(i) Considerações Preliminares:
Etimológicamente, a palavra " internet " significa " rede internacional de computadores, que por meio de diferentes tecnologias de comunicação e informática, permite a realização de atividades, tais como: correio eletrônico, grupos de discussão, computação de longa distância, transferência de arquivos e programas, lazer, compras, pesquisas e estudos, etc ", sendo certo, que tais atividades são realizadas por meio dos provedores de acesso.
De outra parte, o " world wide web " (w.w.w), tem na base da sua constituição, a veiculação de uma elevada gama de informações e dados, através das chamadas " homepages " (páginas pessoais), cuja construção e disponibilização, estão intimamente ligadas aos objetivos de seus autores.
O que vale dizer, as páginas pessoais são elaboradas de conformidade com os objetivos que norteiam os seus idealizadores, vinculando-se única e exclusivamente ao público alvo que se pretende atingir. Assim, navegando pela rede mundial, o internauta encontra toda a sorte de informações sobre qualquer assunto, genérico ou específico, com facilidade e rapidez.
Porém, na medida em que as páginas pessoais são construídas, os elementos que a integram, são compostos de fotografias, desenhos, animações, textos informativos, pesquisas, trabalhos científicos e outros, que como já mencionado, traduzem a expressão direta dos objetivos dos seus autores. E nesse esteio, nascem inúmeros questionamentos quanto a autoria, tais como:
O proprietário de uma página na internet, adquire os direitos autorais sobre todos os elementos que a constituem e a integram?
Os conteúdos veiculados estariam totalmente protegidos, na medida em que sua veiculação e disponibilização pode ser utilizada por terceiros, sem que exista em contrôle mais rigoroso por parte do seu titular ?
Os conteúdos, pelo simples fato de serem vinculados junto a rede mundial, seriam caracterizados como materiais de domínio público, na medida em que qualquer internauta poderia reproduzí-los, sem que houvesse a prévia autorização do autor ?
(ii)
Disposições Legais AplicáveisTenho que a questão do direito autoral no ciberespaço, especialmente no que concerne a proteção do material veiculado e dos direitos de criação na rede mundial computadores, deve ser analisada com base nos instrumentos legais e institutos de direito já existentes e que abaixo são relatados:
É sabido que a Carta Constitucional de 1988, assegura a todos os cidadãos, o direito à liberdade de expressão, quanto ao exercício de atividades intelectuais, artísticas, científicas e de comunicação, independentemente de prévia censura e licença. Trata-se do Princípio da Liberdade de Expressão, que se encontra consagrado no Inciso IX, do artigo 5.º, e, é a base essencial da proteção do direito autoral, no sistema jurídico brasileiro !
Todavia, mister se faz que essa dogma constitucional, seja agregada a outras duas disposições constantes no Capítulo dos Direitos e Garantias Individuais, quais sejam:
a) aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar (artigo 5.º Inciso XXVII);
b) são assegurados nos termos da lei: a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas, o direito de fiscalização do aproveitamento econômico das obras que criarem ou de que participarem aos criadores, aos intérpretes e às respectivas representações sindicais e associativas (artigo 5.º, Inciso XXVIII, alíneas " a " e " b ").
Além disso, o cáput do artigo 220 da CF diz que: " A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição ".
Adicionando-se ao teor das disposições insculpidas na " Constituição Cidadã ", que cuidam da definição dos direitos quanto a autoria, não se pode esquecer que a Lei Federal n.º 9.610/98, trata especificamente da Proteção dos Direitos Autorais.
Um exame mais detalhado da referida lei, nos leva ao encontro de fundamentos destinados a assegurar a proteção necessária aos materiais veiculados dentro do " world wide web "(w.w.w.), como é o caso do cáput do artigo 7.º que diz:
..." Art. 7.º - São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, (...)"...
Reside aqui a exata definição do que vem a ser uma obra intelectual protegida, que segundo a visão do legislador, consiste nas " criações do espírito ". Daí se perguntar o que significa a expressão criação do espírito ?
Entendo que criação do espírito, consiste em tudo aquilo que decorre da livre manifestação de pensamento do ser humano, de cunho eminentemente subjetivo e proveniente da sua intelectualidade, e que poderá ou não, ser exteriorizado perante a coletividade.
Contudo, o legislador vai mais além, especialmente quando diz que as obras intelectuais protegidas poderão ser expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, conhecido ou que seja inventado no futuro. Depreende-se pois, a perfeita simetria da hipótese prevista em lei para a questão da rede mundial de computadores.
O que importa para o campo do direito autoral, é que todas as criações do espírito, frente ao caráter da originalidade, produzidas, armazenadas e distribuídas, quer seja no mundo real, quer seja no mundo virtual, produzem os mesmos efeitos, e como tais, se encontram sob a tutela da proteção do direito de autoria, sendo pois insuscetível de relevância, a forma ou o meio que será adotado para a exteriorização da obra intelectual, seja ele conhecido por todos ou mesmo aqueles que poderão surgir futuramente.
(iii) O Registro da Obra – obrigatoriedade ou não
Superada esta etapa, que me parece tranqüila quanto a proteção do direito autoral de obra intelectual veiculada na rede mundial de computadores, há que se perguntar:
A obra intelectual antes de ser objeto de veiculação no " world wide web " (w.w.w.), carece de registro para que assim, o direito do seu autor seja protegido, contra o uso indevido ?
Nos termos consubstanciados no artigo 18, da Lei n.º 9.610/98, a proteção dos direitos autorais não depende de registro. Este na verdade, de acordo com o disposto no artigo 19, é uma faculdade outorgada ao autor, que poderá proceder ou não o registro de sua obra junto ao orgão competente.
Em outras palavras, a condição principal para que uma obra seja objeto de proteção reside na sua criação, independentemente de qualquer outra providência por parte do autor.
Contudo, penso que a prudência sempre é o melhor remédio para evitar maiores dores de cabeça, ou seja, na hipótese de uma discussão de cunho judicial, que envolva a necessidade de identificação do verdadeiro titular de uma obra intelectual, aquele que apresentar documento hábil que demonstre a sua condição de criador, certamente encontrará a proteção jurisdicional em seu benefício de maneira mais rápida !
(iv) Hipóteses de reprodução e/ou publicação praticadas indevidamente
Para reforçar o meu entendimento quanto a necessidade de se proceder o efetivo registro, chamo a colação, algumas das seguintes definições constantes no artigo 5.º da Lei n.º 9.610/98, que para os efeitos de proteção aos direitos do autor de obra intelectual:
- publicação – consiste no oferecimento de obra literária, artística ou científica ao conhecimento do público, com o conhecimento do autor, ou de qualquer outro titular de direito do autor, por qualquer forma ou processo (Inciso I); - reprodução – a cópia de um ou vários exemplares de uma obra literária, artística ou científica ou de um fonograma, de qualquer forma tangível, incluindo qualquer armazenamento permanente ou temporário por meios eletrônicos ou qualquer outro meio de fixação que venha a ser desenvolvido (Inciso VI); - contrafação – a reprodução não autorizada (Inciso VII);
A caracterização das situações acima mencionadas, podem ser passíveis de adequação ao mundo do " w.w.w.", na medida em que seja identificada a reprodução indevida de conteúdos constantes nas páginas da " web " (sem o consentimento expresso dos autores), especialmente quando tais conteúdos, são provenientes de criações originais do espírito de seus autores.
O que vale dizer, se for vivenciada a hipótese de publicação e/ou reprodução de obra, entendendo-se como tais, os conteúdos veiculados nas " homepages " sem prévia autorização do seu criador, dar-se-á o efetivo descumprimento do disposto no Inciso XXVII, do artigo 5.º da Carta Constitucional (que outorga o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, ao autor), além de atingir frontalmente os dispositivos consubstanciados na Lei n.º 9.610/98, em evidente lesão aos direitos do autor.
E, diante de tais circunstâncias, sob a égide da proteção legal, é assegurado aos autores das criações originais do espírito, o direito de ajuizar medida judicial de contrafação, pugnando pelo imediato sobrestamento da veiculação indevida, sem prejuízo de eventual ação indenizatória destinada ao ressarcimento dos danos morais e patrimoniais que possam ter sido causados.
(v) Conclusões:
Razão pela qual, tenho que o registro da obra, embora se trate de mera faculdade constante no artigo 19 da Lei de Proteção dos Direitos Autorais, é medida que deve ser adotada de forma subsequente a criação da obra, pois, evidenciadas as hipóteses de publicação e/ou de reprodução, sem o prévio consentimento do autor, frente a propositura de eventual ação de contrafação, a comprovação de registro quanto a autoria, terá fundamental importância na dilação probatória, de sorte a caracterizar a titularidade em perfeita consonância com a preservação do direito do autor, diante do Poder Judiciário !