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União homoafetiva e insubordinação judicial

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Na última semana tomamos conhecimento de uma decisão oriunda da justiça goiana, cancelando contrato de união estável de um casal homossexual, mesmo diante da decisão do STF nas ADI 4277 e ADPF 132.

A decisão do STF reconheceu o direito aos casais homossexuais à união estável; a Suprema Corte deu interpretação conforme a Constituição Federal para excluir qualquer significado do artigo 1.723 do Código Civil que impeça o reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar. A decisão prolatada em 04.05.11 tem eficácia erga omnes e efeito vinculante, ou seja, os termos da decisão devem ser obedecidos por todos e de maneira obrigatória.

Contrariando o posicionamento fixado pelo STF, no entanto, o juiz Jerônymo Pedro Villas Boas (Goiânia), anulou união estável de um casal homossexual, ao argumento de que a Corte não tem competência para alterar normas da Constituição Federal. O posicionamento do juiz tem fundamento na letra expressa da Constituição Federal que dispõe no § 3º do art. 226: para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

De acordo com informações do UOL Notícias, o juiz teria afirmado que "a decisão do STF ultrapassou os limites e é ilegítima e inconstitucional". (http://noticias.uol.com.br/cotidiano/2011/06/21/corregedora-do-tj-cassa-decisao-de-juiz-que-anulou-uniao-homoafetiva-em-goias.jhtm).

O juiz goiano não foi o único que "discordou" da decisão do STF. Dentre os muitos manifestos contrários aos termos da decisão do STF, Willian Douglas assim se posicionou no texto "Dois surdos: os religiosos e o movimento gay": O STF deve proteger as minorias, mas não tem legitimidade para ir além da Constituição e profanar a vontade da maioria conforme cristalizada na Constituição. O que houve está muito perto de criar, pelas mãos do STF, uma ditadura das minorias, ou uma ditadura de juízes. O STF é o último intérprete da Constituição, e não o último a maculá-la. Ou talvez o primeiro, se não abdicar de ignorar que algumas coisas só os representantes eleitos podem fazer. http://www.ipclfg.com.br/colunistas/william-douglas/dois-surdos-os-religiosos-e-o-movimento-gay/

Conforme já nos manifestamos em "União homoafetiva, caso Battisti e marcha da maconha", somos todos ser humanos com pré-compreensões diferentes, mas o importante é que nossa Suprema Corte, que não foge da regra, vai conformando o Direito (vai dando os contornos do direito "vivente"), de acordo com sua visão do mundo (sua predominante ideologia).( http://www.ipclfg.com.br/artigos-do-prof-lfg/uniao-homoafetiva-caso-battisti-e-marcha-da-maconha/).

No caso do juiz goiano, no entanto, não se pode deixar de destacar sua "insubordinação funcional". Ao desobedecer decisão (vinculante) da mais alta Corte nacional corre o risco de agora sofrer processo disciplinar. Isso porque a corregedora do Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO), Beatriz Figueiredo Franco, além de cassar sua decisão, ainda levará o caso para a Corte Especial do tribunal, que irá decidir sobre a instauração do processo disciplinar.

Da mesma forma como a Lei Maior é expressa em mencionar que a união estável há de ser entre homem e mulher, também é expressa em fixar que as decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário (art. 102, §2º, CF/88). De outro lado, muitos outros princípios constitucionais amparar a decisão do STF, a começar pelos da dignidade da pessoa humana, da impossibilidade de se discriminar pessoas etc.

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Sobre os autores
Áurea Maria Ferraz de Sousa

Advogada pós graduada em Direito constitucional e em Direito penal e processual penal. Pesquisadora.

Luiz Flávio Gomes

Doutor em Direito Penal pela Universidade Complutense de Madri – UCM e Mestre em Direito Penal pela Universidade de São Paulo – USP. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Jurista e Professor de Direito Penal e de Processo Penal em vários cursos de pós-graduação no Brasil e no exterior. Autor de vários livros jurídicos e de artigos publicados em periódicos nacionais e estrangeiros. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998), Advogado (1999 a 2001) e Deputado Federal (2019). Falecido em 2019.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUSA, Áurea Maria Ferraz ; GOMES, Luiz Flávio. União homoafetiva e insubordinação judicial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2920, 30 jun. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19445. Acesso em: 2 nov. 2024.

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