5. O dispositivo legal estadual é inválido, pois seu conteúdo normativo contrasta com os princípios constitucionais da segurança jurídica, proteção da confiança, coisa julgada e isonomia – alcança fatos que ensejaram a condenação por improbidade ou decisão colegiada que antecederam a entrada em vigor da lei estadual – norma prejudicial estatuída com fins punitivos retroativos - violação aos artigos 5º, caput, e XXXVI da Constituição Federal – inconstitucionalidade material – desvalia pontual da Lei em seu artigo 1º, letra "g".
Os princípios constitucionais da segurança jurídica, da proteção da confiança, da coisa julgada e da isonomia também foram violados, porque a lei estadual, no dispositivo em foco, tem nítido conteúdo lesivo e retroativo aos que praticaram atos tidos com ímprobos e/ou foram condenados antes de sua entrada em vigor.
Tomemos como exemplo elucidativo desta inconstitucionalidade, o seguinte caso hipotético: os fatos caracterizadores de improbidade se deram entre 11.10.02 e 11.11.02. Nessa época, demonstra o Direito Positivo, não vigorava qualquer norma nacional ou estadual que emprestasse tal efeito sancionatório – inacessibilidade a cargos em comissão no Poder Executivo de SC - a prática desses atos.
Por outro lado, partamos da hipótese de que houve acórdão em 05.08.09, que confirmou a condenação (ou a decretou). Nessa data também não havia qualquer norma da ordem jurídica nacional ou estadual, anexando tais efeitos a uma decisão judicialem casos de improbidade, seja de primeiro ou de segundo grau de jurisdição cível.
A norma que vigia e vigora para os fatos ocorridos entre 2002 e 2010, regulando a matéria, é a Lei nacional 8.429/92, que nada tratou sobre o tema inacessibilidade a cargos em comissão, nos termos postos pela lei ficha limpa estadual, que só veio à vigência em 20.12.10, data de sua publicação no diário oficial do Estado de SC.
A violação à segurança jurídica e à proteção da confiança, se dá, por que entre a prática dos comportamentos tidos como ímprobos e a edição da lei que deseja valorá-los de forma sancionatória, em termos retroativos, transcorreram 8 anos e dois meses!Ou seja, após a prática consolidada de tais atos (para o bem ou para o mal), surgiu na ordem jurídica estadual regra que "juridiciza fatos passados", para impedir o exercício de liberdades no presente, a liberdade-participação de acesso a cargos em comissão nos poderes constituídos em SC. Surgiu, no presente, norma-sanção para emprestar a fatos passados efeito limitador ao direito de liberdade-participação.
E tendo em conta o tempo de prolação do acórdão, a diferença temporal, embora menor relativamente à data de ocorrência dos fatos, não é menos desautorizante de incidência válida da nova lei estadual: 1 ano e 4 meses do acórdão. Assim, neste particular, a lei estadual estatuir novo efeito anexo para decisões judiciais já prolatadas, constitui flagrante violação à garantia constitucional da coisa julgada.
E toda lei retroativa punitiva ou gravosa à esfera de direitos da pessoa humana, que busca enredar em sua esfera de juridicidade fatos já consolidados ou sentença já dadas, viola a regra da isonomia. Pois é lei que visa regular, retrospectivamente, casos certos, dados sobre pessoas certas, eis que o passado é certo, mas o futuro não.
A generalidade (universo de pessoas) e abstração (universo de casos) da lei são garantias da igualdade (Norberto Bobbio). E como as leis regulam para o futuro, sua abstração e generalidade guarnecem a igualdade de tratamento de todos os cidadãos não só perante as leis, mais no interior de seus comandos normativos. Lei nova que colhe fatos ou sentenças passadas tem endereço certo, pois já sabe que pessoas receberão sua incidência e que casos concretos ocorreram. Sabe quais casos concretos e quais indivíduos afetará, pois dispõe da certeza do passado! Abarca, retroativamente, no plano do concreto e do individual, pessoas e casos determinados, pois já dados, como o de exemplo antes dado. Tais leis, em nosso sistema de direitos, "não tem futuro para aplicação passada!". E futuro só terão se respeitarem o passado!
Lembremos, a propósito, um rico filme sobre o tema (retroatividade gravosa e injusta das leis), de Costa Gravas, Corte Especial de Justiça, que apresenta o que fizeram os nazistas com a França invadida, para retaliarem os ataques que a resistência francesa impingia aos oficias do exército tedesco no centro de Paris: as forças de ocupação alemã rejulgaram, com novas regras e novas penas, presos já detidos e em cumprimento de sentenças... e decretaram a pena de morte, para muitos casos de furto, para os quais o Direito pré-ocupação previa apenas privação de liberdade! Assim, intolerável que em pleno vigor de nossa democracia retornemos às práticas de regimes que lhe são o contrário e/ou a sua própria morte (in)jurídica! [16]
Todavia, ainda que se pudesse dizer o artigo 1º, letra "g", da Lei estadual válido, ele só o seria pró-futuro; só poderia incidir, válida e eficazmente, sobre fatos ocorríveis a partir de sua entrada em vigor - a partir de 20.12.10. Ou seja, a lei ficha limpa estadual só pode ter efeitos prospectivos, no dia imediato e posterior a 20.12.10, ou melhor, seus efeitos devem projetar-se para o futuro; incidirem apenas sobre fatos ocorríveis a partir de sua entrada em vigor, e jamais ex tunc (retroatividade), sob pena de incidência retroativa de leis gravosas em matéria de liberdades e de direito estrito.Com outras letras: os fatos típicos que terão os efeitos de barrar acesso a cargos em comissão, devem se dar no mundo do ser do direito, após a entrada em vigor da lei ficha limpa (20.12.10), nunca antes!
A doutrina juseleitoral de Adriano da Costa Soares [17], discutindo dispositivo similar constante da lei complementar 135/10, fez precisa crítica ao dispositivo federal. Embora trate, em parte, de condenação criminal, ela se aplica, tout court, às condenações de improbidade, não só pelo evidente conteúdo penal não criminal dessas decisões, mas por que em nosso sistema de direito não pode haver leis gravosas retroativas, por força do princípio da irretroatividade das leis.
Suas lições embora discorram mais sobre decisão criminal, se aplicam, igualmente, aos casos de improbidade, como afirmamos. Pois a sentença que aplica penas da Lei 8.429/92 é sentença penal, por que aplica penas restritivas de direitos e de caráter pecuniário. Ela apenas não é sentença criminal, mas é penal cível!
Outra agressão às garantias constitucionais foi o fato da lei ficha limpa alcançar (eleitoral e estadual catarinense) fatos ocorridos no passado, emprestando-lhes consequências novas e inesperadas, não existentes no momento em que foram praticados ou não cogitados nos processos em que foram sentenciados.
Agressão violenta às regras constitucionais da coisa julgada, do direito adquirido, do ato jurídico perfeito, e dos princípios da segurança jurídica e ao princípio da não-surpresa e da lealdade e confiança nos atos de Estado.
Vide caso Jader em que sua renúncia ocorreu há 09 anos (outubro de 2001), sendo que ele já fora eleito, duas vezes, nesse período, para a Câmara dos Deputados!!!
Tal agressão ao direito político de candidatura e ao direito político fundamental de acesso a cargos públicos em comissão, que são liberdades-participação, não tem exemplo similar em nosso Direito Constitucional ou Eleitoral, e "se a onda pegar" em outras ramos do Direito, poderemos pagar multas de trânsitos por fatos não ilícitos no passado, mas tornados tais no presente; pagar tributos por fatos geradores ocorridos há muito; responder, no presente, por condutas taxadas de crime hoje, mas que no passado, quando praticadas, não o eram.
A lei eleitoral, neste aspecto, tinha endereço certo, era alcançar determinados parlamentares (Jader, Roriz, etc – ACM escapou, pois morreu antes...), que nos últimos anos, renunciaram para escapar a processos ético-disciplinares. E a lei ficha limpa estadual, igualmente.
Ora, apuremos casos como esses através das devidas ações penais, ações de responsabilidade por ato de improbidade, procedimentos responsabilizatórios nos Tribunais de Contas, e nas demais vias legais de responsabilização desses agentes. Contudo, utilizar de tais meios o legislador eleitoral o estadual, ainda que com apelo popular, é praticar ato juridicamente inconstitucional e moralmente questionável.
Nenhum cidadão fã de futebol aceitaria que no meio de uma partida, o juiz alterasse, com surpresa a todos, as regras do jogo, para atingir um resultado previamente querido por ele! Nas eleições não pode ser diferente, ainda que com alto ruído da claque.
Embora politicamente correto o fim, juridicamente abjeto o meio! Não podemos tolerar leis com esse casuísmo.
A lei deve ser geral, abstrata e pró-futuro. Pois deve se aplicar a todas as pessoas, indistintamente; prever hipoteticamente uma série relevante de comportamentos vedados, proibidos ou permitidos; e deve valer para o amanhã, para que possamos dela saber com antecedência, e descobrirmos, racionalmente, os caminhos do lícito e/ou do ilícito, avaliando previamente seus custos e riscos, nossos deveres, direitos e responsabilidades." [18]
Há outro ensaio do estudioso Milton Cordova Júnior, cujas conclusões são ricas ao tema (e caso) em análise [19].
A lição mais contundente sobre o assunto, a demonstrar higidez dessa tese de invalidade da lei estadual, vem do voto do Ministro Celso de Mello no RE 630.147/DF, ao analisar a retroatividade da lei complementar n. 135/10, afetante do direito político fundamental de candidatura. Suas conclusões são aplicáveis a demonstrar a retroatividade lesiva da lei ficha limpa estadual ao direito político fundamental de acesso a cargos públicos em comissão [20].
E para referendar a tese de que a lei ficha limpa estadual contraria a coisa julgada, há precedente de 05.05.11, do TSE, Relator Ministro Marco Aurélio, no Agravo Regimental em Recurso Ordinário nº 877-54/RJ: "INELEGIBILIDADE – COISA JULGADA – LEI COMPLEMENTAR Nº 135/2010 – RETROAÇÃO MÁXIMA. Contraria, a mais não poder, a primeira condição da segurança jurídica – a irretroatividade da lei – olvidar, colocar em plano secundário, ato jurídico perfeito por excelência – a coisa julgada –, ante a Lei Complementar nº 135/2010, implementando-se retroatividade máxima. DJE de 4.5.2011."
Para evidenciar transgressão ao princípio constitucional da proteção da confiança, pela lei ficha limpa estadual, basta o afirmado pelo Ministro Luiz Fux do STF, em voto de desempate no RE 633703/MG - Relator Min. Gilmar Mendes [21].
Assim, voltando ao exemplo de laboratório, se o caso julgado em 2009, ainda estiver em fase de admissibilidade de recurso especial, atribuir aos fatos julgados penas diversas da que consta em seu dispositivo, que não incluiu a vedação de acesso a emprego público, é violar a coisa julgada constante do acórdão condenatório (artigo 5º, XXXVI, da CR).
Por todas essas razões nos parece inconstitucional, sem qualquer dúvida, o artigo 1º, letra "g", da Lei estadual n. 15.381/10, por violação aos princípios constitucionais da segurança jurídica, proteção da confiança, coisa julgada e isonomia.
6.O dispositivo legal estadual é inválido, pois seu conteúdo normativo contrasta com os princípios constitucionais da razoabilidade e da ampla defesa – o comando da norma institui limitação suspensiva de direito de participar da coisa pública "sem dia definido para acabar" e onera a defesa dos acusados excessivamente – institui a "inomeabilidade ou inacessibilidade processual" para cargos públicos - violação aos artigos 5º, LIV e LV da Constituição Federal – inconstitucionalidade material – desvalia pontual da Lei estadual no artigo 1º, letra "g".
O dispositivo catarinense em crítica, tal qual o da lei eleitoral, criou uma "pena" sem tempo certo para expiar. Criaram essas normas indefinição quanto ao "dies ad quem" para o cumprimento da reprimenda limitadora da liberdade de se candidatar e da limitadora da liberdade de acessar cargos públicos. O legislador - eleitoral e estadual - estabeleceu uma pena que depende de circunstâncias indefinidas e incertas para acabar. Vejamos:
"Art. 1º Fica vedada a nomeação para cargos em comissão no âmbito dos órgãos dos Poderes Executivo, (...) às pessoas inseridas nas seguintes hipóteses: (...)
g) os que forem condenados à suspensão dos direitos políticos, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, por ato doloso de improbidade administrativa que importe lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito, desde a condenação ou o trânsito em julgado até o transcurso do prazo de 8 (oito) anos após o cumprimento da pena;"
Há um termo inicial, o da condenação colegiada, que vai até o trânsito em julgado. Isso deixa o período de expiação completamente incerto, não é possível antever, com certeza, o termo final. Concluído esse período de inacessibilidade, haverá mais o tempo do cumprimento da pena. Passado este, no dia imediato subseqüente, começara a correr mais oito anos de inacessibilidade.
Vale esta observação crítica: tendo em conta a regra estadual, não se diga que ela não constitui pena, mas "mero requisito" para provimento de cargo em comissão em SC, nos poderes constituídos estaduais. Não é possível se "importar" o inaceitável equívoco propalado pelos apologistas da lei ficha limpa eleitoral, ao dizerem que "inelegibilidade não é pena". Afirmar se inelegibilidade é ou não pena é papel da Ciência Jurídica, da Teoria do Direito. O Direito Penal, o Direito Administrativo e o Direito Eleitoral se beneficiam de seus aportes explicativos e conceituais.
A Teoria do Direito [22] afirma que sanção (pena) é toda conseqüência limitadora de um direito, de uma liberdade, de um patrimônio moral ou material, decorrente de comportamento juridicizado como ilícito por norma de direito. Comportamento que resulta, para a pessoa que o realiza, a incidência de certa carga restritiva ou ablativa de liberdade em sua esfera jurídica. A sanção é o consequente do descumprimento da norma: acarreta pena a quem prática o comportamento vedado pelo direito.
A sanção pode ser de diversa natureza (privativa de liberdade, inibidora de candidaturas ou de cargos públicos, pecuniária, etc). As normas de direitos podem prevê-las através de diferentes formas legislativas (no mesmo dispositivo, comportamento vedado e sanção; ou em dispositivos constantes de leis diferentes - a norma primária [comportamento] e a secundária [sanção]). Para aplicação legítima da sanção sempre haverá um devido processo. Necessária uma autoridade competenciada para julgar a conduta e aplicar ao seu responsável as consequências sancionatórias previstas nas normas jurídicas.
Nos domínios dos direitos políticos existem comportamentos e sanções dispostas em leis diferentes, cujos atos que ensejam ilícitos são reconhecidos em um processo e perante certa autoridade - todavia a sanção é aplicada em outro processo, perante diversa autoridade. Algo demais atípico frente ao devido processo legal tradicional e ao juiz natural que conhecemos.
Exemplo significativo é a inelegibilidade decorrente de rejeição de contas públicas. O órgão constitucional que julga as contas é o Tribunal de Contas, através de processo administrativo. De suas decisões podem advir conclusões sobre comportamento que serão valorados em outro campo da jurisdição - a judicial -, e na justiça especializada - a eleitoral -, em processo judicial de registro de candidatura.
Isso se dá quando o Tribunal de Contas rejeita contas por irregularidade insanável e por decisão irrecorrível do órgão competente, o que, sob o ângulo da LC 64/90 (artigo 1º, letra "g", antes da alteração da LC 135/10), será valorado na justiça eleitoral como causa potente a cercear o exercício do direito político fundamental de candidatura.
Ou seja: na justiça eleitoral se verificará se ocorreu o pressuposto de fato da norma eleitoral, que desautoriza candidatura pela ocorrência de uma ilicitude reconhecida em processo administrativo de contas, mas cujos efeitos restritivos de liberdade apenas se implementam quando houver busca de candidatura em processo judicial eleitoral.
Ora, estaremos sim diante de sanção, medida punitiva, ablativa de direitos, sempre que um ato humano puder ser valorado como ilícito e justificante de uma limitação da liberdade. Tudo baseado em norma de direito, que limita um comportamento, estabelece consequências de sua prática e define uma autoridade para julgá-lo.
O mesmo raciocínio se aplica à compreensão da limitação de acesso aos cargos públicos como pena/sanção. E no caso de laboratório em foco: sanção que tem como pressuposto o reconhecimento de fatos que gerem condenações judiciais de improbidade colegiadas!
Voltemos ao exemplo hipotetizado. Digamos que do acórdão confirmatório da condenação resulta o seguinte conjunto sancionatório: [i] suspensão dos direitos políticos por 05 anos, [ii] proibição de contratar com o poder público por 05 anos e [iii] de receber benefícios fiscais ou creditícios por 05 anos. A esse conjunto de sanções agregar-se-ia uma nova pena ex post facto e após a coisa julgada: a pena de [iv] "inacesso aos cargos públicos".
Essa última pena além de acrescer às restrições cominadas na sentença, tem um tempo maior de "aflição da liberdade" do que todas as demais, que se limitaram ao período de 05 anos. Se transitar em julgado a condenação de 2009, saberá o cidadão condenado, saberá o Judiciário e saberá a sociedade em geral, quando iniciarão as penas qüinqüenais; saberão, com certeza, o termo inicial e o termo final. O termo inicial é com o trânsito em julgado e o final se dará 05 anos após.
Todavia, quanto a pena ex post facto, seu termo inicial é dia 20.10.2010, tendo em conta a condenação de 2009. Todavia, enquanto durar o processamento do recurso especial interposto pelo cidadão condenado, e este exercer "ampla defesa", pela nova regra ocorreu a seguinte mutação ilegítima: a "garantia processual individual de ampla defesa" foi transformada em uma "pena incerta", em nome da moralidade administrativa; há um endurecimento da "lei e da ordem", com o elastecimento sine die da pena.
Do modo como se fixou os efeitos da pena e o período de sua expiação, a ampla defesa, passou de um bem a um mal; de um bônus a um ônus; de um direito a um encargo duro e penoso.
O cidadão X, pela esdrúxula regra estadual, ainda que acredite em sua inocência e na possibilidade de reversão da condenação, agregará ao período expiatório que conta com 05 anos de suspensão dos direitos políticos e mais 08 anos de inacessibilidade, o imensurável tempo para esgotamento de seus recursos de defesa.
Além da incerteza do tempo de duração da pena de inacesso, se houver êxito nas pelejas recursais de X, a expiação vigorará incerta como nau sem rumo. Absolvido, jamais poderá ser compensada no plano dos seus direitos de liberdade política: essa a única certeza diante de pena sem tempo certo para durar - enquanto ela durar, nada vai compensá-lo no futuro, na esperada hipótese de absolvição em recurso!
No caso de laboratório, vejamos o absurdo da normação em abstrato: X tem 45 anos (em nosso suposto exemplo), sabe que ficará 13 anos fora da vida pública, mais o tempo que durar o exercício de seu direito de defesa!?!!?? Pode isso ser razoável?!?!
Isso é desproporcional e abusivo não só pelo tamanho da pena, pelo tempo em que ela passou a vigorar, mais, notadamente, pela completa incerteza quanto ao tempo que vigorará seus efeitos sancionatórios, pela completa incerteza quanto ao seu termo final (que poderá durar 18 ou 20 anos ou mais, não se sabe?!)!
Além dessa normação inconstitucional, desproporcional e irrazoável sob o ângulo do princípio constitucional da proporcionalidade, outra invalidade acoima a norma da letra "g", do artigo 1º, da Lei estadual: a que viola o princípio da ampla defesa. Parte deste raciocínio já foi desenvolvido acima.
E o raciocínio completo é simples: pela nova regra penal e seus efeitos incertos, além da defesa "não ser mais ampla", pois desde a condenação colegiada sem trânsito se aplica pena ao condenado, o seu exercício é um alongamento da pena, uma ampliação de seu sofrimento, o que demonstra que a norma penal anulou o valor e eficácia de uma garantia fundamental processual!
Em verdade o exercício da defesa recursal de estrito direto (ou mediante embargos infringentes, ou declaratórios, ou embargos de divergência, etc), consistirá em verdadeira "carga de ampliação do tempo de pena", enquanto durar a busca do condenado pelo reconhecimento de sua inocência ou pela invalidade de sua condenação. E no caso hipotetizado, sendo ela conquistada, a pena já foi sofrida, expiada (caso X seja privado do cargo em comissão que ocupa), e o mal injusto decorrente de se condenar um inocente, não mais poderá ser reparado... Seu cargo, seus vencimentos, sua vida, seus projetos, sua honra, sua dignidade, jamais serão reparados!
Assim a liberdade participação em foco é solapada pela lei em comento, sem tempo certo, sem condenação definitiva e enquanto tentar o condenado exercer a garantia constitucional da ampla defesa. Isso tudo é flagrantemente inconstitucional, como anota Adriano da Costa Soares. [23]
E no que toca à violação ao princípio da proporcionalidade, vale ler, mais uma vez, o Ministro Celso de Mello no RE 630.147/DF [24], ao analisar a lei complementar n. 135/10, lesiva ao direito político fundamental de candidatura, por ferir a razoabilidade exigida do poder legislativo.
A pena incerta e sua transmutação do direito de defesa em encargo de ampliação da pena ditam, a mais não poder, a completa desproporcionalidade da medida legislativa levada a efeito pelo legislador catarinense, no que toca ao artigo 1º, letra "g" da Lei estadual n. 15.381/10.