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Commonlawlização no controle difuso de constitucionalidade

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5 MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL DA RESOLUÇÃO DO SENADO FEDERAL NO CONTROLE DIFUSO E O COMMON LAW

Como se sabe, o controle difuso surgiu no Brasil na Constituição da República de 1891, inspirado pelo modelo americano que é da família common law, no qual, qualquer juízo, em caso concreto, poderá declarar a inconstitucionalidade da norma que é considerada nula. Nos Estados Unidos a decisão da Corte Suprema tinha força normativa. No entanto, o Brasil que é da família civil law, não possuía o principio da stare decisis, e resolveu inserir na Constituição de 1934, em honra a separação dos poderes, a resolução do Senado Federal para suspender a norma declarada inconstitucional pelos STF.

Logo, o Brasil não foi coerente com a adoção do modelo americano de controle de constitucionalidade, porque ao colocar o Senado Federal para suspender a norma inconstitucional declarada pelo STF, rejeita a teoria da nulidade de lei incompatível com a constituição. Conforme a crítica do professor Gilmar Mendes (2008) "(...), até porque atribuição de funções substantivas ao Senado Federal era a própria negação da idéia de nulidade da lei devidamente declarada pelo órgão máximo do Poder Judiciário."

Lúcio Bittencourt também faz críticas ao ato do Senado Federal para suspensão da norma:

Se o Senado não agir, nem por isso ficará afetada a eficácia da decisão, a qual continuará a produzir todos os seus efeitos regulares que, de fato, independem de qualquer dos poderes. O objetivo do art.45, IV da Constituição é apenas tornar pública a decisão do tribunal, levando-a ao conhecimento de todos os cidadãos. Dizer que o Senado ‘suspende a execução’ da lei inconstitucional é, positivamente, impropriedade técnica, uma vez que o ato, sendo ‘ineficaz, não pode ter suspensa a sua execução. ( Apud MENDES, 2008).

Além disso, atualmente, o ato do Senado Federal para suspensão da norma inconstitucional está obsoleto. No qual, argumenta em prol da supressão a Patrícia Mello (2008):

a)a necessidade de suspensão da norma declarada inconstitucional pelo Senado e a discricionariedade de sua decisão contrariam a teoria da nulidade da lei inconstitucional, amplamente consolidada no ordenamento brasileiro;

b)a amplitude conferida ao controle abstrato de normas, inclusive com a extensão do rol de legitimados para sua provocação, e a possibilidade de suspensão cautelar da eficácia de leis ou atos normativos, com efeitos vinculantes e gerais, contribuiu para esvaziar a justificativa do art. 52,X, CF;

c)é contraditório admitir que, em sede concentrada, a declaração de inconstitucionalidade produza efeitos erga omnes, e recusar-lhe a mesma eficácia, quando proferida na via incidental;

d)a dispensa da reserva de plenário no sistema difuso, quando o pleno do STF já tiver se manifestado sobre o tema constitucional (art. 481, parágrafo único, CPC), por si só já confere às declarações de inconstitucionalidade produzidas pela Corte efeitos contra todos, em substituição à resolução do Senado;

e)os amplos limites subjetivos das decisões proferidas em demandas coletivas, de igual modo, suprem a necessidade da mencionada resolução do Senado;

f)a possibilidade de um relator, monocraticamente, negar seguimento ou dar provimento ao recurso, tendo em conta sua incompatibilidade ou compatibilidade com a jurisprudência dominante do STF (art. 557, caput e § 1º -A, CPC), constitui mais uma inovação que torna prescindível o art. 52, X, CF;

g)a necessidade de uniformização célere e técnica da jurisprudência desaconselha que se dependa do Senado para conferir eficácia geral às decisões proferidas em sede difuso-incidental.

Diante destes argumentos, demonstra-se que a tendência é dar o efeito erga omnes e vinculante a decisão no controle difuso. Por motivo, da força normativa da Constituição, do princípio da supremacia da Constituição, o STF como guardião da Constituição e a dimensão política do STF que vem enfraquecendo o dispositivo do art.52, inc. X, do CF/88.

O Min. Gilmar Mendes como relator no julgamento da Rcl 4335/AC, que referia ao desrespeito a decisão da Corte no HC 82.959/SP, conheceu da ação por entender que a decisão do STF no controle difuso tem força normativa. Portanto, art. 52, inc. X, da CF/88, que se refere sobre a resolução do Senado Federal para suspender a eficácia da norma inconstitucional declarada pelo STF, era ultrapassada. Ocorrendo, no entanto, mutação constitucional [13] porque a resolução passou a ter um mero efeito de publicidade da decisão, como consta do informativo 454 do STF:

Considerou o relator que, em razão disso, bem como da multiplicação de decisões dotadas de eficácia geral e do advento da Lei 9.882/99, alterou-se de forma radical a concepção que dominava sobre a divisão de poderes, tornando comum no sistema a decisão com eficácia geral, que era excepcional sob a EC 16/65 e a CF 67/69. Salientou serem inevitáveis, portanto, as reinterpretações dos institutos vinculados ao controle incidental de inconstitucionalidade, notadamente o da exigência da maioria absoluta para declaração de inconstitucionalidade e o da suspensão de execução da lei pelo Senado Federal. Reputou ser legítimo entender que, atualmente, a fórmula relativa à suspensão de execução da lei pelo Senado há de ter simples efeito de publicidade, ou seja, se o STF, em sede de controle incidental, declarar, definitivamente, que a lei é inconstitucional, essa decisão terá efeitos gerais, fazendo-se a comunicação àquela Casa legislativa para que publique a decisão no Diário do Congresso. Concluiu, assim, que as decisões proferidas pelo juízo reclamado desrespeitaram a eficácia erga omnes que deve ser atribuída à decisão do STF no HC 82959/SP. Após, pediu vista o Min. Eros Grau.

Rcl 4335/AC, rel. Min. Gilmar Mendes, 1º.2.2007. (Rcl-4335)

No entanto, este caso não foi decidido ainda, o Min. Gilmar Mendes foi acompanhado pelo Min. Eros Grau que pediu vista, e os Min. Sepúlveda Pertence e Joaquim Barbosa não acataram a tese do relator.

Diante o exposto, a doutrina, atualmente, menciona que a decisão do STF no controle difuso poderá ter eficácia transcendente dos motivos determinantes. Bem como, o HC 82.959/SP que a Corte considerou inconstitucional o art. 2º, § 1º, da Lei n. 8.072/90, a qual vedava a progressão de regime aos condenados de crimes hediondos. Não é decisão que tem efeito vinculante, porém a ratio decidendi deste julgamento que se torna norma.

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Presentemente, está ocorrendo o fenômeno da commonlawlização no controle difuso de constitucionalidade. No qual, este processo iniciou com a adoção do modelo americano de controle na Constituição de 1891, e com a constitucionalização do direito está avançando para uma aproximação ao sistema common law. Conforme Patrícia Mello (2008) menciona:

Quanto aos pontos em comum, as decisões proferidas pelo STF em sede difusa se assemelham muito à sistemática do judge made law: referem-se a um litígio entre partes e geram, além de um dispositivo concreto, que soluciona a lide, uma exegese geral sobre a questão constitucional. Tal identidade é compreensível, na medida em que esta via de controle de constitucionalidade se inspirou no direito norte-americano.

E alguns dos fundamentos para este fenômeno da commonlawlização são: a) controle difuso de constitucionalidade é decidido em caso concreto, semelhante a common law; b) a teoria da transcendência dos motivos determinantes, semelhante a ratio decidendi da stare decisis; c) a independência e a ascensão do poder judiciário; d) o papel criativo do juiz através de uma nova hermenêutica constitucional; e) as normatividades dos princípios constitucionais com a idéia de um sistema axiológico e aberto; f) e a força normativa da Constituição; g) STF enquanto guardião da Constituição.


6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O referente texto tenta mostrar que existe aproximação do sistema common law com jurisdição brasileira ratificando o fenômeno da commonlawlização, mormente no controle difuso de constitucionalidade, que foi inspirado no modelo americano. A possível mutação constitucional do art. 52, inc. X, CF/88 dá vigor à teoria da transcendência dos motivos determinantes que ficou demonstrada na semelhança com o preceito da stare decisis, segundo o qual, no caso concreto, retiram-se fundamentos da decisão que transcendem as partes.


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

DANTAS, Paulo Roberto de Figueiredo. Direito Processual Constitucional. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2010.

DAVID, René. Os Grandes Sistemas do Direito Contemporâneo. Trad. Hermínio A. Carvalho. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

______. Os Grandes Sistemas do Direito Contemporâneo. Trad. Hermínio A. Carvalho. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 14 ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

MARINS, Lucas Belloc. A Sistemática da Teoria do Precedente Judicial e a Gradual Introdução de Princípios da Common Law no Direito Brasileiro. Disponível em <http://www.abdpc.org.br/abdpc/artigos/Lucas> acesso em: 20 ago. 2011.

MELLO, Patrícia Perrone Campos. Precedentes: o desenvolvimento judicial do direito no constitucionalismo contemporâneo. Rio de Janeiro: Renovar, 2008.

MENDES, Gilmar Ferreira, et. al. Curso de Direito Constitucional. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

PORTO, Sérgio Gilberto. Sobre a Common Law, Civil Law, e o Precedente Judicial. Disponível em <http://www.abdpc.org.br/abdpc/artigos/Sergio> acesso em: 20 ago. 2011.

SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 27ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008.


Notas

  1. DAVID, René, Os Grandes Sistemas do Direito Contemporâneo, p.356
  2. Tribos de origem germânica – saxões, anglos e dinamarqueses ( id.ibid, p.356)
  3. Civil Law pertence a família romano-germânica, no qual a fonte primordial é a lei.
  4. O rei Henrique VIII queria divorciar da Catarina de Aragão, mas o Papa Clemente VII recusou o seu pedido. Posteriormente, o rei consegue invalidar o seu casamento e é excomungado pelo Papa. Por isso, o rei retira a autoridade papal no seu reinado.
  5. Assim se designa o corpo ou coleção de leis que regem a Igreja Católica (SILVA, De plácido e. Vocabulário Jurídico. p. 465).
  6. Denominação dada ao direito dos antigos romanos, até a codificação de JUSTINIANO (id.ibid. p 478)
  7. É conceito fundado no princípio da liberdade individual, que deve ser regulada pelos costumes e por um conjunto de formalidades, imutáveis, eternas. (SILVA, De Plácido. Vocabulário Jurídico. p. 475)
  8. É locução latina que se traduz: contra todos (SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. p. 541)
  9. PORTO, Sérgio Gilberto. Sobre a Commo Law, Civil Law, e o Precedente Judicial. Disponível em <http://www.abdpc.org.br/abdpc/artigos/Sergio> acesso em: 20 ago. 2011.
  10. Id.ibid.
  11. PORTO, Sérgio Gilberto. Sobre a Common Law, Civil Law, e o Precedente Judicial. Disponível em <http://www.abdpc.org.br/abdpc/artigos/Sergio> acesso em: 20 ago. 2011.
  12. PORTO, Sérgio Gilberto. Sobre a Common Law, Civil Law, e o Precedente Judicial. Disponível em <http://www.abdpc.org.br/abdpc/artigos/Sergio> acesso em: 20 ago. 2011.
  13. Mutação constitucional é quando tem uma mudança no conteúdo do texto constitucional sem modificar, no entanto, a tua forma física.
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Sobre o autor
Carlos Alberto dos Santos Almeida

Policial Militar do Distrito Federal. Acadêmico de Direito em Brasília (DF).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, Carlos Alberto Santos. Commonlawlização no controle difuso de constitucionalidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3130, 26 jan. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20940. Acesso em: 4 nov. 2024.

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