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Os crimes cometidos pelo empregado contra o empregador e o sobrestamento da ação trabalhista

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A CLT não cuida dos efeitos da sentença criminal no processo trabalhista. Portanto, devem ser utilizado o sistema processual comum, permitindo que o juiz suspenda o processo até que se pronuncie a justiça criminal, a fim de se evitar contradições e injustiças.

RESUMO

A evolução das relações econômicas tem exigido do empregador cada vez mais, um comportamento de transferência aos seus empregados das atividades e do controle dos processos produtivos, permitindo o manuseio de ativos sigilosos, acesso direto à clientela, realização de operações financeiras de elevada monta (em nome do empregador ou de terceiros), dentre outras atividades. Neste cenário, tem sido cada vez mais frequente a ocorrência de práticas criminosas/delituosas por parte do empregado contra o empregador ou contra terceiros, em razão das informações as quais o empregado tem acesso em função do exercício de suas atividades. Neste cenário, com a descoberta da fraude com a demissão do funcionário por justa causa, tem sido frequente o ajuizamento de ação trabalhista pelo mesmo, objetivando a reversão da rescisão por justa causa, a indenização por danos morais decorrente da imputação do ato inquinado de criminoso e o pagamento de eventuais encargos trabalhistas ou previdenciários não recolhidos durante a contratualidade. Em que pese reconhecer-se a autonomia entre as jurisdições civis, penais e trabalhistas, entende-se que sempre que houver processo-crime em andamento, a respeito dos mesmos fatos discutidos no processo trabalhista,  é recomendável aguardar-se o pronunciamento da Justiça Criminal, para se evitar contradições, beneficiando-se, inconscientemente, o autor criminoso, premiando suas práticas ilegais e prejudiciais com a reversão da justa causa ou mesmo a indenização por danos morais.

Palavras chave: Ação trabalhista. Sobrestamento. Crimes. Coisa Julgada.


1. INTRODUÇÃO

A evolução das relações econômicas tem ocorrido em um ambiente de velocidade e complexidade. Tal fato tem impactado fortemente as relações de trabalho, exigindo do empregador, cada vez mais, um comportamento de transferência aos seus empregados, das atividades e do controle dos processos produtivos.

Neste processo de delegação, o empregador se vê obrigado a permitir ao empregado manusear ativos sigilosos (fórmulas, desenhos industriais, esquemas, informações estratégicas), acessar diretamente a sua clientela, realizar operações financeiras de elevada monta (em nome do empregador ou de terceiros), dentre outras atividades.

Neste cenário, tem sido cada vez mais frequente a ocorrência de práticas criminosas/delituosas por parte do empregado contra o empregador ou contra terceiros, ante as informações que o empregado tem acesso, em função do exercício de suas atividades.

No presente artigo busca-se analisar as consequências destas práticas perante a legislação trabalhista.

Inicialmente, traz-se exemplo de crimes praticados pelo empregado e se analisa as condutas a serem praticadas pelo empregador e os reflexos destas atitudes perante a legislação trabalhista.

A seguir, analisa-se a questão da autonomia das jurisdições e efeitos da coisa julgada no juízo criminal e os reflexos da coisa julgada criminal na Justiça do Trabalho, especificamente no que se refere ao sobrestamento do feito trabalhista em razão de tramitar processo criminal decorrente dos crimes praticados na vigência do contrato de trabalho, seguidas das considerações finais e referências.


2. DA PRÁTICA DE ATOS CRIMINOSOS NA VIGÊNCIA DO CONTRATO DE TRABALHO

Como antes mencionado, tem sido frequente a ocorrência de práticas criminosas/delituosas por parte do empregado contra o empregador ou contra terceiros, em razão das informações as quais o mesmo tem acesso em função do exercício de suas atividades.

Os exemplos são inúmeros. Um deles, bastante comum, é o do empregado que, atuando no departamento financeiro, apropria-se de volume financeiro do empregador ou de terceiros, cometendo o crime de apropriação indébita – art. 168 do Código Penal. Outro, é o do empregado ou conjunto de empregados, que se apropria de bens imateriais da empresa para empregá-los em empreendimento próprio, cometendo crime contra a propriedade industrial - Lei 9.279/1996 ou, ainda, dependendo do caso concreto e da interpretação, o crime de furto de propriedade imaterial – Código Penal art. 155.

Nestes casos, se o empregador desejar seguir o que preceitua a lei e o que recomenda a boa prática jurídica, este praticará, no mínimo, as seguintes condutas:

- cercar-se-á do conjunto de provas suficiente para comprovar a autoria do ato criminoso/delituoso;

- efetuará a comunicação do fato à autoridade policial;

- procederá à rescisão do contrato de trabalho do empregado, com justa causa, nos moldes do art. 482 CLT;

O empregador poderá, também, ingressar com ação de indenização contra o empregado, objetivando o ressarcimento pelos danos materiais e/ou morais decorrentes do ato ilícito (criminoso/delituoso) em questão.

Diante do fato, a tendência é que o empregado, como medida de retaliação, ingresse com ação trabalhista, objetivando a reversão da rescisão por justa causa, a indenização por danos morais decorrentes da imputação do ato inquinado de criminoso e o pagamento de eventuais encargos trabalhistas ou previdenciários não recolhidos durante a contratualidade.

Configurado este cenário, estaria o empregador diante da possibilidade de experimentar o desprazer de ser condenado a efetuar o pagamento de eventuais verbas trabalhistas a funcionário que cometeu prática criminosa contra si, causando-lhe danos? Estaria o mesmo diante da possibilidade de ter a rescisão do contrato de trabalho revertida e de ser condenado ao pagamento de indenização, mesmo com inquérito policial/ação penal em curso contra o empregado, versando sobre os mesmos fatos?


3. AUTONOMIA DAS JURISDIÇÕES E EFEITOS DA COISA JULGADA NO JUÍZO CRIMINAL

A harmonização das decisões criminais e civis sobre o mesmo fato não é tarefa fácil. Há sistemas que optam pela total independência das jurisdições, sem influência nenhuma da sentença criminal sobre o juízo cível; as que estatuem que a sentença criminal faz coisa julgada no cível e, ainda, sistemas que procuram harmonizar as decisões, para evitar contradições (Dias, 1979, v. 2:522).

Segundo VENOSA (2004: 162) o ordenamento jurídico pátrio adota a independência de jurisdições, com a ação civil e ação penal autônomas, com certa mitigação, porque subsiste relacionamento entre ambas as esferas. A jurisdição, como função decorrente da soberania, é uma só. A divisão em justiça civil e penal dá-se mais por facilidade de organização, para tornar mais simples o seu exercício. Sob o prisma da soberania, a jurisdição é una e indivisível. Como regra, a administração da justiça deve zelar para que não coexistam decisões contraditórias ou antagônicas.

Wagner D. Giglio (2000:43/44), vai mais além e aborda especificamente a relação de autonomia entre os Juízos Criminal e Trabalhista:

Ora, é bem de ver que se fosse possível a uma Corte taxar de injusto (e não meramente ilegal, o que pode acontecer, freqüentemente) o mesmo ato classificado por outro Tribunal de justo, desapareceria a segurança e o Poder Judiciário seria desacreditado, subvertendo-se toda a ordem jurídica. E isso acarretaria conseqüências altamente danosas à própria sobrevivência da sociedade.

Foi para evitar esses efeitos danosos que se coordenaram as conseqüências, sobre um ramo do Direito, dos pronunciamentos de outro, harmonizando-se, assim, as manifestações dos vários órgãos jurisdicionais.

Cumpria respeitar, outrossim, a independência dos diversos tribunais, pois, a prevalecer sempre o pronunciamento de um deles, cairia por terra a divisão administrativa da Justiça: os outros tribunais estariam sujeitos a seguir a orientação do primeiro que, assim sendo, seria o único, dando a palavra definitiva e irrecusável sobre qualquer assunto incidentalmente ventilado em processo sob sua jurisdição.

Enfim: os diversos órgãos judicantes são autônomos, mas devem funcionar em harmonia, coordenados. Cada um deles examina livremente a matéria de sua especialidade, mas a lei procura evitar que haja pronunciamentos contraditórios sobre questões fundamentais de direito.

Ora, a Justiça do Trabalho teve sua autonomia ratificada pela Constituição Federal de 1946, que a incluiu entre os órgãos do Poder Judiciários. Assim sendo, não está subordinada aos pronunciamentos de qualquer outro órgão judicante e, em regra, os julgados da Justiça Criminal não obrigam a Justiça do Trabalho a se pronunciar no mesmo sentido.

Acontece, porém, que a Justiça Criminal decide questões relevantes, de interesse  geral para toda a sociedade, pois trata de problemas que dizem  respeito à liberdade e à própria vida dos jurisdicionados. Por isso, o Direito Penal tem princípios rígidos e o Processo Penal usa métodos rigorosos, na apuração dos fatos, uma vez que deve exigir um maior grau de certeza do que nos demais órgãos jurisdicionais. Compreende-se, por isso, que em certas hipóteses fundamentais predomine o pronunciamento da Justiça Criminal, obrigando o Juiz Trabalhista a se manifestar no mesmo sentido.

Seria  rematado absurdo,  a contrariar aqueles princípios já anunciados, tendentes a coordenar as manifestações dos órgãos judicantes, concluir a Justiça do Trabalho, por exemplo, pela inexistência de improbidade do empregado que, pelos mesmos fatos, tenha sido condenado, no crime, por furto contra seu empregador.

Nada impede, porém, que a Justiça Trabalhista entenda configurada justa causa para dispensa do empregado, pelos mesmos fatos que ensejaram processo-crime em que, a final,  houve absolvição do réu, sob fundamento de que não se caracterizou o ilícito penal. Até pelo contrário: é normal que assim aconteça, uma vez que o conceito de justa causa tem contornos mais elásticos do que os do crime, sendo menos rigorosos, via de conseqüência, os elementos que caracterizam o motivo justificador do despedimento. Um  mesmo ato do empregado pode configurar justa causa e não chegar a caracterizar um crime.

Apesar da autonomia jurisdicional, diversos são os dispositivos legais que tratam dos efeitos da coisa julgada criminal no cível.

O primeiro dispositivo a ser citado é o art. 935 do Código Civil, o qual versa sobre a independência da responsabilidade civil em relação a criminal, impondo, contudo, limitação ao questionamento, no juízo cível, sobre a existência do fato ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.

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Segundo Nery e Nery (2006:325) "quando as questões da existência do fato (materialidade) e de quem seja o seu autor (autoria) estiverem decididas no processo penal, essas matérias se projetam no processo civil. Nessa parte há influência da coisa julgada penal no processo civil".

Já o art. 91, I, do Código Penal estabelece que um dos efeitos da condenação criminal é tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime. Assim, condenado o réu no âmbito criminal, têm de indenizar a vítima dos danos causados pelo crime, sem poder discutir a justiça da decisão criminal na esfera civil.

Também os arts. 63 e seguintes do Código de Processo Penal, Título IV, Da Ação Civil, versam sobre os efeitos da sentença criminal no cível:

Art. 63. Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução no juízo cível, para efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros.

Art. 64. Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, a ação para ressarcimento do dano poderá ser proposta no juízo cível, contra o autor do crime e, se for o caso, contra o responsável civil.

Parágrafo único. Intentada a ação penal, o juiz da ação civil poderá suspender o curso desta, até o julgamento definitivo daquela.

Art. 65. Faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.

Art. 66. Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato.

Importante mencionar, ainda, o art. 74 da 9.099/99, o qual refere-se a homologação de acordo em processo criminal sob sua égide, dispõe:

Art. 74. A composição dos danos civis, reduzida a escrito e homologada pelo Juiz mediante sentença irrecorrível, terá eficácia de título a ser executado no juízo civil competente.

Estes são os principais efeitos da coisa julgada criminal no cível.


4. EFEITOS DA COISA JULGADA CRIMINAL NO JUÍZO TRABALHISTA, AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL NA LEGISLAÇÃO TRABALHISTA E DA APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO DIREITO COMUM E DIREITO PROCESSUAL COMUM:

Nos casos de omissão da legislação trabalhista, recorre-se ao art. 769 da Consolidação das Leis do Trabalho, o qual determina a aplicação do direito processual comum como fonte subsidiária do direito processual do trabalho.

Para Valentin Carrion (2006: 584)

ao processo laboral se aplicam as normas, institutos e estudos da doutrina do processo geral (que é o processo civil), desde que: a) não esteja aqui regulado de outro modo ("casos omissos", "subsidiariamente"); b) não ofendam os princípios do processo laboral ("incompatível"); c) se adapte aos mesmos princípios e peculiaridades deste procedimento; d) não haja impossibilidade material de aplicação (institutos estranhos à relação deduzida no juízo trabalhista).

O legislador da  Consolidação das Leis do Trabalho não se pronunciou sobre os efeitos da sentença criminal no processo trabalhista, matéria objeto deste estudo, tornando obrigatória a aplicação do art. 769 da CLT acima citado, ou seja, aplicando-se as regras de direito processual comum.

Além disso, dispõe o art. 8º, § único, da Consolidação das Leis do Trabalho que:

[..]

o Direito comum será fonte subsidiária do Direito do Trabalho, naquilo em que não for incompatível com os princípios fundamentais deste.

Essa remissão ao Direito comum autoriza a aplicação do art. 935 do Código Civil, que afirma que "a responsabilidade civil" (e, portanto, a responsabilidade trabalhista) "é independente da criminal; não se poderá, porém, questionar mais sobre a existência do fato, ou quem seja  o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal." e demais dispositivos que versam sobre os efeitos da coisa julgada criminal no juízo cível (art. 91, I, CP; arts. 63 e ss, CPP; art. 74 da Lei 9.099/95), conforme amplamente abordado.

4.1 SOBRESTAMENTO DO FEITO

Feita esta digressão, torna-se possível tirar as conclusões que interessam ao processo trabalhista, especialmente no que se refere ao sobrestamento do feito.

Lembre-se, inicialmente, que só a sentença criminal passada em julgado produz efeitos nos pronunciamentos da Justiça do Trabalho.

Em outras palavras: a sentença no processo penal tem que ser definitiva, irrecorrível  e portanto insuscetível de ser reformada, para produzir efeitos em outro juízo.

Prevê o art. 110 do Código de Processo Civil que:

Se o conhecimento da lide depender necessariamente da verificação da existência de fato delituoso, pode o juiz mandar sobrestar no andamento do processo até que se pronuncie a justiça criminal.

Sobre este caráter facultativo do sobrestamento, é o entendimento consolidado na jurisprudência:

A suspensão do processo, na hipótese de que trata o art. 110 do CPC, é facultativa, estando entregue ao prudente exame do juiz, em cada caso, que deve ter em linha de conta a possibilidade de decisões contraditórias (RSTJ. 71/343).

Entretanto, entende-se que sempre que houver processo-crime em andamento, a respeito dos mesmos fatos discutidos no processo trabalhista,  é recomendável aguardar-se o pronunciamento da Justiça Criminal, para evitar contradições, beneficiando-se, inconscientemente, o autor criminoso, premiando suas práticas ilegais e prejudiciais com a reversão da justa causa ou mesmo a indenização por danos morais.

Neste sentido, afloram algumas decisões nos Tribunais do Trabalho:

"PROCESSO-CRIME EM ANDAMENTO A RESPEITO DOS FATOS DISCUTIDOS EM AÇÃO TRABALHISTA. SOBRESTAMENTO DO FEITO. Aforado processo-crime com a finalidade de verificar a existência de ilícito cuja ocorrência é premissa básica da ação trabalhista, é altamente aconselhável o sobrestamento da reclamatória na medida em que, na ação criminal, o fato poderá ser tido como inexistente ou, até mesmo, poderá ser decidido que o denunciado não praticou o ato que lhe foi imputado. Em conseqüência, determinação nesse sentido não representa ato abusivo ou arbitrário do Juízo da causa". (TRT12. Processo:  Nº: 00796-2001-008-12-00-5. Acórdão13059/2002 – Relator Juiz Marcos Vinicio Zanchetta - Publicado no DJ/SC em 21-11-2002 , página: 159). (grifou-se).

Disponível em www.trt12.jus.br

"SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO. POSSIBILIDADE. Obrigação imposta à exeqüente em sentença proferida no juízo criminal e decorrente de fatos que guardam ligação com o contrato de trabalho. Hipótese que autoriza a suspensão da execução do crédito trabalhista até o trânsito em julgado da decisão penal". (TRT 4, Acórdão n° 0081800-70.2002.5.04.0381, Relator Milton Varela Dutra, 1ª Vara do Trabalho de Taquara, Publicado em 19/04/2007). (grifou-se)

Disponível em www.trt12.jus.br

Note-se que não há obrigação legal de assim proceder, constituindo-se o sobrestamento de uma faculdade do Juiz do Trabalho, para aguardar a solução definitiva do processo-crime.

Se o empregado for condenado no crime, estará sempre configurada justa causa, pelos mesmos fatos. Ainda que tenha havido suspensão da execução da pena e o caso não se enquadre na letra "d" do art. 482 da Consolidação das Leis do Trabalho, enquadrar-se-á sempre em outra alínea: improbidade (letra " a"),  incontinência de conduta ou mau procedimento letra " b" , ofensas físicas ou lesão  à honra e boa fama (letras  " j" ou "k" ) etc.

Se houver absolvição por ter sido negado que o empregado era o autor do ato criminoso, ou se a absolvição for fundamentada na inexistência dos fatos que configurariam crime, não poderá haver justa causa. Mais do que isso, nessas hipóteses não haverá nem mesmo ato faltoso.

Também não haverá justa causa se o empregado houver praticado o ato em estado de necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento de dever ou exercício regular de direito, quando for reconhecida uma dessas circunstâncias no processo-crime (art. 65 do Código de Processo Penal).

Necessário, por fim, abordar rapidamente a controvérsia que persiste sobre o momento processual mais adequado para a determinação do sobrestamento do feito.

Wagner D. Giglio (op cit. p. 44) entende que:

Se se optar pelo sobrestamento, é de toda a conveniência só fazê-lo após proceder-se à instrução completa do processo, suspendendo-se apenas o julgamento. E  isso porque o tempo dilui a prova. Se o sobrestamento ocorrer antes da instrução, a demora no pronunciamento da Justiça Criminal dificultará muito a colheita das provas no processo trabalhista, principalmente no que diz respeito à prova testemunhal.

O contraponto a este posicionamento reside justamente no Princípio da Economia Processual, posto que, nesta hipótese, é bastante possível a realização de atos processuais desnecessários (ouvida das partes e testemunhas, produção de prova pericial), que, dependendo do resultado do processo criminal, não terá qualquer serventia, gerando dispêndio de tempo e dinheiro, não só das partes, como do aparato do Poder Judiciário.


5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a prática de atos delituosos pelo empregado no exercício de suas atividades e a dispensa do mesmo por justa causa, surge a possibilidade de o empregador ver-se surpreendido pelo ajuizamento de ação trabalhista.

Em que pese o sistema jurídico brasileiro adotar a independência de jurisdições, com a ação civil e ação penal autônomas, esta independência sofre certa mitigação. Isto porque subsiste relacionamento entre ambas as esferas, porque a jurisdição, como função decorrente da soberania, é uma só, não se devendo assim admitir a coexistência de decisões antagônicas ou contraditórias.

Entende-se, pois, que sempre que houver processo-crime em andamento que tenha por objeto os mesmos fatos discutidos no processo trabalhista,  é recomendável sobrestar-se o feito trabalhista e aguardar-se o pronunciamento da Justiça Criminal. Tal procedimento se justifica para evitar contradições, beneficiando-se, inconscientemente, o autor criminoso, em afronta, ainda, aos princípios da unidade da jurisdição e economia processual, com a prática de atos que, dependendo do resultado do processo criminal, serão inúteis, desnecessários e dispendiosos.


REFERÊNCIAS

BRASIL. Código Civil Brasileiro, Lei 10.406 de 10.1.2002. Diário Oficial [Da União], Brasília, DF, 11 jan. 2002.

BRASIL, Código de Processo Civil, Lei 5.869 de 11.1.1973. Diário Oficial [Da União], Brasília, DF, 17 jan. 2003.

BRASIL, Código de Processo Penal, DL 3689 de 03.10.1941. Diário Oficial [Da União], Brasília, DF, 13 jout. 2001.

BRASIL,Código Penal, DL 2848 de 07.12.1940. Diário Oficial [Da União], Brasília, DF, 31 dez.1940.

BRASIL, Lei 9099/95. Diário Oficial [Da União], Brasília, DF, 17 set. 1995.

CARRION, Valentin.Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. p. 584)

DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1979, 2 v.

GIGLIO, Wagner D. "Justa Causa" (2000: 43/44),

NERY, JR. Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Novo Código Civil e Legislação Extravagante Anotados: atualizado até 15.03.2002 – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. Parte Geral, v.I , 4ª ed. – São Paulo: Atlas, 2004.

BRASIL.Tribunal Regional do Trabalho da 12ª. Região. Processo:  Nº: 00796-2001-008-12-00-5. Acórdão13059/2002 Processo-Crime em andamento a respeito dos fatos discutidos em ação trabalhista. Sobrestamento do feito. Relator Juiz Marcos Vinicio Zanchetta. Diário da Justiça de SC de 21-11-2002, p 159). Disponível em <www.trt12.jus.br>

BRASIL.Tribunal Regional do Trabalho da 4ª. Região. TRT 4, Acórdão n° 0081800-70.2002.5.04.0381. SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO. POSSIBILIDADE. Obrigação imposta à exeqüente em sentença proferida no juízo criminal e decorrente de fatos que guardam ligação com o contrato de trabalho. Hipótese que autoriza a suspensão da execução do crédito trabalhista até o trânsito em julgado da decisão penal. Relator Milton Varela Dutra. 1ª Vara do Trabalho de Taquara, Publicado em 19/04/2007). Disponível em <www.trt4.jus.br>

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Sobre o autor
Luís Fernando Pamplona Novaes

Advogado. Pós-graduado em Direito Contratual pela PUC/SP. Sócio da Nemetz & Kuhnen Advocacia Empresarial. Responsável pelo Departamento de Direito Empresarial da banca. Professor das cadeiras de Direito Empresarial e Direito dos Contratos da FAE Blumenau e Relações do Trabalho do Instituto Catarinense de Pós-Graduação.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NOVAES, Luís Fernando Pamplona. Os crimes cometidos pelo empregado contra o empregador e o sobrestamento da ação trabalhista. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3127, 23 jan. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20926. Acesso em: 25 nov. 2024.

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