5. Índice aplicável quando incidir apenas a correção monetária
Da leitura do que foi até aqui averbado, o termo inicial da
incidência dos juros moratórios (a partir da interpelação) não coincide
necessariamente com o início da contagem da correção monetária (desde quando
a obrigação era exigível pelo critério da "medição"). Neste
passo, surge uma última questão a ser dirimida: qual será o índice
aplicável para os períodos em que incide a correção monetária mas não há
incidência de juros moratórios, tendo em vista que a sistemática de do art. 1º
- F da Lei nº 9.494, de 1997, cuja aplicação é aqui
defendida para todo o período de "atraso de pagamento", abrange tanto
a atualização da moeda quanto os juros de mora?
Neste ponto, é valioso notar a semelhança entre a
sistemática do art. 1º - F da Lei nº 9.494,
de 1997, com a natureza da taxa SELIC, que também abrange conjuntamente a
correção monetária e os juros moratórios, como amplamente cediço.
Assim, tudo aconselha que se adote analogicamente o entendimento jurisprudencial referente à aplicação da taxa SELIC em situações desta natureza. Com efeito, entende o STJ que nos períodos de aplicação da taxa SELIC (mas que, em razão de ausência de mora, não poderia haver incidência dos respectivos juros moratórios) deve ser utilizado um índice específico de correção monetária quando se almejar apenas esta. A título de ilustração, confira-se excerto de Ementa de recente julgado da Corte Especial daquele tribunal:
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. DIREITO FINANCEIRO. REQUISIÇÃO DE PEQUENO VALOR. PERÍODO COMPREENDIDO ENTRE A DATA DA ELABORAÇÃO DA CONTA DE LIQUIDAÇÃO E O EFETIVO PAGAMENTO DA RPV. JUROS DE MORA. DESCABIMENTO. SÚMULA VINCULANTE 17/STF. SÚMULA 168/STJ.
(...
9. Entrementes, ainda que a conta de liquidação tenha sido realizada em período em que aplicável a Taxa Selic como índice de correção monetária do indébito tributário, impõe-se seu afastamento, uma vez que a aludida taxa se decompõe em taxa de inflação do período considerado e taxa de juros reais, cuja incompatibilidade, na hipótese, decorre da não incidência de juros moratórios entre a elaboração dos cálculos e o efetivo pagamento, no prazo legal, da requisição de pequeno valor - RPV.
10. Consectariamente, o índice de correção monetária aplicável aos valores constantes da RPV, quando a conta de liquidação for realizada no período em que vigente a Taxa Selic, é o IPCA-E/IBGE (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial), à luz do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução 242/2001 (revogada pela Resolução 561/2007).
(...)
(AgRg nos EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP Corte Especial nº
1.149.594 – RS; STJ, CORTE ESPECIAL; DJe 08/11/2010)
Assim, para eventuais períodos em que incide a correção monetária, mas não há a incidência de juros moratórios, deve ser aplicada a Ufir (de janeiro de 1992 a dezembro de 2000) e o índice IPCA-E/IBGE para o período restante, conforme os fundamentos esposados anteriormente.
6. Conclusão
Ante o exposto, conclui-se:
(i) A Administração Pública, em caso de atraso de pagamento pelos serviços efetivamente prestados, deve realizar a correção monetária destes valores com a incidência, inclusive, de juros moratórios, que devem ser os legalmente estipulados em face de ausência de previsão contratual, desde que estas obrigações não estejam prescritas;
(ii) Para os casos em que há data certa para o pagamento, prevista em contrato, a Administração estará constituída em mora de pleno direito a partir desta data;
(iii) Nos casos em que não houver previsão da data específica do pagamento, os juros moratórios apenas serão devidos a partir da constituição em mora da Administração, o que somente ocorre quando esta é interpelada pelo devedor, devendo tal fato ser verificado em cada caso concreto;
(iv) A correção monetária incide após a verificação pela Administração Pública da efetiva prestação dos serviços, conforme o critério da "medição";
(v) Os índices aplicáveis, englobando tanto os juros
moratórios quanto a correção monetária, são os índices oficiais de
remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, para todo o
período em atraso, inclusive o anterior à alteração legislativa do conteúdo
do art. 1º - F da Lei nº 9.494, de 1997,
realizada em 2009. A remuneração básica das cadernetas de poupança é a Taxa
Referencial – TR e os juros serão de 0,5% ao mês, conforme disposto no art.
7º da Lei nº 8.660, de 1993 e no art. 12 da
Lei nº 8.177, de 1991.
(vi) Para eventuais períodos em que incide a correção monetária, mas não há a incidência de juros moratórios, deve ser aplicada a Ufir (de janeiro de 1992 a dezembro de 2000) e o índice IPCA-E/IBGE para o período restante.
Notas
- JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 13ª ed. 2009. p. 535.
- CHAVES, Cristiano e ROSENVALD, Nelson. Direito das Obrigações. 2ª ed. 2007. p. 410/411.
- GOMES, Orlando. Obrigações. 12ª ed. 1998. p. 169.
- JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 11ª ed. 2005. p. 84/86.
- Publicado no EDJF 1, p. 240, em 22/11/2010.
- Em função do disposto no CC de 1916. Vale lembrar, por oportuno,
que o artigo primeiro da Lei n
º4.414, de 24 de setembro de 1964, dispõe que "A União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as autarquias, quando condenados a pagar juros de mora, por este responderão na forma do direito civil." - Entendimento do STJ consolidado no julgamento dos embargos de divergência 727.842/SP: ‘CIVIL. JUROS MORATÓRIOS. TAXA LEGAL. CÓDIGO CIVIL, ART. 406. APLICAÇÃO DA TAXA SELIC. 1. Segundo dispõe o art. 406 do Código Civil, "Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional".
2. Assim, atualmente, a taxa dos juros moratórios a que se refere o referido dispositivo é a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC, por ser ela a que incide como juros moratórios dos tributos federais (arts. 13 da Lei 9.065/95, 84 da Lei 8.981/95, 39, § 4º, da Lei 9.250/95, 61, § 3º, da Lei 9.430/96 e 30 da
Lei 10.522/02).
3. Embargos de divergência a que se dá provimento". (DJe: 20/11/2008)