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O credor hipotecário e o concurso singular de credores

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05/09/2011 às 09:22
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Existe conflito na jurisprudência estabelecendo que o credor hipotecário tem preferência sobre os quirografários, desde que também seja exeqüente a tenha efetuado a penhora; do contrário, não.

1 - Direito hipotecário: 1. Colocação do tema - 2. Direito Material - Aspectos processuais: 3. Condições da ação - 4. Da execução comum - 5. Da prova da insolvência do devedor hipotecário - 6. Da execução hipotecaria. III - Incidentes processuais na execução hipotecaria: 7. Litisconsórcio ativo - 8. Medida cautelar autônoma. Seqüestro - 9. Embargos de terceiro prejudicado - 10. Da insolvência judicial do devedor hipotecário - 11. Protesto por preferência - 12. Da instauração do concurso singular de credores - 13. Da desnecessidade da execução a penhora - 14. Alienação judicial do bem hipotecado - 15. Da renuncia tácita -16. As preferências e os privilégios creditórios – 17.Recuperação Judicial – LEI 11.101 DE 09 02 2005 – Execução Coletiva - 18. Novos julgados a respeito do tema – 18 - RECUPERAÇÃO JUDICIAL – LEI 11 101 DE 09 02 2005.19. Conclusão - 20. Proposta para alteração do Código de Processo Civil vigente.

1. O presente trabalho foi elaborado em razão do conflito pretoriano estabelecendo que o credor hipotecário tem preferência sobre os quirografários, desde que também seja exeqüente a tenha efetuado a penhora; do contrario, não. Tal posição foi assumida, de forma pioneira, pelos nobres Juizes da 4ª Câmara do egrégio 1.° TACivSP no julgamento da Ap. 232.321. Acreditamos, porem, que tal postura se deva, sobretudo, a ausência de regras instrumentais no tocante à, instauração e realização do concurso processual da preferência instituído pelo vigente Código de Processo Civil que estabeleçam o principia do contraditório.

Consta do referido julgado, in verbis: "Não será, pois, a simples indicação, nos mesmos autos, do valor atual de seu crédito hipotecário que lhe bastara para dar como cumpridos todos os requisitos pertinentes à sua regular execução. Na verdade, o devedor tem direito ao devido processo legal, e o principio do contraditório é inafastável" 1

1.1.Com efeito, vingando tal entendimento, quaisquer débitos, mesmo o tributário, o trabalhista a outros, deverão passar pelo crivo de regular execução, mediante penhora, a despeito dos privilégios previstos nos arts. 186 a 187 do CTN, em que pose ao fato de tais créditos não estarem sujeitos a concurso, na forma do art. 178 do referido Código.

1.2.A vista da colocação do tema, procuraremos demonstrar a desnecessidade de tal procedimento judicial por parte do credor hipotecário, bem como dos demais credores privilegiados, no tocante ao ingresso na execução, mediante penhora do bem onerado, quando a garantia real foi afetada, em razão da constrição judicial levada a efeito pôr credor quirografário, apresentando, ao final, sugestões ao nosso legislador, para serem incorporadas tais regras ao Código de Processo Civil vigente, haja vista sua omissão, em homenagem ao principio da economia processual, isto sem falar na celeridade da prestação jurisdicional pelo Estado.

1.3.Antes de ingressarmos no tema propriamente dito faremos breve incursão pelo Direito Material, sem prejuízo dos aspectos processuais a serem levantados.

2. A hipoteca é direito real (CC, art. 674, IX) que adere ao imóvel e o acompanha Como a sombra ao corpo, na linguagem do Direito espanhol, ou "adhaerret assibus rei, ut lepra cuti", na dos latinos.

2.1.Como direito real, tem caráter absoluto, vigora contra todos (adversus omnes), e, enquanto se não extingue, acompanha a coisa pelas mutações por que passa. Dai o direito do credor de penhorar o imóvel em poder de quem quer que o detenha, a de executá-lo. É o direito de seqüela.

2.2.A ela (hipoteca), de originário, anda ligado o direito de preferência, isto é, o direito por força do qual o preço do imóvel é precipuamente aplicado ao pagamento da dívida, excluídas, até a concorrente quantia, as dividas que não estão sob igual garantia. O direito de seqüela e o de preferência, eis a virtude, a força da hipoteca, segundo afirmações do grande Lafayette. 2

3. Estando definida a more do devedor, nos termos do art. 580 do CPC, encontra-se o credor hipotecário legitimado a propositura da execução, uma vez mun1do de titulo com os requisitos reclamados pelo art. 586 do mesmo Código, sem prejuízo da cobrança dos acessórios legais a contratuais, devidamente definidos no registro imobiliário, com fundamento nos arts. 956 a 1.061 do CC.

3.1.Nas execuções hipotecarias, porém, vigora o preceito do art. 847 do CC, isto é, os outros credores poderão disputar preferência no tocante a eventuais sobras do pagamento hipotecário regularmente inscrito em primeiro lugar, só podendo ser pleiteada a invalidade da hipoteca respectiva por meio de ação ordinária. 3

3.2.Sobre o tema, ensina Pontes de Miranda: "O credor que obteve garantia hipotecaria para o seu crédito tem duas ações inconfundíveis: a ação pessoal para satisfação do crédito pessoal, que pode ser executiva (e é possível que o seja) se a lei fez do titulo extrajudicial, que se alega, titulo executivo, e a ação real, pela qual se pede o importe da hipoteca, com os interesses. A ação pessoal, se executiva, vai sobre todos os bens do devedor, ao passo que a ação real só apanha o bem gravado. A ação pessoal dirige-se contra o devedor, que pode não ser o proprietário do bem gravado; a ação real dirige-se contra o proprietário, o possuidor em nome próprio e contra todos que possam obstar à extração do valor do bem gravado, para se satisfazer a hipoteca". 4

4. Para que o credor quirografário possa fazer recair a penhora em imóveis a outrem hipotecados, mister é que prove estar: a) vencida a divida hipotecaria ou b) em estado de insolvência o devedor comum. 5

4.1.Verificada uma ou outra hipótese licita é a ação do credor comum, desde que sejam observadas as normas dos arts. 826 (segunda parte) do CC a 615 II, 619 e 698 do CPC, sob pena de ser obstada a alienação judicial do bem objeto da garantia pelo credor hipotecário, mediante interposição de embargos de terceiro, com base no art. 1.047, II, do CPC, haja vista que qualquer alienação feita à, sua revelia é nula - art. 826 - e não pode prejudicar o seu direito real - art. 755 (todos do CC) . 6

4.2.No caso de penhora do bem gravado com ônus real, ao credor hipotecário, uma vez intimado da constrição Judicial (art. 615, II, do CPC), caberá exame das seguintes situações jurídicas que podem ocorrer: a) o credor quirografário demonstrou a insolvência do devedor hipotecário (arts. 813 do CC a 750, I, do CPC);7 b) estar a divida hipotecária vencida e c) a dívida não encontrar-se vencida, operando-se o vencimento extraordinário, porém, em razão do disposto nos arts. 762, II, a 954, II, do CC a 751, I, do CPC . 8

5. No tocante à prova da insolvência do devedor hipotecário, o ônus Cabe ao credor quirografário, podendo ser presumida, A luz do art. 750, I e II, do CPC - regras que tratam do instituto da execução contra devedor insolvente.

Nesse sentido, já decidiu o STF, no julgamento do RE 91.601-MG, que a insolvência do devedor hipotecário se prova pela própria execução do devedor será garantia, mediante penhora do bem onerado, tornando-se desnecessária a declaração judicial de insolvência, na forma dos arts. 748 e ss. do CPC. 9

5.1.Feita essa observação, diante das hipóteses citadas, poderá o credor hipotecário valer-se dos seguintes procedimentos judiciais:

6.Ingressar com a execução singular no caso de ocorrer o inadimplemento da obrigação contraída pelo devedor hipotecário, mediante penhora do bem (art. 655, § 2 º, do CPC), à vista das vantagens de ordem material a processual apontadas, sem prejuízo de dar ciência da demanda ao juízo onde ocorreu a constrição judicial pelo credor quirografário, a fim de que sejam sobrestado os atos executórios e este venha disputar eventual sobra do pagamento hipotecário.

7. Na literatura jurídica e em alguns julgados encontramos um ponto-de-vista comum no tocante à equiparação do credor por Segunda hipoteca ao credor quirografário (NCC art. 1477 – art. . 813 do CC 1916), uma vez que lhes cabe eventual sobra do pagamento do credor pela primeira hipoteca, em razão da prelação real e da prioridade decorrente do direito material. 10

7.1Em tais condições, o credor sem garantia, se a hipoteca não está vencida, somente poderá, executar seu crédito, nas condições do credor por segunda hipoteca, à luz do art. 1477 do art. NCC, mediante declaração judicial da insolvência do devedor hipotecário, provando: a) ausência de outros bens do devedor sem ônus por ocasião da penhora; b) que o passivo do devedor hipotecário é superior ao seu ativo.

7.2.O ilustre J. M. de Carvalho Santos11 cita em sua obra C1óvis Beviláqua, em seus esplendidos comentários: "O credor por segunda hipoteca, quando se garantiu, já encontrou o imóvel gravado, na sua totalidade, em proveito do primeiro credor. Entende-se que sua garantia visou apenas à parcela de valor do imóvel que restasse do pagamento da hipoteca inscrita em primeiro lugar. Por conseguinte, não poderá executar o imóvel senão quando se realizar essa contingência. O seu direito de excussão se retarda, porque a sua garantia é condicional: recai sobre o remanescente. A lei fica em defesa da primeira hipoteca, não consentindo que credores hipotecários posteriores ou quirografários possam executar o imóvel dado em garantia hipotecária, salvo se demonstrarem a Insolvência (judicial) do devedor hipotecário".

7.3.O mesmo J. M. de Carvalho Santos, com apoio de J. M. de Azevedo Marques, sustenta, com grande imaginação jurídica, que, se um sub-hipotecário iniciar a execução, pode o primeiro credor da hipoteca vencida intervir, em qualquer fase da ação, a assumir a posição do exeqüente, para a instauração do concurso de preferência. Não seria curial, nem consoante a índole da hipoteca, que o primeiro ficasse de lado a olhar a execução do segundo, simplesmente porque este tomou a iniciativa do processo. O que o primeiro não pode é, tão-somente, impedir que o segundo inicie a execução diante da insolvência do devedor hipotecário ou na hipótese de estar vencida a primeira hipoteca, porque, nesses casos, o primeiro não pode obstar A venda. Mas pode subsistir o segundo na direção do processo, para continuá-lo, como exeqüente. 12

7.4.Nestas condições, podemos concluir que, com base nos arts. 44, 598 a 745 do CPC, o credor hipotecário, em primeiro lugar, poderá, ingressar no pe1o ativo na qualidade de litisconsorte facultativo, na excussão real promovida por credores posteriores ou quirografários, sem prejuízo da posição das partes, assumindo o comando do processo, uma vez vencida a primeira hipoteca ou provada a Insolvência do devedor hipotecário, ficando prejudicado o procedimento judicial aventado no item é deste trabalho.

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8. Eventualmente, o credor por hipoteca convencional pode, como medida preparatória ou no curso da execução hipotecária, visando a preservar a hipoteca, ingressar com a ação cautelar de seqüestro do imóvel hipotecado, contra quem quer que seja o detentor, louvando-se nos arts. 822 a ss. do CPC, além de outras disposições legais aplicáveis à espécie.

8.1.Tem o seqüestro duplo fim: sujeitar à hipoteca os frutos a rendimentos do pr6dio, percebidos desde o momento em que ele se realiza, a impedir, da data em diante, a imobilização dos acessórios do imóvel e dos imóveis por destino, segundo lição do saudoso Lafayette13 sem prejuízo de eventual depósito ou depósitos nas mãos do depositário público. 14

9. Não demonstrada a insolvência do devedor hipotecário pelo credor sem garantia, não vencido a divida, encontrando-se os pagamentos parciais atualizados, poderá o credor hipotecário, louvando-se no art. 813 do CC, formular "embargos de terceiro prejudicado", expressão usada pelo !lustre jurista Lafayette15 alegando ausência de declaração judicial de insolvência, na forma do art. 761 do CPC. 16

9.1.Em que pese a ser o aresto abaixo julgado na vigência do Código de Processo Civil anterior, tais postulados podem ser perfeitamente aplicados pelos tribunais, in verbis:

"Embargos de terceiro - Credor hipotecário - Oferecimento em caso de penhora de bens recebidos em garantia - Admissibilidade - Aplicação do art. 101 do CPC.

"Hipoteca - Penhora do objeto da garantia em execução por divida quirografária - Quando é possível.

"O credor hipotecário pode, opor embargas de terceiro, afastar a venda Judicial do objeto da garantia quando penhorada em execução por dívida quirografária.

"Acórdão - Vistos, relatados em Mesa e discutidos estes autos de agravo 26.826, de São Paulo, em que é agravante Elísio Noronha e em que é agravado Antero Joaquim Marques: Acordam os Juizes da 4ª Câmara Cível, por votação unânime, em negar provimento ao recurso a condenar o agravante nas custas.

"Cinge-se à questão em decidir da propriedade dos embargos de terceiro opostos pelo credor hipotecário para obstar à venda do imóvel objeto da garantia, bem como se tal venda podia ser obtida pelo mesmo redor, na execução levada a efeito pelo credor quirografário, estando insolvente o devedor comum.

"Não há dúvida de que o remédio adequado são os embargos de terceiro, como ensinam Lafayette, Azevedo Marques, C. de Oliveira Filho a F. Oliveira Conde. Assim também dispunham o Código de Processo de São Paulo e o da Bahia; assim também decidiu a jurisprudência (RT 104/129; RF 87/726 a 92/696).

"Quanto a segunda questão, também decidiu a sentença acertadamente. O devedor comum esta insolvente, como o reconhece o próprio agravante, a fls., e, assim, não pode ele obstar à venda do objeto da garantia. A dívida considera-se vencida (arts. 1425, II, e art. 333, I, II, ambos no NCC), podendo, então, qualquer credor efetuar a penhora, a fim de que, com economia de gastos, se faça oportunamente o concurso creditório em que o credor hipotecário fará valer a sua preferência. Alias, entende o ilustre Min. Consta Manso que o NCC art. 1477 – art. 813 do CC 1916, aplica-se também ao credor quirografário, por identidade de razão, entendendo que pode ele penhorar o imóvel, no caso de insolvência do devedor comum (Votos e Acórdãos, p. 326).

"São Paulo, 20 de setembro de 1945 - Meirelles dos Santos, pres. ad hoc - H. da Silva Lima, relator - Cunha Cintra." 17

10. Poderá, eventualmente, o credor será garantia, com fundamento no art. 750, I e II, do CPC, requerer a insolvência do devedor hipotecário. Sendo declarada a insolvência, caberá, ao credor hipotecário apresentar declaração de seu crédito, na forma do art. 761, II, do mesmo Código.

11. Os procedimentos judiciais apontados, como nas demais situações jurídicas citadas, não elidem o direito do credor hipotecário de formular nos autos da execução do credor comum o pagamento preferencial do seu crédito, ao requerer na referida execução a instauração do concurso singular de preferência, oferecendo os seus artigos, que serão autuados em apenso, devendo passar pelo crivo do contador judicial para efeito de conferência do valor apontado, devendo o registro da hipoteca obedecer ao disposto nos arts. 1492/1498 do NCC.

Eis a lição de acórdão do TJSP: "Concurso de Preferencia - Discussão permitida apenas a credores quirografários - Recurso não provido. Está isento do concurso de preferência, ainda que se apresente para disputa-lo, credor hipotecário a quem compete prioridade, nos termos do art. 847 do CC".19

12. Conforme ficou assinalado no inicio, o Código de Processo Civil vigente, ao instituir o concurso processual de preferência, não tragou seu procedimento. Tal fato já foi apontado pelo nobre Abrão Razuck. 20 A omissão é censurável, pois desorientou a maioria dos credores. Isto não se justifica, uma vez que a pr6pria lei fala que a execução se realiza no interesse do credor que adquire pela penhora o direito de preferência sobre os bens penhorados (art. 612 do CPC) 21 inexistindo privilegio ou preferência de terceiro que passe à frente da prioridade resultante da penhora. Caso contrario, paga-se, com o produto da conversão, o terceiro, cingindo-se a preferencia do exeqüente ao saldo eventual, observada a prioridade a que alude o art. 613 do CPC, segundo lição do Prof. Celso Neves. 22

12.1Também o ilustre Prof. Celso Neves evidencia a falha no Código vigente no tocante à ausência de normas procedimentais relativamente à disputa, afirmando que: "O Código não estabelece rito especial para o que chama de "disputa", inferindo-se, dai, que o incidente processual na execução obedecera ao que determinar o juiz, observando o art. 125, fixando ele os prazos que entender adequados, segundo as circunstancias de cada caso, sendo de aplicar-se, nesse particular, o art. 185".23

12.2.O ilustre processualista José Carlos Barbosa Moreira classifica a referida disputa Como processo incidental de conhecimento. 24

12.3.Nestas condições, ante a ausência de normas procedimentais, caberá ao juiz, na entrega da prestação jurisdicional, suprir a omissão apontada, será prejuízo da posição das partes e em homenagem ao principio do contraditório, dentro do incidente processual no processo executório, visando à instauração e realização do concurso singular de credores, com base nas prelações ou privilégios do credor constituído anteriormente à penhora, louvando-se. nos arts. 598 a 745 do CPC.

12.4.Nesse momento, Cabe registrar o magnífico trabalho de Giuseppe Tarzia, vertido do Italiano para o Português por Teresa Celina de Arruda Alvim, sob o titulo "O contraditório no processo executivo",25 que pode, evidentemente, ser compreendido à luz do Direito brasileiro, e podem mesmo aplicar-se, até certo ponto, guardadas as devidas proporções, as observações que faz à lei brasileira, conforme assinala a ilustre Tradutora.

12.5.O certo a que o contraditório no processo de execução se realiza de forma incidental, visto que o devedor não é citado para defender-se, a sim para cumprir a obrigação decorrente do titulo. 26

12.6.Conforme registrou o Prof. Alcides de Mendonça Lima, o processo de execução, pelo Código vigente, sem oprimir ou lesar o devedor, procura resguardar os direitos do credor, mormente quando unifica as vias executivas, dando maior eficácia do que antes aos títulos extrajudiciais em regra emitidos já com a concordância ou reconhecimento do devedor quanto à, obrigação assumida. 27

13. Os créditos hipotecários constituídos anteriormente à penhora não estão necessariamente sujeitos à passar pelo crivo de regular execução, mediante penhora do bem objeto da garantia, diante de eventual afetação em decorrência de execução singular promovida por credor sem garantia, a luz dos argumentos esposados, isto sem falar na ausência de previsão legal, uma vez que a discussão estabelecida pelo Código vigente está restrita apenas aos credores quirografários e ao direito de preferência resultante da anterioridade da penhora.

13.1.Aliás, na vigência do Regulamento 737, a propositura do protesto por preferência por parte do credor, dentro do processo executivo, independia de constrição judicial, nos termos do seu art. 612, sem prejuízo do contraditório, na forma do art. 617 do mesmo diploma legal.

13.2.O Código de 1939 disciplinava, em seus arts. 1.008 a 1.030, de forma feliz, o concurso de credores no tocante à disputa, pela preferência, sem prejuízo das dividas por sub-hipotecas ou quirografárias, em razão de eventual sobra do pagamento do credor pela primeira hipoteca, mediante amplo contraditório por ocasião do incidente na execução singular.

13.3.O concurso estabelecido pelo Código de Processo Civil revogado poderia versar ou sobre o prego de, arrematação, remissão ou adjudicação, ou ainda sobre os próprios bens, caso não houvessem sido arrematados, remidos ou adjudicados, estabelecendo os arts. 1.020 a 1.021 condições para ser admitido a concurso, sem necessidade do ajuizamento prévio do titulo executivo extrajudicial, mediante penhora de bens, contentando-se o legislador com que os direitos dos credores concorrentes estivessem comprovados por titulo hábil, liquido a certo, não precisando a divida estar vencida, A vista do disposto no art. 945 do CC. Por outro lado, nem todo credor, embora com titulo hábil, era admitido a concurso, uma vez que o Código revogado exigia que o credor tivesse formulado protesto antes de sua, instauração (art. 1.021). A juntada do protesto aos autos de, execução singular impedia, desde logo, a pratica de qualquer ato que pudesse torná-lo ineficaz, ou seja, levantamento de, penhora sem anu6ncia dos credores concorrentes, aos quais ficava ressalvado o direito de prosseguir na execução (art. 1.022).

13.4.A amplitude de, dispute, era regulada pelo art. 1.024 do CPC, admitindo que qualquer credor pudesse, no concurso de credores, discutir a validade do crédito ou contrato hipotecário, a despeito do disposto no art. 847 do CC, como bem leciona o eminente Eduardo Espínola, em notável parecer sobre a matéria. 28

13.5."Na realidade, como ensina Tullio Liebman as partes do concurso silo, do lado ativo, os credores concorrentes, do lado passivo, o executado. Com exceção do exeqüente, que já estava no processo, os credores adquirem a qualidade de partes pelo ato de intervenção... As relações jurídicas materiais dos credores são as mesmas que eram anteriormente a seu ingresso no concurso não as modifica: não há entre eles nem direitos, nem obrigações; cada um deles esta ligado apenas por relação obrigacional comum. A conseqüência é que legitimado a contestar os cr6ditos apresentados e o executado, que pode suscitar contra cada credor as questões que poderia suscitar em embargos do executado ou não ação executiva, se o credor fosse, respectivamente, exeqüente ou autor em ação executiva. Todavia... os credores têm também interesse em excluir do concurso os pretendentes cujos direitos ou cujas preferencias não sejam verdadeiros, por isso a lei lhes reconhece legitimação especial pare, impugnar por vez o crédito ou a preferência por cada qual declarada (arts. 1.024 do CPC e 1.555 do CC, legitimação que tem caráter de substituição processual, porque o credor exerce em seu nome faculdade que juridicamente pertence a terceiro (o executado) (Processo de Execução, pp. 300 e ss.).

"Não assiste razão a Amílcar de Castro ao sustentar que o executado é estranho ao concurso de credores, que "não é litígio com o devedor-executado ", e sim "ação privativa dos credores", em cuja relação processual "não pode intervir o executado", pois somente depois de encerrado, pela respectiva sentença, o concurso, cada credor poderá obter o levantamento da sua, cota-parte, com o "consentimento do devedor", ante cuja recusa se recorrera, de novo, à via executiva. A prevalência de tal opinião implicaria a multiplicação de processos, o que, por si mesmo, estaria a patentear a sua inviabilidade, ainda que não se contrapusesse aos ditames legais, que prescrevem a distribuição das percentagens aos credores habilitados, logo após a organização do correspondente plano, o que viável se faz, porquanto o executado já foi réu, em que figurou como o maior interessado em contestar os créditos declarados, já pelo direito, que lhe assiste, ao saldo eventual já pelo seu interesse em que paguem credores efetivos, e não meramente aparentes, certo como as obrigações não liquidadas subsistirão à execução (Tullio Liebman, ob. cit., pp. 297 e 298)." 29

13.6.Em tais condições, parece-nos de todo inadmissível a colocação feita pelo aresto singular publicado na RT 507/146, sob alegação de inexistência do contraditório no Código vigente, por ocasião do incidente processual estabelecido na entrega do dinheiro, uma vez que, na disputa pela preferência, será lícito ao credor penhorante, aos credores Intervenientes, ao devedor e, eventualmente, a outros interessados deduziram as defesas que tiverem, em que pese ao fato de o devedor ficar A margem desse concurso.

13.7.Com efeito, poderá o devedor sustentar as defesas opostas pelos credores contra os demais, na qualidade de assistente, visando a desconstituir o título impugnado, com base nos arts. 598 e 745 do CPC, sem prejuízo de valerem-se as partes da ação declaratória incidental, a ser deduzida a título de alegações supervenientes, louvando-se nas hipóteses elencadas no art. 303 do mesmo Código, dentro do prazo de 10 dias da ciência de tais alegações. 30

13.8.Ainda por ocasião da decisão judicial prevista no art. 713 do CPC, poderá o devedor oferecer recurso, na qualidade de terceiro prejudicado, louvando-se no art. 499 do mesmo Código, alegando que não foi parte na relação jurídica de Direito Processual na instauração e realização do concurso singular de preferência.

13.9.Na disputa pela preferência, o direito do credor exeqüente não tem o condão de prevalecer sobre qualquer outro privilégio ou garantia que tem sede no Direito Material, instituído anteriormente à penhora, A luz das regras expressas no Código vigente (arts. 709, 11, a 711). O que vale dizer que tal direito diz respeito apenas às penhoras efetuadas em execução por créditos sem garantia, segundo o magistério do Prof. Alcides Mendonça Lima. 31

13.10. A respeito do tema, recentemente veto a lume a obra Execução, do Prof. Paulo Furtado, 32 que, no capítulo da Entrega do dinheiro", assim leciona:

"E extremamente simples a entrega do produto quando se tratar de um único credor interessado, ou credor singular, cuja preferencia nasceu da penhora, na execução por ele promovida.

Determina o juiz a expedição de mandado de levantamento e, ao recebê-lo, o credor dará quitação ao devedor, por termos nos autos...

"A expedição desse mandado, porém, está ainda subordinada a outro pressuposto: que não haja outro privilegio, ou preferência, nascido antes da penhora. A exemplo, hipoteca ou penhor instituídos, outra penhora; arresto etc. Enfim, qualquer ônus que assegure, na forma da lei, a prelação de outrem.

"...

"Quando venham a concorrer diversos credores, estabelece o legislador um procedimento sumaríssimo próprio para o deslinde das questões surgidas no pagamento. O dinheiro ser-lhes-á, distribuído e entregue consoante a ordem das respectivas prelações e, não as havendo, receberá por primeiro o credor exeqüente. A importância remanescente será entregue conforme a anterioridade de cada penhora (CPC, art. 711). Repita-se que, inexistindo preferências a alegar, o credor autor da execução será satisfeito em primeiro lugar. E ao concurso comparecem apenas os credores que tenham sido garantidos com penhora sobre o mesmo bem.

"No juízo onde se deu a primeira penhora há de processar-se o concurso, mas se porventura realizou-se a hasta pública em outro juízo, este fato, por si, não gera qualquer preferência, porque o importante, para determiná-la, é a anterioridade da penhora", e não da praça ou leilão. Adotam-se providências, de juízo para juízo. E de notar-se que esse particular concurso de preferências ocorre quando o produto da arrematação suporta o pagamento de todos os concorrentes."

Afinal, arremata o ilustre Professor, focalizando a questão fulcral debatida, afirmando que "o título executivo, que estabelece a preferencia, indica o credor que será satisfeito antes dos demais (sendo irrelevante tenha ou não penhora em seu favor); seguem-se os credores comuns, ou quirografários, relacionados segundo a ordem de penhoras. Havendo duvidas a respeito, os credores expõem as suas pretensões, requerem a produção de provas (se necessárias) em audiência, mas a disputa entre mas a disputa entre eles versara unicamente sobre o direito de preferência e a anterioridade da penhora (CPC, art. 712). Surgindo questões complexas, o caminho é a via ordinária".33

14. Na eventualidade, sendo negado o direito do credor hipotecário de disputar a preferência, verifica-se tal negativa de prestação jurisdicional como inócua, pois, sem prejuízo do recurso cabível, per ocasião da alienação judicial, poderá requerer o pagamento de seu crédito, que deverá passar pelo crivo do contador judicial, para conferência de sua exatidão material, com base no título a no registro imobiliário, visto que ocorre a transferencia da prelação para o produto da expropriação, à luz da doutrina a da jurisprudência, in verbis:

"O credor hipotecário tem de ser notificado (art. 826). Ainda que não compareça, tem de ser depositado em juízo o valor da hipoteca, para que se dê a adjudicação; se não o foi, o cancelamento e ineficaz, por força do art. 254 da Lei 6.015, de 31.12.73 (art. 295 do Dec. 4.857, de 8.11.39; Dec. 370, de 2.5.1890, art. 104; Dec. 18.542, de 24.12.28, art. 278)". 34

"Como assinala Pontes de Miranda, "a arrematação a adjudicação que extinguem a hipoteca é qualquer arrematação ou a adjudicação em que o credor hipotecário seja figurante ou notificado (art. 826 do CC), ainda que revel ; a se tenha depositado o seu valor ou o apurado, com efeito definitivo de transmissão de propriedade do dinheiro, ou em que seja adjudicante o credor hipotecário cuja hipoteca se tem por extinta, sendo a única, ou a que se havia de preferir" (Tratado de Direito Civil, t. XX/292, § 2.516, 8).

"A extinção da hipoteca a transferência da prelação para o produto da expropriação nada tem a ver com o direito do, credor hipotecário, que, na medida em que não foi saldado, persiste como quirografário para execução em outros bens presentes ou futuros, conforme a lição de Pontes de Miranda (ob. a loc. cits.)" 35

14.1.O mesmo tratamento foi dado pela ínclita 5 ª Câmara do mesmo Tribunal, in verbis: "Alienação judicial - Arrematação - Imóvel arrematado pelo próprio credor exeqüente - Depósito apenas da diferença entre o valor da arrematação e o seu crédito - Inadmissibilidade na espécie - Existência de credor hipotecário - Aplicação dos arts. 690, § 2.°, a 711 do CPC. O § 2 ° do art. 690 do CPC prevê apenas a hip6tese de não existir credor preferencial para que o credor exeqüente deposite apenas a diferença ao invés de depositar todo o valor da arrematação a depois pedir o levantamento de seu crédito" 36

14.2.Por outro lado, o credor hipotecário, por ocasião da alienação judicial, pode licitar o bem objeto da garantia em execução comum de terceiros, mediante depósito da diferença do valor do seu credito e o valor da avaliação do bem, consoante decidiu a 1ª Câmara do referido Tribunal, in verbis: "Alienação judicial - Arrematação - Penhora de imóvel hipotecado A Caixa Econômica estadual - Arrematação por esta - Preço inferior ao da avaliação - Depósito da diferença. - Aplicação dos arts. 690, § 2 º, a 714 do CPC de 1973. O credor hipotecário que arremata o imóvel em execução ajuizada por outro credor deve depositar a diferença entre o valor de seu crédito e o da avaliação do bem".37

15. O que não pode é o credor hipotecário ficar inerte, deixando o processo de execução promovido pelo credor sem garantia, sem sua manifestação, sob pena de operar a extinção da hipoteca, sub-rogando o credor hipotecário apenas no preço da arrematação. 38

15.1.Diz Serpa Lopes, com exatidão. jurídica, que os arts. 826 e 849, VII, do. CC devem ser interpretados em conjunto, como um todo orgânico, que se não pode desintegrar. A arrematação ou adjudicação extingue a hipoteca (art. 849, VII), desde que tenham sido notificados Judicialmente os credores hipotecários que. não forem, de qualquer modo, parte na execução (art. 826). Ao receber a notificação judicial, o credor hipotecário fica, ipso falto, ciente de que o art. 849, VII, não lhe permite inércia, dependendo, assim, de uma ação de sua parte a manutenção de suas prerrogativas hipotecarias. 39

15.2.Não era outra a opinião, anteriormente manifestada, de Azevedo Marques, 40 de Lisipo Garcia, 41de Carvalho Santos, 42 e de Clóvis. 43

16. Conforme assinala o ilustre Prof. Rubens Requião, a classificação da preferência está hoje totalmente subvertida, em razão da edição de dezenas de leis de natureza fiscal e social que imperam em nosso Direito Positivo, dando nova feição ao quadro de preferências e privilégios creditícios. 0 citado jurista elaborou a seguinte classificação:

1.º) crédito resultante da indenização por acidentes da trabalho (Lei 11.101 de 09.12.2005, art. 84, I – direito anterior - Lei Dec.- lei 7.661, de 21.6.45, art. 102, § 1.º);

2.º) créditos dos salários dos empregados e de 1/3 da indenização trabalhista (Lei 5.172, de 25.10.66, art. 186; CLT, art. 449, § 1º, e (Lei 11.101 de 09.12.2005, art. 84, I – direito anterior - Lei Dec.- lei 7.661, de 21.6.45, art. 102, § 1.º);

3.º) créditos tributários da União, Estados e Municípios, no mesmo plano de igualdade (Lei 6.830/80, art. 29; Lei 5.172/66, arts. 186 e 187, e EC 1/69, art. 9.º, I);

4.º) créditos parafiscais, tais como contribuições do INPS, Sesc, Sesi, Senac, Senai etc., no mesmo plano que os créditos tributários da União (Dec. 77.077, de 24.1.76, arts. 147 e 157);

5.º) créditos por encargos da massa (Lei 11.101 de 09.12.2005, art. 84, III – direito anterior - Lei Dec.- lei 7.661, de 21.6.45, art. 124, § 1.º);

6.º) créditos por dívidas da massa (Lei 11.101 de 09.12.2005, art. 84, IV – direito anterior - Lei Dec.- lei 7.661, de 21.6.45, art. 124, § 2.º);

7.º) créditos com direitos reais de garantia; (art. nº 1474 do NCC – direito anterior – art. 811)

8.º) créditos com privilégio especial sobre determinados bens (C, art. 964 da Lei 10.406 de 10.01.2002, art. 964 - direito anterior – CC art. 1.566);

9.º) créditos com privilégio geral (Lei 10.406 de 10.01.2002, art. 965 – direito anterior – CC - art. 1.569);

10.º) créditos quirografários. 44

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Sobre o autor
Oswaldo Moreira Antunes

Advogado aposentado do banco do Brasil. Membro do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ANTUNES, Oswaldo Moreira. O credor hipotecário e o concurso singular de credores. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2987, 5 set. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19913. Acesso em: 4 nov. 2024.

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