RESUMO: O presente trabalho aborda o ensino religioso no Brasil no âmbito da escola pública, sob a égide da Constituição Federal e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
Palavras-Chave: Ensino Religioso. Escola Pública. Religião.
A legislação brasileira acerca do ensino religioso tem se modificado ao longo da sua inserção nas escolas, de modo a exercitar o convívio das diferenças religiosas e de ampliar o conhecimento religioso como substrato importante da vivência em sociedade.
Religião, conforme se infere dos ensinamentos de Carlos Lopes de Mattos, é a “crença na dependência em relação a um ser superior que influi no nosso ser- ou ainda –a instituição social de uma comunidade unida pela crença de seus ritos[1]”.
Ensino, segundo o dicionário Aurélio Básico de Língua Portuguesa, é a “transmissão de conhecimentos, informações ou esclarecimentos úteis e indispensáveis à educação ou a fim determinado”.
No âmbito educacional, nas escolas públicas de ensino fundamental o ensino religioso é disciplina facultativa, sendo ela inserida nos horários normais escolares, conforme determinação do artigo 210, parágrafo 1º da Carta Maior, ao dispor que “O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental.”
A proteção estatal à liberdade religiosa possibilita, dessa forma, tanto a mudança de religião conforme as preferências pessoais dos indivíduos, quanto à formação de novos grupos religiosos, de maneira que o indivíduo passa a ter o direito legal de construir sua identidade religiosa como bem entender, premissa fundamental para a compreensão do que se chama “sincretismo religioso no Brasil”.
A educação religiosa é identificada como forte elemento civilizador, sendo, no entanto, questionada em alguns de seus métodos, razão pela qual a legislação brasileira tem se adaptado a essa realidade, buscando discutir no âmbito das políticas públicas a inserção da cultura no contexto escolar.
A partir do comando constitucional, a disciplina o Ensino Religioso na escola pública foi proposta por diferentes órgãos e em documentos oficiais, tais como: Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, os Parâmetros Curriculares Nacionais, do Ministério da Educação e do Desporto; os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso, do Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso; dentre outros.
A Nova Lei de Diretrizes e bases da Educação em seu artigo 33 - Lei n° 9.394 de 20 de dezembro de 1996 com redação dada pela Lei n° 9475, de 22 de julho de 1997 que legisla sobre este assunto do seguinte modo:
Art.33° - O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo.
§ 1° - Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores.
§ 2° - Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição do ensino religioso
Conforme se observa, a referida Lei é bastante ampla e ambígua, deixando várias lacunas a serem preenchidas pelos Conselhos Estaduais de Ensino conforme realidade e vivências regionais, ficando para as Secretarias Estaduais de Educação e os Conselhos de Educação sua regulamentação. Além disso, existe a possibilidade do Projeto Político Pedagógico de cada unidade escolar adaptar tal legislação à sua realidade vivencial.
Por tais razões, toda e qualquer legislação no âmbito do ensino religioso deve ser analisado à luz do art. 5º, VI da Constituição Federal de 1988, no sentido de que “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção dos locais de culto e suas liturgias”. Tal princípio engloba a liberdade de consciência, a liberdade de crença e a liberdade de culto.
Para Pinto Ferreira, “a Liberdade Religiosa é o direito que tem o homem de adorar a seu Deus, de acordo com sua crença e seu culto”.[2] Segundo Emerson Giumbelli, as condições associadas à liberdade religiosa são as seguintes:
(...) separação entre Estado e igrejas, não intervenção do Estado em assuntos religiosos, restrições dos grupos confessionais ao espaço privado, igualdade das associações religiosas perante a lei, garantia de pluralismo confessional e de escolha individual.[3]
O direito à liberdade de religião é inerente à condição humana, e a religiosidade é um fenômeno sociológico que ganha importância jurídica, graças aos princípios constitucionais, dentre eles o de liberdade.
A inviolabilidade da liberdade de consciência, de crença e de culto constitui a resposta política adequada aos desafios do pluralismo religioso, permitindo desarmar o potencial conflituoso entre as várias concepções.[4]
Trata-se de um Estado Laico, que não se confunde com um Estado ateu, mas sim um Estado onde se respeitam todos os credos e sua exteriorização. Assim sendo, não há confusão com a Igreja, onde os legitimados são aqueles escolhidos pelo povo, pontuando a importância da democracia em um Estado Laico.
O modelo de ensino religioso, estabelecido na Constituição Federal de 1988 e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996, assumiu um caráter pluralista, não confessional, enfatizando os aspectos antropológicos das religiões e, portanto, teoricamente desvinculado da Igreja católica.
Por outro lado, deve ser levado em consideração que o Estado brasileiro é laico e o poder público deve manter-se independente em relação aos cultos religiosos ou igrejas, protegendo e garantindo o livre exercício de todas as religiões, sempre com vistas ao alcance do interesse público, com a garantia da liberdade religiosa, ampliando o espaço conferido ao fenômeno religioso, sempre que forem invocadas pelos cidadãos as garantidas legais.
Por fim, cumpre destacar que numa sociedade democrática como a brasileira, é do interesse de todos a defesa do direito de escolha de cada um, respeitando a liberdade dos demais. Dessa forma, qualquer forma de discriminação deve ser combatida na escola, pois esta é um espaço plural em termos de pensamentos e manifestações, devendo ser pregados o diálogo e a compreensão, em lugar do proselitismo e da intolerância.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília 1988.
BRASIL. Lei de diretrizes e bases da educação nacional. Lei n. 9394/96. Brasília 1996.
GIUMBELLI, Emerson. A presença da Igreja Universal do Reino de Deus no espaço público brasileiro: liberdade religiosa, fora do lugar?Paper apresentado na XXVI conferênciaSociedade Internacional de Sociologia das Religiões. Ixtapan de La Sal, México, 20-24 de agosto de 2001. P. 4
HABERMAS, Jurgen. Entre naturalismo e religião. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, trad. de Flávio Siebeneichler, 2007 [Zwischen Naturalismus und Religion. Frankfurt: Suhrkamp, 2005].
MATOS, Carlos Lopes de- in “Vocabulário Filosófico“, Edições Leia, São Paulo, 1957.
SORIANO, Aldir Guedes – Liberdade Religiosa no Direito Constitucional e Internacional – São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2002, pág.5.
Notas
[1] MATOS, Carlos Lopes de- in “Vocabulário Filosófico“, Edições Leia, São Paulo, 1957.
[2] SORIANO, Aldir Guedes – Liberdade Religiosa no Direito Constitucional e Internacional – São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2002, pág.5.
[3] GIUMBELLI, Emerson. A presença da Igreja Universal do Reino de Deus no espaço público brasileiro: liberdade religiosa, fora do lugar?Paper apresentado na XXVI conferênciaSociedade Internacional de Sociologia das Religiões. Ixtapan de La Sal, México, 20-24 de agosto de 2001. P. 4
[4] HABERMAS, Jurgen. Entre naturalismo e religião. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, trad. de Flávio Siebeneichler, 2007 [Zwischen Naturalismus und Religion. Frankfurt: Suhrkamp, 2005]. p.136.