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Repercussões jurídicas extrapatrimoniais do instituto da ausência numa perspectiva constitucional

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24/06/2012 às 18:02
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CONCLUSÃO

Em última análise, o tema ora apresentado serviu, sobretudo, para ilustrar como deve ser feita a exegese de nossa lei infraconstitucional civil aos auspícios do neoconstitucionalismo, que traz a força normativa da constituição como pressuposto maior na aplicação do direito no caso concreto, aqui, do instituto da ausência no seio do himeneu civil brasileiro.

Assim sendo, não se pode mais admitir que o jurista pretira o comando posto na lei máxima, ainda mais quando o conteúdo material desta norma só fortalece o Estado democrático de direito, tendo por princípio maior a dignidade da pessoa humana.

Ínsito, então, que é dessa construção doutrinária, o nascer de um sistema normativo e jurisprudencial sintonizado com o fenômeno da constitucionalização dos diversos ramos do direito; que ultrapassamos a didática, porém arcaica divisão do direito em público e privado; é desse processo de irradiação direta no caso concreto das normas constitucionais que o direito civil é relido, para a felicidade dos Estados que só serão sustentados com real soberania se souberem, sobretudo dentro do bojo jurídico interno, respeitar os direitos humanos e, assim, se for o caso, relegar ao segundo plano a simples aplicação da lei, entendendo que sua mera subsunção não tem de per si o condão de verdadeiramente engendrar para a sociedade a tão almejada paz social.

Verifica-se ser fato que o sistema normativo em tese foi e é desenvolvido para atender um ideal de justiça, que num Estado democrático de direito, alicerçado no princípio da isonomia (como é a sociedade ocidental), é erigido nos fatos do dever ser legal (normas jurídicas sucessivas que vigoraram e ao longo da linha do tempo cooperaram para a construção do atual arcabouço jurídico) do sentir coletivo, hodiernamente representado por valores que ultrapassam o plano material, configurando a extrapatrimonialidade.

Doutro modo falando, é do conhecimento dos operadores do direito que a obediência à estrita legalidade não é sinônimo de exarar as decisões mais acertadas, pois as circunstâncias fáticas e jurídicas, bem como as nuances envolta ao caso, devem ser consideradas para a tomada de uma decisão ou prática dum ato.

Deve-se considerar, nesse conduto expositivo, que precisamos realizar uma abordagem que preze os vários vértices possíveis de análise, fazendo, por que (razão) não, uma miscelânea dos conceitos e interpretações que melhor justifique nossa posição de sempre colocarmos no topo o bem estar da sociedade civil, mediante a efetivação dos propalados direitos humanos.

O direito, em primeira análise, entendido como conjunto de normas que tem por razão de existência essencial servir de instrumento na busca incessante da aplicação desse ideal de justiça, precisa ser repensado rotundamente a nível mundial. E isso envolve ousar, quebrar paradigmas estanques, a procura de soluções para os problemas de interesse social, sempre almejando o bem de todos, a bem da preservação da dignidade humana.

É a partir dessa concepção que se observa o desenvolvimento de uma lógica jurídica aberta, fundada nos valores patrimoniais sim, mas acima de tudo, fulcrada em valores abstratos, existenciais, que dispensam, apesar de ser a tônica da pós-modernidade jurídica, sua positivação para ser respeitados pelos aplicadores do direito, pois por natureza possuem o condão de aplicação imediata no caso concreto das relações ditas privadas, considerando que são elementos inatos ao ser humano e que expressos, ainda que de maneira subtendida, estão na leitura sistemática de toda a nossa Constituição.

Nesse sentir, constata-se que todas as mudanças legislativas fundadas na doutrina dos valores extrapatrimoniais, onde se privilegia o valor imaterial intrínseco em toda relação negocial, vieram justamente para possibilitar ? no caso do desaparecimento e configuração da ausência ? ao consorte a escolha de querer, ou não, permanecer a uma situação de indefinição angustiante, o que lesa sobremaneira, diante da fugacidade da vida, o desenvolvimento sadio e feliz de uma família.

Vê-se, assim, que a mens legis ao promover a alteração da festejada emenda 66/2010, foi a de conferir uma desburocratização e com isso ganho de tempo, condição sine qua non para que ocorra o respeito aos princípios da duração razoável do processo e, sobretudo, da dignidade da pessoa humana.

Destarte, por todo o exposto, em conformidade com o neoconstitucionalismo e sua força normativa; considerando, assim, que o direito civil recebe os raios dessa força consubstanciada na esperança e consolidação de um direito civilista pós-moderno, denominado direito civil constitucional, alicerçado num direito verdadeiramente humano e menos patrimonial; considerando que a emenda constitucional 66/2010 veio justamente para materializar tais valores jurídicos existenciais nos casos concretos surgidos; concluímos que não resta outra alternativa, senão aplicar, diante da configuração do instituto da ausência, a norma insculpida no parágrafo 6º do art.226 da Constituição Federal de 1988, decretando-se, se for a vontade do cônjuge supérstite, o divórcio de imediato, assegurando-se, como efeito consequente, a sua condição de curador, se assim quiseres, dos bens do ausente, até porque ? enquanto o ausente não voltar (se voltar) ? ninguém saberá se de fato o desaparecimento foi provocado por uma justa e inevitável causa.


REFERÊNCIAS

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Nota

1 Apesar de não ser objeto do presente estudo, interessante anotarmos que as bases objetivas clínicas a serem observadas para constatação de morte encefálica são: “coma aperceptivo com ausência de atividade motora supra-espinal e apnéia” e, complementarmente: “Ausência de atividade elétrica cerebral ou, ausência de atividade metabólica cerebral ou, ausência de perfusão sangüínea cerebral”, com intervalos mínimos entre as duas avaliações clínicas necessárias para a caracterização da morte encefálica de 48 horas, se 7 dias a 2 meses incompletos de vida; de 24 horas se 2 meses a 1 ano incompleto; de 12 horas se de 1 ano a 2 anos incompletos e acima de 2 anos, com intervalos 6 horas de acordo com os art. 4º, 5º e 6º da resolução nº 1.480/97 do Conselho Federal de Medicina (BRASIL, 1997).

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Sobre o autor
Everton Evangelista Guerra

Bacharel em Direito pela Faculdade Estácio de Sá de Sergipe e Pós-graduando em Direito Civil e Processual Civil pela Faculdade Estácio de Sá de Sergipe e ex-estagiário da Procuradoria Geral do Estado de Sergipe. Aprovado no Exame da Ordem.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GUERRA, Everton Evangelista. Repercussões jurídicas extrapatrimoniais do instituto da ausência numa perspectiva constitucional. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3280, 24 jun. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22085. Acesso em: 2 nov. 2024.

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