No mundo moderno, o homem, desde que nasce e durante toda a existência, faz parte, simultânea ou sucessivamente, de diversas instituições ou sociedades, que em sua totalidade formam o Estado.
O Estado, pode ser conceituado como nos ensina Dalmo de Abreu Dallari, em sua obra Elementos de Teoria Geral do Estado, como a ordem jurídica soberana que tem por fim o bem comum de um povo situado em determinado território, formando aí a sociedade, pois se constitui essencialmente de um grupo de indivíduos unidos e organizados permanentemente para realizar um objetivo comum, que é o de formar uma sociedade moderna e democrática.
E sendo que o Estado pressupõe uma sociedade, não pode existir sem um poder. Poder este, que segundo Dalmo de Abreu Dallari, na mesma obra, é um poder dominante com duas características básicas, o de ser originário e, também, irresistível. Originário porque o Estado tem um poder que lhe é próprio e do qual derivam os demais poderes e irresistível, por ser um poder dominante.
Para que o Estado chegasse a esta estrutura e forma, e ainda ser nominado de Estado Moderno e Democrático, teve suas características delineadas no século XVIII, implicando a afirmação de certos valores fundamentais da pessoa humana, bem como a exigência de sua organização e seu funcionamento do Estado tendo em vista a proteção daqueles valores.
Porém, antes disso, Aristóteles, escreveu um tratado sobre o Estado, o qual deu o nome de Política. O filósofo grego pode ser considerado com justiça o fundador da ciência do Estado e cuja obra já distinguia três poderes: o poder deliberante – deliberava sobre todos os negócios do Estado; o poder executivo – atribuído aos magistrados e exercido com fundamento nas decisões tomadas pelo poder deliberante; e o poder de fazer justiça – que dizia respeito à jurisdição. Então, com sua orientação e estudos, ocorre o início da classificação das formas de governo, na qual o governo cabe ou a um só indivíduo ou a um grupo, ou ainda a todo o povo.
A idéia, segundo a qual a soberania, ou o poder político, reside no povo, é relativamente antiga. Inúmeros são os escritores, sobretudo do século XVI em diante, que a proclamam, como Thomas Hobbes autor de De cive e Levithan, que preconizou que os homens criaram por um contrato a sociedade política e cederam seus direitos naturais a um poder comum o qual se submetem por medo e que disciplina seus atos em benefício de todos, John Locke em Le Gouvernement Civil diz que o Estado é criado para interpretar a lei natural e manter a ordem e harmonia entre os homens. Para ele, o poder deve ser exercido pela maioria e o Estado existe pelo consentimento expresso ou tácito dos indivíduos; expresso, em relação aos que intervieram no contrato social, e tácito para os seus descendentes. Locke faz referência aos três poderes essenciais do Estado, o Legislativo, que em sua obra sustenta a supremacia do poder de legislar, que poderia ser exercido por vários órgãos, mas sempre sujeito ao povo, o Executivo e o Judiciário, fornecendo, assim, a inspiração à famosa teoria de Montesquieu que tratou da sistematização final da repartição do poder, em O Espírito das Leis, dando seqüência à teoria da divisão dos poderes políticos do Estado, sustentando que "um poder limita o outro".
As idéias descritas por estes escritores e outros mais, exerceram forte influência em grandes movimentos político-sociais como a Revolução Inglesa através do Bill of Rights, de 1689, a Declaração de Independência das treze colônias americanas em 1776 e, principalmente, na Revolução Francesa que teve seus princípios difundidos na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, as quais perduram até hoje.
Surge aí a aplicação dos poderes, fato este relatado na Declaração da Virgínia que consubstanciava as bases do direito do homem, os Poderes Executivo e Legislativo do Estado deveriam ser separados e distintos do Judiciário, divisão esta utilizada pela Declaração Francesa dos Direitos e do Cidadão.
Assim, de acordo com o artigo 2º da Constituição Federal de 1988, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário são poderes independentes entre si com suas funções típicas atribuídas a cada um: a de legislar, executar e julgar.
Já dizia John Locke que o Poder Legislativo é o órgão supremo do Estado, mas tem poderes limitados pelos direitos naturais dos cidadãos, pois a base do governo é o consentimento dos cidadãos.
Celso Ribeiro Bastos em Curso de Direito Constitucional, explica que a atividade típica do Legislativo é de legislar ele é o poder encarregado da elaboração de normas genéricas e abstratas que se denominam leis. São elas atos que, oriundos do Legislativo e produzidos segundo procedimento descrito na Constituição, inovam originariamente a ordem jurídica.
Já Michel Temer em sua obra Elementos do Direito Constitucional, relata que ao lado das atividades típicas, exerce também o Legislativo, em caráter secundário, funções atípicas como a de administrar e julgar.
Administra quando dispõe sobre sua organização, fiscaliza os atos do Poder Executivo de acordo com o artigo 49, inciso X, da Constituição Federal e também fiscaliza as finanças e orçamentos de acordo com o artigo 70.
Ele julga quando decide a respeito dos crimes de responsabilidade do Presidente da República, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal e do Procurador-Geral da República, bem como dos Ministros de Estado nos crimes de responsabilidade conexos com aqueles praticados pelo Chefe do Executivo.
José Afonso da Silva em Curso de Direito Constitucional Positivo, ensina que o Poder Legislativo tem funções típicas e atípicas, como já elencado anteriormente.
Tais funções de competência da União, são exercidas pelo Congresso Nacional composto pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, que possuem órgãos internos destinados a ordenar seus trabalhos, sendo integrados respectivamente por Deputados Federais e Senadores, tais funções, não são exercidas somente pela União Federal, mas também, pelas demais entidades estatais como Estados, Distrito Federal e Municípios.
Faz-se relevante salientar que, de acordo com o artigo 59 da Constituição Federal de 1988, o Congresso tem como atribuição elaborar emendas à Constituição, leis complementares, leis ordinárias, leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos e resoluções.
Desempenha também, atribuição de grande relevância na fiscalização e controle da Administração das instituições políticas democráticas, controle esse que, de acordo com o artigo 58 da Magna Carta, determina a criação de Comissões permanentes e temporárias, tratando mais especificamente em seu § 3º das Comissões Parlamentares de Inquérito que têm poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, sendo um meio para alcançar o melhor exercício das funções constitucionais de controle.
As Comissões Parlamentares de Inquéritos possuem o poder de investigação que é delimitado pelo poder de atuação da Casa Legislativa a qual pertence, não podendo ter maiores poderes dos que os da Casa criadora. Não é portanto ilimitado encontrando no âmbito da Constituição sua limitação.
Percebe-se com isso, que o Poder Legislativo através das Comissões Parlamentares de Inquérito, realiza missão político-fiscalizadora dos atos praticados pelo Poder Executivo, a fim de que este não venha a ferir nenhum dos princípios da administração pública direta e indireta estabelecidos no artigo 37, caput da Carta Fundamental.
Na atualidade política do Brasil podemos constatar desrespeito a estes princípios constitucionais, comprovado pela grande quantidade da utilização deste procedimento.
Apesar de ser utilizada constantemente para fiscalizar assuntos de grande polêmica, fica muitas vezes em questão os seus limites, ou seja, até onde pode ser implementada uma Comissão Parlamentar de Inquérito sem ferir os direitos e garantias individuais dos cidadãos envolvidos na investigação.
A estrutura do controle político do Poder Legislativo, suas funções, o mecanismo da Comissão Parlamentar de Inquérito, os seus procedimentos, requisitos, finalidades e, principalmente, limites são critérios voltados para abordar de forma mais clara e direta este instrumento de controle e fiscalização. Segundo José Alfredo de Oliveira Baracho, em Teoria Geral das Comissões Parlamentares, a comissão investiga e estabelece mecanismo de controle em qualquer de seus níveis, seja, federal, estadual ou municipal, sobre pessoas, instituições, empresas ou órgãos.
O que se percebe é que a Constituição da República, ao outorgar às Comissões Parlamentares de Inquérito "poderes de investigação próprios das autoridades judiciais" (artigo 58, § 3º), claramente delimitou a natureza de suas atribuições institucionais, restringindo-as, unicamente, ao campo da indagação probatória, com absoluta exclusão de quaisquer outras prerrogativas que se incluem, ordinariamente, na esfera de competência dos magistrados e Tribunais, inclusive aquelas que decorrem do poder geral de cautela conferido aos juizes.
Então, a competência do Poder Legislativo é limitada aos atos sujeitos à sua fiscalização e legislação, praticados no âmbito de sua circunscrição, pois de acordo com Celso Ribeiro Bastos, em Comentários à Constituição do Brasil, o poder convocatório das comissões sofre limitações, pois não se pode compelir um particular a comparecer diante dela para colaborar nas investigações de um determinado fato, deve sim, convidá-lo. Também não será possível que a legislação crie algum tipo de sanção pelo seu não-comparecimento.
A presente pesquisa, visou questionar e analisar as funções, os procedimentos adequados para que o Poder Legislativo institua as Comissões Parlamentares de Inquérito, determinando ainda, quais os limites e poderes que tem para garantir sua eficácia.
Buscou elucidar com maior clareza a Comissão Parlamentar de Inquérito, que é utilizada por representantes do povo (membros do Poder Legislativo) para poder averiguar, investigar e fiscalizar irregularidades dos demais Poderes integrantes do Estado.
Também foi seu objetivo detectar as funções de Controle Político de Poder Legislativo e verificar os procedimentos adotados para tanto.
Tratou de determinar, assim, quais os limites e poderes do Poder Legislativo frente às Comissões Parlamentares de Inquérito!
1. PODER LEGISLATIVO
O Poder Legislativo teve a sua origem na Inglaterra. Formou-se durante a Idade Média quando representantes da nobreza, do clero e do povo procuraram limitar a autoridade absoluta dos reis, tomando como base o ensinamento doutrinário de Montesquieu, um dos pioneiros em dividir a função estatal, criando a teoria da separação dos poderes e propondo: "um sistema em que cada órgão desempenhasse função distinta e, ao mesmo tempo, que a atividade de cada qual caracterizasse forma de contenção da atividade de outro órgão do poder".
Tal poder consiste em fazer, emendar, alterar e revogar as leis. Ele é exercido pelo Congresso ou Parlamento.
Há países em que o Poder Legislativo se constitui num único órgão ou câmara legislativa, esse sistema é conhecido como sistema unicameral. Porém, existe outro sistema, segundo o qual o Poder Legislativo se compõe de dois órgãos ou câmaras legislativas.
Este sistema que foi o adotado no Brasil no âmbito federal, conhecido como bicameral, pois nos Estados e Municípios o sistema legislativo é unicameral.
Este sistema já era previsto em nossa primeira Constituição Republicana (1891) no artigo 16, § 1º, que adotou a denominação de Congresso Nacional, termo empregado, tradicionalmente, pelos países que adotam o regime presidencialista, composto por duas casas: a Câmara dos Deputados e o Senado Federal. Esta denominação tornou-se tradicional em nossa sistemática constitucional, com exceção da Constituição de 1937, que usou o termo "Parlamento Nacional".
É o que preleciona Michel Temer:
"O bicameralismo, no particular, atende à forma de Estado federal positivada pelo constituinte. É que são duas as Casas legislativas componentes do Congresso Nacional, órgão que desempenha a função legislativa: a Câmara dos Deputados e o Senado Federal. Na primeira se encontram os representantes do povo brasileiro (art. 45 C.F.); na segunda, os representantes dos Estados e do Distrito Federal (art. 46 C.F.)".
Assim, tanto o povo brasileiro quanto os Estados têm representação no órgão Legislativo.
O Poder Legislativo guarda a característica de ser o órgão representativo, por excelência, da soberania popular com o traço marcante da representatividade, da eletividade e, também, do ponto de vista jurídico formal, do seu imediatismo à Constituição, já que se subordina a determinados princípios constitucionais e legais, obedecendo ao chamado princípio da hierarquia das normas constitucionais ou da supremacia da Constituição.
1.1 Disposições Gerais
As Casas legislativas componentes do Congresso Nacional são a Câmara dos Deputados e o Senado Federal.
José Afonso da Silva relata que "a Constituição não fixa o número total de Deputados Federais, deixando isso e a representação por Estado e pelo Distrito Federal para serem estabelecidos por lei complementar...".
De acordo com o disposto no artigo 45 da Magna Carta, os deputados são os representantes do povo, ou seja, a representação é do povo brasileiro, esteja em Estado, Território Federal, Distrito Federal ou Município. Então, para estabelecer o número de deputados federais a serem eleitos por Estado, tomou-se como referência a população, como se verifica no artigo 45, § 1º da Constituição Federal.
A lei complementar é que estabelece, para cada legislatura o número de Deputados que representará o povo brasileiro de cada Estado. Nenhum Estado, porém, terá mais de 70 (setenta) ou menos de 08 (oito) deputados, sendo a legislatura de quatro anos.
Já o artigo 46 da Constituição Federal, dispõe que no Senado estão os representantes dos Estados e do Distrito Federal. Os pontos referenciais para a eleição são os Estados e o Distrito Federal.
A paritariedade da representação se assenta no princípio federativo e visa manter o equilíbrio das unidades federadas por força da participação parificada de todos os Estados nas decisões nacionais, sejam aquelas de competência privativa do Senado, seja naquelas de que participa na condição de componente do Congresso Nacional. Aqui, a legislatura é de 08 (oito anos), havendo renovação de 04 (quatro) em 04 (quatro) anos, alternadamente, por um e por 2/3 (dois terços), de acordo com os art. 46, § § 1º e 2º da Magna Carta.
1.2 Função Típica
A atividade do Legislativo é tipificada pela produção de normas geradoras de direitos e obrigações. Legislar é sua atividade típica.
Abrange ainda, este Poder de acordo com o instituído pela Constituição Federal:
"Art. 59. O processo legislativo compreende a elaboração de:
emendas à Constituição;
leis complementares;
leis ordinárias;
leis delegadas;
medidas provisórias;
decretos legislativos;
resoluções."
Para Celso Ribeiro Bastos:
"Ao Legislativo cabe essencialmente, respondendo às aspirações do povo, realizar por meio de normas subcosntitucionais as grandes metas e fins almejados pela Constituição, com os limites que esta mesma impõe ao Estado em benefício do cidadão.
A atividade legislativa é insubstituível porque através dela opera-se a renovação permanente da ordem jurídica, adaptando-se as leis aos novos reclamos das realidades sócio-econômica e política".
1.3 Função atípica
Enquanto que a função típica do Legislativo é a elaboração de leis, ele também exerce funções de outra natureza, tais como as administrativas, as de cooperação com o Poder Executivo e, até mesmo, as investigatórias, voltadas a apurar os desvios cometidos pelos membros componentes dos órgãos públicos.
Não bastando, exerce também, o mister fiscalizatório de acordo com o artigo 49, inciso X, da Constituição Federal que preleciona ser competência, "fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo, incluídos os da administração indireta".
Tem ainda, o Poder Legislativo, duas competências fiscalizadoras que são por sua vez, as seguintes: uma ampla e geral que permite indagar e questionar a respeito de todos os atos do Poder Executivo, inclusive os da administração indireta. E a outra, é a competência fiscalizadora prevista no artigo 70 da Constituição brasileira que cuida da fiscalização financeira e orçamentária, sendo ainda, o Congresso Nacional, auxiliado pelo Tribunal de Contas da União.
Para Orlando Soares:
"A nova Carta Política estabeleceu disposições análogas, estendendo a obrigação de prestação de contas a qualquer pessoa física ou entidade pública que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária (art. 70, parágrafo único)".
Desta forma, poderá ter acesso à máquina burocrática do Poder Executivo para conhecer o ato praticado na sua intimidade, podendo servir o processo de fiscalização de base para a convocação de Ministros de Estado e outros agentes do Poder Executivo para prestarem esclarecimentos sobre assuntos determinados.
Tem então, o Poder Legislativo, as funções atípicas, funções estas que são exercidas em caráter secundário, o qual acabam por fazer nascer a idéia de atipicidade.
É o que nos relata Luís Roberto Barroso, em seu parecer:
"Desde suas origens, integram a substância da atuação do Parlamento funções de tríplice natureza: legislativa, por certo, mas também a representativa e a fiscalizadora. Aliás, com a crescente hegemonia do Poder Executivo no processo legislativo - pela iniciativa reservada, pela sanção e veto, e pela edição de atos com força de lei - a ênfase da atuação do Legislativo tem recaído, efetivamente, na fiscalização, isto é, na investigação e no controle do Poder Público".
Enfatizando o assunto, temos Hely Lopes Meirelles que ensina:
"Os constituintes de 1988 fixaram o entendimento, já pacífico, de que as atribuições do Poder Legislativo não são só de fazer leis, mas também de inspecionar os administradores, fiscalizar os serviços públicos, observar o modo como as leis são executadas e mais: investigar, no sentido mais amplo a ocorrência de fato determinado, de interesse público, apontando os infratores ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal, atingindo a esfera da Administração Pública em geral, e envolvendo seus agentes. Justificam-se essas investigações para transparecer uma das atribuições precípuas do Poder Legislativo: fiscalizar as atividades dos administradores ou de tantos quantos gravitem em torno do interesse público".
2. CONCEITO E ORIGENS
2.1 Conceito das Comissões Parlamentares de Inquérito
Mister é assinalar a importância política do Poder Legislativo a defluir da tríplice função que a Constituição lhe cometeu, a saber, a função legislativa, a função representativa e a função fiscalizadora, esta uma das mais expressivas atribuições institucionais do Legislativo. Daí, a fiscalização dos atos do Poder Executivo pelo Legislativo traduz missão inerente à própria essência do Parlamento.
Para José Alfredo de Oliveira Baracho, o Legislativo tem como missão:
"Por força das disposições constitucionais e da teoria do Estado Democrático, está ligada à sua responsabilidade política de vigilância sobre os fatores que contribuem para que a máquina do Estado não seja objeto de negligência, desonestidade, desmandos, incompetência e prepotência. O Poder Legislativo dispõe de instrumentos hábeis para o saneamento das atividades administrativas: as Comissões Parlamentares de Inquérito e os Tribunais de Contas (...) A faculdade de investigação das Câmaras que formam o Legislativo é um privilégio ou prerrogativa essencial para que este órgão cumpra eficazmente suas funções".
Sem prejuízo das demais funções fundamentais, vê-se aqui a de controle ou investigação dos atos do Executivo, dos atos da Administração Pública Federal, Estadual e Municipal ou dos atos do setor privado local que, direta ou indiretamente, têm influência na vida em sociedade e que por este motivo merecem apuração no interesse da comunidade.
Esta apuração é garantida na Constituição Federal de 1988 que dispõe:
"Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:
(...)
X – fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer de suas casas, os atos do Poder Executivo, incluídos os da administração indireta".
O Congresso Nacional e suas Casas – Câmara dos Deputados e Senado Federal – desempenha as atividades investigatórias através de comissões permanentes e temporárias, constituídas na forma prevista nos respectivos Regimentos Internos limitadas aos preceitos para sua criação dispostos no artigo 58 da Constituição brasileira.
As chamadas Comissões Parlamentares de Inquérito são de compreensão muito ampla e se destinam não só à apuração de fatos que merecem repressão legal, como também ao exame de problemas de importância para a vida econômica ou social do País.
Portanto, de forma concisa e específica, essas comissões de inquérito são garantidas e tratadas diretamente na Constituição Federal que relata:
"Art. 58 . O Congresso Nacional e suas Casas terão comissões permanentes e temporárias, constituídas na forma e com as atribuições previstas no respectivo regimento ou no ato de que resultar sua criação.
(...)
§ 3º. As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores".
As Comissões Parlamentares de Inquérito, também conhecidas pela sigla CPI’S são organismos que desempenham papel de grande relevância na fiscalização e controle da Administração, a ponto de receberem, pela Constituição de 1988, poderes de investigação próprios das autoridades judiciárias, além de outros previstos nos regimentos internos da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.
Para Pinto Ferreira:
"Comissão de Inquérito é a comissão nomeada por uma Câmara, composta de membros desta, e que agem em seu nome para realizar um inquérito ou investigação sobre determinado objeto. Este objeto pode ser um determinado fato ou conjunto de fatos alusivos a acontecimentos políticos, a abusos ou ilegalidades da administração, a questões financeiras, agrícolas, industriais etc., a tudo que interessa à boa atividade do Parlamento".
Trata-se de uma investigação especial e transitória levada a cabo por integrantes do próprio Poder Legislativo, com o fito de apurar fato ou fatos certos, isto é, fatos determinados, definidos, concernentes a uma gama de atividades de interesse do parlamento, visando sempre o bem-estar da coletividade.
É ainda, uma investigação especial porque seus atos são praticados por agentes políticos, integrantes do Poder Legislativo (Senadores, Deputados Federais, Deputados Estaduais e Vereadores) e transitória porque seus atos não se perpetuam no tempo, ao revés, devem terminar em prazo certo, fixado antecedentemente à criação da comissão. Exatamente por isso são consideradas pelo Regimento Interno da Câmara e do Senado Federal como comissões temporárias, ao lado das comissões: especiais, externas e internas.
2.2 Origem das Comissões Parlamentares de Inquérito
No dizer de Hely Lopes Meirelles:
"As origens das comissões de investigação legislativa remontam ao século XVII, quando o Parlamento Inglês, descontente com a conduta de Lundy na direção da guerra contra os irlandeses, nomeou, em 1689, a histórica Select Commitee, que concluiu pela traição daquele militar, levando-o a julgamento e condenação pela Coroa".
Segundo o mesmo autor, a prática das investigações legislativas é comum em todos os Estados de Direito, sendo conhecida nos Estados Unidos por "Congressional Investigations", na Itália por "Commissioni d’Inchieste Parlamentari" e na França por "Commission d’Enquête Parlamentaire".
Tem-se indícios de que o uso das investigações por meio de Comissões Parlamentares de Inquérito iniciou-se na Inglaterra, um século antes, mais exatamente no ano de 1571.
Há quem tenha visto, no entanto, seu início no século XIV, de acordo com os estudos de Rogério Lauria Tucci.
Em nossa esfera jurídica constitucional, este poder de investigação foi previsto inicialmente, na Constituição Política do Império, de 25 de março de 1824.
O conhecimento e a investigação de delitos individuais cometidos pelos membros da Família Imperial, ministros de Estado, conselheiros de Estado, senadores era prevista pelo artigo 47, I , da Carta Imperial bem como conhecer da responsabilidade dos secretários e conselheiros de Estado. Era garantido a todo cidadão direito de apresentar por escrito ao Poder Legislativo e ao Poder Executivo, reclamações, queixas ou petições e até expor qualquer infração à Constituição, com pedido de responsabilidade dos infratores junto à autoridade competente (artigo 179, inciso XXX).
Somente com a Carta Brasileira de 1934 é que as Comissões Parlamentares de Inquérito passaram a fazer parte do arcabouço constitucional brasileiro podendo ser constituídas para investigação de sobre fato determinado:
"Art. 36. A Câmara dos Deputados criará comissões de inquérito sobre fatos determinados, sempre que requerer a terça parte, pelo menos, dos seus membros".
No tocante ao Senado, o artigo 92, § 1º, VI, outorgava poderes à seção Permanente da Câmara Alta para "criar comissões de inquérito sobre fatos determinados observando o parágrafo único do art. 36".
Salvo a Constituição de 1937, as demais também trataram das Comissões Parlamentares de Inquérito. A Constituição de 1946 a tratou em seu artigo 53 e a de 1967 no artigo 39, apoiada na Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969.
A atual Constituição Federal trata do assunto em seu artigo 58, § 3º.
Os artigos 145 e seguintes do Regimento Interno do Senado Federal tratam das Comissões Parlamentares de Inquérito do Senado, enquanto os artigos 35 e seguintes do Regimento Interno da Câmara dos Deputados cuidam das Comissões Parlamentares de Inquérito da Câmara.
Não podemos esquecer ainda que no plano federal aplica-se a Lei nº 1.579, de 18 de março de 1953 que rege as Comissões Parlamentares de Inquérito.