, o eminente professor Luiz Guilherme Marinoni [02], em obra conjunta com o Doutor Sérgio Cruz Arenhart, assevera que o aludido prazo é de quinze dias:

Não sendo caso de rejeição liminar, o exeqüente deverá ser intimado para se pronunciar sobre a impugnação. Por razões de isonomia, o prazo para o exeqüente se manifestar deve ser de quinze dias, ou seja, o mesmo prazo que o executado possui para apresentar a impugnação (art. 475-J, §1º, do CPC).

Entendo que não é o caso de se aplicar isonomia, haja vista que o prazo para oferecimento de impugnação, que é a defesa típica do cumprimento de sentença, não deve ser utilizado, na mesma proporção, para manifestação do exeqüente, pois a manifestação deste sobre a impugnação é muito mais restrita do que os elementos dela própria. Se a lei silenciou a respeito, deve-se, acima de tudo, observância do contraditório, mas aplicando-se a regra do art. 185 do CPC, que é a prevista na Lei.

Outro meio de defesa do devedor, no cumprimento de sentença, é a "objeção de pré-executividade", também conhecida por exceção de pré-executividade, embora a primeira expressão seja mais adequada do ponto de vista técnico. Este meio de defesa continuou sendo possível após a reforma processual decorrente da Lei 11.232/2005. A principal característica da objeção de pré-executividade é o fato de não haver necessidade de prévia penhora para a sua interposição no processo, podendo ser interposta por simples petição nos mesmos autos da execução da sentença, que é a defesa que mostra-se apta a refutar o cumprimento da sentença, quando tem por objeto matéria de ordem pública, que é aquela objeção que poderia ter sido conhecida de ofício pelo juiz, a qualquer tempo. O executado, então, apontará no processo para o juiz esta matéria para que seja prejudicada a execução da sentença em seu favor [03].

Questão que se encontra prevista na Lei e que poderia ensejar várias dúvidas, caso não a fosse, é com relação ao recurso contra a decisão da impugnação. Dispõe o art. 475-M, §3º do CPC que a decisão da impugnação é recorrível mediante agravo de instrumento, salvo se da mesma ocorrer a extinção da execução, ocasião em que será cabível a apelação. A decisão que julga improcedente a impugnação legitima o prosseguimento da execução, por isso previu a lei que o recurso apropriado fosse o agravo de instrumento, pois este não é processado nos mesmos autos em que foi proferida a decisão. Já no caso de decisão que determina a extinção da execução (julgou procedente a impugnação), não há razão para que os autos permaneçam no juízo a quo, pois não haverá, lógico, o prosseguimento da execução, pois a mesma foi extinta.

Neste ponto há uma questão a ser abordada: no caso de impugnação, onde não houve a atribuição de efeito suspensivo, havendo decisão que a julga improcedente, razão não existe para que o recurso cabível seja o agravo de instrumento, como determina o art. 475-M, §3º. Ora, conforme dispõe o §2º do artigo em comento, a impugnação, sem efeito suspensivo, será instruída e decidida em autos apartados, então, mal algum haveria se o recurso fosse apelação quando a sentença fosse de improcedência da impugnação, pois a apelação, nesse caso, seria recebida apenas no seu efeito devolutivo (aplicando-se por analogia o art. 520, V, do CPC), não implicando em obstáculo para o prosseguimento da execução, haja vista que a impugnação encontra-se em autos apartados e a apelação subirá ao Tribunal nesses mesmos autos. Em outras palavras, já que a impugnação não tem efeito suspensivo, a execução poderia prosseguir normalmente, mesmo que houvesse interposição de recurso de apelação da decisão que a julgou improcedente.

Com relação aos honorários de sucumbência na fase de cumprimento de sentença, existem algumas divergências na doutrina e jurisprudência. Todavia, o presente trabalho adota o entendimento que os honorários de sucumbência são devidos. A fundamentação de tal entendimento baseia-se numa interpretação conjunta entre o art. 20, §4º e 475-I, ambos do CPC. O art. 20, §4º do Código de Processo Civil estabelece que os honorários serão fixados pelo juiz, entre outros casos, nas execuções, embargadas ou não, enquanto que o art. 475-I determina que o cumprimento de sentença far-se-á por execução. A verba honorária fixada na fase de conhecimento leva em consideração apenas o trabalho exercido pelo advogado naquela fase, não fazendo projeção para a fase de cumprimento de sentença, pois do contrário, poderia haver injustiça no caso do devedor que cumpre a obrigação, pagando a quantia na qual foi condenado, dentro do prazo estabelecido por lei, sem a necessidade de requerimento da execução da sentença pelo credor. Outro argumento que se pode utilizar é que a multa prevista no art. 475-J do CPC, não atingiria sua finalidade caso não fossem devidos honorários advocatícios no cumprimento de sentença, pois a multa é de apenas dez por cento, enquanto que os honorários advocatícios poderiam atingir o patamar correspondente a vinte por cento do valor da condenação, assim, teria sido mais vantajoso para o devedor do que o sistema anterior, e como se sabe, não foi esta a intenção do legislador, que buscou com a reforma processual colocar à disposição do credor meios mais céleres e eficazes de satisfação de seus direitos.

Dizer que a fixação de honorários advocatícios no cumprimento de sentença seriam devidos apenas no caso de oferecimento de impugnação, também não é a posição mais condizente com o processo. Mesmo não havendo interposição de embargos, desde que requerida a execução pelo credor, outros atos existirão em que será imprescindível a atuação do advogado para a satisfação do credor, tais como penhora, avaliação, hasta pública, adjudicação, alienação e demais atos necessários.

Prosseguindo na execução, efetivada a penhora em bens do devedor, não tendo sido oferecida impugnação, ou se oferecida esta, for julgada improcedente, não tendo o executado efetuado o pagamento para liberação da constrição em seus bens, o exeqüente terá a seu dispor meios legais de satisfação de seu crédito: adjudicação do bem penhorado, alienação por iniciativa particular, alienação em hasta pública e usufruto de bem móvel ou imóvel, cujos procedimentos estão previstos no Livro II do Código de Processo Civil, na parte que trata da execução de título extrajudicial, tendo em vista que sua aplicação subsidiária por expressa previsão no art. 475-R do CPC.

1.2 MULTA PREVISTA NO ART. 475-J DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

A maior inovação trazida pela reforma introduzida pela Lei 11.232/2005, sem dúvida, foi a multa prevista no art. 475-J, caput, do Código de Processo Civil, que é aplicada no caso de ausência de pagamento voluntário pelo devedor do valor da condenação, no prazo de 15 (quinze) dias. Tal multa pode ser considerada como uma punição ao devedor infligida no caso do não cumprimento voluntário da condenação, podendo ser considerada também como uma medida pedagógica imposta ao devedor em favor do credor. Nesse sentido leciona Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart [04]:

A multa em exame tem natureza punitiva, aproximando-se da cláusula penal estabelecida em contrato. Porém, diversamente desta última, a multa do art. 475-J não é fixada pela vontade das partes, mas imposta – como efeito anexo da sentença – por lei.

O art. 475-J, caput, dispõe que caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no valor de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, II, do CPC, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.

A reforma foi realizada em benefício do credor, que já tem a seu favor uma sentença que legitima seu direito. O cumprimento das decisões judiciais pelos jurisdicionados é de suma importância para toda a ordem jurídica, ou seja, são feitas para serem cumpridas por todos, preocupando-se o Estado em criar mecanismos para garantir e efetivar esse cumprimento. Ora, a sentença foi construída num procedimento realizado sob o crivo do contraditório, onde as partes tiveram ao seu dispor todas as formas de provar seus direitos e alegações. Desse modo, a execução da sentença deve ser realizada de uma maneira simples, estando à disposição do credor meios para efetivação da satisfação de seus interesses.

De uma maneira geral, pode-se dizer que o procedimento do cumprimento de sentença inicia-se prestigiando o credor, sendo que seu direito é presumivelmente legítimo perante o ordenamento jurídico, apesar de ser uma presunção relativa, visto que mesmo assim resta ao devedor instrumentos de defesa contra os atos do credor.

É verdade que se mostra discutível a eficácia da multa para satisfação do crédito, haja vista que o devedor que não tem a mínima intenção de pagar não se sentirá compelido apenas pela multa, sendo que, muitas vezes, já se precaveu para se furtar ao dever a que foi submetido, buscando meios fraudulentos e imorais de esquivar de suas obrigações, meios estes que não são objeto do presente trabalho. Mas, para aquele devedor que se preocupa com sua dignidade perante os demais membros da sociedade, sem dúvida, a ameaça da incidência da multa o fará adimplir o quanto antes o débito ao qual foi condenado.

Ocorre que, na aplicação da referida multa em casos concretos, surgem várias dúvidas, às quais a Lei não tratou especificamente, deixando uma razoável margem de entendimentos e situações divergentes. As questões mais discutidas são aquelas relativas ao termo de início da contagem do prazo de 15 (quinze) dias para a incidência da multa, bem como a forma de intimação do executado.

1.2.1 Termo de início para a contagem do prazo de 15 (quinze) dias e forma de intimação do executado

A redação do art. 475-J do Código de Processo Civil não é muito clara ao estabelecer o termo de início da contagem do prazo de quinze dias para incidência da multa.

O entendimento esposado no presente trabalho é que o termo inicial da contagem do prazo de quinze dias para a incidência da multa é o ato de intimação da sentença (ou acórdão) condenatória em quantia certa, salvo se contra ela for interposto recurso com efeito suspensivo.

De início, deve-se distinguir o pagamento voluntário do devedor e o cumprimento de sentença, que será realizado através de execução, pelo credor.

O devedor, ciente de que contra ele foi proferida sentença condenatória em quantia certa, deverá, desde logo, cumpri-la. O prazo de quinze dias para a incidência da multa já teria começado a correr. Para impedir a fluência do prazo, deverá interpor recurso com efeito suspensivo, que é a regra no caso de apelação, pois assim o feito condenatório da sentença não será eficaz. Caso o recurso a ser interposto não tenha efeito suspensivo, para se ver livre da multa de dez por cento sobre o valor da condenação, deverá depositar em juízo o valor devido, que lhe será restituído, caso haja a reforma da sentença. Ora, quando foi intimado da sentença, o devedor ficou ciente de sua obrigação líquida e exigível de pagar. Não faz sentido no caso em que o devedor não tenha a intenção de recorrer da sentença, e mesmo que recorrendo, a sentença não tenha efeito suspensivo, que o mesmo tenha mais quinze dias após o trânsito em julgado para efetuar o pagamento sem a incidência da multa. Este entendimento é defendido por Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart [05]:

Se a sentença, no caso em que o recurso não é recebido com efeito suspensivo, produz efeitos imediatos, o prazo de quinze dias para o devedor cumpri-la corre a partir do momento em que o advogado é dela intimado, o que ocorre com a publicação no Diário de Justiça.

Quando a sentença produz efeitos na pendência da apelação – o que é exceção – ou na pendência dos recursos especial ou extraordinário – o que é regra (art. 542, §2º, do CPC) -, o prazo para o cumprimento da condenação corre no interior do processo, exatamente a partir do momento em que a sentença se torna eficaz. Mais precisamente, o prazo de quinze dias começa a correr a partir do momento em que ao réu é dada ciência da sentença (objeto de apelação) ou da decisão do tribunal (objeto de recurso especial ou de recurso extraordinário).

No caso de recurso de apelação em que não haja atribuição de efeito suspensivo, o devedor, ao recorrer e não depositar em juízo o valor no qual foi condenado, estará assumindo um "risco", pois, caso seja negado provimento ao recurso, deverá pagar a multa, haja vista que já terá transcorrido o prazo de quinze dias da intimação da sentença de primeiro grau de jurisdição.

Há entendimento de que, no caso de recurso, com efeito suspensivo, com proferimento de acórdão, o termo de início da contagem do prazo seria da intimação das partes sobre o retorno dos autos, pois, de acordo com o art. 475-P, II do CPC, o cumprimento da sentença efetuar-se-á perante o juízo que processou a causa no primeiro grau de jurisdição. Como já foi dito, pagamento voluntário e requerimento de cumprimento de sentença são coisas distintas. Com a prolação da sentença, o devedor já estará ciente, através da intimação, da existência de sua obrigação de pagar quantia certa. Se interpor recurso, não sendo a sentença reformada em seu favor, poderão haver duas hipóteses: sendo o recurso com efeito suspensivo, o prazo de quinze dias previsto no art. 475-J, do CPC, começará a correr da intimação do acórdão; não sendo o recurso com efeito suspensivo, a multa já será devida, pois o prazo já transcorreu da intimação da sentença de primeiro grau de jurisdição. Nas duas hipóteses, não havendo o pagamento, o credor deverá requerer o cumprimento de sentença através de execução, com expedição de mandado de penhora. O art. 475-P, II, estabelece que a competência, nesse caso, é do juízo que processou a causa no primeiro grau de jurisdição (juízo a quo), isso porque não seria possível serem realizados os atos executivos no juízo ad quem. É este o alcance da norma, ou seja, fixar competência para determinados atos.

O fato de que em determinados casos, o credor deve instruir o requerimento de cumprimento de sentença com memória discriminada e atualizada do cálculo da condenação, também não afasta a incidência da multa caso o devedor não efetue o pagamento após sua intimação da sentença, haja vista que o executado também tem elementos necessários para elaborar o cálculo, o que não afasta a liquidez do título executivo judicial.

Diante do exposto, de um modo geral, quando o credor requer o cumprimento da sentença através de execução, já houve a incidência da multa, sendo que a próxima providência será a expedição de mandado de penhora, ou seja, o exeqüente, na sua petição de cumprimento de sentença não precisa requerer a intimação do devedor para proceder ao pagamento do valor da condenação, sob pena da incidência da multa de dez por cento e expedição de mandado de penhora. A medida cabível, nesse momento, será a expedição do referido mandado, pois a multa já será devida.

Havendo necessidade do procedimento de liquidação de sentença propriamente dita, o termo inicial do prazo de quinze dias para a incidência da multa prevista no art. 475-J do CPC será a intimação do devedor sobre a decisão de liquidação.

Outra situação diz respeito ao caso de homologação de acordo das partes. Neste caso também aplica-se a multa prevista no art. 475-J, no caso de não cumprimento pelo devedor.

Mesmo o texto do art. 475-J usar da palavra "condenado" em sua redação, deve-se ter em vista primeiramente a intenção do legislador quando da referida reforma no Processo Civil. A multa prevista no art. 475-J foi criada, de uma certa forma, em favor da jurisdição, embora seja revertida em favor do credor, pois foi estabelecida para que os provimentos jurisdicionais fossem cumpridos de forma a garantir uma pacificação social e alcance do fim social das sentenças. Foi criada para desestimular o devedor a ficar inadimplente com o credor, e com o fim de resolução mais rápida dos conflitos já decididos em favor de uma das partes. O acordo das partes homologado pelo Estado-Juiz é título executivo judicial conforme art. 475-N do CPC. A expressão "condenado" prevista no art. 475-J, caput do CPC, dá a impressão que somente as sentenças com resolução do mérito, que expressamente condenem o devedor ao pagamento de determinada quantia, poderão imputar ao devedor a referida multa. Como em vários casos espalhados pela legislação, este é mais um de uso inadequado de uma expressão no texto da lei. O legislador à vezes não leva em consideração que o Código é um instrumento sistematizado de previsão de normas. Não faria sentido em se aplicar uma interpretação literal do texto do art. 475-J, em manifesta contradição ao conjunto normativo estabelecido no Processo Civil, no cumprimento de sentença.

Sendo assim, o art. 475-J do Código de Processo Civil é perfeitamente aplicável no caso de descumprimento do acordo das partes homologado pelo Juiz, mesmo em relação à aplicação da pena de multa. Ocorre que o início do prazo, nesse caso, será no dia em que o devedor não cumpriu o acordo, efetuando o pagamento do pactuado. Em se tratando de acordo, homologado pelo Juiz, em que se estabeleça, por livre convenção das partes, multa incidente sobre o valor da condenação, em favor do credor, no caso de não cumprimento do convencionado pelas partes, ou seja, de pagamento do montante acordado pelo devedor, incidirá também a multa prevista no art. 475-J do CPC, não havendo necessidade do credor ressalvar expressamente no acordo que a multa convencionada será devida sem prejuízo da multa prevista em lei.

Com relação à forma da intimação do devedor para início à fluência do prazo, nas situações já mencionadas, esta se dará, em regra, na pessoa do advogado, pois esta é a sistemática adotada através da reforma processual, que, como já visto, empreendeu meios para agilizar o procedimento de satisfação do crédito, não se mostrando, portanto, necessária a intimação pessoal do réu para dar início ao prazo de quinze dias.

No entanto, tratando-se de réu revel, sem ter constituído advogado nos autos, não é necessária sua intimação, diante da regra prevista no art. 322 do CPC que estabelece que contra ele correrão os prazos independente de intimação.

Sendo o réu revel, citado por edital, tendo-lhe sido nomeado curador especial, também se dispensa a sua intimação pessoal, pois encontra-se em lugar incerto e não sabido, bastando a intimação de seu curador especial para início do prazo, não sendo razoável sua intimação também por edital. A incidência da aludida multa é pautada na razoabilidade, pois o devedor tem o dever de manter seu endereço atualizado perante seu credor, não se furtando ao dever de pagá-lo. A lei não poderia privilegiar esta conduta do devedor de tomar rumo ignorado face às suas obrigações perante o meio social em que vive. Está certo que quando do processo de conhecimento, a obrigação de pagamento era incerta. Porém, quando um indivíduo pratica um ato ilícito que configure violação de direitos de outrem, fica subordinado a este ato, devendo, em tese, aguardar eventual pronunciamento do Poder Judiciário, quando provocado, para se ter uma definitividade da situação em que se envolveu.


CONCLUSÃO

O cumprimento de sentença, através da reforma processual da Lei 11.232/2005, foi instituído de maneira a garantir uma justiça mais célere e eficaz, ou seja, no interesse preponderante do credor. Agora, quem sai vitorioso num processo judicial, pode contar com mais instrumentos de satisfação de seus interesses.

Foram traçados os aspectos gerais do instituto do cumprimento de sentença, dando-se ênfase na execução por quantia certa fundada em título judicial, demonstrando as inovações legislativas trazidas com a reforma, sobretudo no que diz respeito à multa prevista no art. 475-J do Código de Processo Civil, que tem a natureza de punição ao devedor no caso de inadimplemento, sendo que o termo inicial da contagem do prazo de quinze dias para a sua incidência é o ato de intimação (em regra, na pessoa do advogado do devedor) da sentença ou acórdão condenatórios em quantia certa, salvo se contra eles for interposto recurso com efeito suspensivo. Verificou-se que a sentença agora é conceituada como ato que possui aptidão para por fim ao processo ou à fase na qual foi proferida, não sendo mais consagrada como o apenas o ato que põe fim a processo, tendo em vista o sincretismo deste, que foi dividido em fases distintas, sendo devidos honorários advocatícios sucumbenciais também na fase de cumprimento de sentença.

É através do processo que o Estado/Juiz dá efetividade na prestação da tutela jurisdicional, funcionando assim como pacificador social, contribuindo com que o Direito atinja seu objetivo principal, que é o bem comum. Somente com o estudo científico das normas processuais é que estas serão perfeitamente interpretadas pelos operadores do direito, garantindo-se assim menor incidência de debates na doutrina e jurisprudência acerca dos novos institutos processuais criados por inovações legislativas.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 21ª ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2005.

FILHO, Vicente Greco. Direito Processual Civil Brasileiro: Teoria geral do processo e auxiliares da justiça.Vol. I. 20ª ed. rev. e atual. São Paulo; Saraiva, 2007.

FILHO, Vicente Greco. Direito Processual Civil Brasileiro: Processo de execução a procedimentos especiais.Vol. III. 19ª ed. rev. e atual. São Paulo; Saraiva, 2008.

GONÇALVES, Marcus Vinícius Rios. Processo de Execução e Cautelar. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. (Coleção Sinopses Jurídicas, Vol. 12).

MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de Processo Civil: Teoria Geral do Processo.Vol. I. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil: Execução.Vol. III. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.

THEODORO JR., Humberto. A Reforma da Execução do Título Extrajudicial.1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.

THEODORO JR., Humberto. As Novas Reformas do Código de Processo Civil.1ª ed. 2ª tiragem. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

THEODORO JR., Humberto. Processo de Execução e Cumprimento de Sentença.24ª ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Universitária, 2007.


Notas

  1. THEODORO JR., Humberto. Processo de Execução e Cumprimento de Sentença. 24 ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Universitária, 2007. p. 585.
  2. MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil: Execução. Vol. III. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 305.
  3. GONÇALVES, Marcus Vinícius Rios. Processo de Execução e Cautelar. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 74-76. (Coleção Sinopses Jurídicas, Vol. 12).
  4. MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil: Execução. Vol. III. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 238.
  5. MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil: Execução. Vol. III. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 237 e 253.
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Sobre o autor
Fábio Raimundo Gontijo

Oficial de Apoio Judicial do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Professor na Universidade Presidente Antônio Carlos - Campus Bom Despacho/MG. Especialista em Direito Processual pela Universidade Gama Filho. Graduado em Direito pela Faculdades Integradas do Oeste de Minas-FADOM, em 2004.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GONTIJO, Fábio Raimundo. Cumprimento de sentença e multa do artigo 475-J do Código de Processo Civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2871, 12 mai. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19101. Acesso em: 18 nov. 2024.

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