Conclusão
Assim sendo, nota-se que a exigência do prévio indeferimento administrativo decorre da idéia geral de que sem existência de pretensão resistida (lide), não é possível o ingresso em juízo. Por isso, no âmbito previdenciário, não é possível caracterizar a lide se o INSS nem sequer teve a possibilidade de aceitar ou recusar previamente o pedido formulado. Embora em determinadas situações seja possível presumir o indeferimento (decurso de prazo de 45 dias sem resposta) ou dispensá-lo (impossibilidade fática de acesso), a regra é a sua exigência;
Logo, partindo-se do pressuposto de que o Judiciário deve exercer primordialmente a função de revisor dos atos administrativos, de ordinário, somente o que tiver sido objeto de prévia apreciação pelo INSS poderá ser objeto de demanda judicial e não será objeto de controvérsia judicial o que já foi reconhecido administrativamente. No caso dos benefícios previdenciários por incapacidade, como regra, somente moléstias analisadas pelo INSS podem ser objeto de processo judicial e requisitos já reconhecidos pela Autarquia (como incapacidade, carência ou qualidade de segurado), são tidos como aspectos incontroversos. Dessa forma, o prévio indeferimento administrativo tem a importante função de delimitar a controvérsia posta em juízo.
Notas
- É nesse sentido, aliás, que deve ser interpretada a Súmula 213 do extinto Tribunal Federal de Recursos: "O exaurimento da via administrativa não é condição para a propositura de ação de natureza previdenciária".
- Como bem salientado por José Antonio Savaris (In: Direito Processual Previdenciário, Curitiba, Juruá, 2009, p.198): "As regras jurídicas se destinam de maneira geral e abstrata a todos os indivíduos e uma nação está perto de fracassar em seus propósitos fundamentais quando o cumprimento espontâneo do ordenamento jurídico se tornar a exceção e a violação dos direitos materiais é a regra. Ao ter de intervir em praticamente tudo para assegurar a boa-fé dos indivíduos e o adimplemento das normas jurídicas, o Judiciário não será poupado dos graves vícios sociais e culturais que dominam sua época. Antes, será profundamente afetado por eles. Será uma peça a mais na engrenagem de iniqüidade social. A justiça sairá torta e a destempo".
- A propósito, cabe destacar trecho de notícia veiculada pelo Caderno TNU nº 6, de junho a agosto de 2009, que se refere ao Processo nº 2007.38.00.719271-6/MG, no qual a Turma de Uniformização Nacional dispensou o prévio requerimento administrativo : "A relatora do processo na Turma, juíza federal Joana Carolina Lins Pereira, votou pelo provimento do pedido fazendo questão de salientar sua sensibilidade à situação peculiar do processo tendo em vista se tratar de juizado itinerante. Além disso, destacou que ‘outros casos envolvendo requerimento administrativo já foram apreciados na TNU e o entendimento que se firmou foi de que, em se tratando de juizado itinerante, seria desnecessário o requerimento administrativo’. Seu voto foi acompanhado por unanimidade. Durante o julgamento, o juiz federal Derivaldo Filho fez questão de falar de sua experiência. ‘No Tocantins, por exemplo, se faz juizado itinerante a mil e tantos quilômetros da capital. Nesses locais, 70 ou 80% dos requerentes de benefício fazem o primeiro contato com o Estado no momento em que a Justiça Federal chega, porque nem certidão de nascimento nem carteira de identidade eles têm’. E concluiu: ‘Se não abrimos mão da exigência do prévio requerimento administrativo nesses casos, inviabilizaremos os itinerantes porque a acessibilidade à Justiça Federal, como também aos órgãos do INSS, não existe na 1ª Região, principalmente no Nordeste e no Norte do país’."
- A propósito, cabe destacar que, embora o prazo previsto na Lei nº 8.213/91 seja superior, o artigo 49 da Lei do Processo Administrativo Federal permite uma prorrogação motivada, totalizando, por isso, até 60 (sessenta dias). Já o prazo de 45 (quarenta e cinco) dias do §5º do artigo 41-A é improrrogável. Além disso, o artigo 49 remete apenas à decisão, enquanto o artigo 41-A já impõe o pagamento da primeira parcela.
- Nesse aspecto, cabe relembrar, todavia, que o Enunciado 79 do FONAJEF iguala a recusa a prévio requerimento administrativo caso haja denúncia perante a ouvidoria da Previdência Social, ao dispor que "A comprovação de denúncia da negativa de protocolo de pedido de concessão de benefício, feita perante a ouvidoria da Previdência Social, supre a exigência de comprovação de prévio requerimento administrativo nas ações de benefícios da seguridade social".
- Mais uma opção aventada por Savaris (op. cit., p. 206) é ação declaratória do direito de receber tutela administrativa com pedido de tutela urgente no sentido de determinar à autarquia previdenciária que, em prazo razoável, sob pena de multa e outras imposições que se apresentarem necessárias, ofereça resposta final ao requerimento de concessão de benefício previdenciário.
- A favor de tal posicionamento, cabe destacar a Súmula 2 das Turmas Recursais do Rio Grande do Sul ("Tratando-se de concessão de prestações previdenciárias, é imprescindível o prévio requerimento administrativo, que deve ser comprovado pela Carta de Indeferimento ou pelo protocolo fornecido pela Administração (no caso de demora injustificável). No caso de cancelamento de prestações previdenciárias, ou de ações de reajustamento, o exame das questões ventiladas prescinde da via administrativa") e o Enunciado 77 do FONAJEF ("O ajuizamento da ação de concessão de benefício da seguridade social reclama prévio requerimento administrativo").
- De todo modo, tal idéia foi enumerada pela Juíza Federal Cláudia Cristina como uma das vantagens do prévio ingresso administrativo: "O ingresso administrativo reúne uma série de vantagens ao segurado e ao juízo (que não tem condições de se transformar em substituto administrativo do INSS para analisar em cada processo e de ofício um sem número de vínculos trabalhistas e atividades desenvolvidas, afora outros requisitos legais, tornando-se regra o ajuizamento de ação concessiva), tais como: a) permitir eventual deferimento da pretensão em tempo inferior ao da sentença judicial definitiva, sendo regra a oposição de recurso; b) se indeferido administrativamente o benefício, haver delimitação do objeto litigioso, passando a ser objeto de instrução e decisão judicial unicamente o ponto duvidoso, e não todos os requisitos do benefício, o que ocorreria por força da ausência dos efeitos materiais da revelia contra o INSS; c) assegurar a fixação da data de início de benefício (equivalente à data do requerimento administrativo); d) interromper a prescrição; e) administrativamente é possível, conforme a necessidade, tomar depoimento de testemunhas, bem como a investigação direta mediante solicitação de pesquisa, com maior flexibilidade do que a produção da prova judicial; f) possibilita que o segurado faça expressa opção para aposentadoria proporcional, caso não haja reconhecimento de todo o tempo de serviço/contribuição, com maior flexibilidade para programação da aposentadoria pelo segurado; g) o judiciário, com sua pouca estrutura, ficaria liberado para decidir os casos realmente litigiosos; h) não se estará negando o acesso ao judiciário, que a qualquer tempo poderá ser provocado" (g.n.) (cf.Savaris, op. cit., pp. 203-4).
- É o que ocorre, por exemplo, em um caso no qual o autor contribuiu por mais de 12 (doze) meses até 01/01/2005, encerrando os seus recolhimentos a partir de então. Em perícia administrativa, o médico do INSS fixa o início da incapacidade na data de entrada do requerimento realizada em 01/01/2009, atestando que o autor permanecerá incapaz por, pelo menos, 6 (seis) meses (alta programada), ou seja, até 01/07/2009.No entanto, o benefício é indeferido por perda da qualidade de segurado. Já em juízo, o autor passa por perícia médica em 01/05/2009, ocasião em que o Perito Judicial atesta que a incapacidade teve início em 01/01/2005, mas não mais subsiste. Ainda assim pode ser concedido o benefício, pois não mais subsiste a controvérsia acerca da qualidade de segurado. O prazo de cessação, porém, deve ser o fixado administrativamente, pois não havia lide nesse aspecto. De todo modo, isso não impede que haja uma revisão administrativa nos termos do artigo 71 da Lei nº 8.212/91.
- É evidente, porém, que a discrepância de queixas não deve ser baseada nos rigores técnicos da medicina. Não deixará de haver interesse de agir, por exemplo, se administrativamente a queixa do autor é identificada como uma artrose e judicialmente como uma artrite reumatóide. Para inexistir interesse de agir, a discrepância deve ser baseada no senso comum, como ocorre quando se alega administrativamente sofrer de dores de coluna e, em juízo, sustenta-se a existência de doença cardíaca.
- "Art. 475-N. São títulos executivos judiciais:
- Aparentemente contraditória, tal prática de se obter de maneira forçada o próprio indeferimento administrativo, mostra-se relativamente freqüente quando se observa que o pagamento de atrasados pela via judicial pode ser mais vantajosa em relação a base de cálculo para honorários.
- "A Previdência Social deve conceder o melhor benefício a que o segurado fizer jus, cabendo ao servidor orientá-lo nesse sentido".
- Nesse sentido já decidiu o Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
No mesmo sentido é o Enunciado nº. 80 dos Fóruns Nacionais dos Juizados Especiais Federais – FONAJEF: "Em juizados itinerantes, pode ser flexibilizada a exigência de prévio requerimento administrativo, consideradas as peculiaridades da região atendida".
(...)
III – a sentença homologatória de conciliação ou de transação, ainda que inclua matéria não posta em juízo; (Incluído pela Lei nº 11.232, de 2005)"(g.n.)
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA. LAUDO PERICIAL. INCAPACIDADE NÃO COMPROVADA. AUXÍLIO-ACIDENTE. REDUÇÃO DA INCAPACIDADE LABORAL. REQUISITOS. COMPROVAÇÃO. HONORÁRIOS PERICIAIS. 1. Nas ações em que se objetiva a aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, o julgador firma seu convencimento, via de regra, com base na prova pericial. 2. Os benefícios decorrentes de redução da capacidade são fungíveis, sendo facultado ao julgador (e, diga-se, à Administração), conforme a espécie de incapacidade constatada, conceder um deles, ainda que o pedido tenha sido limitado ao outro. Dessa forma, o deferimento do amparo nesses moldes não configura julgamento ultra ou extra petita. 3. Comprovada a existência de redução da capacidade para o trabalho, uma vez preenchidos os requisitos previstos no art. 86 da Lei nº 8.213/91, é de ser reconhecido o direito ao auxílio-acidente. 4. Sucumbente, cabe ao requerido arcar com os honorários periciais. Omissão da sentença que se supre. (TRF4, APELREEX 2006.72.01.004044-1, Sexta Turma, Relatora Maria Isabel Pezzi Klein, D.E. 30/10/2008)"