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Aspectos controvertidos do depósito recursal

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26/01/2012 às 15:22
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Estatística na Justiça do Trabalho

O número crescente de recursos na Justiça do Trabalho é fato de notória preocupação, já que sobrecarrega o judiciário e resulta no atraso do julgamento dos processos.

Há que se definir formas de lidar com essa sobrecarga de trabalho na Justiça Trabalhista, já que as verbas lá discutidas são de natureza alimentar.

Segue abaixo o número de processos nos últimos anos, que evidencia um constante aumento nos números na Justiça do Trabalho:

 

Desde 1941

Ano

Processos

Recebidos

Julgados

Resíduo

2010 *

1.694.496

1.686.330

1.470.749

2009

2.974.042

2.914.547

1.453.709

2008

2.740.952

2.730.431

1.451.949

2007

2.636.798

2.580.396

1.418.029

2006

2.446.914

2.368.212

1.391.769

2005

2.401.273

2.268.279

1.314.642

* Dados atualizados até setembro

No TST, os casos novos são:

 

2010*

107.575

2009

157.335

2008

147.923

2007

139.323

2006

120.544

2005

93.806

* Dados atualizados até setembro

Conforme dados estatísticos contidos no site do Tribunal Superior do Trabalho – TST, só de agravo de instrumento o TST recebeu em 2009 um total de 142.650 agravos de instrumento, dos quais apenas 4,9% foram providos [13], (6.990), fato que prejudica o julgamento de outros processos.

Considerando o período de janeiro a junho, foram autuados 53.816 AIRR e 19.946 RR, 21% e 33% a mais, respectivamente, que em 2009.

Utilizando o agravo de instrumento como exemplo, fica óbvio que tem o depósito recursal, enquanto desestimulador de interposição de recursos procrastinatórios, a finalidade de contribuir de forma significativa para a celeridade processual. No entanto há de se frisar também que o juízo de retratação deveria ser utilizado com mais freqüência como forma de se alcançar a tão almejada celeridade no processo trabalhista.

Até o momento não se tem as estatísticas quanto ao agravo de instrumento, após a obrigatoriedade de depósito recursal, porém, certamente haverá redução significativa em face da exigência do depósito em questão, já que, como visto anteriormente, somente 4,9% dos agravos de instrumentos foram acolhidos no ano de 2009.

No entanto, por outro lado, há previsão de aplicação de multas quando a interposição de recursos procrastinatórios.

Conforme notícia veiculada em 08/12/2010, no Valor Econômico, "...o Tribunal Superior do Trabalho (TST) já aplicou cerca de 1,2 mil multas no percentual de 10% sobre o valor da causa às partes que recorreram de decisões da Corte para o Supremo Tribunal Federal (STF), por meio do chamado agravo de instrumento". [14]


Dos meios alternativos de garantia de juízo e de desestímulo ao recurso meramente protelatório

A jurisprudência dominante entende que não há a possibilidade de isenção de depósito recursal para as microempresas, não obstante ser detentora do benefício da assistência judiciária gratuita, já que o depósito recursal tem por fim a garantia de juízo.

É de conhecimento comum que muitas microempresas operam no limite da sustentabilidade econômica, o que por si só se conclui, que estas pequenas empresas não poderão arcar com os custos elevados do depósito recursal para interpor recurso.

É preciso repensar uma forma de tratar a situação ora vislumbrada, já que muitas microempresas não têm acesso ao duplo grau de jurisdição, pois não possuem condições financeiras para efetuar o deposito recursal, sem prejudicar o bom andamento das atividades empresariais.

Como forma alternativa de garantia de juízo poderia haver uma opção de substituição da garantia em dinheiro por outra garantia, como por exemplo, a apresentação de um determinado bem como garantia ou um valor diferenciado para os depósitos em questão.

Existe um projeto de Lei (7047/2010) que visa a redução do valor do depósito recursal em ação trabalhista quando o recorrente for microempresa ou empresa de pequeno porte inscrita no Simples Nacional para 50%. Atualmente o projeto de lei está sujeito à apreciação conclusiva na Câmara dos Deputados.

É imprescindível que não se busque a duração razoável do processo a todo custo, sem a observância dos demais preceitos constitucionais.

Além disso o tribunal poderia condenar a parte por litigância de má fé ao constatar o objetivo procrastinatório do recurso interposto, como ocorre em alguns casos.

Se a própria Constituição Federal assegura um tratamento jurídico diferenciado às pequenas e médias empresas, é de se admitir uma flexibilização do depósito recursal a estas empresas, seja por meio de substituição da pecúnia por um determinado bem, seja na redução do valor como o pretendido no projeto de lei 7047/2010.


CONCLUSÃO

Os princípios da celeridade e da efetividade devem nortear a Justiça do Trabalho, garantindo, destarte, uma duração razoável do processo, porém, é imprescindível que tal celeridade não seja pretendida a todo custo, sem a observância do contraditório, da ampla defesa e do duplo grau de jurisdição.

Constata-se a necessidade de um tratamento desigual entre as empresas de grande e pequeno porte, visando o princípio da isonomia e do duplo grau de jurisdição, mesmo porque assim dispõe a Constituição Federal de 1988.

Atribuindo-se tratamento diferenciado às microempresas, sanaríamos um grave defeito da lei do depósito recursal, qual seja, o impedimento de se recorrer das decisões, já que as microempresas não possuem, via de regra, condições financeiras de arcar com o depósito recursal.

É fato que muitas microempresas não terão condições de arcar com o alto valor do depósito recursal, o que certamente significará um número considerável de "desistências" de interposição de recurso, que por sua vez, contribuirá para uma Justiça mais célere.

Alcançar a tão almejada duração razoável do processo por estas vias escusas não é forma adequada de resolver a celeuma.

Há países que adotam a obrigação de efetuar o depósito recursal para interposição de recurso, porém, no caso da Espanha, os valores são menores dos que os praticados no Brasil. Assim, temos que na Espanha "todo aquél que no ostente la condición de «trabajador o causahabiente suyo o beneficiario del régimen público de Ia Seguridad Social», debe consignar la cantidad de 150 euros si recurre en suplicación y 300 euros si en casación, incluida la casación para unificación de doctrina (LPL, art. 227). [15]

Não se trata, no caso em tela, de defender a extinção do depósito recursal e, tampouco, sugerir que os valores poderiam ser menores do que os praticados hoje, seguindo as quantias estabelecidas pela Espanha, por exemplo, mas sim de demonstrar a necessidade de se estabelecer uma "diferenciação" de tratamento às microempresas.

É de se destacar recente julgado do TST, que deferiu a isenção de depósito recursal para Reclamada que demonstrou miserabilidade jurídica, conforme consta do processo RO - 1200300-67.2009.5.02.0000, ao qual trancrevo trecho relevante do Ministro Pedro Paulo Teixeira Manus:

"De forma cautelosa, vem sendo admitida, para pessoa jurídica, a gratuidade de Justiça, condicionada à demonstração cabal e inequívoca de que ela não pode arcar com as despesas do processo sem que, com isso, prejudique seu funcionamento e administração, o que a Corte Regional não verificou.

Todavia, diante da análise apurada da documentação colacionada, percebo assistir razão à recorrente, no sentido de que não tem como dispor de R$3.800,00 (três mil e oitocentos reais), importância relativa a 20% do valor dado à causa, diante do faturamento apresentado à fl. 16.". [16]

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Assim, consoante entendimento do TST, no sentido de que a gratuidade de Justiça deve ser concedida à Reclamada, com extensão ao depósito recursal, desde que haja demonstração inequívoca de miserabilidade jurídica, vislumbra-se um importante passo na jurisprudência, que vem de encontro a solução de se propiciar às empresas mais suscetíveis às dificuldades financeiras, notadamente, as microempresas, um tratamento diferenciado.


Bibliografia

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BEBBER, Júlio César. Recursos no processo do trabalho. 02ª edição. São Paulo. Editora LTR. 2009;

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DERVICHE, Victor Rafael. Súmulas, Orientações Jurisprudenciais e Precedentes Normativos do Tribunal Superior do Trabalho. 04ª edição. São Paulo. Editora Método. 2008;

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MARQUES JÚNIOR, José Guilherme. O depósito recursal como obstáculo à ampla defesa das pequenas e microempresas. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 662, 29 abr. 2005. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/6644>. Acesso em: 15 set. 2010;

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MARTINS, Sérgio Pinto. Direito processual do trabalho. 22ª Edição. São Paulo. Editora Atlas. 2007;

NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito processual do trabalho. 05ª edição. São Paulo. Editora Saraiva. 2010;

OLEA, Manuel Alonso e GARCÍA. Rosa Maria Alonso. Derecho procesal del trabajo. 16ª edição. Madrid. Editora Civitas. 2010;

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SARAIVA, Renato. Processo do trabalho. 04ª edição. São Paulo. Editora Método. 2008;

TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Sistema dos recursos trabalhistas. 10ª edição. São Paulo. Editora LTR. 2003;

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Sobre o autor
Fábio Nunes de Lima

Advogado em São Paulo (SP). Integrante do grupo de trabalho da Pró-Reitoria de Pós-Graduação da PUC/SP. Mestre em Direito do Trabalho pela PUC/SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Fábio Nunes. Aspectos controvertidos do depósito recursal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3130, 26 jan. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20943. Acesso em: 16 abr. 2024.

Mais informações

Texto elaborado como requisito parcial para aprovação na disciplina "Recursos no Processo Trabalhista", no Mestrado em Direito da PUC/SP.

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