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Suspensão no fornecimento de energia elétrica ao locatário (lojista) inadimplente em shopping center

31/05/2012 às 14:56
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A suspensão do fornecimento de energia não pode se fundar no aspecto da inadimplência do pagamento dos aluguéis, ou dos encargos comuns ou do “fundo de promoção e propaganda”.

Antes de adentrar a possibilidade de suspender o fornecimento de energia elétrica ao locatário (lojista) de loja de Shopping Center inadimplente, tema do presente artigo, insta esclarecer a sistemática do fornecimento de energia elétrica ao lojista e a forma de apuração e cobrança pelo consumo.

A grande maioria dos Shopping Centers em funcionamento hoje no Brasil não possuem para cada loja instalada em seu complexo ‘Padrão de Energia’ próprio e independente vinculado diretamente à concessionária de serviço público, com cobrança direta realizada por esta, pois na realidade o Empreendimento conta com único ‘Padrão de Energia’. A exceção são as operações de maior porte (ex. supermercado), quando, normalmente, a relação se dá diretamente entre estas operações e a concessionária.

Assim, diante do fato de que as lojas instaladas nos Shopping Centers utilizam-se de energia elétrica fornecida através de um mesmo Padrão de Energia, o empreendedor, diretamente ou através da Administração do Shopping/Condomínio, se vale de aparelhos medidores instalados em cada loja para aferir o consumo individual, a fim de efetuar a cobrança mensal conforme consumo específico.

Assim, na prática, a concessionária de serviço público, ao efetuar a cobrança do consumo de energia elétrica mensal do Shopping Center emite uma única fatura, para o Padrão de Energia existente, e com base no consumo apontando o Empreendedor/Administração do Shopping/Condomínio apura por meio dos aparelhos medidores instalados em cada loja o consumo das mesmas e a responsabilidade de cada lojista no custeio/rateio do pagamento da fatura.

Ou seja, existe uma relação entre o Empreendedor e a concessionária de serviço público e outra relação entre o Empreendedor e os locatários.

Desta feita, apurados os valores devidos por cada locatário em decorrência do consumo realizado, com fulcro em seus Contratos Atípicos de Locação, Normas Gerais e da Convenção de Condomínio, aqueles são obrigados a pagar a sua cota-parte do consumo de energia elétrica, consumo este inserido na categoria de encargos específicos da locação, haja vista ser proveniente exclusivamente de sua operação/atividade.

Ocorre que, invariavelmente, alguns locatários permanecem inadimplentes com o pagamento dos aluguéis (mínimo e o percentual), encargos comuns, fundo de promoção e propaganda (FPP) e dos encargos específicos, por longos períodos, gerando prejuízo ao Empreendedor, pois este, além de não receber os aluguéis, acaba arcando com a cota-parte do inadimplente nos valores devidos de encargos comuns e encargos específicos, haja vista das obrigações que se vencem perante terceiros (prestadores de serviços, funcionários, concessionárias de serviço público – água/esgoto e outras).

Diante de tal cenário de prejuízo ao Empreendedor, configurando uma situação até mesmo desfavorável a todo o Empreendimento considerado (Shopping Center), surge a possibilidade de pressão ao lojista inadimplente, para que efetue o pagamento, e de estancar o aumento do prejuízo, isto através da suspensão do fornecimento de energia elétrica a este locatário.

Cabe ressalvar que a referida suspensão do fornecimento de energia elétrica não pode se fundar no aspecto da inadimplência do pagamento dos aluguéis, ou dos encargos comuns ou do “fundo de promoção e propaganda”, pois posições contrárias entendem que existiriam outros meios para se efetuar tal cobrança e que tal prática seria abuso de direito, haja vista a ação de execução decorrente de crédito de aluguel e encargos acessórios, tais como taxas e despesas de condomínio (art. 585, inciso IV, do Código de Processo Civil).

Desta feita, a possibilidade de suspensão do fornecimento de energia elétrica do locatário de loja de Shopping Center inadimplente com o pagamento do consumo de energia e, se for o caso, de outros valores (aluguel, encargos comuns e FPP), funda-se na inadimplência deste quanto ao pagamento apenas da energia elétrica utilizada.

Perante a concessionária de serviço público que fornece a energia elétrica ao Shopping através do único Padrão de Energia Elétrica instalado, o responsável é o Empreendedor. Assim, este deve honrar com o pagamento de toda a fatura, utilizando-se dos valores recebidos dos locatários conforme consumo de cada um em sua loja e arcando com a cota-parte de locatário inadimplente.

Ocorre que, diante de um cenário de inadimplência do locatário relativo ao seu consumo de energia elétrica, a situação pode se mostrar insustentável dado ao elevado débito deste título (energia elétrica).

Insustentável, pois, com a inadimplência, o Empreendedor, que, para honrar com o compromisso perante da concessionária de serviço público, aporta quantia relativa a parte do lojista devedor, ou seja, realiza pagamento que não é de sua responsabilidade. Desta maneira, conforme for o montante devido, a continuidade deste aporte pode se mostrar impossível ou temerário, onerando demasiadamente o Shopping Center como um todo.

Lado outro, tendo em vista que a relação entre o Empreendedor (seja diretamente ou através da Administração do Shopping ou Condomínio) e o locatário é de locação com regramento próprio e normas bem definidas (Normas Gerais), tal como permitido pelo art. 54 da Lei nº. 8.245/91, e somando ao fato de que o Empreendedor não é agência reguladora e nem prestador de serviço público, nem se trata de uma relação consumerista, não estaria o Empreendedor obrigado a observar para o corte de energia o prazo de notificação (15 dias) previsto na Resolução Normativa nº. 414/2010 da ANEEL (art. 172, inciso I c.c. o art. 173, inciso I, alínea “b”).

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Entretanto, valendo-se de tal previsão, até mesmo para justificar e fundamentar o corte de energia elétrica, em analogia à relação existente e em atenção às disposições da referida Resolução da ANEEL, e também em face de constar, se for o caso, de tal corte em seu Instrumental Jurídico (Normas Gerais), o Empreendedor poderia se valer de tais previsões para efetuar a suspensão do fornecimento de energia elétrica ao lojista, respeitando-se o prazo de 15 (quinze) dias da notificação tal como na Resolução supramencionada.

Importa informar que tais medidas possuem respaldo, em situações análogas, no entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, no Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, no Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo e no Egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina, senão vejamos:

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - DANOS MORAIS - CORTE DO FORNECIMENTO DE ÁGUA - CONDOMÍNIO - EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO DO CONDOMÍNIO - AUSÊNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS PARA A RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL - IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. A AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS TEM COMO PRESSUPOSTO PRINCIPAL A OCORRÊNCIA DA CONDUTA CULPOSA E A EXISTÊNCIA DE UMA RELAÇÃO ENTRE TAL CONDUTA E OS POSSÍVEIS DANOS SOFRIDOS. NOS TERMOS DO ARTIGO 333, INCISO I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, AO AUTOR DA AÇÃO INCUMBE O ÔNUS DE DEMONSTRAR AS CIRCUNSTÂNCIAS BÁSICAS E ESSENCIAIS A QUE DE DIREITO DO SE LHE RECONHEÇA O DIREITO POSTULADO NA PEÇA VESTIBULAR. CONFIGURA EXERCÍCIO REGULAR DO CONDOMÍNIO O CORTE DO FORNECIMENTO DE ÁGUA DO CONDÔMINO INADIMPLENTE, POR SE TRATAR DE BEM DISPONIBILIZADO PELO PRÓPRIO CONDOMÍNIO, E FINANCIADO PELOS CONDÔMINOS. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJMG - NÚMERO DO PROCESSO:  1.0024.06.308722-5/002(1))

COBRANÇA. COTAS CONDOMINIAIS. INADIMPLÊNCIA. PROCEDÊNCIA. INCONFORMISMO. DISCUSSÃO JÁ APRECIADA POR ESTE COLEGIADO QUANDO DO IMPROVIMENTO DA APELAÇÃO CÍVEL Nº 11.526/2001. CONDOMÍNIO EXISTENTE HÁ MAIS DE 20 (VINTE) ANOS. NECESSIDADE DE PAGAR AS COTAS CUJA FINALIDADE VISAM O BEM ESTAR DOS CONDÔMINOS, CONSUBSTANCIADO NA CONTRATAÇÃO DE EMPREGADOS E VIGILANTES, NA MANUTENÇÃO DAS PISCINAS E QUADRAS, NA DISTRIBUIÇÃO DE ÁGUA POTÁVEL, SERVIÇOS ESTES QUE O APELANTE NÃO PODE E NÃO DEVE USUFRUIR SEM O SEU PAGAMENTO, SOB PENA DE ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA RECORRIDA. REJEIÇÃO DE PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. CONHECIMENTO E IMPROVIMENTO DO APELO."(AC Nº 2004.001.22335. TJRJ. REL.: DES. RAUL CELSO LINS E SILVA. 17ª CÂMARA CÍVEL. JULGADO EM 27.10.2004).

AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE - CONDOMÍNIO - INADIMPLÊNCIA - CORTE NO FORNECIMENTO DE ÁGUA - PREVISÃO NA CONVENÇÃO - POSSIBILIDADE - POSSE - IMPOSSIBILIDADE - INTERESSE DA COLETIVIDADE - APELO ADESIVO - PEDIDO - LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ - NÃO OCORRÊNCIA. EXISTINDO PREVISÃO NA CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO NO SENTIDO DE SUSPENDER O FORNECIMENTO DE ÁGUA AO CONDÔMINO INADIMPLENTE, A ADOÇÃO DESTA MEDIDA SE MOSTRA JUSTA E LEGAL EM RAZÃO DE NÃO SE ONERAR DESNECESSARIAMENTE TODA A COLETIVIDADE. POSSE É O EXERCÍCIO DE UM DOS DIREITOS INERENTES À PROPRIEDADE, O MODO PELO QUAL ESTA SE MANIFESTA. PORTANTO, SE ÁGUA É INSUSCEPTÍVEL DE APROPRIAÇÃO NÃO HÁ COMO SE FALAR EM POSSE OU ESBULHO. AINDA MAIS, QUE NÃO EXISTE SERVIDÃO. SE O INTERESSE EM LITÍGIO SE REFERE A DIREITOS DE TODA COLETIVIDADE DE CONDÔMINOS ELE DEVERÁ PREVALECER EM PROL DESTA SOBRE O INTERESSE DO CONDÔMINO PARTICULAR, AINDA MAIS INADIMPLENTE CONFESSO.(TJMG – AC. 1.0188.02.001191-5/0001 – REL. DES. UNIAS SILVA – 15ª CÂMARA CÍVEL – JULGADO EM 23/03/2006).

DESPESAS DE CONDOMÍNIO. AÇÃO OBJETIVANDO A COMPOSIÇÃO DE DANOS MORAIS, EM DECORRÊNCIA DE CORTE DE FORNECIMENTO DE ÁGUA. COBRANÇA DESSA TARIFA QUE VEM DISCRIMINADA NO BOLETO DE PAGAMENTO DAS DESPESAS CONDOMINIAIS. APROVAÇÃO DO CORTE POR ASSEMBLÉIA CONDOMINIAL. CORTE DO FORNECIMENTO QUE SE APRESENTA LEGAL, E NÃO VIOLA QUALQUER DIREITO DA APELADA, DE VEZ QUE INADIMPLENTE COM AS DESPESAS DO CONDOMÍNIO HÁ MUITO TEMPO. INSUSTENTÁVEL A R. SENTENÇA, POIS A MASSA CONDOMINIAL NÃO ESTÁ OBRIGADA A PAGAR POR DESPESAS DE INADIMPLENTE, SOB RISCO DE SE IMPOR VERDADEIRO CAOS AO CONDOMÍNIO. PRECEDENTES. RECURSO PROVIDO, PARA FINS DE REFORMA DA DECISÃO.” (TJSP, 33ª CÂMARA CÍVEL, APELAÇÃO 990.09.232060-2, REL. DES. CARLOS NUNES, J. 16.8.2010, V.U.)

CONDOMÍNIO. NÃO PAGAMENTO DE TAXA CONDOMINIAL. CORTE DE ÁGUA. POSSIBILIDADE. DANO MORAL INEXISTENTE.I - CONFIGURA-SE, POR VEZES, MEDIDA NECESSÁRIA O CORTE DE ÁGUA DE UNIDADE INADIMPLENTE, QUANDO APROVADA EM ASSEMBLÉIA, UMA VEZ QUE A INADIMPLÊNCIA FERE FRONTALMENTE O DIREITO DOS DEMAIS CONDÔMINOS, QUE DEPENDEM DO NUMERÁRIO PARA MANUTENÇÃO, CONSERVAÇÃO E O BEM ESTAR DE TODOS.II - RECURSO PROVIDOAPELAÇÃO CÍVEL (2). INTEMPESTIVIDADE. JUSTA CAUSA. INOCORRÊNCIA. NÃO CONHECIMENTO.I - NÃO OCORRENDO JUSTA CAUSA, REVELA-SE INTEMPESTIVO O RECURSO PROTOCOLADO FORA DO PRAZO ASSINALADO EM LEI.II - RECURSO NÃO CONHECIDORECURSO ADESIVO. ATO ILÍCITO NÃO CONFIGURADO. DANO MORAL INEXISTENTE.I - RECURSO ADESIVO DESPROVIDO. (TJSC - APELAÇÃO CÍVEL N.º 448.710-3 – REL. ANTONIO IVAIR REINALDIN)”

Ademais, da mesma forma que se possibilita a suspensão do fornecimento de energia elétrica em face do não pagamento deste consumo pelo locatário de loja de Shopping Center, caso o lojista possua consumo específico de água/gás(GLP) em sua loja, da mesma maneira, havendo o inadimplemento quanto ao pagamento deste encargo conforme cota-parte de sua responsabilidade, a suspensão do fornecimento de água/gás(GLP) é medida necessária e justa.

Inclusive coaduna com este entendimento a seguinte lição de NELSON KOJRANSKI: “se a concessionária ostenta legitimidade para interromper o fornecimento de água e ou de energia elétrica, o condomínio também pode repassar a sanção ao infrator. Até porque se esse inadimplente residisse em casa de rua, seria diretamente atingido pela interrupção. É de se admitir, pois, que o condomínio se comporta como intermediário entre a concessionária e o condômino consumidor.” (in Tribuna do Direito, ano 18, n. 216, abril/2011)

Assim, vê-se que é perfeitamente viável e juridicamente abalizada a suspensão do fornecimento de energia elétrica ou de outro consumo que gere encargo específico ao locatário de loja de Shopping Center inadimplente com o pagamento relativo ao referido consumo em sua loja (encargo específico), bem como se verifica que tal medida se presta como forma efetiva ao pagamento pelo locatário de outros valores em aberto.

Por fim, cabe esclarecer que a medida ora exposta deve ocorrer apenas em situações extremas, quando o montante devido em razão do referido encargo específico se mostrar alto e o pagamento pelo Empreendedor insustentável, pois a despeito de juridicamente abalizada e do respeito por analogia do prazo de notificação das agências reguladoras, entendimentos contrários podem existir para fundamentar eventual pleito de perdas e danos por parte do locatário em razão da suspensão do fornecimento de energia elétrica, contudo, o êxito em tais demandas, em caso de observância do correto procedimento antes do corte da energia elétrica, ficaria dificultoso ou prejudicado.

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Sobre o autor
Gustavo de Ávila Rajão

Advogado - Gerente da área de Contratos/Consultivo Imobiliários e de Shopping Center do escritório Portela & Lima Advogados Associados. Graduado em Direito pela Universidade Fumec. Aperfeiçoado em Direito Contratual pelo IPEC (Instituto Paulista de Educação Continuada) e Pós-Graduando em Direito Imobiliário pela Universidade Gama Filho.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RAJÃO, Gustavo Ávila. Suspensão no fornecimento de energia elétrica ao locatário (lojista) inadimplente em shopping center. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3256, 31 mai. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21906. Acesso em: 22 nov. 2024.

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